Acórdão nº 000156/17.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução23 de Junho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO NM UNIPESSOAL, LDA.

veio interpor recurso da sentença pela qual o TAF do PORTO na presente providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação do Conselho Diretivo do Requerido, INFARMED – AUTORIDADE NACIONAL DO MEDICAMENTO E PRODUTOS DE SAÚDE, I.P.

, datada de 06/12/2016, que deferiu o pedido de transferência de instalação da Farmácia da C..., sendo indicadas como Contrainteressadas FI, LDA. e S&F, LDA.

, proferiu a seguinte decisão: - julga-se procedente a exceção dilatória de ilegitimidade da Contrainteressada S&F, Lda. e, em consequência, absolve-se a mesma da instância; - julga-se improcedente o presente pedido cautelar e, em consequência, absolve-se o Requerido do pedido.

*Conclusões da Recorrente: 1.ª A douta sentença recorrida interpretou as normas da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro de acordo com os princípios gerais do direito administrativo, designadamente o princípio do aproveitamento dos actos, verificado na desvalorização da forma face ao direito substancial, na possibilidade de suprimento de formalidades essenciais após a prática do acto e na desvalorização de vícios formais e aproveitamento do conteúdo dos actos, violando as normas legais aplicáveis ao caso concreto; 2.ª O art. 20.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro consubstancia uma norma especial e - salvo melhor opinião - deverá prevalecer sobre a norma geral; 3.ª A redacção do art. 20.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, mereceu especial cuidado por parte do legislador, uma vez que, do pedido de transferência obriga a constar documento com a identificação do “nome da rua e o número de polícia ou lote”, ou seja, o legislador não permitiu que fosse referida apenas a localização do imóvel para onde se pretende a transferência da instalação, através de certidões ou plantas, o legislador é peremptório na exigência do “nome da rua e o número de polícia ou lote”; 4.ª A imperatividade das normas constantes da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro prende-se com a protecção do interesse público e a segurança jurídica, uma vez que, se fosse admissível um interessado apresentar um pedido de transferência para uma morada inexistente, ou que não correspondesse ao endereço para onde rigorosamente se pretende transferir uma farmácia, ter-se-ia descoberto a solução para “bloquear” uma dada zona territorial para aquele interessado: bastava-lhe entregar um pedido de transferência com uma morada errada e adquiria um direito de prioridade sobre todos os demais interessados naquela localização que, diligentemente, estivessem activamente em busca de um imóvel num endereço existente; 5.ª A douta sentença recorrida não poderia confirmar a actuação do Recorrido INFARMED e ter suprido todas as irregularidades e assim ignorado todos os incumprimentos dos pressupostos previstos na Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, tendo violado frontalmente as disposições legais constantes do regime legal aplicável, sendo o deferimento do pedido de transferência da Farmácia da C... manifestamente ilegal e abusivo; 6.ª Ao contrário do decidido na douta sentença recorrida, é manifesta a preterição das alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 20.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, não existindo dúvidas acerca da existência das ilegalidades invocadas e demonstradas, bem como da validade das pretensões já invocadas e demonstradas em sede de processo principal, pelo que sempre de deverá considerar a verificação da existência do requisito do fumus boni iuris; 7.ª A certidão camarária emitida em 26.05.2015 foi utilizada para apresentar o pedido de transferência de instalações da Contrainteressada, quando o seu conteúdo é manifestamente contrário às disposições legais previstas para a apresentação daquele pedido, já que à data dos factos que importam para a análise e verificação dos pressupostos legais da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, existia uma farmácia a menos de 350 metros da localização pretendida; 8.ª Ao contrário da decisão recorrida, é manifesta a preterição do artigo 20.º n.º 1 alínea d) da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro.

9.ª A douta sentença recorrida está em clara violação com o art. 20.º n.º 1, alínea h), da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, quando relativamente à óbvia divergência de áreas indicadas no layout e na memória descritiva do imóvel onde a Contrainteressada pretende instalar a nova farmácia, vem decidir que a diferença de área é “meramente residual e sem significado relevante”, “sendo a pequena diferença de áreas detectada irrelevante para este efeito (cfr. Pontos 2 e 4 dos factos provados)”; 10.ª Ao contrário do disposto no art. 20.º Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, a douta sentença recorrida permite uma interpretação elástica e flexível da análise e aplicação das normas legais aplicáveis; 11.ª No caso em concreto verifica-se que a ora Recorrente invocou e demonstrou a existência dos requisitos necessários ao decretamento da providência cautelar (vd. art. 342º do C. Civil; Cf., aplicáveis ex vi do art. 1º e 120.º do CPTA).

12.ª A execução do acto suspendendo, ao permitir a instalação da Farmácia da C..., Contrainteressada, na localização pretendida cria uma situação de facto consumado, que resulta naturalmente no prejuízo directo no exercício da actividade da Recorrente; 13.ª É inquestionável que se verifica in casu o requisito fixado no art. 120º/1/b) do CPTA, pois a execução do acto sub judice causa prejuízos irreparáveis ou de muito difícil reparação à Recorrente; 14ª A sentença recorrida enferma assim de evidentes erros de julgamento, tendo violado claramente, além do mais, o disposto nos arts. 120º do CPTA, 9.º e 342º do Código Civil, art. 2.º e art. 20.º, n.º 1, alíneas b) c) d) e h) da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, art. 39.º do Decreto-Lei n.º 241/2009, de 16/09.

Nestes termos deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

*Em contra alegação o INFARMED concluiu: 1ª. O requisito do fumus boni iuris nunca poderia ter sido considerado verificado pelo Tribunal a quo, já que é evidente a manifesta improcedência dos vícios assacados pela ora Recorrente ao ato suspendendo.

2ª. De facto, é manifesto que o ato suspendendo não viola o artigo 20.º/1/b) e c) da Portaria 352/2012, porquanto o lapso da Contrainteressada ao não colocar a morada completa é totalmente sanável, nomeadamente porque da documentação que a mesma juntou ao requerimento inicial, designadamente a planta de localização e a certidão de distâncias às farmácias, centros de saúde e hospital mais próximos, emitidas pela Câmara Municipal do Porto, resultava com exatidão máxima qual o local/fração a ser analisado para efeito de transferência da Farmácia da C....

3ª. Assim, nos termos do artigo 108.º/2 do CPA, uma vez que em função dos documentos que a ora Contrainteressada anexou ao seu requerimento inicial de qual o local preciso para onde pretendia transferir a sua farmácia, é manifesto que a indicação incompleta da morada não passou de uma imperfeição passível de ser suprida pelo INFARMED.

4ª. Por outro lado, é também evidente que o ato suspendendo não viola a disposição constante do artigo 20.º/1/d) da Portaria 352/2012, já que, como resulta provado pela consulta do processo instrutor, o Centro Hospitalar de São João, E.P.E. declarou expressamente vontade de não abrir nova farmácia após o encerramento da Farmácia do Hospital de São João.

5ª. Pelo que, sempre foi evidente que, quando a Contrainteressada abrisse a sua farmácia já não estaria a laborar a Farmácia do Hospital de São João.

6ª. Por fim, quanto aos vícios assacados, o ato suspendendo também não viola o artigo 20.º/1/h) da Portaria 352/2012, já que, como bem referiu o Tribunal a quo, “essa diferença, meramente residual e sem significado relevante (de 1,35 m2), não se nos afigura que tem a virtualidade de conduzir à conclusão de que o pedido da Contrainteressada viola aquele preceito legal”.

7ª. Acresce que, não obstante a ligeira discrepância entre a área total indicada na memória descritiva e a constante na caderneta predial urbana, não foi colocado em causa a área mínima necessária para que a ora Contrainteressada pudesse transferir a sua farmácia para o local pretendido.

8ª. O requisito do periculum in mora também não se verifica, uma vez que a ora Recorrente não cumpriu com o seu ónus de provar os factos que alegou, nomeadamente a ora Recorrente nunca referiu, sequer, qual a zona comercial que tem um valor/m2 de arrendamento mais elevado do que aquela para onde se transferiu a Farmácia da C....

Nestes termos deve ser negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, mantendo-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

*Por seu turno a CI «FI, Lda», contra alegando concluiu: I. O recurso em apreço carece em absoluto de qualquer fundamento, de facto ou de direito, pelo que ao mesmo deve ser negado provimento e, consequentemente, deve ser mantida na íntegra a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo.

  1. O Tribunal recorrido considerou – e bem - que as alíneas b), c), d) e h) do n.º 1 do artigo 20.º da Portaria n.º 352/2012, cuja violação a Recorrente invoca, foram integralmente cumpridas, pelo que nenhum vício invalidante havia que afastar ao abrigo do princípio do aproveitamento do acto, contrariamente ao alegado.

  2. É inquestionável que, desde o primeiro momento, do pedido de transferência formulado pela Contra-interessada ao Infarmed, consta que o local pretendido é o espaço sito na Estrada da Circunvalação, … – Cfr. n.º 2 dos factos provados - e que foi esse o local considerado pelo Infarmed e pela Câmara Municipal do Porto para o exercício das competências que cabe a cada uma destas entidades.

  3. A ratio da alínea c) do n.º 1 do artigo 20.º da Portaria n.º 352/2012 é a de permitir à câmara municipal competente e ao Infarmed aferirem do cumprimento...

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