Acórdão nº 02056/14.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelCristina da Nova
Data da Resolução17 de Setembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO S…, Lda.

,com o NIPC 5…, com sede na rua…, Porto, vem recorrer da sentença que negou provimento ao recurso e manteve a decisão de acesso a documentos e contas bancárias da Recorrente.

Formula nas respetivas alegações (cfr. fls. 244-278)as seguintes conclusões que se reproduzem: «CONCLUSÕES 1.Com a redacção introduzida pela Lei nº 94/2009, de 1 de Setembro (no que para aqui importa, a redacção é a acolhida no artigo 63º-B na versão aqui aplicável) deixou de se fazer referência expressa à audição prévia nas situações referidas no nº1 [alíneas a) a g)], ou seja, quando está em causa o acesso a documentação bancária do próprio sujeito passivo. Na verdade, de acordo com o nº 5 do artigo 63º-B da LGT, a referência expressa ao direito de audição surge relacionada com o acesso aos documentos bancários de familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com o contribuinte.

  1. Apesar desta evolução/ alteração da lei, a eliminação da referência ao exercício do direito de audição, no caso das situações contempladas no nº1 do artigo 63º-B da LGT, não equivale à dispensa (legal) deste direito. Dito por outras palavras, e recorrendo à terminologia acolhida no artigo 60º, nº 1 da LGT, há que concluir que no caso concreto a lei não prescreve em sentido contrário, no sentido de expressamente dispensar o direito de audição, pois não resulta da letra da lei nem do seu espírito uma vontade clara e inequívoca do legislador no sentido da eliminação do direito de audição.

  2. E, não prescrevendo a lei no sentido de dispensar o direito de audição, no caso concreto, a necessidade de assegurar o exercício de tal direito decorre, desde logo, da CRP, concretamente do artigo 267º, do nº5 do artigo 60º da LGT, do artigo 45º do CPPT e do artigo 100º do CPA.

  3. Deste modo, o artigo 63-B da LGT não afasta o direito de audição nas situações em que, como no caso sub judice, a AT pretende aceder a documentos bancários do próprio sujeito passivo, nem a sua dispensa está contemplada no artigo 60º da LGT (de resto, importa realçar que, no procedimento em causa, nem a AT ensaiou qualquer tentativa de justificar a dispensa do direito de audição).

  4. Assim o entendimento da recorrida de que o artigo 63º-B da LGT, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 94/2009, de 1 de Setembro, eliminou o direito de audição prévia no caso em apreciação, é inconstitucional, pois ele é garantido pelo art. 267º, nº5, da CRP e está assegurado, em geral, pelos arts. 100º do CPA e 60º da LGT, não existindo razões de celeridade ou de conveniência que possam justificar uma eliminação generalizada de tal direito.Por isso, a interpretação da sentença recorrida afecta o direito à reserva da intimidade da vida privada, que é um direito fundamental garantido pelo art. 26º, nº1, da CRP, sendo que o direito de audição deverá ser assegurado nos termos gerais previstos no artigo 60º da LGT e 100º e 101º a 103º do CPA, designadamente quanto às situações e requisitos de inexistência e dispensa de audiência.

  5. Reforçando-se a ideia que num procedimento que já leva meses e meses, prorrogado, se afirmem razões de celeridade ou urgência; dificilmente, para um homem médio, colocado na posição de um destinatário normal, se pode entender que não se concedam 15 dias para o sujeito passivo se pronunciar sobre uma decisão manifestamente agressiva e intrusiva.

  6. No caso sub judice a Administração Fiscal, secundada pelo Tribunal a quo recorre a uma indiciação da prática de um ilícito criminal, sem fazer qualquer juízo sobre a gravidade do seu comportamento, sem fazer sequer alusão aos elementos concretos de algum tipo de crime fiscal.

  7. Na verdade, aquelas exigências legais de indícios da prática de tipo de crime doloso em matéria tributária e necessidade de fundamentação com expressa menção dos motivos concretos que as justificam, não se contentam com uma descrição genérica e vaga da menção, antes deve tal despacho indicar os concretos factos indiciantes que a provarem-se, se integram num concreto tipo de crime doloso em matéria tributária, como tal expressamente estatuído numa concreta norma legal incriminadora.

  8. O despacho proferido pelo Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, não imputa à recorrente quaisquer factos objectivos e concretos e verificados que indiciem a prática de um concreto tipo de crime, mormente em matéria tributária, não se mostrando por isso preenchidos os pressupostos legais de que depende a derrogação do sigilo bancário.

  9. Sendo certo que, a AT limita-se a fazer uso de alegações genéricas, algumas delas em perfeita contradição com a “realidade” que pretende passar (v.g. ponto 5.3 da informação referida em C) do probatório) sem imputar em concreto à recorrente a prática de um crime doloso em matéria tributária, pelo que o valor probatório das mesmas é nulo, permitindo-se falar em indícios da prática de um crime fiscal tipificado no art.º 103º do RGIT sem que, contudo, invoque sequer os elementos daquele tipo legal.

  10. A fundamentação de facto não se deve limitar à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cogniscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto.

  11. A sentença recorrida nas alíneas K) e L) limita-se a dar como provados os autos de declarações, cujo teor nem sequer foi anteriormente ou posteriormente notificado à recorrente, não curando, v.g. de aferir da (falta) de credibilidade em razão da ciência dos seus autores, da sua motivação endógena, etc. etc.

  12. No caso dos autos, é manifesto que tal dever de fundamentação não foi observado pelo tribunal recorrido, designadamente no que concerne à análise crítica das provas.

  13. Sendo que do teor da notificação efectuada à recorrente da decisão de derrogação do sigilo bancário, não constam os autos integrais de declarações, não se percebendo muito bem a afirmação de que se mostra descabido o discurso argumentativo da recorrente quando afirma que a AT violou o disposto na al. b) do art.º 55º do RCPIT. Acaso consta da notificação efectuada a integral transcrição das declarações, com identificação das pessoas que as profiram e as respectivas funções? Não parece… 15.

    A junção dos depoimentos testemunhais escritos, extraídos de processo-crime pendente é ilegal e está proibida, constituindo uma violação do segredo de justiça, violando os comandos normativos dos arts. 89º e 90º do C.P.Penal.

  14. A atender-se que não se está perante provas ilegais, então deveria o Tribunal fazer um esforço acrescido de fundamentação no sentido de dar a conhecer a razão ou as razões pelas quais se atribuiu credibilidade (medida pelo eventual interesse pessoal na decisão da causa), pois as declarações não foram feitas perante nenhum juiz nem foram sujeitas ao princípio do contraditório.

  15. O juiz está obrigado a julgar a matéria de facto de livre apreciação segundo o princípio da objectividade das provas traduzido nas regras de experiência comum, da racionalidade, bom senso, da normalidade da vida, etc., e era por esse critério que haveria de ter julgado a matéria de facto alegada e apreciado os depoimentos das testemunhas que foram produzidos nos autos, tendo especialmente em conta a sua razão de ciência e a oportunidade e sujeição dos seus depoimentos ao princípio do contraditório.

  16. A tudo acrescendo a falta de notificação da junção do PA, que pelos vistos, contém a integral transcrição das declarações, o que não deixa de constituir nulidade (omissão de actosusceptível de...

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