Acórdão nº 00248/11.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução03 de Junho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas IP vem interpor recurso do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, datado de 6 de Dezembro de 2012, e que julgou parcialmente procedente a acção administrativa especial que intentada por PNBP, e onde era solicitado que: a) Se digne conhecer e declarar a prescrição do presente procedimento, e, em consequência, declarar extinto o procedimento contra o Autor. //b) Se digne anular o referido acto pelo mesmo não estar devidamente fundamentado.” Em alegações o recorrente concluiu assim: A. Através de acórdão proferido pelo Tribunal a quo, foi julgada procedente a acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos apresentada pelo Recorrido, anulando-se a decisão final do IFAP, IP que determinou a modificação unilateral do contrato de atribuição de ajudas e o reembolso do montante de 86.879,19 €, por incumprimento do projecto de investimento n.º 2003230010690.

B. Com efeito, entendeu o Tribunal a quo verificar-se o “vício formal de falta de audiência prévia, na parte em que, precisamente, a diligência complementar a que corresponde a inquirição de testemunhas não foi aceite pela entidade demandada”.

C. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito quanto ao alegado vício formal de falta de audiência prévia do acto administrativo impugnado.

D. Nenhuma dúvida se coloca relativamente ao cumprimento pelo ora Recorrente do cumprimento do artigo 100.º do CPA.

E. Disso deu conta o acórdão sentença que registou tal facto sob o n.º 12.

F. Tendo igualmente sido dado como provado que o Recorrido exerceu o seu direito de audiência prévia.

G. Disso deu conta o acórdão sentença que registou tal facto sob o n.º 13.

H. O acórdão considerou como violado o artigo 100.º do CPA ao considerar que tendo o Recorrido, em cumprimento desse preceito legal, indicado testemunhas para sustentar a posição que defendiam, não se procedeu à sua inquirição.

I. O cumprimento do dever de audiência prévia previsto no artigo 100.º do CPA não obriga que fossem ouvidas as testemunhas arroladas.

J. A inquirição de testemunhas inclui-se no âmbito das diligências complementares a que se refere o artigo 104.º do CPA, K. Sendo que a realização de diligências complementares requeridas não constitui um direito do interessado e antes cabe na regra da livre apreciação das provas por parte da Administração, apenas sindicável em caso de erro grosseiro ou de utilização de critério claramente inadequado.

L. O que não aconteceu no caso dos autos.

M. E sobre a alegada omissão de diligências complementares a que alude o artigo 104.º do CPA, já se pronunciou o STA, entre outros, no acórdão de 2006-03-02, no processo n.º 0984/06, segundo o qual: “a realização de diligências complementares, mesmo as que tenham sido solicitadas, cabe na regra da livre apreciação das provas por parte da Administração sujeita ao regime próprio aplicável em tal matéria. Ou seja, uma tal faculdade do instrutor, no exercício da qual goza de ampla margem de apreciação, apenas sindicável, em princípio, em caso de erro grosseiro ou de utilização de critério claramente inadequado” (vd. também acórdão do STA de 2000.02.01, recurso n.º 45290; acórdão do STA de 2008.05.21, processo n.º 084/08), N. Segundo o acórdão do Tribunal a quo, o depoimento das testemunhas poderia ser fundamental para o Recorrido demonstrar a veracidade do alegado na resposta ao ofício de audiência prévia.

O. Contudo, também aqui o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento ao entender que a inquirição das testemunhas podia alterar o conteúdo da decisão final.

P. De facto, o fundamento legal do acto que determinou a modificação unilateral do contrato e consequente reposição do montante indevidamente atribuído foi o incumprimento da Regra de Elegibilidade n.º 1 relativa à elegibilidade das despesas no âmbito das operações co-financiadas pelos fundos estruturais que se refere aos documentos comprovativos das despesas, do Regulamento (CE) n.º 1685/2000, da Comissão, de 28-07, com última redacção dada pelo Regulamento (CE) n.º 448-A/2004 da Comissão, de 10-03, que estabelece que: “os pagamentos executados pelos beneficiários finais devem ser comprovados pelas respectivas facturas pagas. Se tal não for possível os pagamentos devem ser comprovados por documentos contabilísticos de valor probatório equivalente”.

(sublinhado nosso).

Q. Não tendo o Recorrido apresentado os documentos a que estava obrigado, no sentido de não poderem ser consideradas as despesas não tituladas por documentos que observassem a Regra de Elegibilidade n.º 1, era manifesto que a diligência de inquirição das testemunhas arroladas seria sempre inútil, pois que qualquer que fosse o seu resultado, não existindo os documentos que cumprissem a Regra de Elegibilidade, sempre estaria afastada a possibilidade de se considerarem as referidas despesas como elegíveis.

R. Não merece qualquer censura o procedimento adoptado pelo Recorrido, pois que nenhuma prova testemunhal se impunha para a realidade descrita pela Recorrido, e tanto assim é, que, este último nem sequer soube concretizar qual a factualidade relativamente à qual devia ser produzida prova testemunhal.

S. O Recorrente fundamentou o indeferimento da inquirição de testemunhas referindo que o ora Recorrido “já tomou conhecimento de todos os factos que importam à tomada de decisão, e se pronunciou sobre os mesmos (…) ”.

T. No exercício do direito de audiência prévia, em que se suscitam apenas questões de direito, não se descortinando a invocação de factos novos, sendo que as questões suscitadas foram apreciadas pela Administração, não merece qualquer censura a não audição das testemunhas arroladas neste âmbito, pois que nenhuma prova testemunhal se impunha para a realidade descrita.

U. Sem conceder, a entender-se que a não audição das testemunhas indicadas pelo Recorrido em sede de audiência prévia constitui vício formal de falta de audiência prévia, deveria tal preterição de audiência prévia, no caso concreto, degradar -se em formalidade não essencial, havendo aplicação do princípio do aproveitamento dos actos.

V. Resultando dos vários elementos documentais/contabilístico analisados em sede de controlo, o incumprimento por parte do Recorrido, de requisitos legais de carácter formal, pelo que não poderia uma testemunha ou respectiva audição consubstanciar um elemento probatório determinante para a alteração da fundamentação da decisão final.

W. A decisão do procedimento administrativo seria sempre idêntica à decisão que foi impugnada em primeira instância, pelo que o incumprimento julgado pelo Tribunal a quo teria de se degradar em mera irregularidade procedimental, devendo concretizar-se o princípio do aproveitamento do acto.

O recorrido apresentou as suas contra-alegações tendo apresentado as seguintes conclusões: 1. Inconformado com a douta sentença proferida pela Mmª Juiz nos autos, dela recorre o réu.

  1. Contudo, não parece assistir razão ao recorrente e basta uma leitura atenta da douta decisão recorrida, para tanto se concluir.

  2. Da falta de fundamentação e da falta de audiência prévia.

  3. A deliberação de modificação unilateral do contrato celebrado entre com o Réu, com a consequente devolução da quantia € 86.879,19, carece de fundamentação porque: Não ouviu nenhuma das cinco testemunhas arroladas; não teve em conta a pronúncia do A. em sede de audiência prévia; adopta fundamentos obscuros, contraditórios e claramente insuficientes que não esclarecem a motivação do acto.

  4. Relativamente ao facto do R. não ter procedido à audição de testemunhas arroladas e não se ter pronunciado quanto aos argumentos aduzidos em audiência prévia estamos perante o vicio formal de falta de audiência prévia, na parte em que, precisamente, a diligência complementar a que corresponde a inquirição de testemunhas não foi aceite pela entidade demandada e na parte em que o R. não teria explicitado as razões pelas quais não atendeu às alegações do interessado – cfr. art.º 101.º, n.º 3 e 104.º do CPA – Neste sentido, que se acompanha, cfr. Freitas do Amaral e outros, in CPA anotado, 3ª edição, pág. 198.

  5. A Administração não está obrigada a realizar todas as diligências de prova que o interessado requeira na fase de audiência prévia, transformando esta numa reabertura da instrução.

    Contudo, não as poderá omitir sem se pronunciar sobre o pedido que aquele formule nesse sentido, justificando sumariamente o seu indeferimento.

  6. Ora apesar do Réu ter explicitado as razões pelas quais não atendeu ao invocado pelo A. em sede de audiência prévia, o certo é que não se pode considerar que a expressão “ Assim, e considerando que já tomou conhecimento de todos os factos que importam à tomada de decisão, e se pronunciou sobre os mesmos (…)‖ cumpra a justificação sumaria do indeferimento de audição de testemunhas.

  7. O cumprimento do disposto no art.º 100.º do CPA é visto como uma importante garantia de defesa dos direitos do administrado e, porque assim é, constitui uma formalidade essencial.

  8. Todavia a mesma pode, em certos casos, degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que daí resulte qualquer ilegalidade invalidante.

  9. Esses casos serão aqueles em que estando em causa uma actividade vinculada da administração, se conclui que a decisão administrativa não poderá ser outra que não a decisão efectivamente tomada.

  10. O que significa que a degradação daquela formalidade em formalidade não essencial só ocorrerá quando, atentas as circunstâncias, a intervenção do interessado se torna inútil.

  11. Porém, esta inutilidade só ocorrerá “se for possível garantir que o acto seria sempre prolatado, e com a mesma configuração decisória, quaisquer que fossem as vicissitudes do procedimento, ou, como refere o Ac.

    do Pleno de 08.02.2001 – Rec. 46.660, ¯quando se possa...

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