Acórdão nº 01292/06.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução19 de Junho de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Município de AV, devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa especial, intentada contra o Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, tendente à declaração de nulidade ou anulação do Despacho do Secretário de Estado do Ambiente de 08/05/2006, do qual resultou a emissão de Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável com condicionantes, relativamente ao projeto “Aproveitamento Hidroelétrico de S...”, inconformado com o Acórdão proferido em 30 de Outubro de 2013, em coletivo, no TAF de Braga, que confirmando pretérita decisão singular de 1 de Junho de 2012, veio julgar a ação “totalmente improcedente”, veio interpor recurso jurisdicional.

Formula o aqui Recorrente/Município nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentado em 6 de Dezembro de 2013, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 489 a 536 Procº físico).

“A – DA CADUCIDADE DA DIA 1ª. A DIA emitida, em 2006.05.08, caducou, pelo menos, em 2008.05.08, conforme se reconheceu no despacho do Senhor Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, de 2012.10.24 (v. nºs. 14 e 17 dos FP), ex vi do disposto no art. 21º/1 do DL 69/2000, de 3 de Maio, pois até ao presente não foi dado início à execução do projeto em causa – cfr. texto nºs. 1 e 2; 2ª. Contrariamente ao decidido no douto Acórdão recorrido, a questão jurídica da caducidade da DIA pode e deve ser conhecida no presente processo, pois: a) Trata-se de questão de conhecimento oficioso, que pode ser alegada em qualquer fase do processo e deve ser apreciada e decidida no presente processo (v. art. 333º do C. Civil), pois o art. 21º/1 do DL 69/2000, de 3 de Março, integra claramente norma imperativa e injuntiva, excluída da vontade e disponibilidade das partes, e visa prosseguir interesses de ordem pública, no domínio do ambiente e qualidade de vida (v. art. 66º da CRP) – cfr. texto nºs. 3 e 3.1.; b) O art. 65º do CPTA (cfr. art. 48º da LPTA) impõe a apreciação da referida questão, que resulta de factos verificados na pendência do presente processo, declarando-se a caducidade da DIA (cfr. arts. 20º, 22º, 212º/4 e 268º/3 da CRP) – cfr. texto nº. 3.2.; c) A questão jurídica da caducidade da DIA pode e deve ainda ser conhecida no presente processo, ex vi do disposto nos arts. 608º/2 e 611º/1 do NCPC, pois é de conhecimento oficioso e resulta de factos alegados e provados (v. nº. 17 dos FP), não estando o Juiz sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (v. art. 5º/3 do NCPC) – cfr. texto nº. 3.3.; d) No caso sub judice impõe-se a concreta apreciação da questão da caducidade da DIA, reconhecendo-se judicialmente que aquele ato administrativo não produz, nem é atualmente suscetível de produzir efeitos lesivos nos direitos e interesses que motivaram a propositura da presente ação pelo ora recorrente (v. art. 268º/4 da CRP; cfr. arts. 2º, 3º/1, 7º e 51º do CPTA) – cfr. texto nº. 3.4.; e) Do conhecimento da referida questão resultarão assim inquestionáveis benefícios e efeitos úteis, nomeadamente a reposição da legalidade afetada e violada pelo despacho impugnado, assegurando-se, em concreto, o respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático, da legalidade e pelo direito ao ambiente e qualidade de vida (v. arts. 2º, 9º/e), 66º, 202º/2, 266º e 268º/4 da CRP e arts. 2º, 3º/1 e 51º do CPTA) – cfr. texto nºs. 3 e 4; B – DO ÂMBITO MATERIAL E ALCANCE DA DIA 3ª. A DIA tem de especificar, além do mais, “as condições em que o projeto pode ser licenciado ou autorizado” (v. art. 17º/2 do DL 69/2000, de 3 de Maio) – cfr. texto nºs. 5 a 8; 4ª: As condições impostas pela DIA têm de respeitar o princípio da juridicidade, conformando-se com o bloco de legalidade em vigor à data da sua prolação, não podendo ser condicionada à sua conformação com a revisão e alteração de instrumentos de gestão territorial válidos e eficazes, nem estabelecer condições contrárias à Lei (v. arts. e 266º da CRP, arts. 3º e segs. e 121º do CPA, art. 271º do Cód. Civil e arts. 2º/e) e g), 17º, 20º e 27º do DL 69/2000, de 3 de Maio) – cfr. texto nºs. 5 a 8; 5ª. É assim manifesto que o douto Acórdão recorrido violou os princípios da juridicidade e do tempus regit actum – cfr. texto nºs. 5 a 8; C – DA NULIDADE DO DESPACHO IMPUGNADO 6ª. Como se reconheceu no douto Acórdão recorrido, o terreno no qual se pretende implementar o projeto em causa – Aproveitamento Hidroelétrico de S... – integra-se em “espaços naturais”, previstos no Plano Diretor Municipal de AV, nos quais “são proibidas as ações de iniciativa pública ou privada que se traduzam em operações de loteamento, obras de urbanização, construção de edifícios, obras hidráulicas, vias de comunicação, aterros, escavações e destruição do coberto vegetal” (v. arts. 53º e 54º/3 do Plano Diretor Municipal de AV - PDMAV) – cfr. texto nºs. 9 a 15; 7ª. O despacho impugnado é assim manifestamente nulo, pois: a) Violou frontalmente o disposto nos arts. 53º e 54º do PDMAV, dado que aprovou a construção de edifícios e a realização de uma obra hidráulica em espaços naturais, em que as referidas ações estão proibidas (v. art. 103º do DL 380/99, de 22 de Setembro e art. 68º/a) do DL 555/99, de 16 de Dezembro) – cfr. texto nº. 10; b) Violou frontalmente os arts. 8º, 9º e 34º do DL 196/89, de 14 de Julho (Reserva Agrícola Nacional) e os arts. 4º e 15º do DL 93/90, de 19 de Março, bem como a RCM 55/03, de 8 de Abril (Reserva Ecológica Nacional), que não permitem a ocupação, destruição e construção nas áreas em causa (cfr. arts. 133º e 134º do CPA) – cfr. texto nº. 11; c) Violou ainda o disposto nos arts. 1º e segs. do DL 140/99, de 24 de Abril (Rede Natura 2000), bem como os objetivos que determinaram a integração do RV na referida Rede (v. DL 384-B/99, de 23 de Setembro, RCM 142/97, de 28 de Agosto e RCM 76/2000, de 5 de Julho) e a sua classificação como SIC e ZPE – cfr. texto nº. 12; d) Violou o disposto nos arts. 16º e 17º do DL 69/2000, de 3 de Maio, pois desconsiderou totalmente o parecer final da CA – “o projeto não poderá ser viabilizado” – e marginalizou as posições assumidas no âmbito da consulta pública, constantes do respetivo relatório – cfr. texto nºs. 13 a 15; D – DA VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS 8ª. O despacho impugnado violou frontalmente normas e princípios de direito constitucional, reguladores e protetores do ambiente e do ordenamento do território (v. arts. 9º/e) e 66º da CRP), que, contrariamente ao decidido no douto Acórdão recorrido, não se esgotam na mera atribuição de direitos ou faculdades de natureza procedimental ou processual, pelo que a sua invalidade é inquestionável (v. art. 266º da CRP; cfr. arts. 133º/2/d), 134º e 135º do CPA) – cfr. texto nºs. 16 a 18; E – DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO 9ª. Contrariamente ao decidido no douto Acórdão recorrido, o despacho impugnado não contém, em si ou por remissão, quaisquer fundamentos de facto e de direito da decisão tomada, não se invocando minimamente quaisquer factos ou normas, nem se demonstrando a sua aplicação ao caso sub judice, não admitindo a lei qualquer fundamentação implícita ou a posteriori – cfr. texto nºs. 19 a 22.

  1. Do processo instrutor apenso constam diversas informações e pareceres desfavoráveis, relativamente ao sentido da emissão da DIA, que foram completamente desconsiderados pela autoridade decidente (v. n.ºs 4 a 9 dos FP; cfr. art. 268º/3 da CRP, arts. 16º e 17º do DL 69/2000, de 3 de Maio e arts. 124º e 125º do CPA) sendo exigível que “a entidade decidente explicite as razões por que concorda com uma e não com outra das opiniões anteriormente expressas pelos serviços” (v. Ac. STA de 1985.10.04, AD 291/352; cfr. Acs. STA de 1989.07.06, Proc. 20838; de 1987.11.26, AD 322/1220) – cfr. texto nºs. 19 a 22.

  2. O referido despacho enferma assim de manifesta falta de fundamentação de facto e de direito, ou, pelo menos, esta é obscura, contraditória, insuficiente e incongruente, pelo que foram frontalmente violados o art. 268º/3 da CRP, os arts. 124º e 125º do CPA e os arts. 16º e 17º do DL 69/2000, de 3 de Maio (v. Ac. STA de 2004.07.01, Proc. 058/03, in www.dgsi.pt) – cfr. texto nºs. 19 a 22.

NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o douto Acórdão recorrido, com as legais consequências.” Em 9 de Dezembro de 2013 foi proferido Despacho de Admissão do Recurso Jurisdicional interposto (Cfr. Fls. 542 Procº físico).

O Ministério do Ambiente/Recorrido, veio a apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 15 de Janeiro de 2014, concluindo (Cfr. fls. 551 a 562 Procº físico): “i) O despacho em crise condiciona a DIA à compatibilização do projeto com os instrumentos de gestão territorial em vigor, designadamente com o PDMAV; ii) O despacho em crise condiciona a DIA ao cumprimento do regime da REN; iii) A preservação das áreas caracterizadas como Espaços Naturais pelo Reg. PDMAV, não impede a construção de obra hidráulica, nos termos do disposto o art. 4°, n° 2, alínea c) do DL n° 93/90, de 19 de Março; iv) Encontrando-se a matéria das intervenções em zonas de reserva ecológica nacional regulada de modo suficiente na lei, não pode um regulamento administrativo aditar novas condições ou derrogar condições legalmente prefiguradas para admitir ou proibir intervenções; v) Estando o aproveitamento em causa projetado para uma área integrante da REN, a sua viabilização depende do reconhecimento do seu interesse público.

vi) Nos termos da Portaria n° 295/2002, o interesse público do projeto é aferido em momento subsequente à análise dos seus impactos ou incidências ambientais; e que, vii) Sendo essa análise favorável, ou condicionalmente favorável, é reconhecido o interesse público do projeto, podendo o mesmo ser realizado; Pelo que, em nosso entender, bem andou o tribunal «a quo», nenhum reparo se nos afigurar merecer a sua...

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