Acórdão nº 00190/08.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução09 de Outubro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Ministério da Justiça (…) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou procedente acção administrativa especial intentada por SMGM (…).

O recorrente formula as seguintes conclusões: I - Salvo o devido respeito por melhor opinião, a sentença proferida pelo Tribunal a quo procedeu a uma análise insuficiente da matéria factual que envolve os presentes autos, o que conduziu a uma errónea aplicação do direito ao caso em concreto; II - A douta sentença recorrida enferma de manifesto erro de julgamento, ao fazer errada interpretação e aplicação do direito, à matéria de facto considerada assente, por considerar que se verificaram circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar por parte do Recorrido, nos termos do artigo 32.°, alínea d) do ED, traduzidas na não exigibilidade de conduta diversa, justificada pela falta de meios, não ter o apoio de especialistas, não estar acompanhado pelo Inspetor-Chefe, que devia ter planeado e controlado as tarefas executadas por aquele no local do crime e, por último, o facto de o Recorrido não ter tido formação contínua na matéria em causa, constituindo assim causa de justificação do comportamento desconforme ao dever geral de zelo a que o Recorrido está vinculado, impedindo assim a verificação de todos os elementos que integram a infração disciplinar; III- Ora, tais circunstâncias dirimentes só devem ser atendidas se verificadas no momento em que o interessado pratica o facto (ação ou omissão) que, em circunstâncias diferentes, seria considerado ilícito disciplinar. Neste sentido, in Ac. do TCANorte, Proc. 00598/01, de 9 de março de 2001; IV- Ou seja, é preciso que o interessado, no cumprimento dos seus deveres funcionais, explique as razões de tal conduta, não bastando que apresente as suas razões num momento posterior e já no âmbito do processo disciplinar; V- A infração disciplinar decorre da violação ou ofensa de deveres reportados à função ou ao interesse do serviço, enumerando a lei os deveres que impendem sobre o trabalhador público e prescrevendo como ilícito o comportamento que atente contra tais deveres, sendo quatro os elementos Constitutivos da infração disciplinar: um comportamento, ilícito, culposo e que cause um qualquer dano ao interesse público que caiba ao organismo prosseguir e tutelar; VI- A douta sentença recorrida deu como provada a matéria de facto constante no relatório final do PD, nomeadamente os pontos 3.1 a 3.18, que remetem para os artigos 8.º a 21.

º da acusação proferida no âmbito do processo disciplinar; VII- Muito embora o Recorrido não estivesse acompanhado pelo Inspetor - Chefe de Piquete, certo é que aquele frequentou ações de formação, nomeadamente a disciplina de Metodologias de Investigação onde lhe foram explanados os vários procedimentos a adotar no local do crime, entre eles as técnicas de recolha de proteção dos vestígios encontrados, de forma a obstar a contaminação dos mesmos, garantindo a sua integridade, e a realização da reportagem fotográfica no local do crime, procedimento este de inegável importância, que permite documentar o local do mesmo, garantir a integridade da investigação e fornece um registo permanente para uma avaliação posterior; VIII- Ora, comparando os procedimentos que deveriam ter sido adotados pelo Recorrido, quer quanto à recolha dos vestígios quer quanto à realização da reportagem fotográfica no local do crime, verifica-se que aquele não diligenciou pela execução de tais procedimentos, denotando deficiências na forma como procedeu à recolha e empacotamento dos vestígios e à realização da reportagem fotográfica; IX- Para que o Recorrido pudesse invocar em seu favor que não dispunha de meios para recolher quaisquer provas, ou adotar os proctdimentos corretos com vista à realização da reportagem fotográfica no local do crime, era essencial que, nesse momento, justificasse as razões porque o não fez; X- O que não se verificou; XI- Face ao exposto» a atuação do Recorrido consubstancia uma violação do dever de zelo, o qual impõe ao funcionário o exercício das suas funções com eficiência, competência e correção, com respeito pelas normas Legais e regulamentares, pelo que o ato impugnado é passível de anulçâo; XII- Pelo que, a sentença recorrida procedeu a uma errada aplicação do direito ao caso concreto, devendo ser revogada e substituída.

O recorrido, defendendo a manutenção do decidido, contra-alegou, concluindo: 1 - Com a devida vênia, a Douta Sentença procedeu a urna análise carreta e irrepreensível da matéria de facto.

2 A Douta Sentença fez uma correta interpretação e aplicação do direito á matéria de facto, considerada como assente, 3 - Existiram assim circunstâncias dirimente da responsabilidade disciplinar por parte do recorrido nos termos do artº 32, al. d) do ED.

4 - Ao recorrido, perante os factos alegados e carreados pra as autos, não lhe era exigível que atuasse de forma diversa da que atuou, sem meios, sem formação contínua na matéria em casa, sem o apoio de especialista e sem o comportamento pessoal do Inspetor chefe que devia ter planeado e controlado as tarefas executadas pelo recorrido no tocai do crime.

5. Foi referido pelo Chefe de Piquete que, "No piquete nunca houve uma mala adequada para a recolha de vestígios dactiloscópicos” e 6.

que havia uma Especialista de Prevenção escalonado no Piquete, contactável para qualquer eventualidade… 7.

Tal Especialista não foi contactado para se deslocar ao local do roubo, com vista a recolha dos vestidos, como era exigido.

8.

O recorrido agiu dentro do que lhe era exigido, sendo certo que estava só (sem nenhum apoio técnico) dado que o senhor que o acompanhou era tão somente um segurança (nem inspetor era) e que já no local ligou para o chefe a colocá-lo ao corrente de toda a situação.

9.

Existe assim uma circunstância dirimente de responsabilidade disciplinar do ora recorrido, que constituiu causa de justificação do comportamento, e consequentemente causa de exclusão da culpa na senda do decidido pelo Colendo Supremo Tribunal Administrativo de 1/2/2007 no Proc º 1199/06.

10.

Há não exigibilidade de conduta diversa sempre que ocorram circunstâncias exteriores ao agente que o arrastem de foram irresistivel para a prática do facto, de modo que não seria de esperar que se comportasse de outra maneira (Leal Henriques - manual direito disciplinar Macau) 11 - As circunstâncias dirimentes sempre estiveram presentes e sempre estiveram no conhecimento do superior hierárquico.

12 - O recorrido apenas teve formação básica da disciplina de metodologias de investigação criminal, não tendo tido nos últimos anos quaisquer atualizações ou ações complementares de formação.

13 - A conduta do recorrido não pôs em causa a integridade da prova a nível biologico 14 - No âmbito do processo crime em curso NUIPC 528/06.9GAMLD não foi rececionado nenhum pedido de exame no laboratório da policia cientifica 15 - Inexistiu qualquer comportamento ílícito, culpso, causador de dano ao interesse público.

16— A reportagem fotográfica demonstrou devidamente o local do crimes sendo devidamente percetível e suficiente para a prova do processo crime.

17— O local já não se encontra incólume dado que quer a G.N,R., quer o Próprio ofendido já tinham mexido no local, tendo Inclusive a G.N.R. levado uma picareta, retirada do mesmo Local do crime.

18 - Inexistiu assim a violação de dever de zelo, o consequentemente qualquer infração disciplinar.

19 - Existem brigadas especiais inspetores com formação especializada quando as especificidades dos crimes assim o exigem, designadamente crime de roubo ( onde se inclui o processo com base no qual surgiu o processo disciplinar) crime de homicidio, e incêndios em que normalmente vão especialistas / Inspetores especializados para recolha de vestígios, o que não aconteceu no caso ora em apreço, pese embora houvesse um especialista de prevenção.

20 - O recorrido sempre foi e continua a ser um funcionário com desempenho avaliado em Bom com distinção, tendo na ultima classificação relativa a 2012/2013 nota de Muito Bom, com avaliação de 9,73 e nos anteriores sempre avaliação de Muito Bom.

21 - Pelo que a sentença recorrida procedeu a uma correta aplicação de direito ao caso concreto, devendo a mesma ser mantida.

*A Exmº Procuradora-Geral Adjunta, notificada para efeitos do art.º 146º do CPTA, deu parecer de não provimento do recurso.

*Dispensando vistos, cumpre decidir.

*As conclusões de recurso delimitam as questões a decidir, que se identificam infra em epígrafe.

*Os factos, que a decisão recorrida consignou como provados:

  1. Em 13/12/2006, por despacho da Coordenadora de Investigação Criminal, do Departamento de Investigação Criminal de Aveiro, da Polícia Judiciária – Ministério da Justiça, foi instaurado processo de averiguações ao A., a que foi atribuído o nº 05/2006, no qual foi nomeado como instrutor o Inspetor-Chefe António Medina, com vista a «esclarecer as circunstâncias que levaram ao condicionamento dos vestígios da forma relatada na informação junta, bem como razão porque não existe informação descritiva dos registos fotográficos apresentados e que se supõe corresponderem ao exame ao local.» (cf. fls. 4 do PD.).

  2. Em 2/12/2006, o A. elaborou uma informação de serviço, que dou aqui por integralmente reproduzida (cf. fls. 6/14 do PD.).

  3. Em 2/12/2006, o Piquete da Polícia Judiciária – Ministério da Justiça, do Departamento de Investigação Criminal de Aveiro, era composto por: «1.1C.i.C.: Drª MCFF 1.2 Chefe de piquete: JP, Inspector 1.3 Inspectores: SM 1.4 Lofoscopistas: 1.5 Outros: NG, seg.», conforme consta do relatório do serviço de piquete (cf. fls. 17/19 do PD.).

  4. Em 15/12/2006, foi inquirido CMAS, funcionário de investigação criminal, no DIC de Aveiro da Polícia Judiciária, cujo depoimento dou aqui por integralmente reproduzido, destacando o seguinte: «Ser funcionário da Polícia Judiciária desde há dezasseis anos a esta data, encontrando-se colocado neste DIC desde 1999, actualmente a desempenhar...

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