Acórdão nº 02809/14.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelAna Paula Santos
Data da Resolução30 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO O Director – Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou procedente o recurso judicial interposto pelos Recorridos ao abrigo do artigo 89º-A, nº 7 e 8 da Lei Geral Tributária (LGT) contra a decisão de fixação do seu rendimento tributável em sede de IRS relativo ao ano de 2013, no montante de €44.627,79, por avaliação indirecta.

O Recorrente termina as suas alegações de recurso, formulando as conclusões que se reproduzem: I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, concedeu provimento ao recurso à margem referenciado, com as consequências aí sufragadas, e consequentemente, aquilatou que os Recorrentes comprovaram ter sido outra a fonte da manifestação de fortuna evidenciada.

II - Com efeito, o entendimento propugnado na douta sentença ora recorrida, radica no facto, de os sujeitos passivos terem demonstrado a fonte dos rendimentos afectos à aquisição da supra identificada embarcação de recreio mediante a exibição da cópia da ordem da transferência do montante de € 32.605,00 efectuada pela sua filha para a conta nº 30066 10953 00010289201 titulada em nome dos mesmos no S... SA.

III - É contra tal entendimento se insurge o ora Recorrente, tendo em conta que o mesmo viola frontalmente no n.° 3 Art.° 89.°-A da LGT, desvirtuando por completo a ratio legis em termos de ónus de prova ínsita no aludido preceito, sendo manifestamente contrário à doutrina e à jurisprudência.

IV - As manifestações de fortuna constituem um instrumento jurídico de luta contra a fraude e evasão fiscais, que se materializa num método substitutivo, em que sempre que não seja possível apurar os rendimentos efectivamente por si auferidos, os sujeitos passivos são tributados de forma indirecta, através de um rendimento padrão, que resulta da valoração dos bens adquiridos, designados como manifestações de fortuna.

V - De acordo com o disposto no n° 3 do aludido Art. 89°-A da LGT, cabe ao sujeito passivo comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada, (nomeadamente herança ou doação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso ao crédito) podendo fazê-lo, mediante apresentação, de cópia dos extractos bancários que evidenciem a origem e a mobilização dos recursos financeiros utilizados.

VI -Assim, e atendendo ao ónus de prova estatuído no aludido n.° 3 do Art.° 89.°-A da LGT, o entendimento propugnado na douta sentença falece desde logo, porquanto, não encontra assento ou guarida nem no espírito da lei nem na letra da norma nem sequer na jurisprudência.

VII - É incontornável que a mens legislatori repercutida no n.° 3 do Art.° 89-A da LGT, exige a prova da relação directa entre a afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna evidenciada.

VIII - Ao contrário do entendimento plasmado na douta sentença, no caso dos autos impunha-se ao Recorridos efectuar prova, designadamente mediante cópia dos extractos bancários que evidenciassem a origem e a mobilização dos recursos financeiros obtidos, e que esses recursos se destinaram aos suprimentos efectuados à aquisição da manifestação de fortuna.

IX - O ónus de prova da mobilização e destino dos recursos financeiros para justificar a manifestação de fortuna, tem sido objecto de profícua jurisprudência do STA, de que se destaca o Acórdão, dc 12.04.2012, processo nº 298/12: “Para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta não basta ao contribuinte demonstrar que no ano em causa detinha meios financeiros de valor superior ao dos consumos realizados, mas também quais os concretos meios financeiros que afectou à realização de tais consumos sendo a melhor interpretação do art. 89.°-A, n.° 3, da LGT, a que exige que o contribuinte prove a relação causal de afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna evidenciada. (...) Patenteia-se que o sistema criado de controlo das manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados exige ao sujeito passivo que comprove a realidade dos rendimentos declarados e que é outra a fonte do acréscimo do património ou do consumo efectuado - cfr. art.° 89°-A n.° 3 da LGT não lhe bastando fazer a demonstração de factos que permitam duvidar da existência do facto tributário ou da sua quantificação, antes se lhe impondo, que para além disso demonstre quais os concretos meios financeiros não sujeitos a declaração que foram afectos ao consumo evidenciado.

A demonstração de que se fala é, pois, a da afectação concreta dos recursos brotados da referida fonte (rendimentos não sujeitos a tributação) ao concreto consumo ou acréscimo patrimonial.” X - Na mesma esteira tem sido entendimento desse Colendo Tribunal de que é exemplo o Acórdão de 28 de Outubro de 2010, proferido no processo com o n.° 00212/10.9BEPNF: «A não ser assim, bem podia suceder que o contribuinte continuasse a manter na sua disponibilidade os meios financeiros que alegou e demonstrou não estarem sujeitos a declaração totalmente incólumes (i.é, não consumidos por manifestação de fortuna alguma), sendo até que sempre poderia usar os mesmos meios financeiros para justificar diferentes manifestações de fortuna ou, pelo menos, manifestações de fortuna evidenciadas em anos diferentes. Ora, manifestamente, nem pode ser isso que quis o legislador nem esse entendimento colhe apoio na letra da lei. Concluímos, pois, que a melhor interpretação do art. 89.°-A, n.° 3, da LGT, exige que o contribuinte prove a relação directa de afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna evidenciada [...]».

XI - A contrario estaria encontrada a fórmula para contornar a ratio legis ínsita no Art.° 89-A da LGT bastando aos sujeitos passivos fazer a prova da demonstração da disponibilidade financeira e desconsiderar na sua plenitude a sua capacidade aquisitiva face aos rendimentos declarados, o que em nada se coaduna com o princípio de justiça material que é o fundamento da tributação e que não pode dar cobertura a situações como a dos autos sacrificando, sem mais, o interesse público na prevenção e combate da evasão fiscal.

XII - Por outro lado, a questão da justificação parcial da manifestação de fortuna não considerada na decisão de fixação do rendimento colectável dos sujeitos passivos para efeitos de IRS pelo método indirecto do artigo 89°-A da LGT só se pode colocar quando se conclua ter havido justificação parcial da manifestação de fortuna, o que para já, o Recorrente não concede.

XIII - Logo, resulta de forma clara e notória que a douta sentença, violou claramente o disposto no n.° 3 do Art.° 89.°-A da LGT.

Termos em que, concedendo-se PROVIMENTO ao recurso, deve a decisão do Tribunal a quo ser revogada, mantendo-se o acto tributário de decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante do artigo 89°-A da LGT, com todas as legais consequências.

PORÉM V. EX.AS ASSIM DECIDINDO FARÃO SÃ, SERENA E A COSTUMADA JUSTIÇA.

O Recorrido apresentou contra – alegações, mais tendo suscitado a questão concernente à incompetência absoluta deste tribunal, no entendimento de que é competente para conhecer do presente recurso o Supremo Tribunal Administrativo.

O Exmo.

Procurador - Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer, suscitando a questão concernente à incompetência absoluta deste tribunal.

Notificada Recorrente para se pronunciar, querendo, sobre a excepção dilatória suscitada, não usou desta prerrogativa.

Atenta a natureza urgente do processo, foram dispensados os vistos legais (cf. artigos 36º, nº 2 do CPTA e 657º, nº 4 do CP).

DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR As questões suscitadas pelo Recorrente e delimitadas pela alegação de recurso e respectivas conclusões são as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao entender que os ora Recorridos comprovaram ter sido outra a fonte da manifestação de fortuna evidenciada, ou seja, demonstraram a fonte dos rendimentos afectos à aquisição da embarcação de recreio que consubstancia a manifestação de fortuna que subjaz à decisão de determinação da matéria coletável por avaliação indirecta mediante a exibição da cópia da ordem da transferência do montante de € 32.605,00 efectuada pela sua filha para a conta nº 30066 10953 00010289201 titulada em nome dos mesmos no S... SA.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade: Com relevo para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos: A) Em 02.06.2009, o Recorrente J...celebrou com a “S... – SA”, pelo período de 60 meses, um contrato de locação financeira tendo por objeto um barco de recreio, do tipo “veleiro” da marca “JEANNEAU”, tipo “SUN ODYSSEY 45DS” – conforme documento a folhas 23 a 26 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; B) Aquando da celebração do contrato a que se alude em A), o Recorrente J...pagou à “S... – SA” o valor de 25.472,20€ - por acordo; C) Em 03.07.2009, o veleiro a que se alude em A) foi registado em nome da “S... – SA”, com o n.º 1… – conforme documento a folhas 21 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; D) Em 27.12.2012, o Recorrente J...pagou à “S... – SA” o valor de 44.627,79€, por débito da conta n.º 30066 10953 00010289201 – conforme documentos a folhas 27 e 28 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente reproduzido; E) Em 05.12.2012, a conta a que se alude em D) apresentava um “saldo credor” de 8.224,79€ - conforme documento a folhas 28 do processo físico, cujo teor se dá, aqui, por integralmente...

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