Acórdão nº 01244/16.9BEAVR-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução23 de Junho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: F... Serviços, S.A.

, e N..., S.A.

, interpõem recurso jurisdicional de decisão da Mmª Juiz do TAF de Aveiro, que, em acção de contencioso pré-contratual intentada por H... – Gestão de Resíduos, S.A.

, por despacho de 16/03/2017 admitiu «a petição inicial aperfeiçoada, ora apresentada».

As recorrentes concluem: a. Afigura-se desacertada a decisão ora recurso, desde logo porquanto a admissão da petição aperfeiçoada manifestamente viola o princípio da igualdade processual que, com o despacho que julgou improcedente a arguição da nulidade do despacho-sentença que determinou a absolvição da instância, muito acertadamente se acautelou e protegeu.

  1. No despacho em recurso, o Tribunal a quo baseia-se numa interpretação juridicamente inadmissível do disposto no artigo 87º, nº 8 do CPTA, face à factualidade que o precede e à posição omissiva adoptada pela Recorrida H... quanto à arguição da sua ilegitimidade activa em sede de contestação pelas aqui Recorrentes.

  2. Face à factualidade entretanto carreada aos autos, a Autora H..., aqui Recorrida, não possui legitimidade processual, na medida em que manifestamente carece de legitimidade procedimental no quadro do concurso dos presentes autos.

  3. A decisão de admissão de nova petição aperfeiçoada, como se extrai do despacho em recurso, sustenta-se, genericamente, no ínsito previsto no nº 8 do artigo 87º do CPTA, nos termos do qual se prescreve que “a absolvição da instância sem prévia emissão de despacho saneador, em casos em que podia haver lugar ao suprimento de excepções dilatórias ou de irregularidades, não impede o autor de, no prazo de 15 dias, contado da notificação da decisão, apresentar nova petição, com observância das prescrições em falta, a qual se considera apresentada na data em que o tinha sido a primeira, para efeitos de tempestividade da sua apresentação” (sublinhados nossos).

  4. Cumpre notar que esta norma correspondia, antes da revisão ao CPTA operada pelo Decreto-Lei nº 214-G/2015, de 2 de Outubro, ao nº 2 do artigo 89º, nos termos do qual se prescrevia que “a absolvição da instância sem prévia emissão de despacho de aperfeiçoamento não impede o autor de, no prazo de 15 dias contados da notificação da decisão, apresentar nova petição, com observância das prescrições em falta (…)” f. Ora, com a revisão de 2015 ao CPTA foi introduzida à referida norma (recolocada sistematicamente no nº 8 do artigo 87º) uma importante ressalva, que corresponde ao trecho, antes sublinhado, que estabelece um novo pressuposto de aplicação deste preceito, a saber – “em casos em que podia haver lugar ao suprimento de excepções dilatórias ou de irregularidades”.

  5. Tal alteração veio, efectivamente, a delimitar o âmbito de aplicação desta norma, de forma a adequá-la à prossecução dos princípios do contraditório e da igualdade processual das partes, como seguidamente se explanará.

  6. Crê-se ser meridianamente evidente o erro em que incorre o Tribunal a quo ao decidir pela admissão da nova petição com base no preceito supra transcrito.

  7. A faculdade de apresentação de petição aperfeiçoada que ali é conferida ao autor pressupõe que não tenha sido emitido despacho pré-saneador nos casos em que podia haver lugar ao suprimento de excepções dilatórias ou de irregularidades.

  8. No caso dos presentes autos e como se alcança do teor do despacho, atrás transcrito, que indeferiu a arguição da nulidade do despacho saneador sentença, o despacho pré-saneador não foi emitido porque não havia lugar ao suprimento de excepções dilatórias ou de irregularidades, tudo pelo simples facto de que a faculdade de proceder a tal suprimento se esgotou no momento processual em que a Autora, aqui Recorrida, renunciou à apresentação de qualquer resposta às defesas por excepção deduzidas pelas aqui Recorrentes e pelo Réu Município, de entre as quais se arguiu a ilegitimidade activa da Autora por preterição de litisconsórcio necessário.

  9. Tendo a Autora, aqui Recorrida, renunciado à sua faculdade de replicar às excepções deduzidas em sede de contestação e, consequentemente, de proceder ao suprimento da excepção dilatória de ilegitimidade activa, não é manifestamente aplicável, nos presentes autos e na situação in casu, o disposto no artigo 87º, nº 8 do CPTA, pelo que não poderia o Tribunal a quo ter admitido a apresentação de petição inicial aperfeiçoada.

  10. O Tribunal a quo interpretou equivocadamente o teor do artigo 87º, nº 8, porquanto este preceito pressupõe que a não emissão do despacho pré-saneador tenha impedido as partes de proceder ao suprimento de excepções dilatórias ou outras irregularidades nos articulados – o que, manifestamente, não é o caso dos presentes autos.

  11. A interpretação que o Tribunal a quo faz daquele preceito afigura-se, por conseguinte, incompatível com o princípio da igualdade processual das partes, porquanto dela decorre a concessão, à Autora e aqui Recorrida, de um novo prazo para o suprimento da excepção dilatória de ilegitimidade – o que, como bem se assinala no despacho em que se indeferiu a nulidade arguida pela Autora, “configuraria uma violação do princípio da igualdade das partes (cfr. artigo 4º do CPC) que ao Tribunal incumbe assegurar ao longo de todo o processo”.

    n.

    Dessa interpretação resulta a inadmissível concessão de um novo prazo à Autora para o suprimento da excepção dilatória da ilegitimidade activa.

  12. E sublinhe-se que o princípio pro actione que decorre do artigo 7º do CPTA, invocado no despacho recorrido, não se sobreleva àqueloutros princípios da igualdade e do contraditório, estes de carácter estruturante do edifício normativo do processo civil e administrativo.

  13. O despacho ora recorrido enferma de manifesto erro na qualificação jurídica e, concomitantemente, viola frontalmente o disposto nos artigos 6º e 87º, nº 8, ambos do CPTA.

  14. A Autora H..., aqui Recorrida, não pode possuir legitimidade processual porque simplesmente carece de legitimidade procedimental no quadro do concurso dos autos.

  15. O concorrente, interessado no procedimento e titular dos direitos e interesses legalmente protegidos naquela qualidade é o agrupamento constituído por aquelas sociedades – H... e VF.

  16. A exigência da estabilidade subjectiva dos concorrentes/candidatos, transversal à tipologia geral dos procedimentos de formação de contratos públicos, impede, assim, as modificações à estrutura dos concorrentes que se afigurem ilícitas no seio do universo concorrencial.

  17. Exige-se por isso, em cada caso concreto, a apreciação, pela entidade adjudicante, do tipo de modificação subjectiva de forma a averiguar se dessa alteração não decorre qualquer distorção concorrencial, por um lado, e, por outro, se a modificação subjectiva operada não colide com os requisitos técnicos, financeiros e de habilitações profissionais exigidos nas peças do procedimento e nos normativos do CCP a esse respeito.

  18. Deste modo, a validade e a eficácia da modificação subjectiva de um concorrente/candidato no quadro de um procedimento de formação de contrato público pressupõe a emissão, por parte da entidade adjudicante, de um acto administrativo autorizativo de tal modificação.

  19. As razões subjacentes ao efeito constitutivo de um acto administrativo que autorize a modificação subjectiva dos concorrentes/candidatos se encontram, desde logo, no princípio da transparência que informa este tipo de procedimentos.

  20. Tal princípio, que actua como garantia preventiva do princípio da igualdade e da imparcialidade, impõe às entidades adjudicantes o dever da publicitação das decisões tomadas no seio do procedimento, assim como está na base da consagração de mecanismos de controlo dos actos praticados no seu seio (v.g. fundamentação, audiência prévia).

  21. Dele decorre, igualmente, o carácter formalista do procedimento administrativo e, no caso que aqui nos ocupa, do procedimento de formação de contrato público tal como se encontra estruturado no CCP, de tal modo que todas as decisões adoptadas pela entidade adjudicante, bem como todas as pretensões deduzidas pelos interessados no...

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