Acórdão nº 00195/09.8BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução28 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório I..., S.A., com o NIPC 5…e melhor identificada nestes autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 16/04/2015, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação do IVA e juros compensatórios, do ano de 2004, no valor de € 42.807,25.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1 - A Administração Tributária limitou-se a considerar que a contabilidade da sociedade recorrente não reflectia a situação patrimonial exacta e verdadeira, presumindo que determinados valores constituíram proveitos omissos devido a vendas não declaradas pela referida sociedade, e presumindo ainda a concessão pela sociedade V... à ora recorrente de um crédito indevido, pelo que em bom rigor, deveria ter recorrido à aplicação de métodos indirectos, com respeito por todas as garantias dos contribuintes acrescidas em tais situações.

2 - Ora, os elementos aos quais a Administração Tributária teve acesso durante a acção de fiscalização aqui em causa, não constituíam elementos contabilísticos da sociedade recorrente, mas tratava-se antes de documentos extra-contabilísticos - apreensão de documentos referentes ao período de 2002 até ao primeiro semestre de 2004, cópia de ficheiros informáticos efectuadas durante a acção de fiscalização tributária aqui em causa e extractos bancários de uma conta particular.

3 - Para além disso, a Administração Fiscal não conseguiu obter suporte documental na contabilidade da sociedade recorrente, que servisse de fundamento às correcções efectuadas com base em tais elementos.

4 - Assim, as correcções efectuadas pela Administração Tributária na contabilidade da sociedade recorrente deveriam ter sido introduzidas com recurso à aplicação de métodos indirectos, com todas as garantias acrescidas para o contribuinte, nomeadamente, a possibilidade de recorrer ao expediente administrativo previsto no artigo 91° da Lei Geral Tributária, o que foi admitido pelo próprio juiz “a quo” na sentença de que ora se recorre, relativamente à correcção das vendas não declaradas, tendo contudo considerado o conhecimento de tal questão prejudicado pelo facto da correcção em causa ter sido declarada ilegal por erro nos pressupostos de facto.

5 - Para além disso, nos termos do disposto no número 3 do artigo 75° da Lei Geral Tributária, a força probatória dos dados informáticos dos contribuintes depende, salvo o disposto em lei especial, do fornecimento da documentação relativa à sua análise, programação e execução e da possibilidade de a administração tributária os confirmar, o que mais uma vez não sucedeu no caso concreto, circunstância sobre a qual o Meritíssimo Juiz “a quo” nem sequer se pronunciou na sentença de que ora se recorre.

6 - Por outro lado, a liquidação de imposto aqui em causa teve origem no levantamento do sigilo bancário obtido no âmbito da acção inspectiva levada a cabo à sociedade I..., S.A., relativamente à conta bancária número 1…, do Finibanco de Aradas, cujos respectivos titulares são A1..., A2... e A3..., e não os administradores da sociedade recorrente, conforme é referido na sentença de que ora se recorre e sucessivamente afirmado pelo Inspector Tributário ao longo do seu depoimento.

7 - Ora, nos termos do disposto no número 7 do artigo 63°-B da Lei Geral Tributária, o acesso da administração tributária a informação bancária relevante relativa a familiares ou terceiros depende de autorização judicial expressa.

8 - Por outro lado, “os sócios e/ou administradores duma empresa que está a ser alvo de uma inspecção não podem deixar de considerar-se, para este efeito, terceiros, ainda que se encontrem numa relação especial com aquela” - Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 26 de Abril de 2007, proferido no âmbito do processo número 0187/07, e de 16 de Fevereiro de 2005, proferido no âmbito do processo número 01395/04, in base de dados em suporte informático - www.dgsi.pt.

9 - Com efeito, no caso em apreço, na sequência da acção inspectiva que se encontrava a decorrer ao sujeito passivo I..., S.A., tendo-se apurado a existência de uma conta bancária, de que são titulares A3... e mais dois accionistas da mesma sociedade, a Administração Fiscal entendeu necessário aceder a essa conta bancária, para efeitos de averiguar a situação tributária da sociedade recorrente.

10 - Ora, nos termos do número 8 do artigo 63°-B da LGT, o acesso a informação bancária deve obedecer aos requisitos previstos no número 4 do mesmo artigo, entre os quais a audição prévia do contribuinte, neste caso, A3..., A1... e A2..., que não foram notificados para exercer tal direito de audição prévia, razão pela qual o pedido de derrogação está ferido de ilegalidade, e consequentemente todos os actos de liquidação de imposto levados a cabo com base na informação bancária obtida de forma ilegal.

11 - Por outro lado, também o artigo 146°-C do Código de Procedimento e de Processo Tributário preceitua que quando a administração tributária pretenda aceder à informação bancária referente a familiares do contribuinte ou de terceiros com ele relacionados, pode requerer ao Tribunal Tributário de 1.ª instância da área do domicílio fiscal do visado a respectiva autorização, sendo o visado notificado para, querendo, deduzir oposição no prazo de 10 dias, a qual deve ser acompanhada dos respectivos elementos de prova, preceito legal este que foi violado no caso concreto.

12 - E nem sequer se diga, conforme parece fazer crer o Exmo. Representante da Fazenda Pública, na sua douta contestação, que os contribuintes deveriam ter reagido contra a ilegalidade do processo de derrogação do sigilo bancário, através dos meios legalmente previstos nos artigos 146°-A e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez que os titulares da conta bancária aqui em causa, não foram sequer notificados pela Administração Tributária da respectiva decisão de derrogação do sigilo bancário, conforme imposto legalmente, não podendo dela recorrer no prazo de dez dias, conforme a lei lhes permite.

13 - O Meritíssimo Juiz do tribunal “a quo” afirma na sentença de que ora se recorre “De facto, a AT teve acesso aos elementos bancários dessa conta, não titulada pela Impugnante através de documentação fornecida na sequência da busca e apreensão levada a cabo pelos Serviços do Ministério Público de Aveiro e Polícia Judiciária de Aveiro”, o que não corresponde à realidade.

14 - Ora, os únicos elementos bancários que a Polícia Judiciária apreendeu constam do auto lavrado no segundo dia de buscas. Esses elementos eram relativos aos anos de 2002, 2003 e até meados de 2004.

15 - Por outro lado, se analisarmos os anexos ao relatório da inspecção tributária aqui em causa, percebemos que constam muitos mais elementos bancários, que foram obtidos através de derrogação do sigilo bancário, conforme aliás admitido pelo próprio técnico da inspecção tributária no seu depoimento e no próprio relatório final da inspecção, no ponto 1 subordinado ao tema Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção”, 3º parágrafo - “No entanto, no caso concreto, tendo existido a derrogação do sigilo bancário relativamente a uma conta individual dos administradores da I..., S.A. “ e mais adiante no capítulo III.1.2.2 subordinado ao tema “Repatriamento de capitais para a esfera individual dos administradores da I... - 2° parágrafo - página 36 - “Foram solicitados ao Finibanco extractos daquela conta desde 01/01/2003 até Janeiro de 2008, bem como cópias de todos os documentos de suporte dos movimentos bancários, tendo os respectivos elementos sido entregues pela instituição bancária.

16 - Assim, não restam dúvidas que foi derrogado o sigilo bancário, conforme admite o próprio inspector tributário - minuto 01:12:04 - mas sem cumprimento dos procedimentos legalmente impostos e supra referidos, o que determina a anulação da liquidação de imposto aqui em causa.

17 - As situações de duplicação de guias de transporte e de descontos fictícios só ocorreram até meados de 2004 - - depoimento J... - minuto: 00:29:36 e depoimento P... - minuto 01:28:00.

18 - Em relação às compras efectuadas aos fornecedores R... e pela D..., ficou provado através do depoimento das testemunhas arroladas pela sociedade recorrente que esta comprou àquelas duas empresas vários lotes de madeiras desclassificadas, pelo que não sabia se os conseguiria utilizar e qual o aproveitamento que era possível efectuar dos mesmos.

19 - Com efeito, tratava-se de aparas de material, ou seja, réguas de madeiras de reduzidas e muito heterogéneas dimensões, que se destinavam à produção de parquete mosaico (a sociedade impugnante é o único produtor ao nível mundial deste produto, nestas dimensões), destinado a satisfazer sobretudo as encomendas do mercado externo - Inglaterra - PortableFloorMarkers - empresa produtora de pavimentos de dança destinados ao mercado global.

20 - Com efeito, a actividade daquelas duas sociedades (R... e D...) é a importação de madeiras, serração de madeiras e venda destes produtos e mercadorias a um mercado constituído maioritariamente por carpintarias mecânicas.

21 - Na sua actividade regular, vão acumulando restos de madeiras e lotes não susceptíveis de venda, pelas suas características, pela falta de qualidade, dimensões não comerciais, algum defeito particular, etc.

22 - Estas madeiras eram propostas à sociedade ora recorrente e vários negócios foram concretizados, da seguinte forma: tendo em conta as condições não classificáveis dos lotes em causa, o fornecedor facturava todas as medidas aos preços normais, com o compromisso da sociedade ora recorrente, após a utilização das referidas madeiras na sua produção e, depois de verificar o respectivo rendimento ou grau de aproveitamento, identificar o...

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