Acórdão nº 00939/04.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelAna Paula Santos
Data da Resolução26 de Março de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Inconformada, vem a EXMA. REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou procedente a impugnação judicial que E...

e mulher M...

haviam interposto da liquidação adicional do imposto de SISA, do Imposto de Selo e dos juros compensatórios, relativos ao ano de 1999, no valor global de €4.046,60.

Formulounas respectivas alegações, as seguintesconclusões que se reproduzem: I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por E... e mulher M... contra as liquidações adicionais de Sisa, Imposto do Selo e correspondentes juros compensatórios, no valor total de € 4.046,60.

  1. Isto porque o douto Tribunal a quo entendeu anular as liquidações por ocorrência de um vício procedimental: a não abertura do procedimento de revisão previsto nos artigos 91.º e 92.º da LGT já que a correcção levada a cabo pela AT teria sido efectuada com recurso a métodos indirectos.

  2. Não obstante a verificação daquele vício, considerou ainda o douto Tribunal que os elementos recolhidos pela AT em sede inspectiva não se mostravam idóneos para fundar as correcções propostas.

  3. Pelo que, as questões decidendas a submeter ao julgamento do Tribunal ad quem são as seguintes: a) saber se a AT deveria ter recorrido ao método de tributação indirecta e, consequentemente, ter aberto o correspondente procedimento de revisão; b) saber se os meios de prova trazidos aos autos pela Inspecção Tributária são ou não suficientes para que se possa concluir pela simulação do preço por parte dos impugnantes.

    II - A factualidade dada como provada V. O douto Tribunal a quo considerou como provada a matéria de facto constante no ponto “3.1 Matéria de facto dada como provada” (de fls. 3 a 7), para a qual se remete.

  4. No entanto, com o devido respeito, deveriam ainda ter sido dados como provados os seguintes factos, cuja relevância se explanará no ponto relativo à suficiência dos meios probatórios recolhidos pela AT: “13. Os impugnantes foram notificados do projecto de relatório, através do ofício n.º 8307908, de 09-07-2003, emitido pela Direcção de Finanças de Aveiro, a coberto de registo com aviso de recepção, para, querendo, exercer o direito de audição”.

    [A prova deste facto resulta do documento junto de fls. 39 a 41 do PA] “14. Os impugnantes não exerceram o direito de audição”.

    [A prova deste facto resulta do teor do ponto IX. DIREITO DE AUDIÇÃO – FUNDAMENTAÇÃO do Relatório de Inspecção, o qual não foi objecto de discordância por parte dos impugnantes].

    III – O recurso a métodos indirectos VII. O douto Tribunal a quo considerou que os SIT incorreram em erro ao não recorrerem ao método de tributação indirecta, porque os elementos em que se fundou a correcção, por terem sido encontrados num sujeito passivo que não os impugnantes, apenas poderiam conduzir a uma tributação por aquela via.

  5. Consequentemente, e visto que a aplicação de tal método implicava a “abertura do procedimento de revisão previsto nos artigos 91.º e 92.º da LGT”, a partir do momento em que tal não ocorreu, verifica-se uma “nulidade procedimental que afecta a apreciação da questão e determina a anulação dos actos impugnados”.

  6. Ora, a avaliação indirecta só pode efectuar-se (na parte que aos autos nos interessa) em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (artigos 87.º n.º al. b) e 85.º n.º 1 da LGT).

  7. O carácter subsidiário da avaliação indirecta vem sendo sustentado de forma pacífica pela doutrina e pela jurisprudência (vide, por todos, FONSECA CARVALHO, in “I Congresso de Direito Fiscal”, Vida Económica, 2011, pág. 33 e 34 e acórdão do STA, de 12/10/2011, processo 0524/11).

  8. Logo, o que está em causa é saber sea AT se encontrava impedida de apurar de forma directa e exacta a matéria tributável dos impugnantes, isto é, se os SIT teriam de recorrer a métodos indirectos pelo facto de os elementos nos quais se fundaram as correcções não terem sido obtidos junto dos impugnantes, mas da sociedade que intermediou o negócio.

  9. Com o devido respeito, não podemos manifestar concordância com este entendimento, XIII. Desde logo, porque nada na lei nos diz que a avaliação directa apenas se possa fundar em elementos recolhidos junto ou na esfera do sujeito passivo objecto da correcção, nem a jurisprudência aponta nesse sentido.

  10. Depois, porque os SIT não se fundaram em presunções para apurar a matéria tributável em falta, visto que reuniram indícios de que o preço declarado não correspondia ao preço real (o qual apuraram de forma directa e exacta), mas não presumiram a existência de tal divergência.

  11. Ademais, esta questão havia sido já suscitada na impugnação deduzida pelo vendedor J… (processo n.º 203/04.9BEVIS), relativamente aos mesmos factos, entendendo então o Tribunal que “tendo a administração fiscal obtido informação segura de qual o preço real subjacente à transacção, estava desde logo impedida de recorrer à fixação da matéria tributável por presunção, socorrendo-se dos métodos legalmente previstos, pois não ocorre qualquer das circunstâncias elencadas no art. 87.º da LGT”.

  12. Ainda se poderia conceder, como mera hipótese de trabalho, na aplicação de tributação indirecta caso os SIT não tivessem conseguido determinar qual o preço real da transacção, i.e., se apenas tivessem obtido indícios de que o preço declarado não corresponderia à realidade, mas não tivessem logrado apurar qual teria sido o preço efectivamente praticado e acordado entre as partes.

  13. Não é este o caso, visto que a AT logrou reunir um conjunto de elementos que permite afirmar que o preço efectivamente praticado no negócio se cifrou nos 21.000 contos e não nos 16.000 contos.

  14. Em conclusão, podendo a AT apurar de forma directa e exacta a matéria tributável dos impugnantes, encontrava-se legalmente impedida de recorrer a via indirecta, pelo que XIX. Incorreu o douto Tribunal a quo em erro de julgamento de direito, por violação do disposto nos artigos 85.º n.º 1, 87.º n.º 1 alínea b) e 88.º, todos da LGT.

    IV – A idoneidade dos elementos recolhidos pela IT XX. O douto Tribunal a quo entendeu, ainda que a latere, que os “indícios (…) não se mostram suficientemente idóneos para, por si só, suportarem as correcções efectuadas pela AT”, o que configura já um fundamento diverso do que vimos tratando.

  15. Trata-se, aqui, já não de saber se a AT teria de recorrer a métodos indirectos (que constituiu o fundamento para a anulação das liquidações), mas se aqueles elementos seriam suficientes para que se promovessem quaisquer correcções (por via directa ou indirecta).

  16. Não obstante o douto Tribunal recorrido nem ter, face ao preceituado no artigo 124.º do CPPT, de avaliar a idoneidade ou não de tais elementos probatórios, a partir do momento em que conclui pela existência de um vício procedimental por não aplicação de métodos indirectos, importa trazer aqui o ponto 9. (fls. 5 a 7 da sentença) da “Matéria de facto dada como provada”.

  17. Quanto ao indício referido nos pontos 9.a) e 9.b) dos FACTOS PROVADOS – o contrato-promessa – entendeu-se que “a AT não logrou demonstrar a existência de um contrato promessa que vinculasse os outorgantes da escritura pública de compra e venda, não obstante ter reunido indícios de que isso poderá ter chegado a ser equacionado”, além de que “os Impugnantes alegam que a situação que aparentemente resulta dos elementos indicados pela AT chegou a «estar em cima da mesa» como hipótese negocial, mas negam que o acordo se tivesse concretizado dessa forma e por esse quantitativo. E a AT nada tem para negar essa tese, ficando-se sem saber exactamente, ou com séria probabilidade de certeza, qual das versões corresponde à verdade”.

  18. Quanto ao indício referido no ponto 9.c) dos FACTOS PROVADOS – o arquivo em papel referente às notas de honorários cobrados pela empresa de mediação imobiliária – o douto Tribunal a quo considerou que “A AT também não juntou comprovativo de que o valor da comissão recebida pela empresa intermediária corresponde ao valor que seria alcançado se o valor do negócio correspondesse a 21.000.000$00”.

  19. Quanto aos indícios referidos nos pontos 9.d) e e) dos FACTOS PROVADOS – o mapa de vendas com a sua discriminação por meses e pelo valor real e o arquivo em formato papel do mapa de vendas de Março – o douto Tribunal não se pronunciou individualmente sobre os mesmos, parecendo incluí-los na formulação geral da inidoneidade para suportar as correcções da AT.

  20. Avança-se, desde já, que a AT só podia proceder à liquidação adicional de sisa e imposto do selo se tivesse adquirido a séria convicção da existência de um erro ou omissão em tais declarações (designadamente que o preço declarado na escritura de compra e venda era inferior ao preço real da transmissão dos bens), sendo que aquela convicção ter-se-ia de estribar em pressupostos objectivos e não em meras suposições ou juízos de índole subjectiva.

  21. Impendendo sobre a AT o encargo de abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto, importa notar que tal prova não tem de ser directa e dogmática, podendo resultar de “circunstâncias colaterais e indirectas que, atentas a idoneidade dos respectivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível” (acórdão do TCAS 01816/07, de 25-09-2007).

  22. Ainda assim, estamos em crer que a AT recolheu e carreou para os autos elementos bastamente suficientes para que se possa concluir pela simulação do preço por parte dos impugnantes, pelo que XXIX. Passou a impender sobre o contribuinte o ónus de provar a veracidade do declarado.

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