Acórdão nº 00546/08.2BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFernanda Esteves
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. Relatório M...

e sua mulher Maria ...

(Recorrentes), residentes na Rua…, Braga, interpuseram o presente recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedentes os embargos de terceiro que deduziram em reacção à penhora efectuada no âmbito da execução fiscal nº 0353200501037617 que foi instaurada contra S...

e que corre termos no Serviço de Finanças de Barcelos.

Os Recorrentes terminaram as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: I - O recorrente não concorda com a douta sentença que julgou improcedentes os pedidos por ele formulados, por entender que nela se faz uma errada apreciação da matéria de facto e uma incorrecta aplicação da lei.

II - Os Recorrentes não concordam com a sentença recorrida, uma vez que o Tribunal a quo fez uma incorrecta apreciação da prova, bem como uma incorrecta apreciação do Direito por não se considerar a existência da posse pública, pacífica, titulada e de boa - fé pelos Recorrentes e ainda uma incorrecta apreciação do Direito por não se considerar a aquisição da propriedade do imóvel em causa, por parte dos Recorrentes, pela via da usucapião.

III - Os recorrentes solicitam a reapreciação do prova testemunhal e documental.

IV - Quanto à primeira, os Recorrentes entendem que em sede de Audiência de Discussão e Julgamento ficou provada a existência da posse pública, pacífica, contínua, titulada e de boa fé pelos Recorrentes relativa ao bem penhorado nos presentes autos.

V - Sobre tais factos depuseram as testemunhas A…, G… e A….

VI - A testemunha A... esclareceu que era proprietário de um armazém sito nas proximidades do imóvel em apreço nos presentes autos, e como tal deslocava - se frequentemente ao referido local. Esta testemunha foi peremptória a referir que sempre que se deslocava ao referido local era sempre o Recorrente marido quem se encontrava no imóvel em causa, desde o ano de 1993, 1994, ou seja, ano em que fora celebrado o contrato - promessa de compra e venda entre Executado e Recorrente marido referente ao terreno em questão.

VII - A referida testemunha apenas via no local, o Recorrente marido, sempre a limpar e a fazer obras.

VIII - Por tudo isto, a indicada testemunha acabou por referir que sempre pensou que o terreno e construção eram propriedade do Recorrente marido, tendo chegado a pedir - lhe luz emprestada para o mesmo, pedido ao qual ele acedeu durante dois anos e ter assistido pessoalmente à realização de obras de conservação e de beneficiação do imóvel em causa nos presentes autos, obras essas levadas a cabo pelo Recorrente marido.

IX - A Testemunha G… esclareceu que por diversas vezes, auxiliou o Recorrente marido na realização de obras no imóvel em causa bem como no tratamento e limpeza do terreno que integra a referida construção.

X - A testemunha mencionou ainda que era o Recorrente marido quem se deslocava assiduamente ao referido loteamento a fim de proceder à limpeza do terreno e que em momento algum viu lá o Executado, pelo que para ele a propriedade do lote em causa pertencia ao Recorrente marido.

XI - A referida testemunha mencionou ainda o conhecimento da existência de um contrato promessa celebrado entre o anterior proprietário do terreno em causa e o Recorrente marido, bem como sabia que este último já havia pago o preço pelo mesmo.

XII - A identificada testemunha salientou ainda saber da existência de um contrato celebrado entre o Recorrente marido e a EDP relativa a uma cabine que se encontra implantada no referido local, pelo que na qualidade de proprietário em causa, possui uma declaração escrita da EDP, em que a mesma se compromete a retirar do local a mencionada cabine, caso aquele decida vender ou construir no local.

XIII - A testemunha A… esclareceu que conhecia bem o lote de terreno em apreço nos autos, chegando mesmo a ter uma sociedade com o Recorrente marido, que utilizava o referido imóvel como instalação da empresa, acabando por referir que tinha conhecimento que o Recorrente marido já se encontrava no local desde aproximadamente o ano de 1994 (ano da celebração do contrato - promessa).

XIV - A testemunha ressalvou que todos os trabalhos respeitantes a terraplanagem, construção de muros, colocação de janelas foi realizado pelo Recorrente marido e que apesar da sociedade que tinha com o Recorrente marido ter falido, este último continua a ir frequentemente ao local, procedendo á realização de todos trabalhos de limpeza, manutenção e beneficiação que se vão afigurando necessários.

XV - A supra indicada testemunha referiu ainda que sempre considerou o Recorrente marido como o proprietário do referido terreno, até porque a sociedade que criou conjuntamente com aquele, nunca pagou renda a ninguém nem nunca lá viu alguém a arrogar - se da propriedade do identificado imóvel.

XVI - Por fim, a referida testemunha acrescentou que o Recorrente marido sempre pensou e actuou por forma a agir como o verdadeiro e único proprietário do local, frisando ter conhecimento de que, por todo o período em que por motivos profissionais frequentava o espaço em causa, nunca ninguém, muito menos o Executado, apareceu no local a peticionar o pagamento de qualquer quantia a título de rendas ou outras despesas com o imóvel em causa.

XVII - A testemunha, mencionou ainda ter conhecimento de que o Recorrente marido pagou a totalidade do preço pela aquisição do referido terreno ao seu anterior proprietário.

XVIII - Desta forma, da conjugação dos vários depoimentos das testemunhas supra identificadas, podemos concluir que todos eles foram peremptórios em evidenciar que desde 1994, foi o Recorrente marido quem passou em nome próprio a praticar todos os actos possessórios respeitantes ao imóvel em questão sempre na convicção de ser o beneficiário de tal direito.

XIX - Todas as testemunhas supra indicadas referiram ainda que, em momento algum, avistaram no referido imóvel, qualquer outra pessoa a arrogar - se proprietária do mesmo, sendo sempre o Recorrente marido quem lá se encontrava e quem realizava todo o tipo de trabalhos de beneficiação e conservação, a expensas suas, naquele local.

XX - Ficou então provado, através dos testemunhos de G… e A… que os Recorrentes celebraram um contrato - promessa com o Executado, tendo já pago o respectivo preço pelo terreno em apreço e que a partir da data da sua celebração (mais ou menos 1994) foram eles quem, a expensas próprias, realizaram todas as obras que lá se encontram, nomeadamente, no que concerne à construção de muros de suporte, colocação de janelas, vidros e portas, terraplanagens e criação de divisórias.

XXI - Resultou ainda provado que foram sempre aqueles, pelo menos desde 1994, quem procedeu à limpeza do terreno, roçando o mato, plantando árvores e colocando sebes no mesmo.

XXII - Por fim, resultou ainda do teor das diversas testemunhas que tais trabalhos e obras de construção e beneficiação no referido local foram sempre realizados pelos Recorrentes, ininterruptamente, sem violência e sem a oposição de quem quer que fosse, agindo sempre os mesmos na convicção e com a ciência de que exerciam um direito próprio e legítimo.

XXIII - Assim sendo, tendo em conta o supra exposto bem como relevando o depoimento das testemunhas arroladas, deveria o Tribunal a quo, considerar provada a existência da posse pública, pacifica, continua, titulada e de boa - fé pelos Recorrentes relativamente ao imóvel penhorado no presentes autos e em consequência ter ordenado o levantamento da respectiva penhora.

XXIV - Ao não decidir neste sentido, fez o Tribunal a quo uma incorrecta apreciação da matéria de facto.

XXV - Por outro lado, o Tribunal a quo, na sentença por si proferida, entendeu limitar a força probatória do contrato - promessa de compra e venda junto pelos Recorrentes aos autos, indicando para o efeito que “o contrato - promessa não cumpre os requisitas formais, pelo que a apreciação do mesmo como prova ter-se-á que ser apreciada de acordo com as demais provas.” XXVI - Tal limitação probatória é sustentada pelo facto de o referido contrato - promessa de compra venda ter sido celebrado sem o reconhecimento presencial das assinaturas dos promitentes bem como não obedecer ao formalismo legal da confirmação pelo notário, da existência da respectiva licença de utilização ou de construção.

XXVII - Todavia, apesar do teor vertido no nº3 do artigo supra identificado, no caso em apreço, a limitação probatória, fundada na falta dos requisitos formais (a falta da certificação pelo notário da existência de licença de utilização ou construção), bem como a falta do reconhecimento presencial das assinaturas, não deveria ter ocorrido.

XVIII - A letra da lei, vertida no artigo supra transcrito, remete-nos para a necessidade do reconhecimento presencial da assinatura dos promitentes e a certificação pelo notário, da existência da licença respectiva de utilização ou de construção no caso de celebração de contrato oneroso de transmissão ou constituição de direito real sobre edifício, fracção autónoma deste, já construído, em construção ou a construir.

XXIX - Contudo tais omissões não podem “afectar” ou limitar a força probatória do referido documento carreado nos autos.

XXX - A questão da inobservância dos dois requisitos formais prescritos no nº 3 do artigo 410º do Código Civil, os quais supra se indicaram, ficou definitivamente encerrada com a publicação de dois Assentos que o Supremo proferiu sobre a matéria.

XXXI - O Assento de 28 de Junho de 1994, publicado no Bol. Min. Justiça, n.º438, pág.64, que prescreve que “no domínio do nº 3 do artigo 410º do Código Civil, a omissão das formalidades previstas neste número, não pode ser invocada por terceiros”, vide “Das Obrigações em Geral” - Antunes Varela, Vol. I, Página 321.

XXXII - O Assento de 01 de Fevereiro de 1995, publicado no Bol. Min. Justiça, n.º 444, pág.104, que...

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