Acórdão nº 01996/10.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução01 de Julho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: EAGB Recorrido: Município do Porto Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a supra identificada acção administrativa especial, na qual era pedido, designadamente, «

  1. Ser declarada a nulidade do acto administrativo de despedimento da A., por não verificação da alegada justa causa, decretando-se a subsistência do vínculo laboral em lide, e, consequentemente; B) Ser a R. condenada a pagar à A. todas as importâncias dela reclamadas no art.º 36 supra, com os fundamentos invocados neste articulado e que por mera questão de economia, ora aqui de dão por reproduzidos para todos os efeitos legais; C) Ser a R. condenada a reintegrar imediatamente a A., no seu posto de trabalho, nos termos do Art.º 277.º da Lei 59/2008 de 11 de Setembro».

    O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “1° - O procedimento disciplinar foi instaurado por despacho do Sr. Presidente a Câmara do Porto de 11 de Dezembro de 2008, e as infracções imputados à Apelante ocorreram entre Maio de 2003 e Agosto de 2004; 2º - Desses factos o Sr. Presidente da Câmara do Porto teve conhecimento detalhado, pelo menos, em 02 de Dezembro de 2005, como desde logo resulta do facto de nessa data ter participado os mesmos á Polícia Judiciária para efeitos de instauração de procedimento criminal; 3º Atento o disposto no n° 2 do art° 4° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Pública aprovado pelo Dec-lei n° 24/84 de 16/01, na altura em vigor, o direito de instaurar procedimento disciplinar prescrevia "se, conhecida a falta pelo dirigente máximo do serviço, não for instaurado o competente procedimento disciplinar no prazo de 3 meses".

    4º - Segundo a melhor jurisprudência, tal conhecimento cinge-se aos aspectos essenciais do elemento objectivo da infracção, susceptíveis de configurar, prima facie, um comportamento ilícito; 5º- Ou seja, basta que a materialidade dos factos seja susceptível de conduzir à percepção do cariz disciplinar desses mesmos factos ; 6º- Iniciando-se com tal conhecimento o prazo de caducidade do direito de acção disciplinar, cujo termo ad quem ocorre com o despacho de instauração do procedimento disciplinar; 7º- Ora, que os factos dos quais o Sr. Presidente da Câmara do Porto teve conhecimento detalhado em 02 de Dezembro de 2005 revestiam natureza jurídico-disciplinar, é o que resulta também, por maioria de razão, do facto de terem sido considerados como consubstanciadores de ilícitos de natureza jurídico-criminal; 8º- Deveria, por isso, o Sr. Presidente da Câmara do Porto ter instaurado de imediato o competente procedimento disciplinar, ou de inquérito, até porque a tanto estava obrigado, face ao disposto no n° 2 do arte 45° do Dec-lei n° 118/83 de 25 de Fevereiro; 9º- Assim não tendo acontecido e tendo o Sr. Presidente da Câmara do Porto tomado conhecimento de tais factos pelo menos em 2005.12.02, manifesto é que a instauração do presente procedimento disciplinar, decorridos que eram pelo menos três anos e nove dias após aquele conhecimento, se encontra desde há muito prescrita; 10° — Não colhe o argumento expendido no douto Acórdão recorrido no sentido de que a informação factual vertida na participação criminal efectuada à Polícia Judiciária em Dezembro de 2005 não permitia uma caracterização da falta quanto ao modo, tempo e lugar da sua prática, antes considerando que estes elementos apenas foram do conhecimento do Apelado em Setembro de 2008, data em que tomou conhecimento da acusação deduzida no processo criminal; 11º- A caracterização da falta disciplinar nos termos perfilhados no Acórdão recorrido constitui o resultado final do procedimento disciplinar e não o pressuposto prévio da sua instauração; 12º- Na verdade, para a decisão de abertura de procedimento disciplinar é bastante a aquisição procedimental de factos que indiciem a prática e a ocorrência de uma ou várias infracções disciplinares; 13º - A exigência de definição desses factos, nomeadamente quanto às circunstâncias de tempo, modo e lugar, verifica-se sim em relação à peça acusatória [por forma a exercer cabalmente o direito de defesa e não em relação à notícia de factos integradores de ilícitos disciplinares; 14º- No caso dos autos, os elementos probatórios coligidos pelo Município do Porto, ademais e especialmente, as cópias dos recibos que titulavam os aludidos tratamentos falsos, posteriormente remetidos à Policia Judiciária, indiciam de forma segura a existência de factos integradores da prática e a ocorrência de uma ou várias infracções disciplinares; 15º- Tal convicção surge particularmente reforçada pelo facto de, já antes da participação efectuada á Policia Judiciária, os serviços camarários do Réu terem prestado informação a constatar a existência de indícios da prática de ilícitos disciplinares; 16º- A partir deste momento, iniciou-se, pois, a contagem do prazo de prescrição 17º- Por outro lado, no relatório final, é dado como assente ter a Apelante violado os deveres de isenção e de zelo, previstos nas alíneas b) e e) do n°. 2, n°. 4 e n° 7, do artigo 3°. do E.D..

    18º- O dever de zelo consiste em conhecer e aplicar as normas legais e regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, bem como exercer as funções de acordo com os objectivos que tenham sido fixados e utilizando as competências que tenha sido consideradas adequadas; 19º- Dos autos de processo disciplinar, designadamente do Relatório Final, resulta que as quantias recebidas pela Apelante o foram a título de comparticipações da ADSE, à custa daquela entidade e dos direitos que a ADSE legalmente lhe concedeu; 20º- É por demais consabido que beneficiam da ADSE os servidores do estado, latamente considerado, em cujo universo se inclui a Apelante, por deter a qualidade de funcionária pública; 21º- Porém, de tal sistema de apoio na doença beneficia quem quer que seja que detenha a qualidade de funcionário público, independentemente do serviço ou organismo a que pertença; 22º - In casu, as alegadas vantagens patrimoniais auferidas pela Apelante resultam exclusivamente da sua qualidade de funcionária pública e nunca da sua qualidade de funcionária/trabalhadora ao serviço das Águas do Porto, E.M.; 23º- A factualidade imputada à Apelante não é subsumível aos ditames por que se pauta o dever disciplinar de zelo; 24º - Na verdade, esta não vem acusada de qualquer facto relacionado com a falta de conhecimento ou inaplicação de normas regulamentares e/ou instruções de superiores hierárquicos ou aperfeiçoamento da sua preparação técnica; 25º- Em bom rigor, os factos pelos quais a Apelante vem acusada, relacionados com a alegada obtenção ilegítima de vantagens directas ou indirectas, de natureza pecuniária ou outras, não relacionados com as funções que exerce, consubstanciariam violação do dever de isenção, nele se consumindo e esgotando; 26º - Não existe, assim, qualquer nexo de causalidade entre as funções efectivamente exercidas pela Apelante e as alegadas vantagens patrimoniais por ela auferidas; 27º - Assim sendo, não pode dar-se como verificada a violação por parte da Apelante do dever de zelo previsto no art° 3°, n° 2, al. b), com o conteúdo que lhe é assinalado no n° 4, do E.D. em vigor; 28º - Posteriormente à prática dos alegados factos, a Apelante permaneceu ao serviço, exercendo as suas funções com bom comportamento e zelo, tendo obtido boas classificações de serviço nos anos de 2004 e 2005; 29º - Em sede disciplinar, na determinação da medida da pena deve atender-se ao comportamento do arguido anterior e posterior à data da prática dos factos; 30º - Assim sendo, no caso em apreço, não se entende como é possível manter a Apelante ao serviço e ao mesmo tempo afirmar-se que, pela prática de factos ocorridos há cerca de quatro anos, com referência à data da deliberação punitiva, se quebrou então a relação funcional; 31º - Por outro lado, não poderá olvidar-se que na determinação da medida da pena haverá que tomar também em linha de conta as circunstâncias que rodearam a prática da infracção; 32º - Ora, quanto a esse particular, verifica-se que o número de visados no processo disciplinar instaurado, constante do PA apenso, ascende a 63, bem assim como o período de tempo (no caso da representada do Apelante, durante mais de dois anos) durante o qual foram praticados os ilícitos disciplinares permite afirmar que da parte dos ex-SMAS do Porto houve, pelo menos, uma conduta negligente que propiciou a ocorrência de tão elevado número de casos, durante um período de tempo considerável; 33º - Acresce que, como evidencia o relatório final, o universo dos arguidos abrangidos pelo processo disciplinar foi punido, uns, com pena disciplinar de 60 dias, outros, com pena disciplinar de 90 dias e outros ainda, como é o caso da representada do A., com a pena de demissão; 34º - Sendo certo que, em todos os casos, os ilícitos alegadamente praticados são em tudo análogos, divergindo essencialmente quanto aos montantes em causa; 35º - Todavia, não se almeja qual o critério em que assentou a proposta do Sr. Instrutor do processo disciplinar — nem do texto da deliberação impugnada resulta — para a aplicação de penas tão dispares, quando em causa está a violação dos mesmos supostos valores...

    36º - Por outro lado, verifica-se que da apreciação da prova carreada aos autos não se vê como possa atribuir-se à Apelante, sem margem para qualquer dúvida razoável, a autoria dos ilícitos disciplinares em causa; 37º- Subjaz, assim, à decisão punitiva a prova indiciária recolhida em sede de inquérito, insuficiência essa que, aliada à míngua de critério que permita concluir pela aplicação de penas tão díspares a factos que integram os mesmos ilícitos face à violação dos mesmos deveres, se mostra manifestamente insuficiente para fundamentar a pena...

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