Acórdão nº 00217/05.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelPedro Vergueiro
Data da Resolução11 de Outubro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO C…, LDA.

, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 27-06-2011, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com a liquidação de IVA dos anos de 2000 e 2001, no montante global de € 109.696,68.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 304-330), as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) 1ª. A sentença recorrida julgou incorrectamente a matéria fáctica ao não considerar provado que: - A utilização da R… como face visível dos projectos de formação referidos em sede de petição inicial, decorreu de uma exigência dos Centros de Emprego de Guimarães e de Vila Nova de Famalicão, que entenderam que, havendo uma entidade relacionada com a ora Recorrente com sede no Concelho de Guimarães, melhor seria, para o processo de candidatura respectivo - para facilitar a sua aprovação -, que fosse a R… a titulá-lo, em substituição da recorrente, que tem sede no Porto; - Aqueles projectos só foram aprovados tendo em conta o envolvimento e a participação activa da recorrente nos mesmos; - Nas acções de formação subsidiadas ao abrigo do Programa Comunitário Leonardo da Vinci, existe uma entidade coordenadora em nome de quem as demais entidades participantes (entidades parceiras) - que, designadamente, prestem formação no âmbito do projecto apresentado - devem emitir as facturas correspondentes aos serviços que directamente prestem aos seus formandos, para que possam ser pagos dos mesmos, porquanto é a entidade coordenadora que recebe e gere os fundos comunitários; 2ª. O Tribunal ad quem é um órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, cabendo-lhe decidir sobre a matéria de facto submetida à sua apreciação com base numa valoração autónoma dos meios de prova utilizados pelo Tribunal a quo para fundamentar a sua decisão, podendo, in casu devendo, alterar a decisão do Tribunal recorrido sobre a matéria de facto, de acordo com o disposto no art. 712º, n.ºs 1, al. a), e 2, do Cód. Proc. Civil - cfr., art. 690º-A, nº 1 e nº 2 do CPC (actual art. 685º- B, nº 1 e nº 2); 3ª. A apreciação crítica das provas produzidas, nomeadamente da reapreciação da prova gravada correspondente aos depoimentos gravados, na audiência de discussão e julgamento de 16.3.11 (Acta de fls. 273 e ss.), dos depoimentos da Sra. Dra. M… (depoimento gravado em CD com a duração de 1h.2m.13s - 00.00:00 até às 01:02:13), da Sra. D. E… (depoimento gravado em CD com a duração de 28m33s - 01:02:14 até às 01:30:47) e da Sra. D. P… (depoimento gravado em CD com a duração de 9m57s - 01:30:48 até às 01:40:45), determina que se devem considerar como provados os factos referidos na conclusões 1ª supra; 4ª. O art. 9º, nº 11 do CIVA, tem como razão de ser a protecção que o legislador comunitário entendeu conceder às actividades de formação, por serem actividades de interesse geral que importa incentivar; 5ª. A isenção prevista no supra referido normativo abrange não só, (i) as prestações de serviços que tenham por objecto a formação profissional, como também (ii) as transmissões de bens e prestações de serviços conexas com aquela formação profissional, desde que, umas e outras, sejam efectuadas por organismos de direito público ou por entidades reconhecidas como tendo competência nos domínios da formação e reabilitação profissionais pelos ministérios competentes (como é o caso da recorrente); 6ª. Sendo que devem ser consideradas prestações de serviço conexas quando as mesmas são necessárias ou complementares em relação à realização da prestação principal e quando não constituam para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador; 7ª. A isenção a que se refere o nº 11 do art. 9º do CIVA é uma isenção de natureza objectiva - cfr., ofício-circulado nº 55466, de 22.6.87 8ª. Está adquirido nos autos que todas e cada uma das situações de facto em análise nos presentes autos integram-se em acções de formação que, formalmente, foram encabeçadas pelas entidades melhor identificadas em sede de petição inicial (A…, R…, C…).

9ª. Sendo que as acções de formação tituladas pela R... e pelo C… foram material e integralmente levadas a cabo pela recorrente sendo que em relação às acções de formação realizadas pela A..., a recorrente disponibilizou as salas (devidamente equipadas) necessárias à sua realização; 10ª. As facturas em causa nos presentes autos emitidas pela recorrente a cada uma daquelas empresas dizem respeito à alocação pela recorrente a cada um dos cursos dos meios materiais, humanos e financeiros necessários e imprescindíveis à sua concepção, organização, implementação e gestão, o que tudo foi por si realizado; 11ª. Entre o mais, respeitam à organização de candidaturas, turmas e horários, inscrições de formandos, recrutamento e distribuição de formadores, processos de avaliação, e programas de estágios, preparação dos programas das diferentes acções de formação e os respectivos manuais de aprendizagem, cedência de instalações e equipamentos, afectação de elementos do seu quadro de pessoal, gestão da tesouraria e dos fluxos financeiros inerentes a cada uma das acções de formação, recolha de documentação, preparação de dossiers, preenchimento dos formulários de candidaturas aos programas subsidiados e bem assim os respectivos pagamentos, acompanhamento dos formandos e do normal funcionamento dos cursos no dia-a-dia durante a sua duração; 12ª. De resto, nem a R… nem o C… dispunham dos meios materiais, técnicos, humanos ou de know-how suficiente, para realizar, organizar e acompanhar, por si, os cursos em questão, traduzindo-se a experiência e o know how da recorrente numa mais valia inquestionável para os formandos; 13ª. Ainda que se entenda que, não obstante o facto de ter sido a recorrente, enquanto entidade acreditada para prestar formação, a programar, organizar e implementar, de fio a pavio, as acções de formação que, apenas formalmente, foram tituladas por terceiras entidades, não devem as mesmas ser enquadradas na primeira hipótese prevista no art. 9º, nº 11 do CIVA, ainda assim se terão de considerar os serviços prestados - aqui incluindo os serviços prestados à A... - como conexos com aquelas acções de formação e, assim, abrangidos pela isenção prevista na segunda parte da norma.

14ª. Importa ainda ter presente que foram apenas razões regulamentares que levaram a que as acções de formação materialmente levadas a cabo pela recorrente tivessem sido formalmente tituladas pelo R… e pelo C…; 15ª. E em relação às acções de formação subsidiadas ao abrigo do Programa Leonardo d’a Vinci, as facturas foram emitidas em nome da Escola Profissional do C… (actual R…) porquanto era aquela a entidade coordenadora do projecto, quem recebia os fundos comunitários e quem procedia aos pagamentos da formação prestada pela recorrente; 16ª. A interpretação das normas fiscais, das definições delas constantes e das isenções nelas estabelecidas deve ser feita em conformidade com a ratio legis que as determinaram, com os objectivos por elas prosseguidos e no respeito das exigências impostas pelo princípio da neutralidade fiscal 17ª. Sendo certo que no plano de hermenêutica fiscal reflectem-se os problemas comuns de interpretação das normas jurídicas em geral e, assim, “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as normas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.” – cfr., art. 11º da LGT e art. 9º do Cód. Civil.

18ª. Como tal, as normas de incidência tributárias são susceptíveis de interpretação extensiva.

19ª. A ratio do art. 9º, nº 11 do CIVA, vista à luz do escopo axiológico e finalístico do legislador, abrange no seu núcleo as prestações de serviços em causa nos presentes autos; 20ª. Pois, caso contrário, seriam tratadas de modo distinto as mesmas prestações de serviços, consoante o destinatário das mesmas fosse o beneficiário final (o formando) ou uma empresa que, para efectuar formação aos seus formandos, recorresse aos serviços de uma terceira entidade; 21ª. A aplicação estrita e literal das normas invocadas – e a sua interpretação no sentido de vedar a aplicação do art. 9º, nº 11 do CIVA in casu - não se coaduna, entre o mais, com os princípios constitucionais da justiça, da igualdade e da proporcionalidade – cfr., arts. 2º, 13º, nº 1 e 266º, nº 2 da CRP; vd., tb, o art. 55º da LGT 22ª. Na decisão recorrida, violaram-se as disposições legais supra citadas.

Termos em que, na procedência do recurso, requer-se a V. Exas. se dignem revogar a decisão recorrida, com todas as legais consequências, considerando-se procedente a impugnação apresentada.” A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 339 a 340 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões sucitadas pela mesma resumem-se, em indagar da relevância do invocado erro de julgamento ao nível da matéria de facto e bem assim apreciar da bondade das correcções efectuadas em sede de IVA, tendo presente a isenção contida no art. 9º nº 11 do CIVA.

  2. FUNDAMENTOS 3.1 DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “…

    1. No seguimento da ordem de serviço nº 53601 de 31/05/2004, a impugnante foi alvo de uma acção inspectiva iniciada em 2 1/01/2004 e concluída em 11/06/2004, que incidiu sobre os anos de 2000 e 2001 (cf. doc. de fls. 71...

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