Acórdão nº 00586/13.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução28 de Abril de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO Centro Hospitalar de S. João EPE vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 27 de Maio de 2015, e que julgou parcialmente procedente a acção administrativa comum intentada por JJAF, e onde solicitava que deveria o Réu ser condenado: a) A Pagar ao Autor a quantia de € 64 191,77 correspondentes a créditos salariais emergentes do contrato de trabalho entre ambos celebrado referente ao período entre 15-03-2011 e 16-08-2012, durante o qual o Réu negou o direito ao Autor de ser readmitido ao serviço, em violação do regime legal que lhe era aplicável; b) A pagar ao Autor os respectivos juros que se venceram desde a data da citação do Réu calculados sobre o capital de € 63 394,61, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento; c) A pagar ao Autor as despesas de índole patrimonial que este teve sede suportar, originadas na conduta da Ré, no valor de € 376,15; d) A pagar ao Autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais o montante de € 7 000,00; Tudo no montante de € 71 47,92; e ainda e) A reconhecer o período que medeia entre 15-03-201 e 16-08-2012 para efeitos de contagem da antiguidade ao seu serviço;… Em alegações o recorrente concluiu assim: 1 – O Tribunal a quo violou o art. 7º da Lei n.º 67/2007, de 31/12, face à ausência de ilicitude da actuação do Recorrente, porquanto não foi enunciado (nem alegado) o princípio ou comando legal violados no não regresso ao serviço do Recorrido, nem foi identificada a invalidade concreta do acto revogado; 2 – Tal ausência de ilicitude verifica-se igualmente pelo facto de não ter sido dado como provado, nos presentes autos, que o posto de trabalho do Recorrido não estava ocupado no momento em que solicitou o seu regresso, nomeadamente através do desempenho das suas funções por outros médicos; 3 – Não estando provado tal facto – na ausência de elementos que permitam essa conclusão – não está preenchido o pressuposto factual vertido no art. 235º n.º5 da Lei n.º 59/2008, de 11/09 (a contrario sensu), pelo que não se pode considerar violado o direito ao regresso do Recorrido; 4 – Na ausência da ilicitude, não estão reunidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual prevista no art. 7º da Lei n.º 67/2007, de 31/12; 5 – Mesmo que se considerasse a hipótese da existência de ilicitude, o que não se concede, a revogação do acto de indeferimento do regresso não tem efeitos retroactivos – ao contrário do referido pelo Tribunal a quo – porquanto tal acto já se consolidara na ordem jurídica – cfr.

acórdão do STA, de 11/05/2005, Proc. n.º 0289/05, que ora se junta; 6 – Para além da consolidação de tal acto estar devidamente alegada na contestação (cfr. art. 4º a 7º e arts. 31º e 32º), o próprio Tribunal a quo reconheceu, em sede de despacho saneador, que a decisão de indeferimento do regresso não foi impugnada no prazo a que alude o art. 58º n.º2 do CPTA, ou seja, no prazo de 3 meses; 7 – Face a tal consolidação na ordem jurídica, a revogação efectuada pelo Recorrente teve um carácter discricionário, pelo que, ainda que se tratasse de revogar um acto inválido, os efeitos a produzir seriam apenas compatíveis com o regime de revogação de actos válidos, nos termos do art. 145º n.º1 do CPTA; 8 – Não fosse o sentido de justiça e de conveniência do Recorrente, através da revogação, o Recorrido ainda hoje não teria regressado ao serviço… 9 – Pelo que, tendo por base o critério de cálculo dos danos patrimoniais usado pelo Tribunal a quo, o Recorrente não deve ser condenado ao pagamento de quaisquer vencimentos entre o dia 8 de Setembro de 2011 e 16 de Agosto de 2012, aplicando-se o mesmo raciocínio para os danos não patrimoniais.

10 – Mas ainda que se concedessem os efeitos retroactivos da revogação para efeitos de cálculo de danos, tal retroactividade não poderia ser absoluta, face à inércia processual do Recorrido.

11 – Os danos patrimoniais e não patrimoniais do Recorrido – que se aferem essencialmente pelo tempo em que o mesmo não regressou ao serviço – só se verificaram pela sua inércia, uma vez que não utilizou a via processual adequada à eliminação do acto jurídico lesivo e consequente condenação à prática de acto devido, no prazo de 3 meses, deixando que o indeferimento se consolidasse na ordem jurídica e deixando à mercê da discricionariedade e da boa vontade do Recorrente para poder regressar ao serviço.

12 – É que, não obstante a possibilidade de utilização de acção comum para efeitos de responsabilidade civil, o apuramento dos respectivos danos deve-se restringir àqueles “…que se não possam imputar à falta de impugnação contenciosa ou a negligente conduta processual do autor na eventual impugnação deduzida”, nos termos do art. 38º do CPTA – in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, 2ª edição revista, 2007, pág. 227; 13 - Pelo que, a existirem danos, o seu ressarcimento deve ser restringido na medida em que tal inércia do Recorrido não tenha contribuído para a ocorrência daqueles.

O Recorrido contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões: A) O Réu não deu cumprimento ao disposto no n° 1, do art° 640° do Código de Processo Civil; B) O Recorrente não cumpriu este ónus, o que fez estabilizar na ordem jurídica, toda a matéria de facto, bem como a prova por depoimento e a prova por documentos, nenhuma delas posta em causa; C) E, salvo o devido respeito, no caso dos autos, os factos trazidos pelos depoimentos das testemunhas e da prova documental são de molde a não deixar dúvidas; D) Por conseguinte, não merece acolhimento a censura apresentada pelo Réu à decisão proferida, tanto mais que nem sequer colocou em causa o julgamento sobre a matéria de facto (considerados não só os depoimentos das testemunhas, como os documentos dos autos); E) Por outro lado, pretende ancorar-se numa Jurisprudência que, de todo em todo, não lhe pode servir de estribo, porquanto a mesma se centra num acto administrativo consolidado com base num “indeferimento tácito” e cuja génese impugnatória diz respeito a um “recurso contencioso de anulação”; F) No caso dos autos, o acto administrativo revogado (melhor, anulado administrativamente), ainda não estava consolidado, como veremos abaixo; G) Ora, do ponto de vista Jurisprudencial esta questão teve o seu momento, sendo agora, manifestamente vetusta e desajustada da actual realidade do contencioso administrativo; Aliás, não é ao acaso que, por força da Doutrina mais autorizada, o legislador tivesse agora efectuado uma distinção clara entre aquilo que é uma revogação (stricto sensu) e uma anulação administrativa – vide, respectivamente, os n.os 1 e 2, do art. 165º do Código do Procedimento Administrativo; H) Sucede que no caso vertente era aplicável o regime do disposto no art. 141º e nº 2, do art. 145º, ambos do CPA (DL n.º 442/91, de 15 de Novembro), na medida em que os efeitos são fixados ex lege como sendo ex tunc; I) Em termos de Jurisprudência mais actual e consentânea com as alterações no contencioso administrativo (que influenciaram a interpretação e aplicação de algumas normas do CPA), temos por exemplo o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 17/12/2014, no Proc.º 0454/14, 2.ª Secção, no qual foi Relator o Sr. Juiz Conselheiro Aragão Seia, o qual nos remete para o regime previsto nos arts. 137º, 138º, 141º, 142º, n.º 1, 145º, n.° 2 e 146°, todos do Código de Procedimento Administrativo (DL n.º 442/91, de 15 de Novembro); J) Por outro lado, no caso dos autos, estamos perante uma situação sem qualquer margem de livre decisão administrativa (cfr. em geral MARCELO REBELO DE SOUSA/A.S. MATOS, D. Admin. Geral, I, §10). Com efeito, o Réu estava proibido de impedir o regresso do A. naquele contexto factual e, portanto, estava obrigado/vinculado a, nos prazos legais, corrigir a ilegalidade por si criada, repondo os factos como se a ilegalidade inicial não tivesse sido cometida. É o que, a nosso ver, decorre da regra superior da legalidade administrativa consagrada na Constituição e no Código do Procedimento Administrativo. Ainda no mesmo sentido (cfr. D. FREITAS DO AMARAL, Curso…, II, 2ª ed., pp. 501-502, e referências ali contidas); K) Importa referir que, contrariamente à situação tratada pelo Acórdão junto pelo Réu no seu recurso de apelação, no caso dos autos ainda era possível operar a revogação do acto inválido, por estar em tempo (dentro do prazo de um ano) e foi isso mesmo que aconteceu; A comprová-lo, bastará atentarmos na matéria de facto dada como provada nos pontos 15), 27), 28) e 29); L) Outrossim, a conduta ilegal do Recorrente, mereceu vários reparos, desde a própria ARS Norte I.P., à ACSS (sustentada em Parecer da DGAEP para situação análoga), e ainda, da própria Provedoria de Justiça, cfr. docs. n.

os 7, 8, 9 e 10 juntos com a P.I.; M) Assim, tendo ocorrido o indeferimento ao pedido de regresso de licença sem vencimento em 08/09/2011, e a revogação de tal acto em reunião do CA do Réu em 25/06/2012 (menos de um ano), conclui-se que o acto ilegal não chegou a consolidar-se do ponto de vista jurídico; N) Tal situação afasta a possibilidade pretendida agora pelo Réu de ancorar-se no Acórdão que juntou ao seu recurso (sem necessidade, pois bastaria indicá-lo!!!); O) A título adminicular quanto ao momento de produção de efeitos da anulação administrativa (em sentido amplo, apelidada de revogação), destaca-se o vertido no ponto 4., do documento nº 9 junto pelo A. à P.I. e que consiste num documento dirigido pelo Réu à ARS Norte, I.P.. Naquele documento, o Réu refere (sic): “Não estando em causa o direito de regresso do Sr. Dr. Rui Castanheira Henriques, entende o Conselho de Administração que, à luz dos critérios de boa gestão dos recursos disponíveis, o pedido em apreço deverá aguardar melhor oportunidade, tendo em conta que a actual dotação do quadro médico...

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