Acórdão nº 01032/14.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução23 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.RELATÓRIO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA, com sede na Avenida 05 de outubro, n.º 107, 1069-018 L..., inconformado, interpôs recurso jurisdicional da decisão proferida em 22/09/2014 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto nos autos de providência cautelar que contra si foi intentado por MSDR, que indeferiu o seu pedido de revogação da providência cautelar decretada nos autos.

**O RECORRENTE, terminou as respetivas alegações com as seguintes CONCLUSÕES de recurso: “I. Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido a fls.

(…) pelo Tribunal a quo e no qual foi indeferido o pedido efetuado pelo Recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 124º do CPTA, de revogação da providência cautelar decretada nos presentes autos.

  1. O referido despacho surge no âmbito da presente providência cautelar a qual foi interposta pela recorrida com vista à suspensão da eficácia do ato administrativo praticado pelo Senhor Diretor-Geral do Ensino Superior que determinou a sua não colocação no ensino superior.

  2. O referido ato, praticado na sequência da decisão proferida pelo TCAS (Recurso 0971/12), a 19 de dezembro de 2013, que, julgando improcedente a ação de intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias, interposta pela ora recorrida (em conjunto com mais Autores), deu razão ao ora Recorrente, absolvendo-o do pedido, mais não visou senão, no estrito cumprimento da legalidade, repor a situação jurídica da recorrida no que concerne ao seu acesso ao ensino superior.

  3. Porquanto a recorrida, em virtude da sentença proferida em 1ª instância na referida ação de intimação, acedeu – provisoriamente (atento o não trânsito em julgado desta sentença e o efeito devolutivo atribuído ao recurso da mesma interposto) – ao ensino superior, mais concretamente ao par instituição/curso Universidade Nova de L... – Faculdade de Ciências Médicas/ Medicina.

  4. No p.p. dia 15 de julho, o Tribunal a quo decretou procedente a presente providência cautelar, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, porquanto entendeu que “o presente processo tem de proceder, por ser evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, por estar em causa a prática, extemporânea [pelo requerido], fora do seu tempo [legal e processual] de um ato que, por isso, julgamos ser manifestamente ilegal.

    De modo que o presente processo cautelar tem que proceder.

    “ VI. Fundamentando a sua decisão no facto de o Recorrente ter prolatado o ato suspendendo, “executando“ o decidido pelo Douto Acórdão do TCAS, quando este aresto ainda não se tinha consolidado na ordem jurídica por se encontrar pendente no STA a apreciação da reclamação deduzida pelo Requerente: „(...) Sucede, porém, que este aresto ainda não se consolidou, por se encontrar pendente no STA, a apreciação de reclamação deduzida pela Requerente, na sequencia de um pedido de admissão de recurso de revista, razão pela qual o mesmo [Acórdão do TCA Sul, datado de 19 de dezembro de 2013] ainda não transitou em julgado.(...) VII. Sucede que, quase simultâneamente à prolação da douta sentença, o referido acórdão proferido pelo STA, que negou a revista, transitou em julgado(1) e, consequentemente, também transitou em julgado o acórdão proferido pelo TCAS nos exatos termos em que tinha sido proferido, consubstanciando tal facto, na perspetiva do Recorrente, uma alteração das circunstâncias que estiveram subjacentes à decisão proferida pelo Tribunal a quo e que fundamentaram a sentença que decretou a presente providência cautelar.

  5. Com efeito, o facto de o acórdão do STA e o acórdão do TCAS terem transitado em julgado, levou a que se tenha firmado, no ordenamento juridico, o comando absolutório contido neste último acórdão nos exatos e precisos termos em que foi proferido e em que o ato suspendo se fundamentou.

  6. O que conduziria à conclusão de que a ser praticado um novo ato, expurgado este vício, sempre aquele teria o mesmo conteúdo, pelo que, convocando-se o princípio do aproveitamento dos atos administrativos, não seria evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal exigida pela alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, normativo legal ao abrigo do qual foi decretada a presente providência.

  7. Razão pela qual, desse facto [trânsito em julgado] foi dado conhecimento ao tribunal a quo, tendo sido requerido, concomitantemente, ao abrigo do disposto no artigo 124º do CPTA, a revogação da providência cautelar decretada, precisamente por alteração das circunstâncias inicialmente existentes, porquanto o fundamento em que o decretamento da mesma tinha assentado, i.é, o não trânsito em julgado do acórdão do TCAS que serviu de suporte ao ato suspendo, tinha desaparecido do ordenamento jurídico.

  8. Entendeu o tribunal a quo, porém, considerar que “a questão não assenta [como apreciamos supra] na postergação de meras questões formais, de meras formalidades, antes na violação de um direito que é garantido a todos os cidadãos, e de que a Requerente tinha feito uso [o direito de reclamar jurisdicionalmente], pelo que decidimos pela manutenção da decisão cautelar proferida.

    “ Mais argumentando que “Só quando transitada em julgado a decisão judicial que apreciasse essa reclamação [o que só ocorreu a 10 de julho de 2014] é que o Requerido passaria a estar, efetivamente, habilitado a levar por diante o cumprimento dos seus deveres legais e procedimentais (...)“ XII. Ou seja, entendeu o tribunal a quo, que não estava em causa uma mera questão formal mas sim a violação de um direito que é garantido a todos os cidadãos – o direito de reclamar jurisdicionalmente.

  9. Ora, com o devido respeito, que é muito, discorda-se de tal posição porquanto sendo o direito ao recurso um direito que, à semelhança dos demais, deve efetivamente ser garantido a todos os cidadãos e respeitado.

  10. Não se afigura estar em causa a ofensa de tal direito, na medida em que não foi violado ou colocado em causa o direito de reclamar ou de recorrer jurisdicionalmente. Veja-se que a Recorrida interpôs recurso para o STA da decisão proferida pelo TCAS a 19 de dezembro de 2013 e, depois, reclamou do acórdão que negou a Revista, reclamação que foi apreciada e indeferida e que, entretanto, transitou em julgado.

  11. Entende-se, pois, ao contrário do afirmado pelo tribunal a quo, que o que estava, efetivamente, em causa, era um pressuposto formal do ato, na medida em que era um requisito da sua validade e/ou eficácia.

  12. Nessa medida, deveria ter sido reconhecido que, de facto, houve uma alteração das circunstâncias que fundamentaram a providência decretada.

  13. Devendo ter sido aferido pelo Tribunal a quo, considerando que o ato foi praticado antes de se encontrarem reunidos os pressupostos em que o mesmo assentou, in casu, por ainda não se ter verificado o trânsito em julgado da decisão que o mesmo pretendeu “executar”, de que forma a alteração deste facto, concatenado com o facto de não ter havido qualquer alteração no seu conteúdo absolutório, consubstanciaria, efetivamente um vício invalidante do ato.

  14. O que levaria à conclusão, necessariamente, de que o vício em causa não seria invalidante do ato, porquanto, a praticar-se um novo ato expurgando-se o vício, isto é, revogando-se o ato suspendo e praticando-se outro (como, aliás, sugerido pelo tribunal a quo), mas agora após o trânsito em julgado do acórdão, este sempre teria o mesmo conteúdo do ato ora suspendo.

  15. Ora, em razão dos princípios da racionalidade, eficiência e desburocratização, mas também por razões de economia processual, é conferido ao juiz, mormente (mas não só) no que concerne a vícios formais, o poder de considerar sanado o vício, acolhendo-se, assim, o princípio do aproveitamento dos atos administrativos.

  16. E, assim sendo, deveria ter o Tribunal a quo, convocando o princípio do aproveitamento dos atos administrativos, configurado como possível que tal vício fosse considerado sanado e, nessa medida, não seria evidente a procedência da ação principal, requisito exigido pela alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA e ao abrigo da qual foi decretada a presente providencia cautelar.

  17. Pois, como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “é caso a caso que, quando se afigure evidente a existência de um vício de forma ou de procedimento, ao juiz se impõe verificar se os elementos disponíveis permitem afirmar a existência de uma situação em que deve haver lugar ao aproveitamento do acto (…).” (negrito nosso) XXII. Note-se que o supramencionado princípio tem merecido acolhimento na nossa jurisprudência, tal como já referiu este colendo Tribunal (2) “O princípio geral de direito que se exprime pela fórmula latina “utile per inutile non vitiatur”, (...), vem sendo reconhecido quanto à sua existência e valia/relevância pela doutrina e pela jurisprudência nacionais, admitindo-se o seu operar em certas e determinadas circunstâncias.

    XXIII.

    Tal princípio habilita o julgador, mormente, o juiz administrativo a poder negar relevância anulatória ao erro da Administração [seja por ilegalidades formais ou materiais], mesmo no domínio dos actos proferidos no exercício de um poder discricionário, quando, pelo conteúdo do acto e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar, com inteira segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa, nomeadamente, ou porque não afectou as ponderações ou as opções compreendidas (efectuadas ou potenciais) nesse espaço discricionário, ou porque subsistem fundamentos exactos bastantes para suportar a validade do acto [v.g., derivados da natureza vinculada dos actos praticados conforme à lei], ou seja ainda porque inexiste em concreto utilidade prática e efectiva para o impugnante do operar daquela anulação visto os vícios existentes não inquinarem a substância do...

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