Acórdão nº 01761/10.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução26 de Maio de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO Município da Maia vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 30 de Maio de 2016, e que julgou parcialmente procedente a acção administrativa comum no âmbito da responsabilidade civil extracontratual do Estado intentada por JFLTS e onde era solicitado que devia a entidade demandada ser condenada: “A)…no pagamento da quantia de 5 041, 33€ (cinco mil quarenta e um euros e trinta e três cêntimos), acrescida de juros à taxa legal a título de indemnização, pelos danos patrimoniais sofridos pelo Autor, nos termos do artigo 2º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48 051 ex vi artigos 483º e sgs do CC. e B)…no pagamento da quantia de 5 000€ (cinco mil euros) acrescidos de juros à taxa legal, a título de danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, nos termos do artigo 496º do Código Civil”.

Ocorreu intervenção espontânea da companhia de seguros F... – Companhia de Seguros SA.

Em alegações o recorrente concluiu assim: I – Entende a Ré/Recorrente que a Meritíssima Juiz “a quo” ao decidir como o fez, não interpretou e não aplicou corretamente o direito, ora em crise tendo em conta a fundamentação de facto na Douta Sentença, ora em crise.

II - A tampa de saneamento da caixa onde o Autor caiu foi furtada, como resulta da alínea u) dos factos não provados, contudo deve ser dado como provado, atendendo ao documento junto aos autos referido no número 13 em articulação com o número 26 da fundamentação de facto.

III - A alínea v) dos factos não provados da Douta Sentença deve ser dado como provada.

IV – Do depoimento do Autor extrai-se, desde logo, que “(…após dar a informação à senhora, virou-se e caiu na caixa que tinha sido roubada…)” –, conforme se alcança pela gravação no sistema “Habilus Media Studio” entre os 2.00 a 2.19.

V - A situação relatada no depoimento do Autor é corroborada pelo arquivamento dos autos após apresentação da queixa no Serviços do Ministério Público da Maia no depoimento que presta e que se encontra gravado no sistema “Habilus Media Studio” entre os 05.39 a 06.00 (“Fiz queixa na GNR”; “O processo foi arquivado”).

VI – Em reforço desta situação do furto das tampas, o Autor que fazia o trajeto todos os dias (de manhã e à tarde) para o seu local de trabalho, no seu depoimento refere e conforma “(…) que as tampas de saneamento estavam lá colocadas e (…) que não tem dúvidas que as mesmas lá estavam (…)” (Gravação no sistema “Habilus Media Studio” entre as 06.53 a 07.04).

VII - Aliás, confrontado pela Meritíssima Juiz “a quo” o Autor confirma que “(…) aquela tampa estava lá de manhã. Recorda-se? Essa tampa estava lá. (…)” (Gravação no sistema “Habilus Media Studio” entre as 07.00 a 07.27).

VIII – Estamos perante um facto dado como provado no n.º 14) da fundamentação de facto e que se transcreve: “O arruamento da Rua Etar Ponte de Moreira faz parte de uma operação de loteamento cujo processo de licenciamento deu entrada nos serviços da Ré em 18 de julho de 2000 em nome da T... – Imobiliária, L.da e correu os seus termos sob o número 5554/00 (cfr. fls 2 do processo administrativo)”.

E no ponto 15) refere que: “No licenciamento da operação de loteamento foram impostas pelo Réu condicionantes, designadamente a construção das seguintes infraestruturas: arruamentos (…) sinalização de trânsito devendo inclusive apresentar uma proposta de toponímia (cfr. fls. 63, 66, 139, 140, 185 e alvará constante a fls. 369 a 372 do processo administrativo de loteamento).” IX - As infraestruturas que ali estavam a ser construídas pela T... não eram da responsabilidade do Município.

X – Os trabalhos que o Réu/Recorrente impôs à T... são trabalhos que decorrem diretamente do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação aplicável, ou seja, obras de urbanização.

XI - A urbanização ou a dotação de um terreno de infraestruturas urbanísticas apresenta-se, assim, também como um processo que está claramente a montante da construção, ou seja, da criação de novas edificações, sendo, ou devendo ser, uma conditio sine qua non para a construção.” XII - O Réu/Recorrente não pode ser responsabilizado extracontratualmente pelo furto da tampa de saneamento que deu azo ao sinistro do Autor.

XIII - O Réu/Recorrente não pode condenado por facto ilícito no âmbito dos denominados atos de “gestão pública”, designadamente no que respeita à violação dos deveres de fiscalização e conservação das vias de trânsito, com fundamento na presunção de culpa prevista no n.º1 do artigo 493.º do Código Civil.

XIV - Na verdade, não é materialmente possível o Réu/Recorrente ser condenado pelo furto das tampas, sendo, para o efeito, obrigado à sua reposição num espeço de cerca 12 horas.

XV – Contudo, não se poderá deixar de salientar que a obrigação da construção do arruamento recaía nos deveres definidos no Alvará de Loteamento concedido pelo Município da Maia à T..., no que respeita ao “arruamento de ligação à E.N., bem como a construção ao longo do I.C.24 e Ramo de acesso e E.N.13 (….)”, veja-se a este propósito o ponto 16 a fundamentação de facto e constante a fls. 189 do processo administrativo.

XVI – Acresce ao que se disse, que o arruamento estava em terra batida.

XVII – Não havia receção provisória das obras de urbanização, por parte dos serviços do Réu/Recorrente, à data do sinistro.

XVIII – Por conseguinte, não assiste qualquer responsabilidade, como já se disse, ao Réu/Recorrente quanto a obrigação se conservar e manter o arruamento.

XIX – Aliás, na entrada do arruamento era proibida a circulação de pessoas e de tráfego automóvel, existindo para o efeito uma placa no estaleiro um sinal de proibição de passagem de peões e uma vedação metálica com estacas de madeira colocadas pela T..., veja-se a este propósito o n.º 25 da fundamentação de facto.

XX – Como se disse a alínea u) dos factos não provados deve ser considerada como provada, desde logo, pelo documento n.º 3 junto pelo Autor, ou seja, a Certidão extraída do Inquérito que correu os seus termos na 1.ª Secção dos Serviços do Ministério Público da Maia sob o n.º 847/07.7GAMAI, datada de 02 de Outubro de 2008, no qual atesta que as tampas de saneamento foram furtadas.

XXI – Das diligências levadas a efeito pela Ex.ma Senhora Procuradora Adjunta e que plasmou no seu despacho, pode-se facilmente extrair da dita certidão o seguinte (cfr. pág. 5): “Não é pois possível imputar-se o crime aqui em análise quer à Junta de Freguesia quer à Câmara Municipal. Na verdade, não resulta apurado que tivesse havido por parte das duas entidades uma violação de dever objectivo de cuidado. A tampa de saneamento foi furtada, esta é a posição do arguido que não contrariada (sendo certo que é do nosso conhecimento que isso ocorre com frequência).

Não resulta apurado que tivesse havido por parte das entidades responsáveis um esquecimento de fechar a tampa numa hipotética obra em curso.

Assim, tendo sido furtada a tampa de saneamento, conforme é referido nos autos, não era previsível para os arguidos que viesse ocorrer um acidente pois deste facto tinham pleno desconhecimento. Não se prova pois a omissão a um dever de cuidado.” (Negrito e sublinhado nosso) XXII - Com efeito, decorre do artigo 369.º e 371.º do Código Civil que os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas perceções da entidade documentadora.

XXIII - Também, como já se aludiu em supra, como bem refere ao Ex.ma Senhora Procuradora do Ministério Público da Maia, não era previsível para o Réu/Recorrente – partindo do pressuposto que algum dever de cuidado, de vigilância ou de conservação lhe competia-, que viesse a ocorrer um acidente pois desse facto tinham pleno desconhecimento, tendo em conta figura bonus pater familae.

XXIV – A alínea v) dos factos não provados deve ser considerada provada.

XXV – Com a alteração deste facto caí por terra a responsabilidade assacada ao Réu/Recorrente na Douta Sentença proferida pela Meritíssima Juiz “a quo”.

XXVI - É confirmado pelo Autor que a zona do arruamento encontrava-se em obras (ver gravação no sistema “Habilus Media Studio” entre as 15.00 a 15.20), “(…) estavam a executar trabalhos ao lado daquela urbanização (…)”, bem como este refere expressamente que à entrada para o arruamento que viria a ligar a Rua Ponte da Etar de Moreira à EN 13 “(…) se encontrava vedada (…) com um separador de betão” e que a “(…) estava intransitável (…) passando de lado (…), conforme se alcança pela gravação no sistema “Habilus Media Studio” entre as 15.41 a 16.31. “(…) A rua não tinha guias, passeios e o buraco estava no meio da rua (…)”conforme se alcança pela gravação no sistema “Habilus Media Studio” entre as 16.31 a 17.22.

XXVII – Tendo em vista o reforço do entendimento que o Réu/Recorrente vem sustentado nestas Alegações refere-se o email enviado aos serviços municipais que o troço do arruamento de ligação entre a EN13 e a Rua da Etar de Moreira se encontra devidamente concluído “há alguma semanas a esta parte…” mas “…mesmo assim continua cortada por um enorme bloco de betão…”.

XXVIII - Situação semelhante foi relatada pela testemunha SA.. que de acordo com o depoimento prestado e gravado no sistema “Habilus Media Studio” entre as 02.39.00.a 02.42.22 a instância do Ilustre Mandatário do T...: “(…) sei que estava fechado ao trânsito (…) tinha umas barreiras de cimento que não dava acesso a Via Norte com cerca de 1 metro de altura (…) havia 2 até chegou a haver mais (…) No acesso à Via Norte havia duas, sim(…) não passava veículo só passava pessoas se passassem pela terra(…) As pessoas arriscam(…) Não era sítio de passagem.(…) Aquilo estava fechado. (...) Abriram ao trânsito à cerca de um ano e meio(…)”.

XXIX - Contudo, no depoimento prestado pela testemunha MS.. em 20 de Março de 2015 que a Meritíssima Juiz “a quo” valorou como...

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