Acórdão nº 00356/16.3BEMDL-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução20 de Outubro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: MAF e outros vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, de 02.07.2017, pela qual foi indeferida a providência cautelar requerida contra a Direcção-Geral de Alimentação Veterinária para o levantamento do sequestro determinado pela requerida sobre as explorações dos requerentes.

Invocaram para tanto que, ao contrário do decidido, se verificam todos os requisitos para o decretamento da providência, pelo que a decisão recorrida violou o disposto no artigo 11º do Decreto-Lei 244/2000, de 27.09, no artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e no artigo 58º da Constituição da República Portuguesa.

A Entidade Requerida contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. Vem o presente recurso da sentença que indeferiu a providência requerida, nomeadamente, a tomada de medidas adequadas ao levantamento do sequestro sobre as explorações dos requerentes.

  1. A sentença recorrida considerou que os requerentes não alegaram os pressupostos de facto de que depende o requerido levantamento, concluindo nestes termos pela irrelevância do apuramento da existência de animais nas explorações.

  2. Pugnou ainda pela não verificação do fumus boni iuris, ressalvando que ainda que estivesse evidenciado, a presente providência estaria votada ao insucesso por força da preponderância do interesse público.

  3. A decisão recorrida é desacertada e ancora numa interpretação errada do regime legal em causa.

  4. Nomeadamente, o Decreto-Lei 244/2000 que estabelece um conjunto de medidas profilácticas com vista à erradicação da brucelose.

  5. Para o que interessa no presente caso, o artigo 11º define o que é o “sequestro” constando do artigo 2º um conjunto de definições legais.

  6. Da interpretação concatenada do artigo 2º alínea 9) e alínea 27) e artigo 11º do mencionado Decreto-Lei resulta o sentido de que o sequestro sanitário é imposto aos proprietários de explorações com animais contaminados.

  7. O sequestro surge assim como uma medida de contenção da epidemia naquele foco local, impedindo a entrada e saída de animais e a manutenção do efectivo sob vigilância sanitária.

  8. Ao sequestro segue-se a medida de abate total compulsivo do efectivo quando a autoridade sanitária constatar que não seja possível implementar medidas de melhoria menos gravosas.

  9. Portanto, atendendo à melhor interpretação do diploma verifica-se que as medidas constantes dos artigos 10º, 11º e 12º do Decreto-Lei 244/2000 foram estabelecidas por ordem crescente de gravidade, culminando no abate total.

  10. Isto para dizer que, o efectivo pecuário dos requerentes foi abatido – sujeito à medida mais gravosa, facto que o Tribunal desconsiderou por completo, considerando-o “irrelevante”.

  11. No entanto, a demonstração da ausência de animais na exploração evidencia a mais completa desnecessidade de manutenção da ordem de sequestro às explorações, sob pena de se criar um absurdo legal, sequestrando-se o “nada”, porque se não existem animais contaminados não existe nada que se pretenda conter.

  12. Efectivamente, o n.º 2 do artigo 11º estabelece determinadas condições para que o levantamento do sequestro opere, como seja, a realização de exames sereológicos ou a autorização da autoridade sanitária.

  13. Todavia, não podem ler-se estas condições isoladas da razão de ser do diploma e do próprio normativo em causa, sendo que, apelando também a um critério de razoabilidade, facilmente se constata que tal solução, que as condições de levantamento do sequestro foram estabelecidas para os proprietários detentores de animais, e não para aqueles que não os possuem por via do abate total do efectivo – caso dos requerentes.

  14. É que se não existem animais naquelas explorações concretas deixa de se justificar a imposição de sequestro às explorações.

  15. Veja-se que a própria Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária reconheceu a desnecessidade da manutenção dessa medida, procedendo oficiosamente ao levantamento do sequestro de 3 (três) das 7 (sete) explorações que constituem a unidade epidemiológica da pena, conforme “notificação de levantamento de sequestro” notificada aos requerentes JFV e MAF, em 28.03.2017.

  16. Mantendo ainda em sequestro quatro das explorações que constituem a unidade epidemiológica da pena, o que nenhum sentido faz atento o facto de se encontrarem nas mesmas condições materiais (sem animais) das explorações em que o levantamento do sequestro se verificou.

  17. Com efeito, a manutenção da ordem de sequestro nos termos expostos – sem que os requerentes sejam proprietários de animais – não só é ilegal como é inconstitucional.

  18. A manutenção desta decisão representa a interdição do exercício de actividade profissional encapotada sob a forma de uma decisão válida e legítima – que conforme demonstramos não o é.

  19. E este “estado de coisas” embate frontalmente nos mais elementares princípios constitucionais, não só naqueles “direito ao trabalho” e “direito à propriedade privada” mas revela-se também violador do princípio da legalidade por traduzir a aplicação de uma sanção – interdição do exercício da actividade profissional – não cominada em lei.

  20. Não há qualquer fundamento de facto e/ou de direito que justifique a manutenção da imposição do sequestro com consequências tão gravosas para os requerentes que – há mais de um ano – se encontram pedidos de exercer a sua actividade profissional, sem que haja perspectivas de a poderem retomar, estando completamente sujeitos ao mais puro arbítrio e indiferença da Administração que actua “quando quer” e “como quer”.

  21. No caso concreto encontram-se preenchidos todos os requisitos de que depende o decretamento da providência: quer o fumus boni iuris, o periculum in mora e a não prevalência do interesse público face às razões aduzidas.

  22. A actuação da Administração Pública no caso dos autos viola frontalmente os princípios da legalidade, da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, da boa administração, da justiça e razoabilidade, da boa-fé, artigos 3º, 4º, 5º e 10º do Código de Procedimento Administrativa e agride de forma intolerável os princípios constitucionais da legalidade, do contraditório, da presunção de inocência, da proibição de arbítrio, direito à justiça e segurança e proibição da indefesa, proporcionalidade, consagrados nos artigos 20º n.º 1, 18º, 27º n.º 1, 32º e 29º da Constituição da República Portuguesa, bem como os direitos fundamentais dos requerentes consagrados nos artigos 58º e 62º da Lei Fundamental.

  23. Bem assim, é inconstitucional por violação do disposto no artigo 58º da Constituição da República Portuguesa a interpretação do artigo 11º n.º 2 do Decreto-Lei 244/2000 no sentido de permitir a manutenção da decisão de sequestro das explorações dos proprietários ainda que nelas não existam animais por terem sido submetidos à medida de abate total compulsivo.

  24. A decisão recorrida viola o disposto nos artigos 11º do Decreto-Lei 244/2000, artigo 120º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 58º da Constituição da República Portuguesa devendo ser substituída por outra que julgue procedente a providência requerida condenando-se a Direcção-Geral da Alimentação e Veterinária à prática dos actos adequados para levantamento da medida de sequestro às explorações dos requerentes.

    * II – Matéria de facto.

    Os Recorrentes insurgem-se quanto à matéria de facto por não ter sido considerado, na decisão recorrida, um facto relevante, invocado no artigo 51º do requerimento inicial, o de já não existirem animais na sua exploração a justificar a manutenção do sequestro, por terem sido todos abatidos em Agosto de 2016.

    Na verdade esta matéria é relevante e deve considerar-se provada por acordo das partes dado que não foi negada pela Entidade Requerida, antes confirmada, nos artigos 25º e 26º da sua oposição.

    Deveremos assim dar como sumariamente provados os seguintes factos: 1) MAFD, MFFDS, MNNM, SMFD, MGTCN, MCCNG, AJMF e CAFD dedicam-se à actividade de reprodução de bovinos (por acordo).

    2) MAFD é dono da exploração agrícola n.º ENA45 e ENJ66 (cfr. fls. 48 do suporte físico do processo).

    3) MFFDS é dona da exploração agrícola n.º ENN54 (cfr. fls. 48 do suporte físico do processo).

    4) MNNM é dona da exploração agrícola n.º ENC7O (cfr. fls. 48 do suporte físico do processo).

    5) SMFD é dona da exploração agrícola n.º ENN3O (cfr. fls. 48 do suporte físico do processo).

    6) MGTCN é dona da exploração agrícola n.º ENFO8 (por acordo).

    7) MCCNG é dona da exploração agrícola n.º ENH34 (por acordo).

    8) AJMF é dono da exploração agrícola n.º EN60S (cfr. fls. 48 do suporte físico do processo).

    9) CAFD é dono da exploração agrícola n.º ENG36 (cfr. fls. 48 do suporte físico do processo).

    10) As explorações agrícolas referenciadas entre 2) e 9) formam a Unidade Epidemiológica da Pena (fls. 48 do suporte físico do processo).

    11) A...

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