Acórdão nº 00118/2002.TFPRT.32 de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFernanda Esteves
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. Relatório Construções ..., Lda.

(Recorrente), CF 5…, com sede na Rua…, Ermesinde, Valongo, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), referente ao ano de 1999.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: 1ª. Por força do disposto nos art.s 1º, 2º, 13º, 18º.2, 32º.1, 2 e 5, aplicável por força do artº 18º.1, todos da Constituição, 9º.1 do CC, 93º.2, 40º.3, 48º, 52º, 59º, 67º e 119º do Tratado de Roma, e 2º.1, 4º e 5º.1 da 6ª Directiva sobre o IVA, com, pelo menos, força supra - ordinária em relação às normas nacionais de direito ordinário, e levando-se ainda em conta o teor do Acórdão de 12.1.2006 do Tribunal de Justiça Europeu, o processo de impugnação de um acto tributário é de plena jurisdição, e, em consequência o valor da prova produzida em procedimento administrativo - tributário esgota-se com a decisão final produzida nesse procedimento (acto administrativo).

  1. Os factos dados como provados pela FP, em procedimento administrativo - tributário, iniciado, tramitado e concluído, com base em possível violação do disposto no artº 19º, 3 e 4 do CIVA, por força dos princípios e direitos decorrentes nas normas invocadas na conclusão anterior, têm que ser provados pela FP, no processo judicial, caso a FP declare a existência dos factos violadores, e não reconheça o direito à dedução do imposto, desde que o sujeito passivo impugne judicialmente esse acto.

  2. Em matérias dessas espécies, dos nºs 3 e 4 do artº. 19º do CIVA, a FP não goza de presunção de legalidade dos seus actos, pois tais matérias têm relevância jurídico-penal. A atribuição à FP dessa presunção perverteria assim aqueles princípios e direitos.

  3. Em atenção a esses princípios e direitos, o disposto nos arts. 74º., 75º e 76º. da LGT têm que ser interpretados em função das normas invocadas, sendo certo que o disposto nos nºs. 1 e 4 do artigo 76º é matéria inconstitucional.

  4. Atento este quadro normativo, é indubitável que a FP não produziu qualquer meio de prova no âmbito deste processo; por isso, o acto tributário deve ser anulado ou revogado.

  5. Embora não se reconheça qualquer valor à prova do procedimento administrativo, desde logo porque é obtida sem controlo judicial e sem submissão ao contraditório, sempre se dirá que, desse procedimento, resulta que a Impte adquiriu todos os serviços correspondentes aos valores das facturas.

  6. Os indícios que sustentam a decisão de liquidar o imposto não são suficientemente consistentes e credíveis para suportar tal decisão.

  7. Ao contrário da FP, que não logrou fazer prova dos constitutivos do direito à liquidação, a Recorrente provou a falta dos factos constitutivos daquele direito.

  8. Ficou provado que a Recorrente não dispunha de meios para efectuar uma obra de tal dimensão sem recurso ao trabalho de sub - empreiteiros, que a obra foi adjudicada ao J... que arranjava trabalhadores para nela trabalharem e que os pagamentos, em regra, eram feitos em dinheiro.

  9. Apesar de não terem sido recolhidos outros elementos de prova, nomeadamente a reinquirição da testemunha J..., ou a inquirição de outras pessoas, a decisão sob recurso altera completamente a valoração da prova produzida em relação à primeira sentença anulada por este Tribunal.

  10. Em sede de contraprova, pois a prova compete à FP, os factos alegados pela Recorrente na sua petição estão suficientemente provados, quer por força dos depoimentos das testemunhas inquiridas, coerentes, objectivos e isentos, quer pela experiência comum.

  11. Por força do alegado, quanto a factos deve ser julgada provada a realidade de operações consubstanciadas nas facturas.

  12. Por força de tudo o que vai alegado, o acto tributário deverá ser anulado ou revogado.

JUSTIÇA! Não foram apresentadas contra-alegações.

O Exmo.

Procurador - Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir, já que a tal nada obsta.

Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pela Recorrente, e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões [cf. artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nº s 3 e 4 e 690º, nº 1 todos do CPC, na redacção aplicável, “ex vi” artigo 2º, alínea e), e artigo 281º do CPPT], são as de saber: (i) se a sentença recorrida, ao relevar a prova produzida pela Fazenda Pública no decurso do procedimento administrativo sem que essa prova tivesse sido reproduzida e examinada em audiência pública, violou, entre outros, os artigos 75º, nº 1 da Lei Geral Tributária, 32º, n.º 2, 202º, nº 2 e 203º, da Constituição da República Portuguesa e 345º e 350º do Código Civil; (ii) da inconstitucionalidade do artigo 76º, nº 1 e 4 da LGT; (iii) se a sentença errou ao considerar que os indícios apontados no RIT, e a que o Tribunal a quo aderiu, são suficientemente sérios e credíveis para se poder concluir pela não prestação dos serviços titulados pelas facturas em causa nos autos; (iv) se a sentença recorrida incorreu em erro no julgamento de facto e de direito ao não ter dado como provados os factos alegados pela Impugnante no sentido de demonstrar que os serviços constantes das facturas foram efectivamente prestados e, consequentemente, ao ter concluído pela falta de demonstração da materialidade das operações tituladas pelas facturas em causa.

  1. Fundamentação 2.1. Matéria de Facto 2.1.1.

    O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma: Factos provados: A).

    A Impugnante Construções ..., Lda., NIPC 5…, com sede na Rua…, em Valongo, foi objecto de uma acção inspectiva que teve início no dia 06.04.2001 e termo em 04.12.2001, com base na Ordem de Serviço n.º 28 094 - cfr. Relatório de Inspecção junto a fls.182 a 214 do processo administrativo; B).

    Na sequência da acção inspectiva, acima referida, os Serviços de Inspecção Tributária, elaboraram um relatório, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido, e do qual consta, para além do mais, o seguinte: “I.CONCLUSÕES DA ACÇÃO INSPECTIVA No âmbito da presente acção inspectiva, produziram-se todo um conjunto de fundamentos, quer em sede das empresa utilizadora, quer em sede dos supostos emitentes, que claramente apontam para que as facturas de A…, n.º 137, 139, 144 e 147, de Ab..., n.º 017 e 051, de D..., n.º 155, 156 e 189, de M..., n.º 043 e de R..., n.º 0003 e 0004, movimentadas como custos do exercício de 1999 sob a rubrica de “subcontratos”, encerram factos e operações que não se deram e que, portanto, são documentos falsos.

    Nessa medida, e porque se tratam de despesas fictícias, por falta de enquadramento no preceituado no artigo 23º do Código do IRC, tais valores não podem ser considerados como custos fiscais, pelo que, será de promover as correcções técnicas em sede do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, através do acréscimo ao lucro tributável declarado do valor de 51.074.160$00.

    I. OBJECTIVO, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA (…) B – MOTIVO, ÂMBITO E INCIDÊNCIA TEMPORAL (…) Motivo: A acção inspectiva teve por motivo determinante a suspeita de utilização de facturas falsas, atribuídas ao operador A... por serviços supostamente prestados de aplicação de gessos projectados e colocação de molduras em obras de construção civil.

    (…) III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL 1. FACTOS QUE DESPOLETARAM A PRESENTE ACÇÃO INSPECTIVA No âmbito de uma acção inspectiva anteriormente efectuada ao contribuinte A...

    , NIF 1…, colectado como empresário em nome individual, no exercício da actividade de fornecimento de gessos e outros materiais relacionados com a construção civil, assim como a sua aplicação no âmbito das prestações de serviços, na sequência do cruzamento da informação obtida através de solicitação via postal dos elementos relativos às relações económicas entre aquele agente e as Construções ..., Lda., apurou-se que esta empresa lançou na sua escrita as facturas n.º 137 de 30/06/99, 139 de 30/06/99, 144 de 30/07/99 e 147 de 28/07/99, que pretendem traduzir a “aplicação de gessos projectados e molduras na obra de Ermesinde” No âmbito da referida acção, verificou-se que os elementos que integravam a escrita do referido A... não reflectiam o registo das mencionadas facturas, assim como se constatou que o valor contido nas mesmas não foram declaradas à Administração Fiscal, quer em sede do IRS, quer do IVA.

    Por essa razão, indagou-se o referido indivíduo, exibindo-se para tanto fotocópias das mencionadas facturas, que pelos vistos apresentam uma letra manuscrita diferente da sua, tendo para o efeito prestado as seguintes declarações: - Quanto às facturas n.º 137, 139, 144 e 147 todas emitidas em 1999 à firma “Construções ..., Lda.”, declarou não ser sua a letra que nelas surge manuscrita nem autorizou alguém a fazê-lo por si, acrescentando que durante o ano de 1999 não exerceu qualquer actividade comercial ou de prestação de serviços para a aludida empresa; - Desconhece quem utilizou as suas facturas, isto é, a 137, 139, 147 e 144, sabe sem dúvida que não emitiu essas facturas e que não prestou os serviços que delas constam, até porque não costumava passar facturas por valores tão elevados. Admite que alguém tenha tido acesso a essas facturas e que abusivamente se tenha servido das mesmas para fins em relação aos quais é completamente alheio. Desconfia que as mesmas possam ter sido fornecidas ou emitidas por J..., que chegou a trabalhar consigo até Março/Abril de 1998, sendo por isso uma pessoa que teve acesso às facturas que normalmente utilizava; - O depoente fez questão de precisar que durante o ano de 1998 e mais...

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