Acórdão nº 00805/16.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | Lu |
Data da Resolução | 21 de Outubro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: MCV e marido ECG (Rua …) interpõem recurso jurisdicional de decisão do TAF de Braga que, em providência cautelar de restituição de posse, intentada contra Ren – Rede Eléctrica Nacional S.A.
(Avª …), se declarou materialmente incompetente e absolveu a ré da instância.
Concluem: I- Os Apelantes são donos e legítimos possuidores do prédio rústico que respeita à questão controvertida; II- a Apelada nunca encetou qualquer tipo de negociação ou contactou com os Apelantes a anteceder os atos que praticou no prédio rustico, III- A Apelada arrogou-se da qualidade de “…concessionária da exploração da Rede Nacional de Transporte Público (RNT), em regime de concessão de serviço público…”, IV- Enquanto concessionária da Rede Nacional de Exploração está conferida à Apelada o direito previsto no artigo 12º do Decreto-Lei nº 2972006, de 15 de Fevereiro, V- A atividade da Apelada enquadra-se no âmbito das relações jurídicas e administrativas, VI- O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga é competente em razão da matéria VII- A Mmª Juiz a quo violou o disposto no artº 4º, nº 1, al. g), do ETAF.
A recorrida contra-alegou, concluindo:
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O Tribunal "a quo" refere que nos termos do disposto no art.º 212, n.° 3 da CRP " compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais".
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Um litígio emergente de relações jurídico-administrativas ou fiscais, será uma controvérsia sobre relações jurídicas disciplinadas por normas de direito administrativo e/ou fiscal.
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Nos termos do disposto no art.° 212, n.° 3 da CRP " compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais".
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No âmbito do art.º 212, n.° 3 da CRP "estão em causa apenas os litígios emergentes de relações jurídico-administrativas (ou fiscais).
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Dispõe o art.º 40º n.° 1 da Lei n.° 62/2013, de 26/08 (Lei da Organização do Sistema Judiciário) que os tribunais judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.
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Da conjugação dos preceitos legais referidos, extrai-se a regra da competência residual dos tribunais judiciais, ou seja, a mesma estará excluída se a competência para julgar a causa estiver atribuída a outra jurisdição, nomeadamente, aos tribunais administrativos e fiscais.
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Entendeu o tribunal "a quo" que, no caso sub judice, os ora recorrentes peticionaram que fosse decretada a providência cautelar de restituição provisória da posse, providência que é instrumental da acção principal que irão intentar e que visará o reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio rústico cuja posse é pedida a restituição com fundamento em actos de perturbação e esbulho por parte da ora recorrida.
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O que está aqui em causa é um litígio onde se questiona o direito de propriedade dos recorrentes, com invocação de normas ligadas ao pedido de aquisição originária de tal direito, por via do instituto da usucapião e à aquisição derivada, por via do instituto da compra e venda.
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A questão sub judice não se enquadra assim, em nenhuma das alíneas do n.° 1 do art.° 4º do ETAF, porquanto o que importa dirimir é um litígio emergente de urna relação jurídico-administrativa, pelo que o tribunal "a quo" absolveu (e bem) a ora recorrida da instância por se considerar materialmente incompetente para conhecer do pedido formulado pelos ora recorrentes.
*O Exmª Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de provimento do recurso.
*Cumpre decidir, dispensando vistos.
*Circunstancialmente, podemos alinhar que, em termos que aqui se dão como reproduzidos: 1.º - Os recorrentes peticionaram a restituição provisória de posse de prédio rústico (cfr. req. inic.
); 2.º - A Mmª Juiz convidou os requerentes “a identificar a Acção e, em termos sumários, indicarem o pedido e a causa de pedir da acção principal de que a presente providência dependerá” (cfr. fls. 16/16V.
); 3.º - Ao que os requerentes responderam, assim (cfr. fls. 20/1): 1) Os Requerentes intentaram os presentes autos de providência cautelar previamente à ação principal que dará entrada neste douto Tribunal.
2) Esses autos serão intentados sob a forma de Ação Administrativa Comum, com cumulação de pedidos. Assim.
3) Os Requerentes irão pedir o reconhecimento pela Requerida do direito de propriedade daqueles sobre o prédio rústico, 4) Invocarão o enriquecimento sem causa do Requerida e, bem ainda, 5) a condenação da aqui requerida no pagamento da indemnização decorrente da imposição de sacrifícios. Com efeito, 6) A Requerida tem pautado a sua conduta como se o prédio rustico fosse seu, 7) Extraiu do solo do prédio rústico saibro para a composição do betão armado.
8) cortou arvores em áreas não quantificadas, 9) procedeu à venda das mesmos e integrou no seu patrimônio o produto da venda, 10) alterou, por rebaixamento, a cota do prédio rústico e, 11) construiu caminhos no prédio rústico dos Requerentes. Ora, 12) A factualidade supracitado era do inteiro desconhecimento dos requerentes, conforme se alegou na petição inicial.
13) Face ao exposto, paradoxalmente, a Requerida tem atuado como se o prédio rústico fosse seu e, por essa via, ocorreu a inversão do titulo de posse -com o qual os Requerentes não se conformam, não toleram nem a aquela atua a coberto da Lei.
4.º - Por decisão de 06/06/2016, o tribunal declarou-se materialmente incompetente e absolveu a ré da instância (cfr. fls. 46-51).
*O Direito: A decisão recorrida teve em fundamentação: «(…) A determinação da competência do tribunal em razão da matéria é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer matéria, sendo questão de conhecimento oficioso, pelo que passaremos, desde já, a apreciar a competência material do Tribunal Administrativo para a apreciação e decisão do presente litígio (Cfr. artigos 96.º e 97.º n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do art.º 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e art.º 13.º do CPTA).
Nos termos do disposto no art.º 212.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP) “compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.” Em anotação a este preceito (então art.º 214.º), Gomes Canotilho e Vital Moreira (in Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª Edição, pág...
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