Acórdão nº 01085/08.7BEBRG-B de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução22 de Outubro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: CAFC e ARD vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de 03 de Janeiro de 2013 pelo qual foi admitido o articulado superveniente apresentado pelo réu na acção que interpuseram contra o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.

Invocaram para tanto, em suma, que os factos invocados para a admissão do articulado superveniente são instrumentais pelo que apenas poderiam ser considerados se o facto essencial tivesse sido invocado na contestação pelo que o articulado devia ter sido rejeitado, face ao disposto nos artigos 264º e 506º, n.º2, do Código de Processo Civil, pelo que a decisão recorrida ao admiti-lo violou estas disposições legais; o recorrido alegou ter tido conhecimento desses factos apenas em Dezembro de 2012 mas já devia ter deles conhecimento através dos relatórios de volume tráfego rodoviário que são emitidos mensal, trimestral e anualmente; o recorrido podia e devia, em todo caso, ter apresentado o requerimento de modo a que os factos nele alegados pudessem constar da base instrutória e, não o tendo feito, revela negligência grave com prejuízo para o regular andamento da causa, o que também deveria conduzir à rejeição por extemporaneidade; a invocação de factos supervenientes, neste contexto revela abuso de direito, excedendo manifestamente os limnites impostos pela boa-fé processual; a admissão do articulado superveniente viola o princípio da concentração da defesa e o princípio da igualdade, consagrado no artigo 3º do Código de Processo Civil e no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.

O recorrido contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida; invocou ainda as questões prévias da extemporaneidade do recurso e do efeito a atribuir ao recurso, devolutivo e não suspensivo, como foi fixado.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. Tendo os autores alegado factos, na petição inicial, que permitem demonstrar que a exploração da A28 excede os limites de ruido legalmente impostos para zonas sensíveis e viola a disposição do artigo 11º, n.º1, alínea b) do regulamento Geral do Ruído, a alegação de matéria de facto, por parte do réu, para efeito de enquadramento jurídico na alínea c) do n.º1 do mesmo artigo 11º, com o consequente agravamento do limite de exposição ao ruído, corresponde a uma verdadeira excepção peremptória, na medida em que o efeito desses factos, extinguindo o direito dos autores, é determinado por normas de direito substantivo.

  1. O facto essencial destinado a demonstrar a existência de excepção é o que se refere ao efectivo volume de tráfego no troço de auto-estrada em causa, e tendo em conta que a via entrou em funcionamento em 2005, o réu não poderia ter deixado de alegar esse facto na contestação quando esta foi apresentada em Outubro de 2008 (artigo 489º, n.º1, do Código de Processo Civil.

  2. Os dados estatísticos relativos ao tráfego na rede de auto-estradas, fornecidos pelo Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, IP, são factos instrumentais ou probatórios que, em que produzidos em momento posterior à apresentação da contestação, apenas poderiam ser considerados para prova do facto essencial se este tivesse sido alegado nessa peça processual como matéria de defesa.

  3. Invocando-se a ocorrência superveniente de factos, só os factos essenciais novos que se produziram posteriormente à contestação é que poderão servir de base à formulação de um articulado superveniente.

  4. O articulado superveniente apresentado pelo réu reportando-se a meros factos instrumentais ou probatórios quem ainda que produzidos em momento posterior à apresentação da contestação, não se destinam a fazer prova de facto essencial que tenha sido alegado na contestação, é inadmissível e deve ser rejeitado em aplicação das disposições conjugadas dos artigos 264º e 506º, n.º2, do Código de Processo Civil.

  5. O réu, enquanto departamento ministerial com tutela da área de avaliação de impacte ambiental, tem o especial dever de conhecer em tempo oportuno os dados de tráfego na rede nacional de auto-estradas, os quais são publicitados com uma periodicidade mensal, trimestral e anual pelo Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias (agora substituído pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, IP), e são do conhecimento público.

  6. O réu invocou ter tido conhecimento, em Dezembro de 2012, de factos instrumentais supervenientes relativos à passagem de mais de três milhões de veículos por ano com base em informação oficiosa que foi prestada a seu pedido pelo Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, contendo dados do Tráfego Médio Diário Anual dos anos de 2008, 2009, 2010 e 2011, não obstante esses dados terem sido divulgados periodicamente através de relatórios mensais, trimestrais e anuais.

  7. A admitir-se que o réu teve conhecimento de dados de tráfego relativos ao referido período de tempo através da informação oficiosa do Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, nada impedia que pudesse ter solicitada idêntica informação em momento anterior à elaboração da base instrutória (que data de Setembro de 2011) e para o efeito da inclusão desses factos como matéria controvertida.

    I. Ou seja, a mesma ocorrência que justificou a apresentação do articulado superveniente – a prestação de informação oficiosa -,, justificaria que o réu pudesse obter, pelo mesmo meio, os dados de tráfego relativos a todo esse período de tempo em termos de poderem ser levados oportunamente à base instrutória.

  8. O momento processual a que se refere a alínea a) do n.º3 do artigo 506º do Código de Processo Civil para efeito de apresentação de articulados supervenientes deve entender-se como sendo aquele em que há lugar ao saneamento do processo e à selecção da matéria de facto controvertida, seja essa actividade assegurada por via oral, através da audiência preliminar, ou por via escrita, através da prolação do despacho saneador.

    L. Tendo qualquer dessas modalidades o mesmo específico objectivo e encerrando uma fase processual que vai delimitar os termos do litígio e definir o conjunto de factos que transitam como factos controvertidos para a fase do julgamento, nenhum motivo há, dada a manifesta analogia de situações, para que o momento processual limite a apresentação de articulados supervenientes não seja o despacho saneador, quando o juiz, por decisão discricionária, dispense a audiência preliminar.

  9. Tendo podido o réu apresentar o articulado superveniente de forma a que os factos nele alegados pudessem constar da base instrutória, sem eu daí resultasse qualquer prejuízo para o regular andamento da causa, revela negligência grave o desconhecimento dos factos, que venha invocar aquela factualidade muito mais tarde e já na fase de instrução do processo, o que igualmente deve conduzir à rejeição do articulado por extemporaneidade, N. A apresentação de um articulado superveniente em Dezembro de 2012 para reportar factos relativos a 2008, 2009, 2010 e 2011, que o réu desde há muito tinha o dever de conhecer, excede manifestamente os limites impostos pela boa fé processual e corresponde ao exercício ilegítimo de um direito que, como tal, caracteriza um abuso de direito.

  10. Neste contexto, a admissão do articulado superveniente viola o disposto no artigo 506º, n.ºs 1, 2 e 4, do Código de Processo Civil, e o princípio da concentração da defesa que resulta do artigo 489º, n.º1, do Código de Processo Civil.

  11. E Põe em causa o princípio da igualdade processual das partes previsto no artigo 3º do Código de Processo Civil, como concretização do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição, ao permitir ao réu a alegação de questão de facto nova num momento em que se encontrava precludida a possibilidade de o fazer.

  12. São inconstitucionais, por violação do princípio constitucional da igualdade, as normas dos n.ºs 1e 2 do artigo 506º do Código de Processo Civil, quando interpretadas no sentido de que os factos instrumentais, ainda que supervenientes, podem ser deduzidos em articulado posterior para prova de factos essenciais que, sendo já conhecidos ou cognoscíveis pela parte a quem aproveitam, não foram alegados nos articulados normais.

    *II – Os recorridos apresentaram as seguintes conclusões das contra-alegações: 1. O recurso não deve ser admitido, por extemporâneo, uma vez que a admissão do articulado superveniente, como despacho interlocutório, só pode ser posto em causa com o recurso que vier a ser interposto da decisão final.

    1. ...

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