Acórdão nº 00809/16.3BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Maio de 2017
Magistrado Responsável | H |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: BA & A...
– Consultoria e Trading, Ldª Recorrido: Ministério da Administração Interna Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou improcedente a supra identificada acção de contencioso pré-contratual e absolveu o Réu dos pedidos.
O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “A – A assinatura eletrónica qualificada é da sociedade comercial. Por seu turno, quem apõe não é titular da assinatura, representa a sociedade comercial na plataforma, e apenas nela.
B – A assinatura digital só substitui a autógrafa no caso de o representante reunir em si os poderes de representação e os poderes de vinculação. O Sr. RAPC não tem poderes de vinculação da empresa, já que não é administrador da empresa, e tampouco lhe fora conferidos poderes de vinculação através de procuração.
C – Pode-se concluir pelo teor da procuração da D... que apenas foram conferidos “os poderes necessários para, em nome e em representação da sociedade, ASSINAR EM PLATAFORMAS ELECTRONICAS DE CONTRATACAO, utilizado para o efeito o certificado digital qualificado a emitir nos termos do documento em anexo.” Apenas são conferidos poderes de representação na plataforma, isto é, não conferiu poderes de vinculação e os que conferiu foi apenas para representar na plataforma.
D – Conclui-se assim que, a assinatura digital no caso dos autos não equivale à assinatura autógrafa e, por outro lado, que a assinatura autógrafa no caso em apreço não é inócua ou que deve a mesma ser desconsiderada (ainda que não obrigue a sociedade).
E – Acresce que, o Anexo I e o próprio artigo 57º, n.º 4 do CCP, impõem que aquele seja assinado pelo representante legal da sociedade. E não pela própria sociedade, que é o que acontece se o Anexo I for apenas assinado com recurso a um certificado digital.
F – A manifestação de vontade de uma sociedade não está necessariamente na assinatura digital do certificado digital da empresa, uma vez que, o certificado digital de assinatura, valores de autenticidade, de encriptação, de fidedignidade, entre outros, mas que nada contendem com a manifestação de uma vontade como aquela que se encontra prevista no n.º 4 do artigo 57º do CCP.
G – Por fim, quanto a esta matéria, caso se perfilhasse do entendimento da Mma. Juiz do tribunal a quo ter-se-ia que defender que quem manifesta a vontade no Manual do HACCP é o Sr. RAPC e não o Sr. JMBS (pessoa singular que apôs a assinatura autógrafa naquele manual).
H – Não existe no Direito do Consumo e, mais concretamente, no DL n.º 67/2003, de 8 de Abril qualquer norma que imponha uma exceção no prazo de garantia quanto aos bens perecíveis. Por outro lado, em lado nenhum, seja do Dl 67/2003, seja de qualquer outro diploma avulso se vislumbra que no caso dos bens perecíveis, o prazo de garantia deva ser igual ao prazo de validade.
I – Quando o legislador refere “salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade.”, deve-se ao facto de que, quanto estejam em causa determinadas coisas com determinadas caraterísticas, pode não operar a presunção prevista no n.º 2, isto é, não se presume que a falta de conformidade exista à data da entrega do bem. Esta ressalva não respeita à exceção quanto ao prazo de garantia de dois anos, este continua a ser o único prazo definido e admitido para os bens móveis novos.
J – E, mesmo que assim não se entendesse, jamais o prazo de garantia poderia ser inferior a seis meses. Isto porque, como sabemos, o Dl 67/2003, transpôs para o ordenamento jurídico interno a Diretiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio, sobre certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas. E, nos termos da referida Diretiva, mais concretamente, no artigo 5º, n.º 3, consta que “ (…) presume-se que as faltas de conformidade que se manifestem num prazo de seis meses a contar da data de entrega do bem já existiam nessa data (…).” K – No limite, aplicar-se-ia o regime estatuído no artigo 921º, n.º 2 do Código Civil, o qual prevê “No silêncio do contrato, o prazo da garantia expira seis meses após a entrega da coisa, se os usos não estabelecerem prazo maior.” L – A prova “viva” da razão da Recorrente são os contratos celebrados entre o Recorrido e a Contrainteressada nos anos de 2014 e 2015, em que se encontra definido como prazo de garantia, os dois anos.
M – Para além de todo o mais, a junção/pedido do Júri não é inócua, já que, tendo em conta que o Sr. RAPC apenas detinha poderes de representação, era fundamental aferir se quem declarava no Anexo I detinha ou não poderes de vinculação.
N – A junção da procuração consistiu na apresentação de novo documento após o termo do prazo de apresentação de propostas, pelo que, o Júri deveria logo no relatório preliminar ter proposto a exclusão da proposta, pois, já nesse momento se verificava a respetiva causa de exclusão, isto é, o Anexo I não foi assinado por quem detinha poderes para obrigar a empresa.
O – As matérias relativas aos poderes como não são reconduzíveis a atributos, termos ou condições não poderão ser objeto de pedido de esclarecimento com vista à junção de documento que deveria ter sido junto com a proposta inicialmente.
Nestes termos, e nos melhores de direito que Vªs Exªs doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente ser anulada a sentença, devendo ser alterada a sentença recorrida por outra que julgue os pedidos totalmente procedentes.
Assim decidindo, farão V.Ex.ªs, Venerandos Desembargadores, a acostumada JUSTIÇA!”.
O Recorrido contra-alegou, em termos que se dão por reproduzidos, e, tendo elaborado conclusões, aqui se vertem: “1.ª – Contrariamente ao que alega a Recorrente, a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, integrante da proposta da Contrainteressada “RG... Nutrição, SA” foi assinada por representante com poderes para obrigar a sociedade, concretamente, o Sr. RAPC.
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- Com efeito, a referida declaração foi submetida na plataforma eletrónica e assinada com recurso a assinatura eletrónica qualificada, pelo Sr. RAPC, através de certificado digital de representação, emitido pela entidade certificadora “D... – Certificadora Digital, SA”.
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- Conforme dispõe o artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto, a aposição de uma assinatura eletrónica qualificada a um documento eletrónico equivale à assinatura autógrafa dos documentos com forma escrita sobre suporte de papel e cria a presunção de que i) a pessoa que apôs a assinatura eletrónica qualificada é o titular desta ou é representante com poderes bastantes da pessoa coletiva titular da assinatura eletrónica qualificada; ii) a assinatura eletrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento eletrónico; iii) o documento eletrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura eletrónica qualificada.
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- A declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos foi assinada eletronicamente com recurso a um certificado digital qualificado de representação contendo, portanto, a identificação da empresa, do representante (precisamente o Sr. RAPC) e respetivos poderes de representação, tal como previsto na alínea a), n.º 1, do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto.
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- Deste modo, o certificado digital permite relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, dispensando-se, assim, a submissão à plataforma eletrónica de um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 15.º do programa do procedimento e do n.º 7 do artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto.
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- Nesse sentido, vejam-se, designadamente, os seguintes Acórdãos: Acórdão do STA, Processo: 0175/14, de 20-02-2014, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo: 02389/10.4BELSB, de 25-11-2011 e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo: 102/11, de 16-09-2011.
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- Em suma, o Sr. RAPC tem poderes para representar a Contrainteressada “RG... Nutrição, SA”, poderes que se inserem também no domínio da apresentação da proposta na plataforma eletrónica, onde se desenrolam os procedimentos eletrónicos de contratação pública nacional, considerando o disposto no art.º 62.º do CCP e na Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto, daí aquele representante estar munido e ter utilizado o certificado digital qualificado de representação, emitido pela “D... – Certificadora Digital, S.A.”, mediante o qual assinou os documentos da proposta.
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- Neste contexto, falecem os argumentos invocados pelo autor visando a exclusão da proposta da Contrainteressada “RG... Nutrição, S.A.” e a anulação do ato de adjudicação e bem andou a sentença recorrida ao assim considerar.
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– Também não assiste razão à Recorrente quando sustenta que foi violado o prazo de garantia mínimo de dois anos legalmente definido para os bens móveis, nos termos do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, prazo que considera ser aplicável aos bens perecíveis objeto do contrato inerente ao procedimento adjudicatório sub judice, in casu, ração (alimento para animais).
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- Nas peças do procedimento foi fixado o prazo de validade dos bens, com a indicação clara do prazo que os concorrentes tinham obrigatoriamente que observar. No entanto, relativamente ao prazo de 2 anos, este não foi expressamente indicado, remetendo apenas o caderno de encargos para o regime da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, que deverá ser aplicado com as necessárias adaptações.
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- O que está previsto no artigo 10º do caderno de encargos, e porque se trata de um bem perecível, é a obrigação a um prazo de validade não inferior 90 dias.
O Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, alterado pelo Decreto-lei n.º 84/2008, de 21 de...
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