Acórdão nº 00506/09.6BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução24 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório OMCF, devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada contra a EP – Estradas de Portugal SA, na qual peticionou a atribuição de uma indemnização global de 8.000€, em resultado de ter sido atingido “por eucalipto propriedade da demandada que se precipitou sobre as viaturas”, inconformado com a Sentença proferida em 31 de maio de 2016, no TAF de Aveiro, na qual a ação foi julgada “improcedente”, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 8 de julho de 2016 (Cfr. fls. 305 a 312 Procº físico).

Formula o aqui Recorrente nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões: “1 - A sentença que antecede é nula porque omite em absoluto a fundamentação.

2 - A juiz que proferiu a Sentença ora em crise não realizou qualquer diligência de prova, pelo que, não estava apta a explicar de forma racional o motivo por que dá como provados certos factos e como não provados outros.

3 - No caso dos autos já havia sido proferido Acórdão de onde resulta que “Só com base numa factualidade formalmente verdadeira (no sentido de corresponder às respostas dadas e justificadas pelo tribunal, após a audiência de discussão e julgamento) poderão as partes reagir, quer impugnando a materialidade fáctica consignada na sentença, quer a posterior análise jurídica, se assim o entenderem, sendo certo que, 4 - A sentença recorrida ao omitir essa fundamentação totalmente, impede as partes de perceber o raciocínio lógico do julgador, inquinando de nulidade a Sentença que antecede.

5 - Ficou provado que a viatura do A. foi atingida por uma árvore propriedade da R., sendo certo que era a R. que tinha de provar que a R. cumpriu com o dever de zelo que lhe incumbia.

6 - A presunção legal que decorre do Art.º 493.º n.º 1 do C.C. obriga a R. a provar que aquele facto não se deveu a culpa sua, bastando ao A. alegar, como fez o facto gerador de responsabilidade.

7 - Para ser ilidida tal presunção terá a Administração que demonstrar que os seus agentes cumpriram o dever de fiscalizar, de forma sistemática e adequada, a coisa móvel ou imóvel, à sua guarda, ou que o evento danoso se ficou a dever a caso fortuito ou de força maior, sendo que, 8 - No caso dos autos, a R. alegou que os intensos golpes de calor terão desencadeado o processo de fratura, no entanto, a R. não provou que no dia do sinistro ou nos anteriores se verificaram condições climatéricas anormais, seja, 9 - A R. não demonstrou que existiram circunstâncias excecionais que afastassem a sua responsabilidade na eclosão do sinistro, pelo que, não se conseguindo determinar a causa da queda do ramo é contra a R. que a falta de prova deve operar, devendo em consequência nesta parte ser revogada a sentença recorrida, ou seja, terá de recair sobre a R. a obrigação de indemnizar o A. porquanto sobre si recai a presunção da ocorrência de facto ilícito por omissão dos deveres de vigilância.

10 - Termos em que, deverá a sentença que antecede ser revogada e substituída por outra que, dando cabal cumprimento às normas violadas condene a R. a indemnizar o A. pelos prejuízos sofridos e dados como provados, assim se fazendo a tão costumada JUSTIÇA.” O Recurso Jurisdicional foi admitido por Despacho de 5 de setembro de 2016 (Cfr. fls. 346 Procº físico).

A Recorrida/Estradas de Portugal, veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 13 de outubro de 20116, nas quais concluiu (Cfr. Fls. 354 a 357 Procº físico): “1. O recurso interposto alicerça-se na discordância da convicção do tribunal a quo dos factos provados.

  1. Ora, o Recorrente não fundamenta as suas alegações com o rigor que se mostra necessário, para que o tribunal a quo, mude, agora, os factos dados como provados.

  2. Aliás, nem tão pouco faz uso de transcrições de passagens da gravação da prova testemunhal que permitiria tirar as conclusões pretendidas.

  3. O A./Recorrente demandou a R./Recorrida, com fundamento em responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.

  4. O Autor fazia-se circular num veículo, na EN 1, sentido Sul Norte, tendo sofrido um acidente de viação, em resultado da queda da copa de um eucalipto.

  5. Os serviços da ex-Direcção de Estradas de Aveiro, órgão descentralizado da Recorrida, vigiam aturada e constantemente as condições de circulação na EN 1.

  6. Os técnicos de conservação adstritos à ex-Direcção de Estradas de Aveiro, passam com regularidade naquela via.

  7. Da matéria provada, resulta que a árvore não evidenciava qualquer sinal de decrepitude ou doença, pelo contrário a árvore em apreço encontrava-se viçosa e em bom estado vegetativo, nada fazendo supor a sua queda.

  8. Provou-se que em face da verificação deste acidente, foi solicitado ao Gabinete do Ambiente da Recorrida, uma vistoria à árvore em questão, tendo-se o Gabinete do Ambiente, pronunciado, através da CS n.º 2544/2006/GAMB, de onde se retiram as seguintes conclusões: “… Da observação efetuada no local e por consulta do histórico fotográfico exibido a fratura do ramo não se terá ficado a dever a podridão ou a qualquer outra causa de ordem sanitária causadora do enfraquecimento, mas presumivelmente a sucessivos e intensos golpes de calor, ocorridos na altura, que terão desencadeado um processo mecânico de fratura …” 10. A matéria dada como provada permite concluir que não se mostram preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual com a consequentemente obrigação de indemnizar.

  9. Face à prova produzida, pode concluir-se, que a Ré/Recorrida cumpriu o dever de vigilância, que sobre si lhe impendia.

  10. No âmbito dos poderes que competiam à EP – Estradas de Portugal, S.A., determinados pelo Decreto-Lei n.º 374/2007, de 7 de Novembro, foi zelada a manutenção e conservação das condições das infraestruturas rodoviária sob a sua jurisdição, a EN 1.

  11. A factualidade provada aponta toda ela no sentido de a Ré/Recorrida ter adotado medidas concretas no sentido de evitar o dano ocorrido, no que respeita ao cumprimento do dever de vigilância relativamente à manutenção e conservação da árvore, cuja copa caiu, ou seja, o acidente ocorreu não só independentemente deste cumprimento, mas tão-somente por causas fortuitas e imprevisíveis.

  12. De facto, está provado que a Recorrida cumpriu todos os deveres que lhe eram imputados, desde logo, e no ano de 2006 elaborou uma listagem contendo o levantamento, em todas as estradas na sua jurisdição, de todas as árvores que constituíam perigo para a via e nessa listagem não constava a árvore – eucalipto, cuja ramada caiu, 15. Nada há a apontar à conduta da Ré/Recorrida, no que aos cuidados de conservação, guarda e vigilância das árvores diz respeito e que só por circunstâncias anómalas o acidente em apreço terá ocorrido.

  13. De igual forma no âmbito da fiscalização levada a cabo pela ex-Direção de Estradas de Aveiro, não foi detetada qualquer situação de perigosidade relativamente às árvores que ladeavam a EN 1.

  14. Face ao sobredito, não se demonstrou que foi, qualquer omissão da Recorrida, que constituiu causa adequada do evento danoso, já que nada fazia prever a queda de um eucalipto viçoso e em bom estado vegetativo como ficou devidamente provado, tratando-se, deste modo, de um facto anómalo.

  15. Ou seja, não se demonstrou, como seria mister que fosse feito, para o Autor da ação lograr êxito, que nas descritas circunstâncias, foi qualquer omissão de conservação das árvores que ladeiam a EN 1, da entidade Recorrida que deu causa à produção do acidente.

  16. A Recorrida, ilidiu, como se lhe impunha, que exerceu a devida vigilância e fiscalização sobre as árvores sob sua responsabilidade, nomeadamente, na EN 1.

  17. A Recorrida organizou os seus serviços de modo a assegurar um eficiente sistema de prevenção e vigilância de anomalias previsíveis, e no caso concreto exerceu efetivamente uma adequada e contínua fiscalização, pelo que também não existiria culpa da Ré .

  18. A vigilância exercida pela Recorrida foi levada a cabo no respeito das regras técnicas e de prudência comum adequadas à situação concreta e à prevenção do resultado.

  19. A douta sentença recorrida cumpriu a lei, devendo-se, por isso, ser mantida.

Nestes termos e nos melhores de Direito, que serão por V. Exªs. doutamente supridos, deve a douta sentença recorrida ser mantida, com todas as legais consequências, assim se fazendo, como sempre a costumada JUSTIÇA!” O Ministério Público junto deste Tribunal, tendo sido notificado em 30 de Janeiro de 2017 (Cfr. fls. 373 Procº físico), nada veio dizer, requerer ou promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar As principais questões a apreciar resultam predominantemente da invocada “falta de fundamentação da decisão”, ao que acresce a circunstância da “juiz que profere a decisão não foi a mesma que efetuou o julgamento”, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto Sublinha-se desde logo que a originária decisão proferida pelo tribunal a quo veio a ser revogada por este TCAN exatamente em resultado de deficiências e incongruências na fixação da matéria de facto, tendo então sido determinada a baixa dos Autos à 1ª instância para que “reproduza, com toda a fidelidade, a matéria de facto provada”.

Em qualquer caso, é manifesto que o tribunal a quo, ainda que através de juiz já diferente, não deu cumprimento ao determinado, antes tendo fixado a matéria de facto, de modo...

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