Acórdão nº 01126/15.1BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução10 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO GMSDL vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 28 de Novembro de 2016, e que julgou improcedente a providência cautelar que intentou contra o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, e onde era peticionado que devia: “…ser decretada a providência cautelar agora requerida e regulada a situação jurídica no sentido de ser autorizada a redução em cinco horas semanais do horário de trabalho da requerente, por aplicação do regime da laboração continua, (…)”.

Em alegações a recorrente concluiu assim: I Na situação sub judice o Meritíssimo Tribunal a quo considerou que se verificavam os dois requisitos essenciais para o decretamento da providência – “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízo de difícil reparação” e o “fumus boni iuris”-, tendo a mesma sido indeferida por virtude de o mesmo ter entendido que à luz do estatuído no nº2 do artº.120º do CPTA, os danos resultantes da concessão da providência seriam claramente superiores para o recorrido e para as necessidades que lhe cumpre satisfazer, em prol da comunidade, do que os recorrentes da sua recusa, para a recorrente.

II Na situação sub judice, a entidade aqui recorrida cumpriu o ónus da alegação imposto pelo nº5 do artº.120º do CPTA como essencial para que o tribunal pudesse apreciar a questão relativa à ponderação dos interesses em causa, ou seja, saber se a concessão da providência causaria um prejuízo maior ao interesse público do que o benefício que adviria da mesma para a recorrente.

III Acontece que, alegação de factos é algo de diferente de prova dos mesmos, considerando a recorrente, no seu modesto entender, que a materialidade dada como provada nas alíneas G) e K) do probatório não pode, por si só, servir para fundamentar a douta decisão aqui em crise.

IV Os dois factos acima indicados não serão, em termos jurídicos, verdadeiros factos processuais, mas tão só e apenas documentos cujo teor foi dado como parcialmente provado, resultando de uma simples leitura de ambos que os mesmos são simples transcrições parciais de dois documentos.

V Os documentos não são factos mas meios de prova de factos, pelo que não basta dar por reproduzidos os documentos, sendo que a remissão para um documento tem apenas o alcance de dar como provada a existência desse documento.

VI In casu, o Meritíssimo Tribunal a quo deu como provada a existência de dois pareceres administrativos, não constando da douta sentença aqui em crise qualquer referência concreta ao exame específico da prova, referindo-se na mesma apenas que “a matéria coligida como provada resulta da prova documental constante dos autos e do processo administrativo apenso”.

VII Pese embora os presentes autos revistam a forma de providência cautelar, a verdade é que, ainda assim, é aplicável à douta sentença aqui em crise o artº. 94º, nº3, do CPTA, sendo manifesto que a frase “a matéria coligida como provada resulta da prova documental constante dos autos e do processo administrativo apenso” não é, por si só, passível de cumprir a exigência de revelação do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo Meritíssimo Tribunal a quo ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto.

VIII Acresce, ainda, que, mesmo que assim se não entendesse, o que só por mera hipótese se refere, a verdade é que inexistem nos autos elementos que possam permitir concluir pela exequibilidade, ou adequação, e tais objetivos e critérios, tendo em atenção as circunstâncias concretas do caso) v.g. desconhece-se a população servida pelo recorrido; o número de consultas médias do Serviço de Imunoalergologia nos últimos três anos; o número de consultas atribuído a cada especialista de Imunoalergologia; o número de consultas efectuado pela recorrente nos últimos três anos; o número de especialistas do Serviço de Imunoalergologia; o número de internos do Serviço de Imunoalergologia e o número de consultas atribuídas aos mesmos; o número de internos acompanhados pela recorrente; etc…).

IX Pese embora em sede de providência cautelar haja apenas lugar a uma simples análise perfunctória baseada num juízo sumário de factos a apreciar, a verdade é que, ainda assim, tal análise terá de ser fundamentada, impondo-se que na decisão o tribunal fundamente a mesma de modo a perceber-se o seu itinerário cognoscitivo e valorativo relativo à matéria de facto provada.

X Para que a ponderação de interesses prevista no nº2 do artº.120º do CPTA possa ter lugar, não basta a simples alegação de que a providência prejudica o interesse público, sendo necessário comprovar, ainda que de forma menos exigente relativamente ao processo principal, factualidade passível de tal prejudicialidade.

XI Não consubstancia tal prova um simples parecer que se limita a referir que a pretensão da recorrente não pode merecer provimento “(…) sob pena de não ser possível cumprir, com qualidade os objectivos assistenciais e formativos a que está obrigado. Uma vez que no Serviço de Imunoalergologia existe um quadro médico reduzido, em que um elemento já pratica um horário de 18 horas semanais, qualquer decisão neste sentido deverá ter como consequência o alargamento do quadro médico do Serviço. Uma vez que no Serviço de Imunoalergologia existe um quadro médico reduzido, em que um elemento já pratica um horário de 18 horas semanais, qualquer decisão neste sentido deverá ter como consequência o alargamento do quadro médico do Serviço.

(…)”.

XII Isto porque, a primeira frase é desprovida de conteúdo fáctico passível de análise e contradição, enquanto que a segunda não é concretizada com elementos concretos que permitam, ainda que indiciariamente, aferir da veracidade da mesma.

XIII Do supra exposto resulta que, mesmo em sede de providência cautelar, para que na ponderação de interesses prevista no nº2 do artº.120º, do CPTA, se possa considerar indiciariamente provado que da concessão de uma providência podem resultar prejuízos superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, é necessário, antes de mais, que a entidade requerida tenha, pelo menos, carreado para o processo elementos formalmente válidos para aferição do interesse que alega ser predominante, nomeadamente em matéria de fundamentação. Só com tais elementos será possível ao tribunal verificar, ainda que indiciariamente, os fundamentos da pretensão da entidade requerida os quais poderão, depois ser objecto de contraditório na acção principal. A não ser assim, um simples papel, com uma mera declaração de princípios, permitiria sempre às entidades públicas que prestam serviços comunitários obter vencimento em qualquer providência cautelar à luz do critério de ponderação de interesses.

XIV Ao não entender assim, a douta sentença enferma do vício de nulidade...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT