Acórdão nº 02165/14.5BESNT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelEsperan
Data da Resolução08 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte 1. Relatório S... – SERVIÇOS E TECNOLOGIA DA SEGURANÇA, S.A., interpõe recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Braga, de 21.09.2015, que julgou improcedente a ação de contencioso pré-contratual que a Recorrente intentou contra RESINORTE – VALORIZAÇÃO E TRATAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS e, como contrainteressadas, V... – PREVENÇÃO E VIGILÂNCIA LDA; P... – SEGURANÇA PRIVADA, SA; R... – RONDAS E SEGURANÇA, LDA.; SG... – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE SEGURANÇA E VIGILÂNCIA, LDA; C... – SERVIÇOS E TECNOLOGIA DE SEGURANÇA, SA; e E... – PORTUGAL DE SEGURANÇA, SA, na qual peticiona, além do mais, a anulação do ato de adjudicação, à V..., LDA, do procedimento de concurso público para a prestação de serviços de segurança, vigilância e portaria no aterro sanitário de Condessoso.

A Recorrente apresentou alegações, onde conclui nos seguintes termos, que delimitam o objeto do recurso: 1.ª O presente Recurso é apresentado nos termos do artigo 37.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de dezembro, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 182/2007, de 9 de maio e nos artigos 142.º, 144.º, n.º 1 e 147.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, porquanto todos os seus pressupostos se acham preenchidos.

  1. O fundamento da ação de contencioso pré-contratual trazida aos autos de 1.ª instância residiu, essencialmente, na circunstância de os preços propostos pelas contrainteressados V..., P..., R... e Sg... no procedimento tramitado pela Resinorte – Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos, S.A. se revelarem insuficientes para cobrir os custos legal e regularmente obrigatórios, associados à prestação dos serviços em causa naquele procedimento, e no contrato que entretanto haja sido celebrado, nomeadamente os custos resultantes de normas imperativas de natureza laboral e social.

  2. Numa palavra: a questão trazida aos autos pela S... foi a de saber se, por revelarem preços insuficientes para cobrir os custos implicados na prestação dos serviços em causa pelo procedimento tramitado, maxime custos relativos aos custos laborais e sociais juridicamente obrigatórios, as propostas daqueles concorrentes deveriam, ao contrário do decidido pelo Conselho de Administração da Resinorte – Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos, S.A. ter sido excluídas.

  3. No Acórdão recorrido, limitou-se o Tribunal a quo a (i) de um lado, identificar a questão sob tratamento como “aferir da legalidade do ato de adjudicação do procedimento concursal à proposta apresentada pela contrainteressada “V... – Prevenção e Vigilância LDA”, nomeadamente se o ato de adjudicação viola o preceituado no art 70.º, n.º 2, alíneas e), f), e g) e se são devidos os actos a cuja prática a Autora pede a condenação da Ré”, (ii) de outro e (ii) por fim, concluir que os preços apresentados pelas contra-interessadas “V... – Prevenção e Vigilância Privada, Lda.”, “P... – Segurança Privada, S.A.”, “R... – Rondas e Segurança, Lda.” e “Sg... – Prestação de Serviços de Segurança e Vigilância, Lda.”, estão bem acima do preço considerado anormalmente baixo no referido artigo (71.º, n.º1, alínea b), sendo assim verosímil que tais preços não suscitassem dúvidas ao Júri do concurso quanto à sua conformidade com as vinculações legais ou regulamentares aplicáveis.”.

  4. Em concreto, o que resulta do Acórdão recorrido são duas teses jurídicas diferenciadas, situadas em dois diferentes planos de argumentação.

  5. O entendimento último do Tribunal a quo é o de que não se preenchendo o critério de qualificação do preço como anormalmente baixo, previsto no artigo 71.º do CCP não haveria fundamento para que o júri tomasse por evidente a violação da legislação em vigor – eis a primeira tese jurídica.

  6. Aceitando porém que os referidos custos mínimos obrigatórios pudessem ser determinados não haveria, em qualquer caso, qualquer amparo no Direito da Contratação Pública para que propostas das contrainteressadas viessem a ser excluídas – eis a segunda tese jurídica.

  7. O facto de o apuramento dos referidos custos mínimos e da insuficiência das propostas das contrainteressadas não resultar da matéria de facto assente não converte o exercício que se requer a este Tribunal Central Administrativo num exercício meramente condicional, sem que possa ser aplicado de forma definitiva aos autos.

  8. Com efeito, foi a assunção daquela primeira tese jurídica – segundo a qual a insuficiência para suportar tais custos mínimos não determina que a proposta seja de preço anormalmente baixo – que bloqueou o próprio Tribunal a quo ao seu apuramento e confronto in casu.

  9. O Acórdão recorrido não se limitou pois a simplesmente dispensar o apuramento desses custos mínimos; mais profundamente, o que o coletivo de juízes verteu na sua decisão foi a conclusão, logicamente anterior, segundo a qual seria compreensível que os preços propostos no Procedimento “não suscitassem dúvidas ao Júri do concurso quanto à sua conformidade com as vinculações legais ou regulamentares aplicáveis”, sendo esta uma conclusão jurídica cuja apreciação cabe no âmbito deste Recurso.

  10. Também cabe neste Recurso a apreciação da segunda tese jurídica enunciada no Acórdão recorrido, isto é, a tese segundo a qual inexistiriam mecanismos no Direito da Contratação Pública que imponham a exclusão das propostas abaixo do preço de custo apresentadas pelas concorrentes V..., P..., R... e Sg....

  11. Assim, constituem objeto da presente revista duas questões de Direito: (1) Na formação de preços de propostas para a prestação de serviços de segurança e vigilância apresentadas em sede de procedimentos pré-contratuais, os concorrentes estão subordinados a um conjunto de custos mínimos obrigatórios de matriz laboral e social que resultam das normas legais, regulamentares e convencionais aplicáveis? (2) No Direito da Contratação Pública existem mecanismos que imponham ao Júri dos procedimentos a exclusão de propostas cujo preço não reflita o cumprimento desses custos mínimos obrigatórios? A) O erro de julgamento de Direito do Tribunal a quo refletidos na não aplicação dos mecanismos que, no Direito da Contratação Pública, impõem a exclusão de propostas cujo preço se situe abaixo do preço de custo 13.ª Da perspetiva da entidade adjudicante, não pode admitir-se que, na análise das propostas que lhe são apresentadas, esta venha a bastar-se com elementos de todo em todo genéricos e incompletos, não valendo neste contexto vir argumentar que o CCP ou as peças do procedimento não impõe aos concorrentes a decomposição detalhada dos preços apresentados. É que é o próprio Direito da Contratação Pública que, por mais do que uma via, faz recair sobre os Júris dos procedimentos pré-contratuais a obrigação de não selecionar propostas cujos preços apresentados se revelem, perante os dados objetivamente resultantes de todo o bloco legal, insuficientes para cobrir as exigências laborais ou sociais implicadas nos serviços a prestar.

  12. A primeira dessas vias é a causa de exclusão prevista na alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP, em cujos termos “são excluídas as propostas cuja análise revele […] que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis”.

  13. Através desse mecanismo, são convocadas para a operação de confirmação da aceitabilidade de uma proposta todas as normas que integram o ordenamento jurídico e que são suscetíveis de parametrizar o conteúdo do “contrato a celebrar”.

  14. Subjacente a esta causa de exclusão está, pois, e desde logo, o princípio da legalidade, nos termos do qual, como é sabido, a Administração se encontra vinculada a se abster da elaboração de qualquer regulamento, da aprovação de qualquer ato, da celebração de qualquer contrato ou da execução de qualquer operação material que ofenda o bloco de juridicidade.

  15. É precisamente o conteúdo normativo do princípio da legalidade que permite esclarecer qual seja a solução jurídica a aplicar aos casos em que a entidade adjudicante detete que as prestações do contrato a celebrar, tal como foram configuradas na proposta a que o concorrente se vinculou irrevogavelmente (artigo 65.º do CCP), não podem ser executadas sem que o adjudicatário incorra numa ilegalidade.

  16. Nenhuma preterição do princípio da legalidade das competências e das atribuições existe quando uma entidade adjudicante, no exercício das responsabilidades inelimináveis de análise de propostas que o legislador lhe cometeu nos termos previstos nos n.

    os 1 e 2 do artigo 70.º, no n.º 1 do artigo 124.º, no n.º 2 do artigo 146.º e nos n.

    os 1 e 4 do artigo 148.º do CCP, se depara com um conjunto de informações que lhe atestam, sem margem para dúvidas, que a adjudicação da proposta que tem em mãos conduziria à celebração de um contrato que não poderia ser executado sem desrespeito por normas legais ou regulamentares que vinculam uma ou ambas as partes.

  17. Aquela alínea f) permite – e impõe, sob pena de incumprimento do mandato que dela consta – que cada entidade adjudicante verifique se o teor da proposta contém, explícita ou até implicitamente, informações que demonstram que o clausulado de um contrato celebrado na sequência da adjudicação dessa proposta seria desconforme com as vinculações legais e regulamentares a que as partes estão sujeitas.

  18. Pode então suceder que – tal como no caso dos autos – embora a proposta de preço superior ao limiar do preço anormalmente baixo adotado no Caderno de Encargos, não contenha direta e explicitamente uma condição de teor ilegal, ainda assim a entidade adjudicante continue a verificar, com base no somatório das informações que dela constam, ser juridicamente impossível que o clausulado proposto satisfaça normas legais ou regulamentares vinculativas para ela própria ou para o proponente.

  19. Nessas hipóteses, tem aplicação a alínea f) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP: a...

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