Acórdão nº 00125/07.1BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução23 de Junho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO Construções GASC, SA vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 12 de Janeiro de 2017 e que decidiu que as despesas com garantia bancária não devem ser reclamadas como custas de parte no âmbito de acção intentada contra o Município de Sernancelhe e onde era solicitado que devia ser: “…declarada nula a deliberação da Ré de 9 de Março de 2007, pela qual condenou a ora A. no pagamento de uma indemnização no montante de € 320.620,00 e fixou o prazo de 30 dias para o pagamento, por constituir acto viciado de usurpação de poder e ofender os direitos essenciais à segurança das relações jurídicas, da protecção da confiança da A., da boa fé e do contraditório, integrantes do princípio constitucional da proporcionalidade e da justiça; estar eivado de abuso de direito na modalidade de “venire contra factum proprium”, e/ou caso assim não se entenda a mesma anulada por ilegal, e/ou juridicamente inexistente, pelo seu objecto ser totalmente ilegal e impossível.

Em alegações ao recorrente Construções GASC, SA apresentou as seguintes conclusões: I. A prestação de caução por garantia bancária constituiu uma despesa documentada, efectivamente suportada nestes autos pela recorrente, visando a suspensão da execução do seu património, atenta a natureza executória da deliberação impugnada, II. O recurso à garantia bancária é o meio comum e habitual usado pelas empresas, por razões de constrangimento de tesouraria, como é do conhecimento da generalidade das pessoas e era do recorrido, e em termos de custos têm paralelismo com os seguros caução, não havendo qualquer evidência de mercado que dite o recurso ao seguro caução por ser “mais barato”.

  1. A prestação de caução, face à natureza da deliberação com carácter executória, também era um acto absolutamente necessário à defesa dos direitos da Autora, (art. 534.º do CPC, por interpretação a contrario).

  2. A Meritíssima Juiz a quo decidiu que não são de considerar como custas de parte as despesas com a emissão e manutenção da garantia bancária, no valor de 27.310,84 €, sustenta tal decisão na circunstância de o CPTA não atribuir à impugnação judicial do acto administrativo o efeito de suspender a respectiva eficácia, podendo a parte recorrer ao processo cautelar de suspensão da eficácia do acto, mais refere que a Autora, ora recorrente, tinha à sua disposição um meio processual que permitiria, em caso de procedência, a suspensão da eficácia do acto impugnado, através dum procedimento cautelar mas optou pela prestação da garantia bancária, dando ainda guarida à argumentação do reclamante, ora recorrido, que “em momento algum a lei impunha à Autora a apresentação de garantia que, aliás, esta contratou com a entidade bancária que entendeu, nas condições por si escolhidas e aceites, sem que aos demais intervenientes processuais fosse dada oportunidade de as controlar.

    ” V. Mas, se a recorrente tivesse decidido ir pela suspensão da eficácia do acto, o recorrido tomaria a resolução fundamentada para prosseguir a execução, declarando que a execução era urgente, porque o seu deferimento seria gravemente prejudicial para o interesse público.

  3. E não diga o recorrido que esta tomada de posição é ficcionada! É o que faria o recorrido, sem margem para dúvida, no confronto com as deliberações tomadas, quer a que foi objecto da impugnação, quer a que levou ao impulso processual da execução administrativa sobre o património da recorrente, quer ainda porque era a conduta que estaria de acordo com os ditames das regras da experiência comum e actuação do “bonus pater famílias”, VII. E uma vez tomada que fosse essa resolução fundamentada, a execução prosseguiria com a inevitável apreensão e penhora de bens e saldos bancários da recorrente, e quando, porventura, o Tribunal julgasse infundada a resolução (se o julgasse) os efeitos gravemente danosos decorrentes da penhora de bens e saldos bancários e inerente falta de liquidez, já estariam consumados podendo inclusivamente desencadear a insolvência da recorrente.

  4. Poderia sempre ainda dizer-se que a recorrente podia ter recorrido ao pedido do decretamento provisório da providência (artigo 131.º do CPTA), mas claramente não se dariam como verificados os pressupostos que legitimariam esse pedido de decretamento provisório da providência, uma vez que não sendo caso de tutela de direitos, liberdades e garantias que de outro modo não pudesse ser exercido em tempo útil e que, portanto, estivesse em risco de sofrer uma lesão irreversível, o entendimento da doutrina e da jurisprudência é que para fazer funcionar a extensão desse regime previsto na parte final do n.º 1 a outros casos, é preciso que esse caso tenha a natureza de excepcional.

  5. Por último, não se pode esquecer que estando em causa o pretenso pagamento ao recorrido de uma quantia de 320.620,00 €, o decretamento provisório da providência seria sempre, por acção do Tribunal (e tendo em conta os potenciais prejuízos para os interesses públicos em conflito com os interesses da recorrente), a imposição à recorrente da prestação de garantia por uma das formas previstas na lei tributária (artigo 120.º, nºs 3 e 4 do CPTA).

  6. Resulta do artigo 120.º, n.º 6 do CPTA que “Quando no processo principal esteja apenas em causa o pagamento de quantia certa, sem natureza sancionatória, as providências cautelares são adoptadas independentemente da verificação dos requisitos previstos no n.º 1 se tiver sido prestada garantia por uma das formas previstas na lei tributária.” XI. Por isso, caso a recorrente tivesse recorrido ao processo cautelar o efeito seria o mesmo, ter que prestar a garantia por uma das formas previstas na lei tributária.

  7. Acresce dizer que como no processo principal apenas se discute uma obrigação de pagar a quantia certa, sem natureza sancionatória, a providência cautelar seria sempre adoptada, independentemente da verificação dos requisitos previstos no n.º 1 daquele citado artigo, se tivesse sido prestada garantia por uma das formas previstas na lei tributária.

  8. Por outro lado, decorre do artigo 50.º, n.º 2, um efeito suspensivo automático da impugnação, que na defesa do princípio da celeridade e economia processual devia ser ponderado, e não foi, em ordem a que se decidisse que não era caso de recorrer à providência cautelar.

  9. O recorrido refere expressamente no artigo 24.º do seu articulado superveniente supra referido: “Na verdade, só em 27.08.2007 a Entidade Demandada foi notificada por telecópia pela Autora da emissão de certidão pela Secretaria do Tribunal onde finalmente surgia cópia do documento comprovativo da prestação da referida garantia sob a forma de garantia bancária n.º 125-02-116456, emitida pelo Banco Comercial Português, SA. (cfr. doc. n.º 1).” XV. Reporta esse documento n.º 1 para o teor da garantia bancária e dela consta expressamente que o valor total da garantia é de 320.620,00 €, que é beneficiário o recorrido e que é válida até ao trânsito em julgado da decisão que for proferida no âmbito do processo de impugnação.

  10. O recorrido foi notificado para se pronunciar sobre a modalidade e idoneidade da garantia prestada pela recorrente em ordem a exercer o contraditório e não o fez, pelo que indiscutivelmente a aceitou para todos os efeitos legais.

  11. Por outro lado, o recorrido ordenou a suspensão da execução do acto administrativo, que promovera, logo que teve conhecimento da apresentação dessa garantia, só podendo extrair-se deste comportamento que também no segmento da execução fiscal administrativa, deu aceitação à natureza, modalidade e idoneidade da caução prestada.

  12. Aceitação, aliás, inequívoca do recorrido, como este deixou registado no artigo 39.º desse articulado superveniente ao consignar: “Tivesse o documento que comprovava a prestação da garantia sido devidamente identificado na petição inicial e, com razoável probabilidade, muito mais cedo teria sido ordenada a suspensão da execução!” Assim, XIX. O recorrido entendeu estar acautelado o cumprimento da obrigação através da prestação daquela garantia, cuja idoneidade não quis discutir em contraditório como podia, pois para tanto foi notificada, que lhe garantia prevenir a insolvência da recorrente e consequente impossibilidade de cobrar a totalidade ou parte do crédito...

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