Acórdão nº 03124/10.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | Jo |
Data da Resolução | 07 de Outubro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO DFM e CMOM, vieram interpor recurso do acórdão pelo qual o TAF do PORTO julgou improcedente a presente acção administrativa especial contra o Município do Porto, na qual figura como contra interessado “Condomínio do Edifício sito na Rua de SJB, n.ºs 302 a 438 e Rua das A... n.ºs 223 a 317, no Porto”, tendo em vista obter a declaração de nulidade ou a anulação dos despachos do Senhor Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade da Câmara Municipal do Porto, datados de 23/11/2006 e 13/02/2009, que determinaram a demolição da construção existente na varanda do imóvel dos Autores e a posse administrativa do imóvel, com vista à execução coerciva da ordem de demolição.
* Em alegações os RECORRENTES formularam as seguintes conclusões: I – Para que estejamos perante uma obra de construção civil exige-se que a construção em causa esteja ligada ao solo, ou a edifício pré-existente, e que tenha carácter de permanência. A este respeito, António Pereira da Costa define obra de construção civil como “o conjunto erigido pelo homem com quaisquer materiais, reunidos e ligados artificialmente ao solo ou a um imóvel com carácter de permanência, com individualidade própria e distinta dos seus elementos” (sublinhado do signatário).
II – Não é de considerar como “obra de construção” (maxime como obra sujeita a licenciamento), a aplicação, numa varanda, de um “sistema de painéis transparentes”, “adquiridos no estrangeiro”, “totalmente amovíveis”, que “recolhem de modo semelhante a uma cortina” e que, “quando estão totalmente recolhidos o espaço da varanda fica descoberto, ocupando os painéis cerca de 12 a 15 cm da varanda”, sendo a “recolha dos referidos painéis” “efectuada de modo rápido e manual, sem recurso a quaisquer instrumentos mecânicos ou outros auxiliares”, sendo “possível a qualquer pessoa proceder ao recolhimento da totalidade dos painéis em menos de dois minutos”, que tem um “tecto amovível, semelhante a um toldo, que quando recolhe ocupa cerca de ¼ do espaço aéreo sobrejacente à varanda” (cfr. als. W) a DD) da matéria de facto provada).
III – Tendo sido decido em sentido diverso, foi violado o disposto no artigo 4º, nº 2, al. c) do RJUE, sendo certo que os actos atacados padecem de violação de lei neste particular.
IV – Não é conforme aos princípios constitucionais da legalidade e da segurança jurídica a interpretação do disposto no artigo 4º, nº 2, al. c) do RJUE no sentido de que se encontra sujeita a licenciamento a aplicação, numa varanda, de um “sistema de painéis transparentes”, “adquiridos no estrangeiro”, “totalmente amovíveis”, que “recolhem de modo semelhante a uma cortina” e que, “quando estão totalmente recolhidos o espaço da varanda fica descoberto, ocupando os painéis cerca de 12 a 15 cm da varanda”, sendo a “recolha dos referidos painéis” “efectuada de modo rápido e manual, sem recurso a quaisquer instrumentos mecânicos ou outros auxiliares”, sendo “possível a qualquer pessoa proceder ao recolhimento da totalidade dos painéis em menos de dois minutos”, que tem um “tecto amovível, semelhante a um toldo, que quando recolhe ocupa cerca de ¼ do espaço aéreo sobrejacente à varanda”.
V – É de considerar que continua a ser um espaço aberto, que não concorre para a área bruta de construção, uma varanda ou terraço no qual tenha sido aplicado um “sistema de painéis transparentes”, “adquiridos no estrangeiro”, “totalmente amovíveis”, que “recolhem de modo semelhante a uma cortina” e que, “quando estão totalmente recolhidos o espaço da varanda fica descoberto, ocupando os painéis cerca de 12 a 15 cm da varanda”, sendo a “recolha dos referidos painéis” “efectuada de modo rápido e manual, sem recurso a quaisquer instrumentos mecânicos ou outros auxiliares”, sendo “possível a qualquer pessoa proceder ao recolhimento da totalidade dos painéis em menos de dois minutos”, que tem um “tecto amovível, semelhante a um toldo, que quando recolhe ocupa cerca de ¼ do espaço aéreo sobrejacente à varanda”.
V – Tendo sido decidido em sentido diverso, foi feita errada aplicação e interpretação do disposto no nº 5 do artigo 4º do PDM do Porto, sendo certo que os actos atacados padecem de violação de lei neste particular.
VI – As conclusões sobre “dissonância da linguagem arquitectónica do edifício” e prejuízo do “arranjo estético” do edifício encerram algum carácter de subjectividade e estão relacionadas com o saber e as leges artis da arquitectura. Nesta medida, e com o devido respeito, o intérprete jurídico, quando se pronuncia sobre tais matérias, deve ter alguma cautela e respeito pelo saber e leges artis da arquitectura.
VII – O Tribunal a quo considerou de modo assertivo (e, com o devido respeito, pouco ponderado) que o sistema de painéis transparentes em causa constituía “efectivamente” um elemento dissonante da linguagem arquitectónica do edifício” e que prejudicava o seu “arranjo estético”, todavia, estas conclusões não encontram arrimo na matéria factual apurada nos autos, na medida em que ficou demonstrado que os painéis são “transparentes” e que quando estão totalmente recolhidos o espaço da varanda fica descoberto, ocupando os painéis cerca de 12 a 15 cm da varanda”, que o sistema em causa é um “sistema de calhas técnicas e rolamentos”, que se encontra instalado de forma recuada, por relação ao gradado existente da varanda, sendo os elementos metálicos da mesma cor de tal gradado (cfr. als. EE) a HH) da matéria de facto provada) e que “do passeio do lado oposto da rua o referido sistema é praticamente invisível”, sendo que “existe uma árvore de grande porte, mesmo em frente à varanda dos Autores e que quando a mesma se encontra com folhas, o sistema não é visível, quer do passeio do lado oposto da rua quer do mesmo lado da rua (cfr. als. II) a JJ) da matéria de facto provada).
VIII – Neste particular, o Tribunal a quo deveria ter tido em consideração que foi ouvido, como testemunha dos recorrentes, o Sr. Arquitecto AJGM, que reside no edifício e que é nem mais nem menos que o arquitecto autor do projecto do edifício. Esta testemunha depôs em termos favoráveis à tese dos recorrentes, não tendo dúvidas em afirmar que o sistema de painéis transparentes em causa não traduzia qualquer dano estético (bem pelo contrário). Afirmou que foi consultado pelos recorrentes antes da colocação do sistema e que se mostrou favorável a tal ideia. O seu depoimento, considerado pelo Tribunal isento e credível (cf. a acta da resposta à matéria de facto), concorreu para a prova dos factos atinentes às características do sistema, que transmite as referidas ideias de leveza, transparência, consonância de cor e quasi invisibilidade.
IX – Assim, mesmo que o sistema de painéis transparentes estivesse sujeito a licenciamento, que não está, não se verificariam os obstáculos apontado na sentença recorrida ao seu licenciamento (dissonância da linguagem arquitectónica e prejuízo do arranjo estético), tendo sido feita errada aplicação e interpretação do disposto no artigo 24º do RJUE e do artigo 121º do RJUE, sendo certo que os actos atacados padecem de violação de lei neste particular.
X – A demolição consubstancia a medida mais onerosa da tutela da legalidade urbanística, que apenas poderá ser tomada após a realização de um juízo prévio de absoluta impossibilidade de licenciamento, ainda que com correcções/ alterações, sendo que tal juízo não foi levado a efeito no caso concreto, sendo certo que a ponderação sobre uma possível legalização deve ter lugar não apenas antes da execução do acto de demolição, como previamente à sua adopção (Cf. Carla Amado Gomes, “Embargos e demolições: entre a vinculação e a discricionariedade”, in Cadernos de Justiça Administrativa, nº 19, pp. 39 e ss.).
XI –A informação produzida pelo Departamento de Gestão Urbanística e Fiscalização (cfr. al. K) da matéria de facto provada), limita-se a dizer que a construção incorre no “incumprimento do PDM”, todavia, naquela informação não se fundamenta qual ou o porquê da incompatibilidade dos parâmetros urbanísticos e regulamentares, nomeadamente quais as disposições violadas e/ou característica factual da obra que constitua tal violação, bem como nada se referiu sobre a possibilidade ou impossibilidade de correcção da obra com vista à sua legalização. Mesmo com essa “informação” não pôde o recorrente ou qualquer outrem ficar ciente das razões que sustentam a decisão de demolição da obra, de forma a poder aceitá-la ou impugná-la em todos os seus aspectos. Assim sendo, a ordem demolição não foi sido precedida por um juízo esclarecido relativo à possibilidade de legalização de tais obras e nem resulta desse juízo a conclusão de que ela é impossível, mesmo com as modificações ou correcções.
XII – De todo o modo, a recorrente mulher, comproprietária do imóvel e casada no regime da separação de bens, nunca foi notificada dos despachos de demolição e de proposta da posse administrativa, e muito menos para proceder a qualquer alteração/ correcção do sistema, não lhe tendo sido dada qualquer oportunidade para o efeito. Mesmo para aquela doutrina que entende que a possibilidade de legalização ou juízo prévio de absoluta impossibilidade de licenciamento estão dependentes, de algum modo, da iniciativa do particular, a verdade é que (pelo menos) a um dos comproprietários do imóvel nunca foi dada oportunidade de tomar tal iniciativa.
XIII – Mantêm, assim, os recorrentes que não existiu in casu (o procedimento administrativo não o revela) a realização de um juízo prévio de absoluta impossibilidade de licenciamento, ainda que com correcções/ alterações, em violação do disposto do artigo 106º, nº 2 do RJUE e do princípio da proporcionalidade, padecendo os actos atacados do vício de violação neste particular.
XIV – Está adquirido nos autos que no processo administrativo não existe qualquer notificação dirigida à Autora mulher dando-lhe a conhecer a ordem de demolição e a posse...
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