Acórdão nº 00882/16.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | Ana Patroc |
Data da Resolução | 29 de Junho de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório B..., contribuinte n.º 2…, e a Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 08/03/2017, que julgou parcialmente procedente o recurso das decisões de avaliação indirecta da matéria colectável de IRS dos anos de 2011 e 2012, proferidas em 18/03/2016, pela Chefe de Divisão dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto (por subdelegação de competências), que fixaram como rendimento tributável, a enquadrar na categoria G do IRS, os montantes de €161.153,97 e €351.200,00, respectivamente.
O Recorrente B...
terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1 – A Recorrente demonstrou e provou que a fonte geradora das suas manifestações de fortuna têm origem nos fundos próprios do seu pai e avô, consubstanciada na prática familiar de longa data e face aos muitos anos de desenvolvimento de atividade comercial e industrial, e que lhes permitiu acumular largas somas de numerário suficiente para garantir os depósitos em numerário ocorridos nos anos de 2011 e 2012; 2 – Não constitui nenhuma ilegalidade o facto do pai e avô do Recorrente terem mantido fora do circuito financeiro controlado pelas entidades bancárias, valores pecuniários, mesmo que elevados, que lhe permitiu proceder aos depósitos em numerário nos anos de 2011 e 2012; 3 – Tendo o Recorrente demonstrado que as suas manifestações de fortuna, são as doações do seu pai e avô, deve ficar afastado da necessidade de justificar as fontes, ou meios financeiros, por aqueles utilizados na obtenção dos mesmos, cabendo à AT, se assim o pretender, proceder aos atos e procedimentos tendentes a investigar se os valores doados ou transferidos para si foram sujeitos a tributação anterior e enquanto na posse dos mesmos, não lhe cabendo a ele provar como é que eles obtiveram aqueles meios de fortuna; 4 – O Recorrente, ao indicar a fonte geradora das suas manifestações de fortuna, cumpriu o dever que para si resulta do nº.3 do artigo 89º-A da LGT; 5 – A comprovação dos rendimentos declarados em 2011 e 2012 tem como única fonte de manifestação de fortuna, as doações de seu pai e avô, estando devidamente comprovado por documento autenticado a doação de € 230.000,00, o qual permitiu em 2012 os depósitos de € 173.500,00 e € 57.700,00; 6 – Se não fosse a doação de seu avô em 15.12.2012, no montante de € 230.000,00, o Recorrente, sem atividade laboral altamente remunerada e sem atividade comercial altamente lucrativa, agravada pela condição de estudante em Inglaterra, jamais lhe seria possível entre 13.11.2012 e 21.11.2012 obter os rendimentos de € 125.500,00 e em 20.11.2012 ter procedido a um depósito de € 99.000,00; 7 – A Recorrente, na sua qualidade de sujeito passivo, apenas tem de demonstrar e provar qual é a fonte das suas manifestações de fortuna, pelo que ao provar que são as doações de seu pai e avô, cumpre a obrigação que sobre ele pende; 8 – A Lei não identifica e, muito menos enumera um quadro tipo ou padrão de quais devem ser as fontes de manifestações de fortuna, e podendo muito bem sê-lo a doação do pai e do avô, está cumprido o objetivo exigido pelo nº.3 do artigo 89º-A da LGT; 9 – A Douta sentença recorrida incorreu assim em erro de julgamento ao não aceitar a comprovação do Recorrente de que as suas manifestações de fortuna consistem nas doações do pai e do avô; 10 – Não há assim quaisquer motivos para considerar não justificado o valor de € 76.153,90 em 2011 e de € 231.200,00 em 2012 e, em consequência, motivos para recorrer à determinação da matéria tributável por métodos indiretos; 11 – A notificação ao mandatário I..., e por este recusada, viola o princípio legal estabelecido no n.º 3 do artigo 40º do CPPT, porque esta matéria não é reservada a matéria interpretativa da Lei. É uma questão de legitimidade e não de interpretação; 12 – Se o legislador tivesse pretendido, e não pretendeu, considerar validamente eficaz a notificação aos mandatários, ainda que imperfeitamente realizadas ou com inobservância das formalidades exigidas, tê-lo-ia levado à letra da Lei, o que não acontece.
Foram assim violados, entre outros, os princípios estabelecidos nos artigos 87º, nº.1, al. b) e 89º-A da LGT, artigo 40º do CPPT e arts.21º e 34º do CRP.
Termos em que, Deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, Considerar justificados os valores de € 76.153,90 em 2011 e €231.200,00 em 2012, e ainda nula a notificação efetuada ao mandatário I... por violação do artigo 40º, nº.3 do CPPT.
Assim se fazendo Justiça!”****A ERFP apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma: “(…) A. Vem o Autor interpor recurso do segmento desfavorável da douta decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no entanto, tal como se demonstrará, a mesma deve, ser mantida, por não estar ferida de qualquer invalidade.
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Em relação aos rendimentos do ano de 2011, que a douta decisão recorrida considerou e bem, não justificados é de salientar que o Recorrente “não demonstrou, como lhe competia, a origem dos mesmos, ou seja a fonte do acréscimo patrimonial”.
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As justificações trazidas à colação são vazias de conteúdo e incapazes de explicar os depósitos em numerários realizados, cuja proveniência permanece desconhecida.
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Se o Recorrente, se coloca agora na posição de “testa de ferro” dos negócios familiares, de ter “18 a 20 anos”, não logra com isso demonstrar a proveniência dos depósitos em numerário.
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Considera o Recorrente que ficou demonstrado, qual foi a fonte de obtenção dos valores em numerários depositados, tendo segundo a sua alegação ficado “evidenciado graças aos montantes disponibilizados pelo seu pai e avó”, no entanto esta declaração de vontade não pode constituir fundamento legal, lógico ou razoável para que se considerem justificados estes montantes.
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Porquanto, tendo as normas jurídicas que suportam a correcção do imposto, como princípio - matriz o combate à fraude e à evasão fiscal, não se pode considerar como critério influenciador da prova, simples alegações, sem qualquer elemento probatório.
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Seguindo a teoria do Recorrente toda e qualquer manifestação de fortuna seria justificada, desde que se invocasse a utilização de dinheiro de terceiros, nomeadamente de pais e avós, sem que fosse demonstrada a origem do fluxo financeiro inicial e a sua conexão com a sua com os factos.
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Se é verdadeira a afirmação que “manter o dinheiro fora do circuito financeiro controlado pelas entidades bancárias não constitui nenhuma ilegalidade”, não se pode com isso ser recompensado com a possibilidade de toda e qualquer manifestação de fortuna de terceiro ser considerada, sem mais, como justificada.
I. Assim, é manifesto que não foi feita qualquer demonstração da proveniência dos depósitos em numerário, da prova apresentada não é possível identificar com certeza a sua origem, não tendo o Recorrente efectuado a prova exigida pelo n.° 3 do artigo 89°-A da LGT, e não o tendo feito estamos perante uma divergência não justificada entre os rendimentos declarados e os acréscimos patrimoniais evidenciados, legitimadora de tributação por via de avaliação indirecta.
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Relativamente à aquisição da quota da sociedade “A...”, considera e bem a douta decisão recorrida que: “o Recorrente não logrou demonstrar a origem do rendimento que lhe permitiu a realização dessa despesa, não bastando para provar a ilegitimidade do acto de avaliação indirecta dizer que detinha meios financeiros, cabendo-lhe antes demonstrar os concretos meios financeiros que afetou à realização dessa despesa, o que efectivamente não sucedeu”.
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Em relação aos rendimentos de 2012, que a douta decisão recorrida considerou e bem, não justificados é de salientar que o Recorrente não demonstrou a origem deste valor, “uma vez que (...) não logrou provar que tais depósitos provinham de uma doação de € 230 000,00 efetuada pelo seu avô. Sendo certo que a referida doação, só por si, não justifica os depósitos, cabendo ao contribuinte demonstrar a sua origem, afastando, assim, a possibilidade de estarem em causa rendimento de outra proveniência e passíveis de tributação”.
L. Não obstante a alusão de proveniência do dinheiro através de doação, em face da necessidade do rigoroso percurso desde a origem dos montantes depositados em numerário nas suas contas pessoais, não é efectuada a comprovação e nexo da fonte com os montantes identificados como acréscimos patrimoniais.
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Não basta que o Recorrente alegue que recebeu, a título de doação do seu avô € 230 000,00, é necessário que se demonstre o percurso específico dos montantes depositados de modo a comprovar a fonte e que aqueles acréscimos não estavam obrigados a declaração fiscal.
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Tanto mais que resulta dos factos da testemunha Ber..., pai e procurador do Recorrente que “a doação foi de € 230 000,00, em numerário, servindo para a aquisição de uma casa que custou € 650 000,00”, ou seja a mesma doação poderia servir, para justificar várias manifestações de fortuna, caso a lei não exigisse o nexo da fonte com os montantes identificados como acréscimos patrimoniais.
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Com efeito, é incontornável que a mens legislatori repercutida no n.° 3 do art.° 89°-A da LGT, exigia que o Recorrente efectuasse a prova da relação directa entre a afectação de certos montantes (não sujeitos a declaração) a determinada manifestação de fortuna evidenciada, que não se basta com meras considerações e com uma narrativa dinâmica, inconclusiva, que não é suficiente para afastar a decisão de aplicação de métodos indirectos.
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Entender o contrário, como faz o Recorrente, desvirtua radicalmente a ratio legis em termos de prova ínsita no aludido preceito, sendo manifestamente contrário à doutrina e à jurisprudência.
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Toda a...
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