Acórdão nº 00668/08.0BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução18 de Novembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO L... - Indústria Portuense de artefactos de Cimento, Lda, com sede na …, intentou contra Estradas de Portugal, E.P.E., com sede na …, acção administrativa comum, com processo sumário, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 24.013,28, a título de indemnização por responsabilidade civil extra-contratual, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data do sinistro até efectivo e integral pagamento.

Por sentença proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada improcedente a acção e absolvida do pedido a Ré.

Desta decisão vem interposto recurso. Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões: 1.

Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida nos autos supra e à margem referenciados, por entender a Apelante, por um lado, que a mesma padece de erros manifestos no julgamento da matéria de facto e, por outro, que os factos dados como provados não são idóneos a sustentar a decisão do Tribunal recorrido – impondo, ao invés, a condenação da Ré nos pedidos formulados; I) DA MATÉRIA DE FACTO · Alínea E) dos factos provados 2.

Não existindo qualquer prova documental nos autos relativa à medição da velocidade a que o veículo em causa circulava na altura do sinistro, nem tampouco qualquer referência a esse respeito no auto elaborado pelas autoridades que ali se deslocaram, claudicam as provas necessárias a sustentar (ainda que de forma aproximada) a velocidade fixada na alínea E) dos factos provados; 3.

A conjugação do depoimento da testemunha João Borges Duarte (acima transcrito) com os demais elementos de prova constantes dos autos obrigam a que seja alterada a redação conferida à alínea E) dos factos provados, por forma a ter-se por demonstrado, tão-só, que “Nesse dia estava bom tempo, não chovia e o veículo circulava a uma velocidade moderada”; · Quesito 10º da base instrutória 4.

A execução dos trabalhos referidos no quesito 10º da base instrutória (tido por não provado pelo Tribunal recorrido) vem dada como demonstrada logo nas respostas oferecidas aos restantes quesitos da base instrutória, tendo a Primeira Instância considerado provadas quer as características da via antes da sua execução (alínea H) dos factos provados: “Inexistia, no seu limite, qualquer berma ou protecção entre a extrema da via e a valeta”), quer a especificação das próprias obras levadas a cabo no local (alínea J) dos factos provados: “Os trabalhos consubstanciaram na supressão da valeta existente”); 5.

Os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas a este propósito (e, designadamente, o teor do depoimento prestado pela testemunha LMPV, acima transcrito) são reveladores quanto à realização de tais obras; 6.

Também na alínea S) dos factos provados se teve por demonstrada (embora com uma finalidade complementar) a realização dos trabalhos questionados no quesito 10º da base instrutória; 7.

O Município do Marco de Canavezes (responsável pela execução das obras em causa), na correspondência trocada com a Ré a tal propósito – vide doc. nº 1 junto com o requerimento da Ré apresentado em 30.09.2010 e, concretamente, a missiva do Município de 14.07.2005, incluída no mesmo doc. nº 1 –, expressamente refere a segurança rodoviária no assunto em discussão e subjacente à realização dos trabalhos, especificando que se pretende “executar os passeios desde o Km 45,3 e Km 46,2 exactamente para criar as condições de segurança que a situação impõe”; 8.

A execução e localização dos trabalhos referenciados no quesito 10º da base instrutória resulta evidente, por último, do confronto dos registos fotográficos juntos com a P.I. dos autos (sob a designação de docs. n.

os 2, 3, 5, 6, 7 e 8) e, bem assim, dos documentos incluídos no doc. nº 1 junto com o requerimento apresentado pela Ré em 30.09.2010; 9.

Com base nos elementos de prova recolhidos no processo, deverá proceder-se à alteração da resposta oferecida ao quesito 10º da base instrutória, cuja matéria deverá, como tal, ser tida por provada; · Alínea T) dos factos provados 10.

Os trabalhos realizados na via e referenciados na alínea T) dos factos provados não foram efectuados pela Estradas de Portugal, mas por iniciativa e conta do Município do Marco de Canavezes, razão pela qual a demonstração dos intentos atribuídos às obras promovidas não podem partir de meras declarações (interessadas) da Ré, devendo antes basear-se no que resulta da análise do conjunto dos elementos de prova constantes dos autos; 11.

Também aqui se recorda que o doc. nº 1 junto com o requerimento da Ré apresentado em 30.09.2010 (e, concretamente, a missiva do Município de 14.07.2005, incluída no mesmo doc. nº 1) expressamente refere a segurança rodoviária no assunto em discussão e subjacente à realização dos trabalhos, especificando que se pretende “executar os passeios desde o Km 45,3 e Km 46,2 exactamente para criar as condições de segurança que a situação impõe”; 12.

Nos depoimentos respetivos, as testemunhas LMPV e AM (acima transcritos) expressamente referenciam a insegurança rodoviária vivida na estrada em apreço e a recorrência dos acidentes em tempos lá registados, especificando os melhoramentos introduzidos pelo Município por via das obras referenciadas na alínea T) dos factos provados; 13.

Sendo certo que os trabalhos a que se reporta a alínea T) dos factos provados coincidiram com a construção da Escola Secundária de Alpendurada, não pode daí retirar-se que os mesmos não visaram ou contemplaram o melhoramento das condições de circulação rodoviária, tanto mais que os fatores que davam causa aos inúmeros acidentes rodoviários ali ocorridos foram eliminados com sucesso através das referidas obras; 14.

Os elementos de prova constantes dos autos obrigam, salvo melhor entendimento, a concluir como manifestamente redutora a redacção atribuída à alínea T) dos factos provados, dando como não provada, assim, a factualidade à mesma subjacente; II) DA MATÉRIA DE DIREITO 15.

O Tribunal teve por demonstrada não só a ocorrência do facto de que emerge a responsabilidade reclamada (cfr., designadamente, alíneas C) e D) dos factos provados), como a concretização dos danos sofridos pela Autora e o nexo de causalidade existente entre o referido facto e os mesmos danos (cfr., alíneas L) a R) dos factos provados); 16.

Na decisão em crise, os argumentos subjacentes à apreciação da ilicitude da conduta da Ré e, bem assim, da culpa da mesma na ocorrência do relatado acidente encontram-se eivados de erros de raciocínio; 17.

Conforme bem se identifica na Sentença recorrida, sobre a Ré impende a presunção de culpa prevista no artº 493º, nº 1 do Código Civil, visto que a responsabilidade da Ré pela supervisão das condições de circulação da via identificada nos autos não só nunca foi questionada por qualquer dos intervenientes processuais (sendo genericamente admitida na decisão em crise), como decorre das suas próprias competências estatutárias; 18.

Remetendo para o teor da matéria assente na decisão recorrida (e, designadamente, para alíneas A), E) F), G), H) e I)), está provado nos autos: - que o acidente em apreço ocorreu com um veículo pesado com semi-reboque; - que o local em que se deu o dito acidente é uma via aberta ao trânsito de dois sentidos, incluindo veículos pesados, com 5,90 metros de largura e ladeada por uma valeta com cerca de 40cm de profundidade, sem que se mostrasse (à data) servida por qualquer berma ou protecção entre a extrema da via e a valeta; - que as características da própria via e, nomeadamente, a largura da faixa de rodagem e a existência da referida curva apertada (às quais o condutor é, naturalmente, alheio) obrigaram o veículo a circular junto ao seu limite; 19.

Tendo presente a factualidade provada, necessário se torna concluir que as comprovadas características da via em apreço apresentavam graves debilidades estruturais (constatáveis, de resto, por visualização dos docs. n.

os 2 e 3 juntos com a P.I.) que a tornavam inadequada à circulação em segurança de veículos longos e pesados, debilidades essas expressamente reconhecidas pelas testemunhas Luís Vieira e AM (cfr. depoimentos supra transcritos) como estando na origem dos “vários acidentes” que naquele local se registaram ao longo dos anos; 20.

A configuração do traçado da via, aliada às características dos veículos que na mesma podem circular (nomeadamente, pesados e longos), impunham à entidade aqui Ré o dever de prever o perigo à circulação de veículos oferecido no mesmo local, quanto mais não fosse pelos consecutivos alertas que constituíam os repetidos sinistros ali ocorridos; 21.

A matéria de facto apurada no processo impede que se exclua a responsabilidade da Ré (como foi feito) com fundamento na ausência de violação de qualquer norma legal ou regra técnica e de prudência comum, com base numa (pretensa) inexistência de previsibilidade objectiva do sinistro ocorrido, 22.

Nenhuma factualidade foi dada como provada quanto à alegada imprudência do condutor (cfr. resposta dada ao quesito 24º da base instrutória), tendo ficado demonstrado, pelo contrário, que o mesmo conduzia a uma velocidade moderada (e, em todo o caso, dentro do limite legalmente estabelecido); 23.

Resultando a responsabilidade da Ré da omissão no cumprimento das suas obrigações legais e estatutárias – omissão essa amplamente demonstrada nos autos–, a mesma não só não logrou provar qualquer facto susceptível de afastar a presunção de culpa que sobre si impende, como falhou em contrariar a prova que claramente demonstra que tal responsabilidade efectivamente lhe incumbe; 24.

Decidindo em desconformidade com o enquadramento ora enunciado, violou o Tribunal recorrido, designadamente, o disposto nos artigos 483º, 487º, 493º, todos do C.C., no art. e 659º, nº 3 do C.P.C. e nos arts. 2º, nº 1, 4º, nº 1 e 6º do Decreto-lei nº 48051, de 21 de Novembro de 1967.

NESTES TERMOS, REQUER-SE SE DIGNEM CONCEDER INTEGRAL PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM...

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