Acórdão nº 01432/12.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução17 de Abril de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: JMMS e FCRSS vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador, de 31.01.2014, e do acórdão, de 06.06.2014, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o primeiro na parte em que julgou verificada a excepção de incompetência material para apreciar o pedido de reconhecimento do direito de propriedade dos autores e absolveu o demandado do pedido de indemnização, e o segundo a julgar totalmente improcedente a acção interposta pelos ora recorrentes contra o Município de VNG, para impugnação dos actos praticados por dois Vereadores daquela edilidade, de 27.02.2008 e de 16.04.2012, que ordenaram, o primeiro, a demolição de uma edificação dos autores na Escarpa da SP, e o segundo o prosseguimento das acções de fiscalização da Câmara Municipal naquele local.

Invocaram para tanto, em síntese, que: o despacho saneador recorrido violou o preceituado no art.º 15.º do CPTA e no art.º 91.º do CPC ao declarar o Tribunal Administrativo e Fiscal incompetente para o conhecimento incidental da questão do reconhecimento do direito de propriedade dos ora recorrentes, e bem assim violou o disposto nos artigos 4.º e 47.º do CPTA ao declarar ilegal a cumulação dos pedidos formulados pelos recorrentes, no que toca ao pedido indemnizatório; quanto ao acórdão, defendem que ao recusar-se a decidir sobre existência ou não de condições de solidez, segurança ou salubridade do imóvel, com perigo para os recorrentes ou para terceiros, sob a alegação de que se trata de matéria da competência do recorrido enquanto entidade administrativa, deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, sendo, consequentemente, nulo por omissão de pronúncia (art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC); finalmente, assentando a doutamente decidida improcedência da acção no pressuposto da violação do art.º 18.º do RGEU, isto é, na consideração de que as fundações do edifício não estão estabelecidas sobre terreno estável e suficientemente firme, sem a adequada prova, o douto acórdão recorrido padece de deficit instrutório, insuficiência de matéria de facto para a decisão e falta de especificação de fundamentos de facto que justifiquem a decisão.

O recorrido contra-alegou defendendo a manutenção de ambas as decisões recorridas.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer do sentido da procedência do recurso quanto ao acórdão por insuficiência da matéria de facto.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto dos recursos jurisdicionais: - Do despacho saneador:

  1. O douto despacho saneador viola o preceituado no art.º 15.º do CPTA e no art.º 91.º do CPC ao declarar o Tribunal Administrativo e Fiscal incompetente para o conhecimento incidental da questão do reconhecimento do direito de propriedade dos ora recorrentes.

  2. O mesmo douto despacho viola o disposto nos art.ºs 4.º e 47.º do CPTA ao declarar ilegal a cumulação dos pedidos formulados pelos recorrentes, no que toca ao pedido indemnizatório.

  3. O Tribunal a quo deveria, por conseguinte, ter conhecido da questão do direito de propriedade, embora incidentalmente e com as legais restrições dos efeitos da decisão, e dos formulados pedidos indemnizatórios.

    - do acórdão: D) Por sua vez, o douto acórdão recorrido incorre em erro de julgamento ao não julgar procedente a acção com base na alegada falta de adequada fundamentação dos actos impugnados, em especial do despacho de 27 de Fevereiro de 2008, do Senhor Vereador AGB.

  4. O mesmo douto acórdão incorreu igualmente em erro de julgamento ao não ter como procedente e invalidante o alegado vício da falta de audição da recorrente mulher.

  5. O douto acórdão recorrido, acompanhando acriticamente e sem provas a posição do Réu, assenta no errado pressuposto de o edifício dos recorrentes viola o art.º 18.º do RGEU.

  6. Não existe em qualquer relatório do LNEC que conste dos autos (ou de qualquer outro que se conheça) uma qualquer afirmação ou, muito menos, demonstração de que as fundações do edifício dos recorrentes não estejam estabelecidas sobre terreno estável e suficientemente firme.

  7. Ao recusar-se a decidir sobre existência ou não de condições de solidez, segurança ou salubridade do imóvel, com perigo para os recorrentes ou para terceiros, sob a alegação de que se trata de matéria da competência do recorrido enquanto entidade administrativa, o douto acórdão deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, sendo, consequentemente, nulo por omissão de pronúncia (art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC).

  8. Assentando a doutamente decidida improcedência da acção no pressuposto da violação do art.º 18.º do RGEU, isto é, na consideração de que as fundações do edifício não estão estabelecidas sobre terreno estável e suficientemente firme, sem a adequada prova, o douto acórdão recorrido padece de deficit instrutório, insuficiência de matéria de facto para a decisão e falta de especificação de fundamentos de facto que justifiquem a decisão.

    * II – Matéria de facto.

    Julgaram-se provados os seguintes factos: 1. Através do ofício n.º 136/2008, datado de 23/01/2008, da Câmara Municipal de VNG, subscrito pelo Vereador AGB, o autor marido foi notificado para se pronunciar, querendo, sobre a intenção de ordenar a cessação da utilização indevida do edifício em questão no prazo de 15 dias “(…) nos termos do disposto nos artigos 100.º e segs. e 149.º do Código de Procedimento Administrativo e nos artigos 100.º e 109.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, bem como de ordenar a demolição total do edifício e consequente reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data de início da respectiva construção, demolição essa que deverá ser executada no prazo de 30 dias, sendo que, no caso de tal ordem não ser acatada, o presidente da Câmara determinará a respectiva demolição por conta do infractor” (cf. doc. nº 1 junto com a p.i. e que aqui se dá por integralmente reproduzido).

    1. De seguida, o autor marido foi notificado, através de ofício de 10/04/2008, do despacho do Vice-Presidente da Câmara, MAC, datado de 19 de Março de 2008, que, com base em diferentes considerandos sobre a Escarpa da SP, determina "a suspensão de todas as iniciativas municipais para aquele local, nomeadamente as respeitantes aos procedimentos administrativos de tutela da legalidade urbanística em curso, com vista a colaborar, coordenadamente, com o Ministério da Administração Interna na intervenção que lá venha a ser produzida" (cf. doc. nº 3 junto com a p.i. e que aqui se dá por integralmente reproduzido).

    2. O autor marido foi notificado no dia 23/04/2012 do conteúdo do ofício n.º 3380/2012, datado de 17/04/2012, do Município de VNG, do qual consta que (…) por despacho de 16 de Abril de 2012 da Senhora Vereadora do Pelouro da Fiscalização, foi determinado notificar o autor do "levantamento da suspensão das iniciativas municipais para a Escarpa da SP, ordenada por despacho da Senhora Vereadora, de 21/03/2011, uma vez que, atento o teor do despacho n.º 17/2009, de 30/04/2009, proferido pela Senhora Governadora Civil do Distrito do Porto, estão reunidas as condições necessárias ao levantamento da suspensão ordenada, retomando-se os procedimentos de fiscalização urbanística desencadeados para aquele local" (…) "deverá dar cumprimento ao despacho do Senhor Vereador AGB, de 27/02/2008 que ordenou a cessação da utilização e demolição total da edificação sita na Rua…, freguesia de Santa Marinha, bem como a reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data de início da respectiva construção, em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 106.º do citado diploma legal, no prazo anteriormente concedido, ao qual deve acrescer um prazo adicional de 10 dias, perfazendo um total de 30 dias (…).

      A decisão notificada foi devidamente fundamentada, nos termos do disposto nos artigos 124.º e 125.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), porquanto foram indicados os factos que motivaram a comunicação de intenção de cessação da utilização e subsequente demolição do edifício, a saber, o acidente ocorrido em 24 de Setembro de 2006 na Escarpa da SP a um conjunto de edificações localizadas na mesma Escarpa, o relatório elaborado pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), e a inexistência de licença administrativa da edificação".

      (…) decorrido o mencionado prazo, sem que se verifique o cumprimento voluntário das mencionadas ordens, foi já determinado, por despacho de 16 de Abril de 2012, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 107.º do D. L. n.º 555/99, de 16 de Dezembro, na sua atual redação, a posse administrativa do imóvel sito no local acima identificado, no dia 5 de Junho de 2012, a partir das 10:00 horas e pelo período estritamente necessário ao cumprimento da ordem de demolição total da edificação referida e reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data de início das respectivas construções, sitas na Rua…, freguesia de Santa Marinha deste município, por terem sido realizadas ilegalmente, em violação do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º do citado diploma, com custos a v/cargo" (cf. doc. nº 1 junto com a p. i. e que aqui se dá por integralmente reproduzido).

      III - Enquadramento jurídico.

    3. O recurso do despacho saneador.

      1.1. A competência do tribunal administrativo para conhecer do pedido incidental do direito de propriedade – o artigo 15.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos; o artigo 91.º do Código de Processo Civil.

      Determina o artigo 15.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“Extensão da competência à decisão de questões prejudiciais”).

      1 - Quando o conhecimento do objecto da acção dependa, no todo ou em parte, da decisão de uma ou mais questões da competência de tribunal pertencente a outra jurisdição, pode o juiz sobrestar na decisão até que o tribunal...

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