Acórdão nº 02209/08.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução18 de Dezembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: AJRA veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 15.12.2010, pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção administrativa comum intentada contra o Estado Português para pagamento, a título de responsabilidade civil extracontratual, das quantias de 842,91 € a título de danos patrimoniais e de 30.000,00 € a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora a contar da data da citação até integral e efectivo pagamento.

Invocou para tanto, em síntese, que o Tribunal a quo incorreu em erro no enquadramento jurídico dos factos, violando o disposto no artigo 669º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil (de 1995).

O recorrido contra-alegou defendendo a manutenção do decidido.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. O Tribunal recorrido decidiu julgar a acção totalmente improcedente, por não provada, e, em consequência, absolver o réu do pedido.

  1. Com esta decisão não podemos concordar.

  2. O Tribunal recorrido entendeu estarem preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, com excepção da presunção da culpa.

  3. Esta decisão contende com a factualidade dada como provada, ou seja, há um erro notório na apreciação da prova.

  4. No caso sub judice estamos perante uma culpa colectiva, culpa que abrange os casos em que os danos não podem ser directamente imputados a um comportamento concreto de um funcionário ou agente, mas resultam de uma actuação global.

  5. O probatório produzido nos autos deixa-nos concluir, salvo o devido respeito e melhor opinião que houve um funcionamento anormal do serviço. Não funcionou como seria legítimo esperar de um serviço administrativo moderno que se pretende justo e eficiente, mas ao invés se demonstrou defeituoso, mal organizado, não sendo o “comportamento normal” que seira de esperar de um serviço administrativo moderno.

  6. Salvo o devido respeito, a partir do raciocínio que um cidadão tem que se fazer acompanhar do comprovativo do pagamento de multa, sob pena de se ver culpado de uma situação a que é externo, é no mínimo surreal.

  7. Nos autos provou-se indubitavelmente que o departamento responsável pelo registo e difusão de informações a nível nacional não funcionou a tempo de evitar que o autor fosse retido e sofresse as consequências inerentes à sua retenção, provadas nos autos.

  8. Não bastasse o funcionamento deficiente do referido departamento – uma vez que ao contrário do afirmado na sentença não foram os inspectores que registaram a informação, limitando-se a enviar fax comprovativo do pagamento para o referido departamento responsável por tal para o Tribunal Judicial de Braga – o serviço estava inoperante e assim se manteve até ao final da tarde pelo menos, atentos os depoimentos dos inspectores de serviço nesse dia no Aeroporto Francisco Sá Carneiro.

  9. Pelo exposto, e pela prova produzida nos autos, a culpa (na sua modalidade de culpa colectiva, salvo devido respeito e melhor opinião) encontra-se preenchida.

  10. Há assim um erro na qualificação jurídica dois factos.

  11. Norma violada: alínea a), do n.º2, do artigo 669º, do Código de Processo Civil (de 1995).

    * II – Matéria de facto.

    Determina o artigo 685.º-B, do Código de Processo Civil de 1995 (aplicável no tempo a este recurso) que: “1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

    1. Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

    (…)” O autor invoca, no ponto 4 das conclusões das suas alegações que na decisão recorrida “há um erro notório na apreciação da prova” o que indica estar a pôr em causa o julgamento da matéria de facto. Mas esta afirmação é antecedida por uma outra a de que a decisão recorrida “contende com a factualidade dada como provada”.

    Mas não indica quais os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados. Nem das suas alegações resulta, por leitura interpretativa, quais os pontos da matéria de facto que, na sua perspectiva, deviam ter merecido um julgamento diverso.

    Por outro lado invoca o depoimento de testemunhas, funcionários dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, mas não por referência aos pontos da matéria de facto dada como provada e dada como não provada nem faz menção ao registo de gravação dos respectivos depoimentos.

    Do contexto das alegações e respectivas conclusões verifica-se que, em bom rigor, o autor não põe em causa o julgamento da matéria de facto mas apenas a leitura feita pelo Tribunal a quo da matéria dada como provada.

    Deverão assim considerar-se como provados os seguintes factos, constantes da decisão recorrida:

    1. O autor, no dia 22 de Junho de 2007, no momento de passagem no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras do Aeroporto de Lisboa foi detido pelos funcionários do referido serviço – ponto A) da matéria de facto assente.

    2. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras informou o autor que estava a cumprir mandatos de detenção proferidos no âmbito dos processos n.ºs 146/05.9GTBRG e 1909/05.OPBRG, do 2.º Juízo Criminal de Braga - ponto B) da matéria de facto assente.

    3. Mandatos por força dos quais devia o autor ser detido e conduzido a estabelecimento prisional para cumprimento da pena de prisão subsidiária em alternativa à pena de multa em que foi condenado nos referidos processos - ponto C) da matéria de facto assente.

    4. Pena que o autor não teria de cumprir se pagasse as referidas multas, o que fez entregando a quantia de 720 € para pagamento da multa relativa ao primeiro dos referidos processos e 520 € para pagamento da multa relativa ao segundo processo - ponto D) da matéria de facto assente.

    5. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras entregou ao autor dois recibos juntos aos autos com a petição inicial como documentos 3 e 4 que se dão por integralmente reproduzidos, dando sem efeito a detenção - ponto E) da matéria de facto assente.

    6. O pagamento das multas, por parte do autor foi objecto de registo e comunicação pelos serviços do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras em serviço no Aeroporto de Lisboa no dia 22.6.2007, tendo estes elaborado “Relatório de Ocorrências” – ponto 39.º da base instrutória.

    7. O autor no dia 7.7.2007 compareceu no posto de controlo de passaportes de saída - resposta dada ao ponto 40.º da base instrutória.

    8. O autor, no dia 7 de Julho de 2007, quando se encontrava no aeroporto Francisco Sá Carneiro com vista a embarcar no voo 1458 da companhia de aviação Easyjet, com destino a Genebra, Suíça, apresentou o respectivo passaporte no Posto de Fronteira do referido Aeroporto e foi informado por um funcionário do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras que, atendendo à informação constante do sistema informático, deveria aguardar numa sala para a qual iria ser encaminhado - ponto F) da matéria de facto assente.

    9. O autor aguardou algum tempo ao lado do balcão do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – resposta dada ao ponto 13.º da base instrutória.

    10. O autor, a dada altura, foi encaminhado por uma funcionária do referido serviço para uma sala que lhe disse existir um problema com o sistema informático, pelo que deveria aguardar - ponto G) da matéria de facto assente.

    11. Após a chegada da inspectora que o acompanhou o autor foi conduzido para as instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para se esclarecer do que se tratava – resposta dada ao ponto 42.º da base instrutória.

    12. Do sistema informático não constava a informação referente ao pagamento das multas que o autor efectuou no dia 22.06.2007 – resposta dada ao ponto 37.º da base instrutória.

    13. O sistema informático que permitiria fazer a pesquisa encontrava-se inoperante – ponto 43.º da Base Instrutória.

    14. Após as 16 horas, foram contactados o centro de informática do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras em Lisboa, o Departamento de Imigração, Registo e Difusão do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e a Unidade de Apoio do Aeroporto de Lisboa do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – resposta dada ao ponto 44.º da base instrutória.

    15. Após as 16 horas o inspector de turno do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras em serviço no aeroporto, explicou ao autor o motivo das diligências que tinha de efectuar, tendo solicitado a sua colaboração para esclarecer a que diziam respeito as “medidas cautelares” referidas – resposta dada ao ponto 45.º da Base Instrutória.

    16. O autor afirmou igualmente...

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