Acórdão nº 00119/07.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução20 de Abril de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública e a Digníssima Magistrada do Ministério Público interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, proferida em 22/04/2013, que julgou procedente a oposição deduzida por J…, NIF 1…, residente em Rua…, Porto Alto 2135 - Samora Correia e M…, NIF 1…, residente em…, concelho de Ourém, originariamente instaurada contra “R…, Lda.”, NIPC 6…com sede em ..., São Martinho do Bispo, Coimbra, para cobrança coerciva da quantia de €343.738,85.

A Recorrente Fazenda Pública terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1. A Fazenda Pública não pode concordar com a douta sentença pelas razões de facto e de direito que se explanam: 2. As certidões de dívida em causa nos autos, ao contrário do que é afirmado pelo Mmº Juiz, não resultam de liquidações adicionais ou corrigidas, mas sim de liquidações de IVA que tiveram origem em declarações periódicas entregues voluntariamente pela própria originária devedora, e que deram origem a pagamentos em falta (PF) por não terem sido entregues os meios de pagamento dos referidos impostos (IVA) no prazo legal de pagamento.

  1. Tal entendimento advém não só da leitura às próprias certidões de dívida sob os n°s 2003/107836, 2003/124563, 2003/137366, 2003/138484, 2003/139796 e que constam dos autos, bem como da fundamentação das liquidações e que constam a fls. (...) dos autos.

  2. Portanto, o Mm° Juiz do Tribunal “a quo”, e com todo e devido respeito, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto ao julgar os Oponentes partes ilegítimas na execução, por entender que existiu ilegalidade nas certidões de divida.

  3. Isto porque, conforme se pode depreender dos autos, as certidões de dívidas são legais, porque contém os requisitos essenciais exigidos no art°163.° do C.P.P.T., ou seja, as certidões fazem menção da entidade emissora ou promotora da execução, encontram-se todas assinadas, a data em que foram emitidas, o nome e domicilio da originária devedora, bem como indicam a natureza e proveniência da divida e indicação, por extenso do seu montante.

  4. Por outro lado, o Mm°(a) Juiz(a) do Tribunal à “quo” ao ter definido como prazo legal de pagamento voluntário das dívidas as datas das liquidações (por terem ocorrido no ano de 2003), fundamentando para o efeito que aquele ano de 2003 constam nas referidas certidões de dívidas, entendemos, também, que neste caso, o tribunal errou igualmente, fazendo uma incorreta apreciação da prova constante dos autos e consequentemente, neste caso, fez uma errada interpretação do art° 24.° da Lei Geral Tributária.

  5. Ora, o legislador estabeleceu que a alínea a) do n°1 do art°24.° da LGT abrangia a responsabilidade pelas dívidas tributárias constituídas durante o exercício de funções dos gestores ou cujo prazo do respetivo pagamento ou entrega tenha terminado já depois desse exercício.

  6. Já na previsão legal da alínea b) do citado artigo, o legislador estabeleceu imputação da falta de entrega ou pagamento dos tributos ao gestor que, tendo o prazo de pagamento ou de entrega do imposto terminado no seu período de gerência, os não tenha efetuado, a menos de que se demonstre que não lhe foi imputável essa falta, ou seja, faz recair sobre o gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega do imposto, pois tal imputabilidade presume-se.

  7. Assim, a execução fiscal contra a qual se dirigiu a oposição, na parte que interessa à decisão do presente recurso, tem em vista a cobrança coerciva de dívidas respeitantes a imposto sobre valor acrescentado (IVA) relativa ao exercício de 2002 e em regime de tributação mensal, e tiveram origem, no essencial, em declarações de IVA voluntariamente entregues pela própria Originária devedora.

  8. O disposto no art°84.° do C.P.P.T define o que constitui pagamento voluntário de dívidas de impostos dizendo que é o “… efectuado dentro do prazo estabelecido nas leis tributárias”.

  9. E o então art°40.° do Código do Imposto de Valor Acrescentado (CIVA) estabelecia os prazos para entrega das declarações periódicas de IVA, que no caso em concreto, deviam ter sido enviadas até ao dia 10 (dez) do segundo mês seguinte àquele a que respeitam as operações, por se tratar de um sujeito passivo com um volume de negócios igual ou superior a €498.797,90 no ano civil anterior.

  10. Estabelecendo o então art°26.° do CIVA os prazos para pagamento e entrega do imposto, referindo que «... os sujeitos passivos são obrigados a entregar o montante do imposto exigível, (...) na Direcção de Serviços de Cobrança do IVA, simultaneamente com as declarações a que se refere o art°40.° …” 13.Assim, no âmbito da entrega voluntária das declarações efetuadas pelo próprio contribuinte (Originária Devedora) é facto inequívoco que o prazo de entrega do referido imposto, para os exercícios em análise, ocorreram no período do exercício da gerência dos ora Oponentes, face aos prazos de entrega do imposto acima referidos, isto é, a Originária Devedora deveria ter entregue os impostos (IVA) até 10 de Outubro de 2002, 10 de Novembro de 2002, 10 de Dezembro de 2002, 10 de Janeiro de 2003, 10 de Fevereiro de 2003.

  11. E tais prazos máximos de entrega do imposto advêm do facto de estarmos perante os períodos de tributação mensal de IVA para os seguintes períodos: Agosto de 2002, Setembro de 2002, Outubro de 2002, Outubro de 2002, Novembro de 2002 e Dezembro de 2002.

  12. No entanto, o Tribunal “a quo” assumiu como prazo legal de pagamento as datas das “liquidações” e que foram efetuadas apenas no ano de 2003 (por culpa exclusiva da originária devedora que entregou e submeteu as referidas declarações de IVA já fora do prazo).

  13. No entanto, é nosso entendimento que estamos perante situações jurídicas diferentes, isto é, a expressão “prazo legal de pagamento” estabelecido no n.° 1 da al. b) do art°24.° da LGT diz respeito a dívidas que deviam ter sido pagas no período compreendido pela responsabilidade, independentemente de terem sido efetivamente liquidadas ou postas à cobrança nesse espaço de tempo, enquanto que a “liquidação 2003” incluída nas referidas certidões diz respeito ao ano em que foram efetuadas as liquidações e que apenas ocorreram naquele ano, conforme havia já referido, porque as mesmas declarações foram entregues fora de prazo e sem meio de pagamento (com exceção da declaração de IVA de Dezembro de 2002 que foi submetida ainda dentro do prazo legal, mas também sem meio de pagamento).

  14. Ora, na data da entrega dos tributos, os Oponentes exerciam as correspondentes funções de gerência e como tal, a reversão das dívidas em causa insere-se na alínea b) do n°1 do art°24.° da Lei Geral Tributária.

  15. Nesse sentido a anotação de António Lima Guerreiro, em “Lei Geral Tributária Anotada”, Ed. Rei dos Livros, pag. 142 que refere “Solução contrária beneficiaria injustamente os administradores ou gerentes que, por motivo de incumprimento dos seus deveres legais de cooperação com a administração fiscal, inviabilizassem o pagamento das obrigações tributárias legalmente vencidas no período de exercício do seu cargo, em detrimento dos que os vieram substituir. Não é pois, relevante para a definição do âmbito da responsabilidade prevista na alínea b) do número 1 do presente artigo, a data do apuramento da dívida por meio de acção de inspecção, mas o termo do prazo legal da obrigação de pagamento.” 19.Parece-nos que outra solução não pode ser dada senão esta interpretação literal da norma.

  16. Fazendo o paralelismo da situação jurídica, disso é exemplo o n°3 do disposto no art°35.° da LGT em que o legislador estabeleceu que “Os juros compensatórios contam-se dia a dia desde o termo do prazo de apresentação da declaração, do termo do prazo de entrega do imposto a pagar antecipadamente ou retido ou a reter, até ao suprimento, correcção ou detecção da falta que motivou o retardamento da liquidação”.

  17. E quanto à gerência de facto existe um elemento incontornável, que se encontra junto aos autos que é a ata cuja cópia integra a fls. 39 dos autos, relativa à reunião da Assembleia Geral, realizada a 12-11-2002, e na qual tiveram intervenção ativa.

  18. Essa reunião foi convocada para “deliberar sobre proposta de celebração de um contrato de locação financeira imobiliária com a M… - Sociedade de Locação Financeira, SA, tendo por objecto a fracção autónoma...” 23. É mencionado nessa ata que a proposta foi aprovada por unanimidade e que foi ainda unanimemente deliberado mandatar o sócio gerente L… e o gerente J… para outorgar, em nome e, em representação da sociedade na outorga daquele contrato.

  19. Parece-nos, portanto, que estamos perante verdadeiros atos de gestão e que o Órgão de Execução Fiscal carreou factualidade concreta e suficiente para estribar a justificação da gerência de facto por parte dos ora Recorridos/ Oponentes.

  20. Sendo certo que a sentença recorrida não os considerou (atos de gestão - de gerência) expressamente como provados, no entanto, nos factos dados como “não provados” considerou “Que os autores não exerceram quaisquer actos de gerência efectiva da devedora originária no período referido supra em 14”.

  21. Fundamentando essa “não prova” pela existência de documentos no processo de execução, fls. 36 dos autos, “atestando a intervenção dos oponentes em assembleia da sociedade e o assumir da representação desta por um deles para a outorga de um contrato de locação a realizar”.

  22. Assim, o Mm° Juiz do Tribunal “a quo” deveria ter expressamente referido como factos dados como provados aqueles atos de gerência e não o tendo feito, incorreu na omissão de pronúncia de matéria de facto.

  23. O Tribunal deve declarar os factos provados e os não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (n.° 2 do artigo 653.° do CPC, aplicável por...

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