Acórdão nº 00247/06.6BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelVital Lopes
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE 1 – RELATÓRIO B..., Lda., recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a impugnação judicial das liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios referentes a períodos de tributação de 2004.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo.

Na sequência do despacho de admissão, o Recorrente apresentou alegações, juntou 3 docs. e formulou as seguintes «Conclusões: a. O Meritíssimo Juiz a quo, não podia, dentro do princípio da livre apreciação da prova, dar os factos invocados pela Administração Tributária como provados, não valorando a prova testemunhal oferecida pela impugnante quanto a esta matéria.

b. Desta forma, e porque a Sentença aprecia negativamente e contra a aqui recorrente e apresentante da prova testemunhal, factos assim seleccionados, esta ofende o disposto no nº 1 do artigo 115º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e ainda o nº 1 do artigo 99º da Lei Geral Tributária, pelo que, deverá considerar-se nula, nos termos do nº 1 do artigo 125º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

c. É que, a não consideração pela Sentença recorrida e pela Administração Tributária do IVA suportado nas compras, carece de fundamentação, como impõe o artigo 82º, nº 1 do CIVA, na sua redacção vigente à ocorrência dos factos.

d. A Administração Tributária não fundamentou objectiva e materialmente o juízo que formulou, como preceitua o artigo 77º, nº 1 e 2 e artigo 74º, nºs 1 e 2 da Lei Geral Tributária, uma vez que a acção Inspectiva durou apenas 1 dia, ou seja, a Administração Fiscal nada viu.

e. A contabilidade da sujeito passivo estava totalmente organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal, nos termos do nº 1 do artigo 75º da Lei Geral Tributária.

f. Ademais, não está sequer referenciado no Relatório da Inspecção qualquer suspeita de que haja omissão de vendas ou de prestação de serviços ou contabilização de custos que não tenham sido suportados, nem a Inspecção Tributária avança qualquer facto concreto que lance o descrédito sobre a contabilidade da impugnante, aqui recorrente.

g. É que hoje não pode buscar-se, como pretendeu a Administração Tributária, qualquer apoio numa alegada presunção de ilegalidade do acto tributário para fazer recair sobre a contribuinte, aqui recorrente, o ónus da prova da ilegalidade do acto ou actos tributários. ( Nesse sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 1 de Março de 2005 – Rec. 4770/01).

h. A douta Sentença recorrida apoia-se exclusivamente nos factos alegados, suposições (ora suposições não são provas) e presumidos constantes no Relatório da Inspecção Tributária, que não provou que existissem indícios de que a contabilidade do sujeito passivo não reflectia a sua exacta situação patrimonial.

i. O absoluto desconhecimento a que a Sentença recorrida vota, substancialmente, os factos alegados pela impugnante, ora recorrente, menospreza os princípios do inquisitório e do contraditório.

j. A matéria de facto fixada na decisão recorrida não contempla a prova efectuada através do depoimento das testemunhas, tendente à demonstração efectiva de subcontratos nas suas obras realizadas no ano de 2004.

k. A correcta análise e valoração da prova constante dos autos não permitia concluir, de forma inequívoca e irrefutável, que os subcontratos efectuados à impugnante no valor de 174.030,00 € e registados na sua contabilidade, na conta 62.16, não tenham existido, uma vez que a Administração Tributária aceitou como correctos o valor das prestações de serviços efectuadas pela impugnante no valor de 177.930,38 € (conforme página 65 do Relatório).

l. O Tribunal a quo ao proceder à fundamentação das liquidações adicionais de IVA com base em elementos que não haviam sido relevados no Relatório da Inspecção com referência ao exercício de 2004, demonstra notoriamente a insuficiência da mesma fundamentação.

m. E, incorre o Tribunal recorrido, na medida em em se substitui à própria Administração Tributária, em manifesta fundamentação à posteriori dos actos tributários, como sejam as liquidações adicionais de IVA impugnadas.

n. Ora, no procedimento administrativo que conduziu à liquidação impugnada, a administração tributária não podia alterar o montante das deduções declarado, a menos que a actividade instrutória desenvolvida lhe permitisse concluir com segurança (e não permitiu, no caso sub judice) que às facturas em causa não correspondem prestações de serviços efectivas.

o. Tendo, apesar disso, procedido à correcção consubstanciada na liquidação impugnada, a administração tributária violou, para além do art. 19°/3 do CIVA, de que fez uma errada aplicação, os princípios constitucional e legalmente consagrados, da proporcionalidade, da legalidade, da justiça, do inquisitório, da busca da verdade material, do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos (cfr. art. 266º 1 e 2 da CRP, artºs. 55º e 58º da L.G.T. e violou o nº 2 do artigo 82º do CIVA).

p. É que, segundo as regras do ónus da prova, antes de se poder onerar a impugnante, aqui recorrente, com a prova de que as facturas em causa correspondem a prestações de serviços efectivas (subcontratos), é à Administração Tributária que caberia demonstrar que tais facturas dizem respeito a operações simuladas, necessidade essa de prova que decorre do artigo 19º -3 do CIVA, e está de acordo, v.g., com a regra geral de repartição do ónus da prova (art. 342.° do Código Civil), e com a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes, bem como dos dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade (art. 75° nº 1 da L.G.T. e artigo 82º do CIVA).

q. Sendo o artigo 82º, nº 1 (actual artigo 87º) do CIVA expresso no sentido de referir “quando fundamentadamente” considere ter havido deduções superiores às devidas.” r. Acresce ainda a inconstitucionalidade que está subjacente à prática da Administração Tributária, que desde já se denuncia nos termos do artigo 204º da Constituição da Republica Portuguesa, por se considerar violado o disposto no nº 3 do artigo 103 da CRP, visto que ninguém pode ser obrigado a pagar impostos cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei.

s. A preterição de formalidade legal referida em 78º, 79º, 80º e 81º, constitui preterição de formalidade legal essencial, da qual deve resultar a anulação das liquidações impugnadas.

t. Entre outras disposições legais, a mui douta Sentença violou os artigos 8º, nº 2 alinea a), 58º, 60º, nº 3 e alínea a) do nº 1, 77º, nº 1 e 99º da L.G.T., 82º, nº 1 do CIVA, artigo 659º e 668º, nº 1, alínea c) do C.P.C. e artigo 266º, nº 2 e 103º, nº 3 da C.R.P.

Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre douto suprimento de V.Exas., entende a recorrente que deverá o presente Recurso ser julgado procedente e provado e, em consequência, seja proferida DECISÃO, na qual se reveja a matéria dada por provada e, em consequência, se revogue a DOUTA SENTENÇA recorrida, anulando-se por ilegais as liquidações de IVA, objecto dos autos, a bem da JUSTIÇA».

A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal é de parecer que deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se na ordem jurídica a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações do Recorrente e sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso (cf. artigos 684.º, n.º3 e 685.º-A, n.º1, do CPC), as questões que essencialmente importa conhecer reconduzem-se a indagar (i) se a sentença incorreu em nulidade na apreciação e valoração que fez da prova testemunhal produzida pela impugnante/Recorrente e por violação do princípio do inquisitório e da verdade material; (ii) se a sentença assentou o julgamento que fez quanto à fundamentação das correcções em elementos não relevados no relatório de inspecção; (iii) se as correcções contêm a fundamentação legalmente exigível; (iv) se as correcções do IVA deduzido em facturas contabilizadas pela impugnante/Recorrente se podem considerar materialmente fundamentadas em vista do critério legal de repartição do ónus de prova.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO Em 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos: «1. A Impugnante, “B…, LDA”, Contribuinte Fiscal nº 5…, constituiu-se por escritura pública de 23/1/2003, com um capital social inicial de € 5.000, tendo como sócios J… e M….

  1. Na sequência de inspecção efectuada, credenciada pela Ordem de Serviço nº OI200501247, de 23/6/2005, que teve início em 11/7/2005 e findou nesse mesmo dia, e abrangeu os exercícios de 2003 e 2004, foram emitidas as liquidações adicionais nº 05239842, nº 05239844, e nº 05239646, referentes a IVA de 2003 e 2004, e liquidações nº 05239843, nº 05239845, e nº 05239847, referentes a juros compensatórios, da responsabilidade da impugnante, com limite de pagamento até 30/11/2005.

  2. A Administração Tributária, tendo notícia da emissão de facturas falsas por parte de “B… Comércio Materiais de Construção Lda. /A… Lda.”, J…, “Sociedade de Construções…, Lda./C…”, “G…, Lda”, identificou, entre outros, como adquirentes desses serviços, “B…, Lda”, CF nº 5…, “J… Unipessoal, Lda.”, CF nº 5…, e “J…, Lda.”, CF nº 1…, nas quais surge como sócio gerente J…, aludido em 1.

  3. As acções inspectivas relativas às sociedades comerciais “J… Unipessoal, Lda.” e “J…, Lda.” tiveram início em 22/5/2005 e terminus em 11/7/2005, e nelas foi recolhida factualidade idêntica à que serviu de base às liquidações impugnadas nestes autos.

  4. No decurso da acção inspectiva, em auto de...

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