Acórdão nº 00106/03 - Porto de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução09 de Junho de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 14/01/2008, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade B…, Lda., contribuinte n.º5…, com sede na Av…, em Matosinhos, contra a liquidação adicional de IVA relativo a 1999, no montante total de 116.611,64€.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “A. A douta sentença do Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento em matéria de facto e de direito decidindo que a impugnante e aqui recorrida tinha direito à dedução do IVA contido nas facturas do fornecedor K… reputadas pela AT como titulando operações simuladas ou inexistentes por força da verificação de um vício de fundamentação dos actos tributários impugnados.

  1. O presente recurso é interposto contra a douta sentença porquanto, ao contrário do decidido, entende a Fazenda Pública que a fundamentação dos actos tributários impugnados é exaustiva, completa e elucidativa do itinerário valorativo e cognoscitivo seguido no procedimento tributário que culminou com a respectiva emissão.

  2. A Inspecção Tributária recolheu e apurou indícios sobejamente sérios e fundados em como as facturas emitidas pela K… não correspondiam a operações reais e efectivas.

  3. A K... era uma empresa destinada a funcionar em aparente normalidade, mas que ocultava alguém que através dela exercia a actividade de venda de veículos cujo principal desígnio consistia na não entrega ao Estado dos impostos devidos (e por si liquidados nas facturas).

  4. A K... introduzia no mercado nacional viaturas a preços inferiores ao do mercado, liquidando o IVA nas respectivas facturas, mas não o entregando ao Estado, tal foi comprovado pela Inspecção Tributária, possibilitando aos seus clientes, entre as quais a impugnante, a dedução do imposto mencionado nessas facturas.

  5. Os indícios recolhidos fundamentam, no respeito pelas normas legais aplicáveis, os actos tributários impugnados, indicando de forma clara, exacta e completa o sentido e alcance dos actos impugnados e os seus efeitos jurídicos.

  6. A fundamentação constante do relatório inspectivo e, ao contrário do decidido, foi de molde a satisfazer o dever da AT de emitir as liquidações impugnadas e reflecte a motivação que, de forma coerente e credível conduz à conclusão de que devem ser desconsiderados os valores constantes das facturas identificadas, emitidas pela K..., em obediência ao disposto no n.° 3 do artigo 19° do Código do IVA.

  7. Se assim não for entendido, é de atentar no facto da impugnante demonstrar, pelo teor da petição inicial, bem como pela prova produzida, quer documental quer testemunhal, deter um conhecimento detalhado sobre os actos impugnados, tendo procurando demonstrar a efectividade das operações através da junção de cópia dos cheques emitidos para pagamento à K..., de cópia das facturas emitidas pela K... e ainda através da prova testemunhal produzida, invocando em seu benefício a normalidade e legalidade das transacções.

    I. O aludido conhecimento detido pela impugnante sobre o conteúdo dos actos tributários degrada a formalidade essencial em não essencial, devendo o vício de fundamentação eventualmente existente considerar-se por isso sanado, cfr. neste sentido o Professor Leite de Campos e os Juízes Conselheiros Silva Rodrigues e Lopes de Sousa, na anotação ao artigo 77° da LGT Comentada e Anotada, ed. Vislis, 3ª ed., pág.381 e ss.

    Sem conceder, J. Os actos impugnados resultam da não-aceitação pela Inspecção Tributária (IT) de factos declarados pela impugnante como constitutivos do seu direito à dedução do IVA pago a montante e não da afirmação pela IT da existência de factos tributários não declarados ou com dimensão diferente da declarada.

  8. É de salientar também que, no caso, não se pretende apurar a responsabilidade pelo incumprimento das obrigações fiscais da K..., emitente das facturas, como pretende a impugnante, mas aferir se as operações referidas nas facturas emitidas em nome da impugnante, correspondem ou não à realidade e, para esse efeito o comportamento fiscal da primeira, ainda que isoladamente considerado não seja determinante, não pode deixar de ser ponderado em conjunto com os demais indícios recolhidos pela Inspecção.

    L. Cabia à impugnante o ónus da prova da existência dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto, nos termos do disposto no artigo 19° n.° 3 do CIVA. Neste sentido, vide por todos o Ac. do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, in proc. n.° 1026/02, de 07/05/2003.

  9. No caso subjudice, a prova testemunhal e documental carreada nos autos pela impugnante não logrou comprovar a existência das operações subjacentes àquelas contestadas facturas.

  10. Não foi apresentada, nem em sede de procedimento inspectivo nem em sede de impugnação judicial qualquer evidência da veracidade das operações, na medida em que o apport probatório da impugnante é nulo ou muito deficitário.

  11. Não se verificando o vício de fundamentação sentenciado, padece a douta sentença de erro de julgamento em matéria de facto e de direito, por ter violado o disposto o disposto no artigo 77° da LGT, artigo 74º do mesmo diploma, artigo 19° n.°3 do CIVA e no artigo 123° n.º 1 do CPPT e artigo 659° n.º 2 do CPC, aplicável supletivamente, devendo considerarem-se válidos os actos tributários impugnados e, como tal, manter-se na ordem jurídica.

    Nestes termos, Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências.” ****Não houve contra-alegações.

    ****O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso (cfr. fls. 142).

    ****Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    ****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, ao decidir que os dados colhidos pela Administração Tributária (plasmados no relatório de inspecção) não foram de molde a fundamentar, formal (e, consequentemente, substancialmente), a conclusão retirada pela Administração Tributária de que as operações referidas nas facturas cujo IVA foi deduzido são simuladas.

    III. Fundamentação 1. Matéria de facto Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com fundamento nos documentos existentes nos autos, (incluindo o processo administrativo – P.A.), os quais não foram impugnados, considero suficientemente provados os seguintes factos, com relevância para a decisão da causa: A). Na sequência de uma acção inspectiva, foram efectuadas, à impugnante, três liquidações adicionais em sede de IVA e juros compensatórios, relativas ao ano de 1999, no valor de total de 116.611,64€ respectivamente, fls. 115 do P.A. junto aos autos B). Tais liquidações adicionais resultaram do facto de que a Administração...

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