Acórdão nº 00301/14.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução07 de Julho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório EJGMFB, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada contra a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, tendente, em síntese, a obter a sua inscrição na OTOC, inconformada com a Sentença proferida em 27 de setembro de 2016 (Cfr. fls. 158 a 175 Procº físico) que julgou parcialmente procedente a Ação, mais tendo condenado a OTOC “na prática de novo ato administrativo, com observância do dever de audição da interessada”, veio interpor recurso jurisdicional do mesmo, proferido em primeira instância no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.

Formula a aqui Recorrente nas suas alegações de recurso, apresentadas em 7 de novembro de 2016, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 200v a 202v Procº físico): “1. O ato administrativo que recusou, novamente, a inscrição da ora recorrente é a expressão da assumida resistência da entidade demandada em dar cumprimento a uma Lei da República (Lei nº 27/98, de 3 de Junho), já que depois de ter “inventado” um regulamento elegendo como meio de prova único dos requisitos de inscrição ali previstos a assinatura das declarações fiscais, após a anulação da recusa inicial com tal fundamento, reincidiu recusando apreciar outros meios de prova e só após condenação em processo executivo e ameaça de sanção pecuniária compulsória acedeu à audição das testemunhas.

  1. Mas esta diligência foi uma mera formalidade, já que a decisão de recusa da inscrição estava, de há muito, pré-determinada e a deliberação aqui impugnada limitou-se a fingir que apreciava os depoimentos prestados, fazendo uma apreciação, incompleta, truncada e preconceituosa do seu conteúdo, tendente ao indeferimento da inscrição da A., que estava previamente decidida, como os antecedentes bem demonstram.

  2. O ato impugnado adota um conceito de responsabilidade direta que equivale materialmente à restrição probatória julgada ilegal pelas decisões judiciais juntas como Documentos 1 e 2 com a p.i., na medida em enuncia que tal conceito demanda que se trate da pessoa a quem a Administração fiscal interpela em caso de irregularidade.

  3. A Administração Tributária só pode interpelar como interlocutor quem assine as declarações fiscais dos contribuintes, já que de outra forma, não poderia conhecer a identidade do responsável direto pela contabilidade.

  4. Ou seja, o ato impugnado adota, materialmente, a mesma restrição probatória julgada ilegal pelas decisões judiciais referidas, pois continua, na prática, a exigir a assinatura das declarações para prova da responsabilidade direta pela contabilidade.

  5. O ato em causa envolve, assim, uma violação do caso julgado que dimana das referidas decisões judiciais, sendo nulo, nos termos dos arts. 133º, nº 1, al. h) do CPA e 158º, nº2 do CPTA.

  6. Ao assim não considerar, julgando antes cumprido o caso julgado que dimana das decisões do TAF Porto (DOC.1 junto com a p.i.) e do STA (DOC. 2 junto com a p.i.) a sentença recorrida viola os arts. 173º, nº1 e 158º, nº2 do CPTA e o art. 133º, nº1, al. h) do CPA (de 1991).

  7. A sentença recorrida incorre em erro de julgamento ao ter por pressuposto, que expressa, que a A. não põe em causa que os depoimentos testemunhais que invoca tenham sido considerados na decisão administrativa e ainda que não refere na sua alegação que a prova por si indicada não foi considerada ou que houve erro quanto à atribuição do valor probatório aos particulares depoimentos que indica.

  8. Estas conclusões são expressamente desmentidas e infirmadas pelo teor dos arts. 73º a 89º da p.i., cujo conteúdo a sentença recorrida, lamentavelmente, ignorou.

  9. Ademais, a sentença recorrida expressa um entendimento segundo o qual estaria vedado ao Tribunal sindicar a apreciação da prova produzida no procedimento plasmada no ato impugnado, excetuando nos casos de erro grosseiro, que não teria sido alegado.

  10. Desde logo, salienta-se novo erro da sentença recorrida, já que a A. na p.i. alegou expressamente erro manifesto de apreciação da prova, que, juridicamente, é a mesma coisa que erro grosseiro, o que sucede é que a sentença recorrida se furtou a dele conhecer, com base na suposta insindicabilidade da apreciação probatória da Administração.

  11. Aliás, a interpretação plasmada na sentença recorrida dos poderes de cognição do Tribunal e portanto do art. 3º do CPTA segundo a qual a apreciação da prova produzida no procedimento se insere “numa margem de livre apreciação da administração, relativamente à qual não cabe a este tribunal sindicar mais do que a existência de erro (grosseiro)” é manifestamente inconstitucional, por violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva consagrado nos arts. 20º e 268º, nº4 da CRP.

  12. Como a doutrina e a jurisprudência reconhecem de forma inequívoca, a apreciação da prova em sede procedimental constitui uma atividade materialmente idêntica à desenvolvida pelos Tribunais, que obedece exatamente às mesmas regras e princípios e visa um único e mesmo objetivo: o apuramento da verdade e o carreamento dos factos (verídicos) necessários à decisão.

  13. Ao contrário do que decidiu a sentença recorrida, não existe qualquer obstáculo legal ou constitucional a que o Tribunal possa e deva sindicar a forma e a correção (ou a incorreção) da apreciação probatória efetuada pela Administração.

  14. Deverá, pois, este venerando Tribunal revogar a sentença recorrida e sindicar a valoração da prova contida no ato impugnado, ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos como Tribunal de Apelação.

  15. Sendo certo que uma apreciação isenta e intelectualmente honesta dos depoimentos testemunhais prestados concluirá, inevitavelmente, que o ato impugnado incorre em erro manifesto de apreciação na valoração da prova testemunhal efetuada e vício de erro sobre os pressupostos de facto ao não considerar demonstrados os factos alegados pela A., ora recorrente, no procedimento, designadamente a responsabilidade direta por contabilidade organizada durante os anos de 1991 e 1992.

  16. O depoimento prestado no procedimento pela testemunha MCBSNS e o documento apresentado por esta (Cfr. p.a.) demonstram inequivocamente que a A., ora recorrente, foi responsável direta pela contabilidade organizada da sociedade comercial F&S, Lda. durante os anos de 1991 e 1992.

  17. O depoimento prestado no procedimento pela testemunha AJSM (Cfr. p.a.) demonstra inequivocamente que a A., ora recorrente, foi responsável direta pela contabilidade organizada da sociedade comercial T..., Lda. durante os anos de 1991 e 1992.

  18. Os depoimentos prestados no procedimento pelas testemunhas MFFS e CACC (Cfr. p.a.i.) demonstram inequivocamente que a A., ora recorrente, foi responsável direta pela contabilidade organizada da sociedade comercial M..., Lda. durante o ano de 1992.

  19. Os depoimentos de EMG e MFG demonstram inequivocamente que a A. foi responsável pela contabilidade organizada da sociedade comercial F... Têxteis, Lda. durante o ano de 1992.

  20. Caso entenda que a análise do p.a.i. seria insuficiente para a prova dos factos alegados e consequente demonstração dos aludidos vícios, o que não se admite, o Tribunal sempre deverá ordenar, nos termos do art. 149º, nº2 do CPTA, a produção da prova testemunhal requerida à cautela com a p.i.

  21. Apreciada a prova produzida constante do p.a.i. designadamente os depoimentos testemunhais atrás mencionados, o Tribunal, além de considerar procedentes os vícios do ato atrás referidos, tem inevitavelmente de concluir que a A., ora recorrente, foi, efetivamente, responsável pela contabilidade organizada, de várias empresas nos anos de 1991, 1992, 1993 e 1994.

  22. Ou seja, a A., ora recorrente, demonstra ter sido responsável direta pela contabilidade organizada, nos termos do POC, de várias entidades durante três anos, seguidos ou interpolados, entre 1 de Janeiro de 1989 e a publicação do Decreto-Lei n.º 265/95, de 17 de Outubro, preenchendo os requisitos de inscrição previstos no art. 1º da Lei nº 27/98, de 3 de Junho.

  23. Sendo assim, a entidade demandada, ora recorrida, está legalmente vinculada a aceitar a inscrição da A., ora recorrente, não lhe restando qualquer margem de discricionariedade.

  24. Pelo que se impõe condenar a entidade demandada, ora recorrida, à prática do ato de inscrição da A., ora recorrente, na Ordem dos Contabilistas Certificados, no prazo de 10 dias, nos termos dos arts. 66, nº1 e 71º, nº1, parte final do CPTA, conforme havia sido peticionado.

    Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida e condenada a entidade demandada, ora recorrida, à prática do ato de inscrição da A., ora recorrente, na Ordem dos Contabilistas Certificados, no prazo de 10 dias. Como é de Direito e de Justiça!” A aqui Recorrida/OTOC veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 15 de dezembro de 2016, concluindo (Cfr. Fls. 214v a 218 Procº físico): “1. Não faz sentido a invocação de violação de caso julgado feita pela recorrente, quando já antes se fixou que o caso julgado a executar e cumprir o que impunha era (apenas) a análise e valoração de todos os meios de prova que a recorrente, após o julgado anulatório que obteve, apresentasse para prova dos requisitos exigidos na Lei n.º 27/98.

  25. Das alegações da recorrente ressalta também que é sua pretensão que a recorrida aprecie a nova prova que apresentou esquecendo aquela que já constava do procedimento, sendo que os factos que ali se visavam comprovar, tal como inicialmente alegado pela recorrente, era se esta fora responsável direta por contabilidades organizadas nos termos do P.O.C. durante os anos de 1993, 1994 e 1995.

  26. depois de um longo processo, pretende afinal a recorrente não sou que se valorem novos meios de prova, mas também novos factos, isto é, que afinal também teria exercido aquelas funções em 1992, quiçá até em 1991.

  27. Deve lembrar-se que a recorrida indeferiu o pedido da recorrente por entender (apenas e só) que o meio de prova...

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