Acórdão nº 00929/14.9BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | Lu |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: NMVMCO (…) interpõe recurso jurisdicional de sentença proferida pelo TAF de Coimbra, que julgou improcedente a providência cautelar de admissão provisória a concurso ou exame (art.º 112º, nº 2, b), do CPTA) por si interposta contra o Centro de Estudos Judiciários (…).
No seu recurso, em que, a final, se peticiona a revogação do decidido e a procedência da providência, o autor conclui: 1. A sentença de fls., debalde douta, deve ser revogada.
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A sentença de fls. é um acto processualmente nulo – enquanto acto processual de competência jurisdicional –, por preterição do princípio do contraditório (cf. artigo 3º, nº 3 do CPC), tudo com as legais consequências.
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Pelo que, deve dar-se provimento à arguida nulidade, anulando-se a sentença de fls., ordenando-se a baixa dos autos à 1ª Instância de forma a que seja conferido ao requerente o contraditório quanto à oposição de fls. oferecida pelo CEJ, tudo com as legais consequências.
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Sem prescindir ou conceder do acima exposto, e por mera cautela legal de patrocínio, mercê da posição adoptada pelo CEJ, quando confrontado com o arrazoado do requerente e os documentos por si juntos com o requerimento inicial de fls. (os mesmos que constam do PA, aliás), deve dar-se por assente a factualidade descrita nos artigos 39 a 43 do requerimento inicial de fls.
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Deve ainda dar-se por assente o conteúdo dos documentos juntos como docs. 13 a 18 com o requerimento inicial de fls.
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O método de selecção e recrutamento previsto no RRAJ é um método de avaliação curricular, cf. resulta cristalinamente dos vários pontos do artigo 12º daquele Regulamento.
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Trata-se de uma metodologia genericamente prevista para o provimento administrativo de vagas no âmbito da vulgarmente denominada “função pública”, cf. Portaria nº 145-A/2011, de 6.04.
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Assim, primeiro que tudo, o candidato deve apresentar um CV factualmente orientado para a demonstração das competências que pretende ver reconhecidas, acolitando esse CV com os documentos pertinentes.
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O recorrente invocou no seu CV (cf. doc. 4), e entre o mais, a experiência profissional que sumariamente consta dos artigos 39º e ss. do requerimento inicial de fls.
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Tal experiência assenta, nomeada e particularmente, e de forma mais duradoura, consistente e longeva, no exercício de funções como gerente/administrador de sociedades, ou seja, como Membro de Órgãos Estatutários (MOE).
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No seu CV (v. doc. 4), o recorrente indica actos e factos concretos relacionados com o exercício daquelas funções, bem como áreas e matérias da actividade empresarial em que a mesma se desdobrou.
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Em diferentes sociedades (mais precisamente, oito sociedades, cf. artigo 88º do requerimento inicial de fls.).
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Para prova dessa qualidade, e do lapso temporal em que a mesma decorreu, o (ora) recorrente juntou três documentos emitidos pela Segurança Social (i.e., pelo ISS, IP), que constituem o extracto de remunerações, com os respectivos descontos, relativos ao recorrente nos últimos 23 anos, pelo menos (i.e,, desde 1990 até 2014).
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Ora, o CEJ entende que tais documentos, por si só, não comprovam o exercício da actividade de “gestão de empresas”.
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O Tribunal recorrido, por seu turno, e de forma telegráfica, entende que essa posição do recorrido “(…) não é irrazoável”.
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Com o devido respeito, não é possível concordar com tal entendimento.
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Diga-se desde já que a avaliação desses documentos, enquanto meios probatórios relevantes da factualidade inscrita no CV do recorrente não contemplam qualquer juízo técnico específico próprio da função administrativa.
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A desvalorização desses documentos é um exemplo claro de erro de avaliação por parte da Administração, por contrariar as regras da lógica mediana e da experiência comum.
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Além disso, é duplamente ilegal.
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Com efeito, está em causa nos presentes autos a existência – e preterição – de um dever, por parte do CEJ, de convidar o candidato a, em caso de insuficiência documental da sua candidatura, vir completar a mesma.
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Tal dever está genericamente previsto para todos os procedimentos públicos de selecção e recrutamento, ou, em geral, de contratação pública.
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A actuação contrária, que foi a professada pelo recorrido – e pelo Tribunal recorrido –, contraria, entre outros, os princípios gerais de direito administrativo da cooperação, da verdade, da justiça material e da participação procedimental dos interessados, cf. artigos 4º, 6º, 6º-A, 7º e 8º, todos do CPA (velho).
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Note-se que o apontado dever emerge especificamente para o caso sub judice do artigo 7º, nº 2, da Lei nº 22/2013, de 26.02, que estabelece o Estatuto dos Administradores Judiciais, diploma cuja aplicação ao caso dos autos é suscitada directamente pelo Decreto-Lei nº 134/2013, de 4.10, diploma que habilitou o CEJ a elaborar o RRAJ.
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Assim, os documentos juntos pelo recorrente são idóneos e suficientes para a demonstração do exercício da actividade de “gestão de empresas”, para os efeitos previstos no artigo 12º do RRAJ (avaliados à luz dos critérios normais de experiência e da lógica do homem médio).
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Não entendendo dessa forma, sempre deveria o CEJ ter convidado o recorrente a prestar os esclarecimentos tidos por necessários, nomeadamente mediante a junção de outra documentação tida por idónea.
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Aliás, e conforme resulta dos documentos juntos aos autos como documentos 13 a 18, o CEJ presumiu quanto a outros candidatos aquilo que diz não poder presumir (!) quanto ao recorrente.
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Visto o exposto supra, aplicando a fórmula prevista no artigo 12º do RRAJ, e alterando apenas a classificação atribuída quanto ao 1º factor de densificação da experiência profissional – i.e., mantendo todas as demais pontuações atribuídas pelo(s) júri(s) –, verificamos que o recorrente sempre teria, pelo menos, a classificação de 14,8 valores.
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O que lhe confere um lugar elegível, com direito à frequência do estágio e realização do exame final.
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Sem termos de entrar aprofundadamente na avaliação da actuação do júri.
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Assim, a pretensão do recorrente é justa e legítima, e tem tudo para proceder em sede de tutela principal.
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O que deverá ser valorado para efeitos de tutela cautelar, seja pela al. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, seja pela al. b) do mesmo normativo.
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Debalde o Tribunal a quo não se ter pronunciado sobre os mesmos, por desconsiderar a existência de fumus boni iuris relevante – erradamente, como vimos –, a verdade é que o decretamente cautelar, no caso dos autos, assenta num periculum in mora autodemonstrado, pela natureza extraordinária e urgente do procedimento em causa – o que motivou, aliás, o decretamento provisório, ao abrigo do artigo 131º do CPTA, 33. Não havendo qualquer risco de lesão para o interesse público.
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Pelo que deve o recurso proceder, com todas as legais consequências, decretando-se a tutela cautelar requerida a fls., nos termos do petitório do requerimento inicial de fls.
O recorrido apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: 1.
Feito o devido cotejo legal e jurisprudencial, mormente atendendo ao disposto no n.º 3 do artigo 118.º, n.º 1 do artigo 119.º, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, n.º s 3 e 4 do artigo 3.º e n.º 1 do artigo 195.º, ambos do Código de Processo Civil, e ao vertido nos Acórdãos do TCA Norte, datados de 23/09/2010, proc. n.º 00648/10.5BEBRG, e de 16/12/2011, proc. n.º 00877/11.4BEBRG, não existe cominação legal expressa que determine a nulidade em caso de prolação de decisão final com preterição da notificação ao requerente da oposição apresentada pelo requerido.
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No caso sub judice é de afastar a existência da nulidade processual derivada da falta de notificação da oposição e da preterição do princípio do contraditório, já que nenhuma matéria de exceção foi suscitada em que fosse de conceder a possibilidade de o Recorrente se pronunciar, pelo que, a omissão da notificação em causa não tem a aptidão de influir no exame ou na decisão da causa.
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Nessa medida, é possível afirmar que, observada a formalidade omitida, a decisão que viesse a ser tomada seria a mesma, do que se infere que tal omissão não se mostra como suscetível de influir nos contornos factuais e jurídicos que presidiram e nos quais assentou a decisão judicial posta em crise.
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O mesmo se diga em relação à falta de notificação do documento junto com a oposição – sentença proferida no âmbito do processo cautelar n.º 2513/14.8BELSB que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada –, já que o mesmo em nada influiu ou interferiu com o sentido da decisão que foi proferida, porquanto o documento em causa não traz nada de novo em termos factuais, tratando-se de citação jurisprudencial.
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Quanto à factualidade assente, da análise cuidada do teor da oposição, verifica-se à saciedade a alegação de factos que no seu essencial são, desde logo, incompatíveis com os invocados no requerimento inicial, donde resulta a visão contraditória das partes quanto ao objeto do litígio.
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De facto, os documentos juntos pelo Requerente, ora Recorrente, não foram postos em dúvida (quanto à sua autoria, falsidade e conteúdo), mas o Recorrido, na sua oposição, expressa-se sobeja e expressamente sobre os documentos juntos ao requerimento inicial, retirando deles (do seu teor) as suas conclusões (cfr., e a título de exemplo, os artigos 57.º a 73.º da oposição).
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O Recorrido ao defender como se defendeu não confessou: impugnou. Porquanto contradisse os factos articulados no requerimento inicial, em particular, quando afirmou que dos documentos que acompanham o requerimento inicial não resultam factos que possam produzir o efeito jurídico pretendido pelo Recorrente. É por tudo isto, que não se alcança a alegada “confissão tácita” invocada pelo Recorrente.
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Ainda a este propósito, o Tribunal a quo considerou assente que o ora Recorrente remeteu o respetivo Curriculum vitae (CV) também submetido por...
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