Acórdão nº 01224/06.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelEsperan
Data da Resolução22 de Maio de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte 1. Relatório AMRC interpõe recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, que julgou não verificado o facto ilícito e, em consequência, improcedente a ação que a Recorrente intentou contra o HOSPITAL DE ML, na qual peticiona uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que alegadamente sofreu em consequência de ter saltado de uma janela do 1º andar das instalações do Recorrido, durante o seu internamento para tratamento de descompensação psicótica, o que entende ter acontecido por omissão do dever de vigilância do Recorrido e por ausência das necessárias condições de segurança das janelas do edifício.

A Recorrente conclui as suas alegações como se segue: 1. “O presente recurso vem interposto da decisão proferida pelo Tribunal a quo o qual julgou improcedente a pretensão indemnizatória formulada pela A. ao abrigo do instituto da responsabilidade civil extracontratual por entender não se verificar, in casu, a ocorrência de qualquer facto ilícito atribuível à R.

  1. O presente recurso tem por objecto não apenas a interpretação e aplicação da lei à factualidade dada como provada, mas visa também a reapreciação da prova produzida, maxime a prova testemunhal (gravada) com vista à impugnação da matéria de facto.

  2. Por outro lado, o presente recurso visa também a impugnação da matéria de facto, sendo que o mesmo se impõe, a partir do momento em que a Mª Juiz a quo, deu como provada a matéria constante dos quesitos 54º e 55º 4. Para o efeito, a A. funda a sua discordância no teor dos registos clínicos juntos aos autos; no teor do processo de averiguações interno e o depoimento da Enf. EJ, colhido na sessão de julgamento de dia 4 de Outubro de 2012, com início às 14h.39m.20s e da testemunha SMBSM, obtido no dia de 4 de Outubro de 2012 5. De facto, da conjugação dos citados elementos probatórios, entende a A. que fica demonstrado a violação das regras de prudência comum por banda da R e que se traduzem na omissão do dever de vigilância e omissão do dever de adopção de mecanismos de segurança nas janelas existentes nas suas instalações que efectivamente salvaguardassem a integridade física da A.

  3. Relativamente à subsunção de direito ao caso em concreto, entende a Recorrente que, uma vez alterada a resposta aos quesitos sobreditos, ficará amplamente demonstrado que estão reunidos os pressupostos para proceder a pretensão indemnizatória com fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual.

  4. Normas jurídicas violadas: art.º 483º do CC; art.º 6º do DL 48051.

”*O Recorrida contra-alegou, concluindo que: “1ª – Devem manter-se as respostas, tal como foram dadas, aos quesitos 54º e 55º da Base Instrutória uma vez que estão em conformidade com a prova produzida.

  1. – Não houve qualquer violação do dever de vigilância por parte dos profissionais do ora recorrido, pois 3ª – Tratava-se de uma doente internada voluntariamente; das diversas vezes que estivera internada no Hospital, ora recorrido, nunca manifestara qualquer ideação auto – destrutiva; na data da ocorrência ia já no 11º dia de internamento, motivado, não por qualquer comportamento auto – destrutivo, mas por descompensação psicótica; não apresentava consciência mórbida; não havendo nada, mesmo nada, que justificasse uma especial vigilância.

  2. – Não houve também qualquer violação do dever de vigilância em relação às condições de segurança nas janelas do Hospital, ora recorrido.

  3. – Os estabelecimentos de Saúde Mental, na área do internamento, destinam-se tanto a doentes internados compulsivamente nos termos da Lei de Saúde Mental como a doentes internados voluntariamente.

  4. – Em relação aos primeiros exigem-se medidas especiais de segurança para evitar fugas e outras situações de desespero.

  5. – Em relação aos segundos – os internados voluntariamente – já não são necessárias tais medidas especiais até porque estes doentes – era o caso da recorrente – podem sair do Hospital sempre que o desejem, desde que assinem o respectivo termo de responsabilidade da alta.

”*A Magistrada do Ministério Público junto deste TCA Norte emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso e mantida a sentença recorrida.

*2. Objeto do recurso O presente recurso, tal como delimitado pelas alegações da Recorrente, tem por objeto: i) A impugnação dos pontos 54) e 55) da matéria de facto assente, que a Recorrente considera que deviam ter sido dados como não provados; ii) Erro de julgamento quanto à não verificação do facto ilícito consubstanciado na omissão de deveres de vigilância e de segurança.

*3. Factos A decisão recorrida considerou assente a seguinte factualidade: 1) A A. padece de uma doença do foro psíquico denominada de psicose atípica; 2) Em virtude daquela doença, a A. foi por diversas vezes internada no Hospital de ML; 3) O R. é um hospital do sector público administrativo, integrado na rede de prestação de cuidados de saúde (com a natureza jurídica estabelecida pela alínea a) do n.° 1 do artigo 2.° da Lei n.° 27/2002, de 8 de Novembro, e pelo Decreto-Lei n.° 188/2003, de 20 de Agosto), tendo por missão a prestação de cuidados de saúde especializados de psiquiatria e de saúde mental à população adulta; 4) Em princípios de Outubro de 2003, em virtude de uma descompensação psicótica da sua doença, a A. foi internada no hospital supra, no serviço PV/ VC; 5) A A. ficou internada sob a responsabilidade médica Dra. SV e aos cuidados do serviço de enfermagem chefiado pela Enfermeira EJ; 6) No dia 10/10/2003, cerca das 11:40 horas, a A. foi conduzida pela Enfermeira EJ a uma sala de estar/convívio para que aí pudesse relaxar e fumar um cigarro; 7) A sala referida situa-se num 1° andar; 8) Aquela sala possui janelas que distam do solo cerca de 5 metros de altura; 9) Como consequência da queda, a A. foi transportada pelo INEM para a Unidade Local de Saúde (ULS) de Matosinhos, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, ficando aí internada desde o dia 10 de Outubro até dia 17 do mesmo mês; 10) Posteriormente, em 17/10/2003, foi-lhe dada alta hospital e conduzida daquela ULS para o Hospital de ML; 11) Do relatório de alta clínica consta “Resumo da história clínica: Fractura exposta multicominutiva de pilar tibial direito. Fractura cominutiva calcâneo. Terapêutica efectuada: Encavilhamento peronial direito + maléolo tibeal + osteo-fixação com fixador externo. Osteosíntese com cravo Steim.

Resultado: melhor Prognóstico: reservado.” Teve alta, com terapêutica instituída e consulta marcada para o dia 19/11/2003 para fazer radiografia sem gesso; 12) Após ter conduzido a A. à sala descrita nos pontos 6), 7) e 9) deste probatório, a Enfermeira EJ deu-lhe um cigarro, conversou um pouco com a A. e referiu-lhe, então, que ia chamar um dos enfermeiros de serviço para a acompanhar ao exterior quando acabasse de fumar o cigarro; 13) Após, a Enfermeira EJ ausentou-se da sala descrita nos pontos 6), 7) e 8) deste probatório, deixando a A. só e sem qualquer vigilância; 14) A A. saltou por uma das janelas; 15) A roupa e sapatos que a A. trazia ficaram danificados, importando as calças o valor de cerca de 40,00 Euros, a camisola o valor de cerca de 25,00 Euros e os sapatos o valor de cerca de 30,00 Euros; 16) Em 17/10/2003, após ser transferida do Hospital PH... para os serviços do R., a A. foi transportada para “H...- Hospitais Portugueses, S.A.- C...”, tendo despendido a quantia de 40,00 Euros nesse transporte e a quantia de 25,00 Euros na consulta que ali efectuou; 17) Na C... concluíram que a A. apresentava fractura do pilar tibial direito, fractura do calcâneo esquerdo e fractura do corpo vertebral de L2; 18) Naquela clínica foi submetida a operação cirúrgica no dia 05/11/2003, tendo feito: a) Extracção do fixador externo da perna direita e imobilização do tornozelo com bota gessada; b) Redução incrucente da fractura do calcâneo esquerdo com reintrodução de novo cravo de gissave e colocação, por agulha, de enxerto ósseo e imobilização gessada do tornozelo com bota gessada; 19) A A. teve alta hospitalar no dia 11/11/2003, para aguardar re-internamento; 20) Para realização da cirurgia descrita no ponto 18 deste probatório e obtenção de cuidados subsequentes, a A. despendeu a quantia de 10.204,57 Euros; 21) A apólice do seu seguro de saúde não cobria este tipo de ocorrências; 22) Àquela quantia acrescem 940,01 Euros relativa à permanência de um acompanhante durante o período de internamento; 23) Em 16/12/2003, a A. deslocou-se novamente aos HOSPITAIS PORTUGUESES, S.A. (H...), tendo pago 8,00 Euros...

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