Acórdão nº 01144/04.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | H |
Data da Resolução | 22 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrentes: O Réu Centro Hospitalar de São João, EPE Os Autores RMPM e outros Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a supra identificada acção administrativa comum e condenou o Hospital Réu “a pagar a cada um dos AA., HFFM; IFFM; IMFMQS, indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 35.000,00 bem assim como ao A., JBFC, indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 30.000,00 acrescidas de juros desde a notificação desta sentença”.
O objecto do recurso interposto pelo Centro Hospitalar de São João, EPE, é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): A. “O presente recurso vem interposto da sentença que condenou o Centro Hospitalar de São João, E.P.E. (adiante “CHSJ”) a pagar a cada um dos Autores HFFM, IFFM e IMFMQS uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de 35.000€, bem assim como ao Autor JBFC, uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de 30.000€, acrescidas de juros desde a notificação da sentença; B. O Meritíssimo Juiz a quo errou por completo na decisão recorrida porque fez uma incorrecta apreciação da prova produzida, violando, desta feita o disposto nos artigos 653.º, n.º 2 e 659.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 140.º do CPTA; C. A violação das disposições legais referidas em B) radica no facto de o Tribunal Recorrido, apesar de dar por reproduzido na matéria de facto assente o teor dos relatórios periciais juntos aos autos, ter ignorado olimpicamente os mencionados relatórios e se ter negado a fazer uma apreciação crítica das provas; D. Consequentemente, a sentença recorrida espelha uma desadequada decisão sobre a matéria de facto, que conduziu, por sua vez a um indevida e errada aplicação do direito, vulnerando, por esse motivo, o disposto no artigo 659.º, n.º 2 do CPC, aplicável ex vi artigo 140.º do CPTA; E. O erro no julgamento da matéria de facto incide sobre os quesitos 2.º, 3.º, 8.º, 9.º-A, 15.º e 16.º da Base Instrutória (adiante “BI”); F. A factualidade constante dos quesitos 2.º e 3.º da BI prende-se com o local onde a entubação para ventilação foi efectuada, se no esófago ou na traqueia, sendo que o Tribunal Recorrido concluiu que tinha sido feita no esófago; G. Este julgamento não é correcto porquanto nenhuma das testemunhas em cujos depoimentos o Tribunal alicerçou o julgamento destes quesitos menciona que a entubação foi realizada no esófago, ao que acresce que os peritos que produziram o Relatório Pericial junto aos autos (fls. 462 a 464) consideram que os registos da auscultação pulmonar da vítima revelam que a entubação foi feita na traqueia, entendimento que foi corroborado pela Perita consultada pela Inspecção-Geral de Saúde (Relatório Pericial fls. 453 a 461) e ainda, segundo a única testemunha que esteve presente desde o início da cesariana – o Enf. FRJTR –, se a entubação tivesse sido feita na posição esofágica, a vítima não teria tido saturações tão boas durante tempo, nem os sinais vitais teriam aguentado tanto tempo [depoimento de MACAF com início de gravação às 9:30:02; depoimento de MFA com início de gravação às 11:13:59; depoimento de JMRC com início de gravação às 11:48:23 e depoimento de FRJTR com início de gravação às 12:21:40]; H. A decisão da matéria de facto quanto ao quesito 8.º da BI enferma de erro de julgamento ao considerá-lo “Não provado”. Neste quesito questiona-se se a constatação do tubo em posição esofágica poderia ficar a dever-se às manobras de massagens cardíacas; I. Uma vez que as anestesistas da equipa B afirmaram que quando a posição do tubo foi verificada já tinham sido iniciadas as massagens cardíacas e porque resulta claro do Relatório Pericial junto aos autos (fls 462 a 464) que a constatação do tubo em posição esofágica pode resultar das manobras de ressuscitação com massagem cardíaca externa, o Tribunal a quo errou ao dar como “Não provado” o quesito 8.º [depoimento de MACAF com início de gravação às 9:30:02; depoimento de MFA com início de gravação às 11:13:59]; J. No quesito 9.º-A da BI, julgado “Não provado”, procura-se apurar se o procedimento protocolar assumido em situação de necessidade de ressuscitação face à iminência de paragem cardíaca é pedir auxílio; K. A decisão do Tribunal Recorrido relativamente ao quesito 9.º-A da BI é incompreensível porquanto, não só as duas anestesistas da equipa B foram unânimes em responder que nas situações descritas o procedimento a adoptar é pedir ajuda, como também o Relatório Pericial junto aos autos (fls. 453 a 461) refere que não era de prever o desencadeamento de um bronco espasmo tão intenso e resistente que justificasse um pedido antecipado de ajuda [depoimento de MACAF com início de gravação às 9:30:02; depoimento de MFA com início de gravação às 11:13:59]; L. O quesito 15.º da BI, julgado “Não provado”, versava sobre a possibilidade de o bronco espasmo ter origem numa conjugação de factores, tais como, tabagismo, estado gravídico, e emergência da intervenção; M. A decisão proferida sobre este quesito é, outrossim, errada porque a prova produzida conduz exactamente ao entendimento contrário, quer o Relatório Pericial (fls. 458), quer o depoimento de uma das médicas anestesistas do qual resulta inequivocamente que o tabagismo e o edema externo característico da gravidez podem desencadear um bronco espasmo [depoimento de MACAF com início de gravação às 9:30:02]; N. No quesito 16.º da BI, julgado “Não provado”, onde se procura averiguar se era previsível o desencadear de um bronco espasmo tão intenso de forma a justificar um pedido antecipado de ajuda, o Relatório Pericial (fls. 458) é inequívoco conduzindo a uma resposta no sentido contrário ao que veio a ser julgado; O. Os erros cometidos no julgamento da matéria de facto, em franca violação do disposto no artigo 659.º, n.º 2 do CPC, conduziram o Tribunal a quo a fazer uma deficiente e equívoca aplicação do direito no apuramento da verificação de dois dos requisitos da responsabilidade civil extracontratual: a culpa e a ilicitude, conforme disposto no artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967; P. Inexiste culpa dos agentes do CHSJ porque, face à factualidade apurada por via da prova testemunhal produzida e dos relatórios periciais juntos aos autos, ficou demonstrado que não existiu qualquer desvio ou desconformidade entre o seu comportamento e a “conduta padrão” à luz da qual deve ser aferida a existência de culpa como disposto no artigo 4.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48.051 e do artigo 487.º do Código Civil; Q. Inexiste outrossim ilicitude. O Tribunal a quo errou ao concluir pela violação da legis artis por parte dos agentes do CHSJ, quer no momento da indução da anestesia, quer nos cuidados prestados entre a anestesia e a paragem cardíaca, quer os prestados na sequência da paragem cardíaca, porque não violaram qualquer norma técnica ou protocolar que previsse a adopção de procedimentos diferentes da conduta efectivamente seguida por eles; R. Inexistindo culpa e inexistindo ilicitude, o Tribunal Recorrido ao condenar o Recorrente ao pagamento de uma indemnização violou o artigo 2.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48.051 que pressupõe a verificação cumulativa dos pressupostos de responsabilidade civil extracontratual de pessoas colectivas públicas: a culpa, a ilicitude; o facto danoso e o nexo de causalidade.
POR FIM, S. Na eventualidade de improceder a argumentação acima exposta pelo Recorrente no que ao julgamento da matéria de facto e à aplicação do direito respeita, que conduzem, na sua convicção, à improcedência do pedido, o certo é que, ainda que assim não se entenda, o Tribunal a quo errou na aplicação que fez do art.º 496.º, n.º 2, do Código Civil ao atribuir uma indemnização ao pai da vítima, o Autor JBFC; T. Por força do “princípio do chamamento sucessivo” contido nesse preceito legal, o pai da vítima só deveria ser chamado se não existissem descendentes, conforme resulta da expressão contida no art.º 496.º, n.º 2 “na falta destes”, ao fazer a passagem do 1.º grupo para o 2.º grupo de sujeitos beneficiários da indemnização por danos não patrimoniais em caso de morte.
Termos em que, e nos mais de direito que V.ªs Ex.ªs doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença e, em conformidade julgando a presente acção totalmente improcedente, com as legais consequências, ou, caso assim não se entenda, revogar a sentença na parte em que atribui uma indemnização ao pai da vítima, o autor JBFC, com o que V.Exªs farão sã e costumeira JUSTIÇA!” O objecto do recurso interposto pelos Autores é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação: I. “O presente recurso versa, apenas e só, sobre a parte da decisão proferida pelo Tribunal a quo que julgou improcedente a alínea d) do pedido formulado na Petição Inicial, a saber: d) ao A. RMPM, na qualidade de legal dos menores HFFM e IFFM, a quantia de 128.080,00 euros, acrescida de juros legais vincendos desde a sua citação até efectivo e integral pagamento; (valor resultante do requerimento de aperfeiçoamento junto aos autos em 02/10/2006) II. Conformando-se os Recorrentes com tudo o mais decidido na sentença ora em crise.
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O julgador fundamentou a improcedência do pedido formulado na alínea d), da seguinte forma: “… Também quanto às demais despesas suportadas pelo A., RMPM, em representação dos seus filhos menores, resultantes da infeliz ocorrência com a sua mãe, não se logrou provar aquilo que vinha alegado a tal título.
Na verdade, a factualidade elencada relativa às concretas despesas que o A. RMPM, pai das duas crianças menores filhas de FCFS, teria com a habitação/ educação/saúde/alimentação /vestuário das mesmas não foi alcançada a sua prova.
…” IV. Encontramos nos autos factos alegados e provados que permitiriam julgar de forma diferente...
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