Acórdão nº 00830/14..6BELSB de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução06 de Março de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, SA, com os sinais nos autos, inconformado com a decisão proferida no TAF do Porto, em 23 de Dezembro de 2014, através da qual foi julgada procedente a providência que apresentou, na qual foi condenado: “a) a abster-se de praticar a conduta que consiste na emissão e divulgação das recomendações ou diretrizes que se mostram plasmadas na circular informativa nº. 068/CD/8.1.6, datada de 21/03/2014; b) a remover, imediatamente, a circular informativa nº. 068/CD/8.1.6 da sua página da internet, www.infarmed.pt; c) a abster-se de difundir, publicar e/ou publicitar em qualquer outro meio, recomendações e diretrizes de teor igual ou semelhante às da circular informativa nº. 068/CD/8.1.6; e d) a pagar à Requerente uma sanção pecuniária compulsória, nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil, no valor não inferior a 500,00€ [quinhentos euros] por cada dia de atraso no cumprimento do decidido em a), b) e c) supra, veio, em 13 de janeiro de 2015, recorrer jurisdicionalmente da mesma, concluindo (Cfr. Fls. 517 a 534 Procº físico): “1ª. A Circular Informativa 068/CD/8.1.6. não é um ato administrativo, na medida em que é uma mera recomendação sem efeitos jurídicos proferida pelo INFARMED no âmbito das suas competências técnicas e funcionais.

  1. Aliás, refira-se que a referida circular informativa não preenche os requisitos do artigo 120.º do CPA para ser considerada um ato administrativo, na medida em que: i) não regula situações jurídicas, apenas formula um juízo técnico; ii) não produz qualquer efeito jurídico, não havendo qualquer sanção para o seu incumprimento; e iii) não se dirige a uma situação individual e concreta, mas sim a todas as situações em que é usado o Oxigénio a 93% em meio hospitalar.

  2. Desta forma, e nos termos do artigo 120.º/1/a) do CPTA, o douto Tribunal a quo deveria ter julgado totalmente improcedente os pedidos cautelares efetuados pela ora Recorrida.

  3. Isto porque, não sendo a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. um ato administrativo e tendo a ora Recorrida afirmado expressamente que a ação de que esta providência é instrumental tem como objeto a impugnação da referida circular, resulta evidente a manifesta improcedência da ação principal de que estes autos dependem.

  4. Ou seja, dada a inimpugnabilidade da Circular Informativa 068/CD/8.1.6.certamentre que a ação administrativa de esta providência depende será julgada improcedente.

  5. O que se acabou de referir é válido também para o caso hipotético de se considerar que a circular informativa ora em crise é um regulamento.

  6. O douto Tribunal a quo errou também ao considerar verificado o requisito do fumus boni iuris nos termos do artigo 120.º/1/c) do CPTA, na medida em que i) não ficou demonstrado que o INFARMED laborou em erro manifesto na elaboração da Circular Informativa 068/CD/8.1.6., e ii) a referida circular foi elaborada no âmbito de poderes discricionários conferidos pela lei ao INFARMED.

  7. De facto, o INFARMED não laborou em erro grosseiro – nem tal foi demonstrado pelo Tribunal a quo –, porquanto basta uma mera consulta dos documentos e do processo instrutor juntos aos autos para perceber qua há vários técnicos especializados que consideram haver dúvidas fundadas quanto à utilização do Oxigénio a 93% em meio hospitalar.

  8. Isto é, o INFARMED não anda sozinho no juízo técnico que elaborou e informou na circular informativa em causa nos presentes autos.

  9. Por outro lado, e tendo em consideração que a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. é uma mera recomendação técnica que tem como base um juízo também ele técnico, é evidente que a referida circular foi emitida tendo por base poderes discricionários conferidos pelo legislador ao INFARMED.

  10. Desta forma, não tendo demonstrado que a referida circular foi elaborada tendo por base um erro grosseiro, o Tribunal a quo não podia avaliar do mérito da mesma.

  11. Desta forma também, o douto Tribunal a quo também errou ao considerar que a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. violava o princípio da legalidade, nomeadamente porque não referiu qual a disposição legal que vincula o INFARMED a manter a mesma interpretação técnica da constante na farmacopeia portuguesa, mesmo provando que esta última não está correta.

  12. Nos presentes autos não se verifica qualquer situação de periculum in mora, porquanto a Circular Informativa 068/CD/8.1.6. não vincula os seus destinatários, já que a mesma não determina qualquer sanção para o seu não cumprimento.

  13. Além disso, nos autos não ficou provado, nem indiciariamente, que os clientes da ora Recorrida deixaram de contratar com esta por efeito da Circular Informativa 068/CD/8.1.6..

  14. Nos termos do artigo 120.º/2 do CPTA, o douto Tribunal a quo deveria ter considerado que os interesses públicos em causa nos presentes autos são superiores aos interesses da Recorrida.

  15. Isto porque, os interesses que o INFARMED defende consubstanciam-se na defesa da saúde pública no seu global.

  16. Sendo que, consultando os autos – documentos e processo instrutor – resulta evidente a preocupação efetiva de diversos técnicos especializados relativamente à utilização de Oxigénio a 93% em meio hospitalar, pelo que, não se compreende como é que com esses dados o douto Tribunal a quo considerou que a preocupação do INFARMED na elaboração da Circular Informativa 068/CD/8.1.6. não era séria nem manifesta.

  17. Na verdade, qualquer dúvida quanto à segurança da Saúde pública é séria, manifesta e exige atuação das entidades competentes.

NESTES TERMOS, Deve ser concedido provimento ao recurso do Recorrente, revogando-se a douta Sentença recorrida, com as legais consequências.” A Recorrida/S...

veio a apresentar as suas Contra-alegações de recurso em 3 de Fevereiro de 2015, nas quais concluiu (Cfr. Fls. 541 a 566 Procº físico): “I - A Circular Informativa nº. 068/CD/8.1.6 respeitante à utilização de oxigénio 93% em meio hospitalar é um ato administrativo emanado do Conselho Diretivo do Recorrente de acordo com as competências conferidas pelo art. 5º., nº. 2, al. d), do DL 46/2012.

II - A circular constitui prescrição - “ordena o que deve ser feito” - e traduz o imperativo poder-dever da Administração.

III - A Circular informa os destinatários sobre a concreta utilização do Oxigénio 93%, impedindo o seu uso em circunstâncias “normais” e fixando a sua utilização residual, limitada “aos locais de difícil acesso” e a “situações de recurso”.

IV - O ato produz efeitos jurídicos sobre uma situação individual, singular e concreta, qual seja a situação da Recorrida na qualidade de fornecedora de sistemas de concentradores de oxigénio a 93% e das unidades hospitalares utilizadoras destes equipamentos e obrigadas ao cumprimento das recomendações do Recorrente.

V - A circular informativa constitui uma decisão administrativa que tem por objeto as qualidades e aptidões técnicas do dispositivo médico oxigénio 93% e as condições da sua utilização definindo o Recorrente as diretrizes e prescrições a observar pelos seus utilizadores produzindo, com isso, efeitos jurídicos concretos e específicos.

VI - O ato sob censura é impugnável por se mostrar dotado de eficácia externa: incorpora recomendações, diretrizes e prescrições quanto à qualidade e uso de oxigénio 93% em meio hospitalar, sendo, pela sua natureza e conteúdo, diretamente dirigido à Autora enquanto produtora de concentradores e sistemas de concentradores de oxigénio a 93%.

VII – Mostram-se verificados os requisitos necessários ao decretamento da providência cautelar requerida, nomeadamente: VIII – quanto ao fumus boni iuris é manifesto que o conteúdo do ato administrativo é contrário a lei e às convenções aplicáveis.

IX - Os atos administrativos estão sujeitos ao princípio da juridicidade e ao bloco de legalidade vigente pelo que a atuação dos órgãos e agentes administrativos está subordinada à Constituição e à lei, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e de acordo com os fins para que foram conferidos – Art.º art. 266º./2 da C.R.P. e artº 3º. do C.P.A.

X – A produção, fabrico e distribuição de substâncias para uso clínico, humano ou animal, é regulada, com força obrigatória de lei, pela “Farmacopeia Europeia”.

XI - Emana da Farmacopeia Europeia o bloco de legalidade que o Recorrente, na qualidade de ente administrativo, deve respeitar.

XII - Alega o Recorrente, o que por mera hipótese se considera, que a posição técnica vertida na Farmacopeia Europeia está errada.

XIII – Porém, o Recorrente não logrou demonstrar o suposto erro de que, em tese própria, padece a monografia da Farmacopeia Europeia e, por outro lado, desrespeitou frontalmente o nela estabelecido.

XIV - Não tendo o Recorrente demonstrado que a monografia encerra um qualquer erro técnico, que por mera hipótese se considera, e não tendo impugnado a matéria de facto dada como indiciariamente demonstrada, jamais a sua pretensão poderia proceder! XV - Decorre inequivocamente do texto da monografia da farmacopeia europeia que o Oxigénio 93% (a) destina-se a uso medicinal por unidades hospitalares e é diretamente administrado no sistema de gasoduto da unidade hospitalar; (b) Não há limitações ou reservas na monografia quanto à sua utilização; (c) É utilizado em ambiente hospitalar há mais de 25 anos; e (d) A referência a locais de difícil acesso constante no relatório da 136ª reunião Comissão da Farmacopeia evidencia uma vantagem – e não uma restrição - que esta forma de fornecimento de Oxigénio representa por poder ser utilizada em locais de difícil acesso.

XVI - O Recorrente elaborou a Circular Informativa tendo por base uma comunicação da “APEQ – Associação Portuguesa das Empresas Químicas” que, por sua vez, assenta num mero documento de trabalho cujas especificações e restrições não foram atendidas na Farmacopeia Europeia.

XVII- O referido parecer da “APEQ” distorce a informação sobre o uso...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT