Acórdão nº 00797/08.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MLLSCS veio instaurar a presente ação administrativa especial contra a UNIVERSIDADE DE C...

, pedindo a condenação desta entidade demandada a: a) reconhecer como válida a formação e competências académicas nas unidades curriculares de Ginecologia, Obstetrícia, Patologia Cirúrgica II, Patologia Médica II e Pediatria, todas unidades curriculares do 5.º ano do curso de Medicina na Universidade de C..., efetuadas na Universidade de Bona, na Alemanha, no ano letivo 2006/2007, no âmbito do programa Erasmus, b) validar, definitivamente, os exames realizados nas unidades curriculares de Ginecologia, Obstetrícia, Patologia Cirúrgica II, Patologia Médica II e Pediatria, ao abrigo da providência cautelar com processo n.º 680/08.9BECBR.

* Pelo acórdão do TAF de Coimbra a fls. 497 e seguintes foi julgada a acção improcedente.

* Inconformada com tal decisão a Autora, ora RECORRENTE, interpôs o presente recurso tendo formulado em ALEGAÇÕES as seguintes CONCLUSÕES: 1) O acórdão recorrido ignorando o direito, fez de uma relação jurídica contratual trilateral (contratos multilaterais), prevista no art. 23.º do DL. 42/2005 (regulação do programa ERASMUS), dois contratos sinalagmáticos, incorrendo assim em erro de julgamento, que é patente, na qualificação e consequências da relação jurídica em causa.

2) Quer a proposta de contrato celebrado entre a Universidade de Origem e a Recorrente, quer a proposta de contrato celebrada entre a aluna e a Universidade de Destino (assim divergentes, no que se refere às unidades curriculares a frequentar e frequentadas) são nulas enquanto contrato, na medida em que falta, quer num caso, quer noutro, uma das três declarações de vontade essenciais à formação da relação jurídica multilateral de que se trata, que se explica na necessidade de existirem três declarações de vontade concordantes no que ao fim contratual diz respeito - cfr. jurisprudência, doutrina e legislação citadas no corpo das alegações.

3) A Aluna recorrente, que, à época, tinha cerca de 20 anos de idade, foi objeto de escárnio pelo professor Alemão responsável pela Faculdade de Medicina de Bona, dizendo este que ela não estava na Alemanha para passear ou divertir-se e matriculou-a, ou em reverência exigiu-lhe que o fizesse, em mais unidades curriculares do que aquelas que estavam antes previstas na proposta contratual celebrada entre a estudante e a Faculdade de Medicina de C….

4) Tranquilizando a Recorrente, disse-lhe o seu tutor na Alemanha (só a qualificação das funções desse professor como “tutor”, já diz muito sobre a força da opinião do mesmo) que isso já tinha acontecido noutras situações, sendo que nunca nenhuma Faculdade de Medicina Europeia lhe tinha negado o pedido de reconhecimento das unidades curriculares feitas na sua Faculdade.

5) O Professor alemão da Faculdade de Medicina de Bona, tutor da recorrente, fez, concordantemente com o que havia dito a esta, o pedido de reconhecimento das unidades curriculares feitas na Alemanha para além das que foram objeto da proposta contratual celebrada entre a recorrente e a Faculdade de Medicina de C…, que ignorou tal pedido, como consta dos factos provados no ponto 6 e ss. do acórdão recorrido.

6) Esta recusa de reconhecimento de que se trata afirma-se como uma “inflexibilidade incompreensível e inacreditável” da R., nas próprias palavras do coordenador departamental do programa Erasmus da Faculdade de Medicina de Bona, P. D. W.

7) Não existe, para quem saiba o que é o contrato multilateral, qualquer contrato por falta de declaração de vontade concordante no fim (como é característica dos contratos multilaterais) entre as três partes contratantes (Universidade de origem, Universidade de destino e aluna), sendo o alegado contrato celebrado entre a Aluna e a Universidade de C..., que serviu para denegar a pretensão, inexistente, nulo e de nenhum efeito – cfr. arts. 23.º e 24.º do DL 42/2005, conjugado com os arts. 217.º, 220.º e 405.º do Código Civil (cfr. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, p. 329), aplicáveis entre o mais ex vi do art. 185.º, n.º 2 do CPA ou até do art. 133.º, n.º 1 do CPA (falta de elemento essencial que é a declaração da vontade), e bem assim o art. 185.º, n.º 1 do CPA, normativos estes que, assim, em evidente erro de julgamento, foram violados.

8) É um facto, indesmentível internacionalmente, que a Faculdade de Medicina da Universidade de Bona detém melhor qualidade técnica e científica e exigência na aprovação para com os seus alunos do que a Faculdade de Medicina da Universidade de C....

9) A recorrente, que é uma jovem séria e digna, assentiu na reverente sugestão do Professor Alemão e, assim, concluiu com aproveitamento várias unidades curriculares que lhe foram propostas por esse responsável pelo programa ERASMUS da Faculdade de Medicina de Bona, esforçando-se assim para atingir os objetivos que lhe foram propostos.

10) Inexistindo contrato, a questão do reconhecimento ou não das unidades curriculares feitas na Faculdade de Medicina daquela Universidade Alemã (que é o que está em causa), jamais pode ser decidida com fundamento na vinculatividade formal de um contrato inexistente entre a Universidade de C... e a Aluna Recorrente, que não previa a frequência e o reconhecimento da formação em algumas unidades curriculares feitas pela recorrente na Alemanha, mas, também ao contrário do que em erro de julgamento foi decidido, com o recurso ao estatuído no art. 134.º, n.º 3 do CPA e à principiologia.

11) Verificam-se no caso, como dissemos especifica e detalhadamente, os três pressupostos em que se explica o art. 134.º, n.º 3 do CPA, sendo que a formação obtida com êxito na Alemanha pela aluna deve ser reconhecida como inexorável facto que é, por força da aplicação do normativo a que aludimos e, assim também no que releva, por aplicação da principiologia citada.

12) Em modo recursivo, diremos assim que o acórdão ao desconsiderar erroneamente a aplicação da principiologia à situação vertente, dizendo, por um lado, que a mesma não vale contra o suposto contrato e, por outro lado, dizendo que a mesma não vale contra normas, face à força constitucional da principiologia invocada que tornaria agravadamente ilegal qualquer interpretação das normas que os afrontasse, incorre em erro de julgamento.

13) Assim mesmo, independentemente de uma abordagem da principiologia comunitária (designadamente a liberdade de circulação de pessoas e serviços entre os Estados-Membros, previsto no então art. 3.º, n.º 1, al. c) do Tratado da CE; ou o princípio do reconhecimento das formações e qualificações profissionais, previsto entre o mais nos arts. 4.º, 10.º e ss. da Diretiva n.º 2005/36/CE do Parlamento Europeu e do Conselho), 14) por força do princípio da boa fé, da proteção da confiança, da segurança, do princípio da mobilidade e do reconhecimento mútuo do valor da formação e das competências adquiridas (art. 44.º do DL. 74/2006 e arts. 1.º, 3.º, als. b) e f), 11.º e 13.º, da Lei 46/86, de 14/10), do direito à educação e ao ensino (nas dimensões a que se referem os arts. 43.º, 73.º e 74.º da Constituição da República Portuguesa), da proporcionalidade, da igualdade e da justiça (previstos nos arts. 13.º, 266.º, 18.º, 58.º, n.º 1 e n.º 2 ali. b) da Constituição da República), tudo nas específicas e concretas dimensões especifica e detalhadamente alegadas, deve a acórdão, ser revogada por afronta a esta principiologia, aplicável que é por força do estatuído no art. 134.º ou diretamente ou por consideração da mesma no seu alcance constitucional, que assim implicaria que a interpretação seguida dos arts. 23.º, 24.º, 25.º e 26.º do DL. 42/2005, de 22 de Fevereiro e 178.º do CPA, se devesse, por inconstitucionalidade material, desaplicar na situação vertente, exigindo positivamente a sua aplicação o reconhecimento da formação da A. de que se trata.

15) Ainda que a recusa fosse expressão de uma lícita interpretação da lei, mormente do estatuído nos arts. 23.º a 26.º do DL. 42/2005, de 22 de Fevereiro, a A., atenta a sua boa fé, teria direito ao reconhecimento da formação prática em causa, por força da atuação do instituto do abuso de direito (cfr. entre o mais, o art. 334.º do CC).

16) Atento o que se expôs, e de acordo com as regras da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT