Acórdão nº 02363/15.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelAlexandra Alendouro
Data da Resolução04 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO MFS interpôs recurso da sentença proferida pelo TAF de BRAGA que julgou improcedente, por falta de verificação do requisito previsto no art.º 120.º, n.º 1, alínea b), in fine do CPTA, a providência cautelar intentada contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA/SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS de suspensão de eficácia dos seguintes actos: (i) “decisão de não apreciação da manifestação de interesse efectuada em 28/07/2014, ao abrigo do disposto no art.º 88.º, n.º 2, da Lei 23/2007, de 04 de Julho” (Autorização de residência para exercício de actividade profissional subordinada), proferida em 28/10/2014 e notificada em 13/11/2014; (ii) “decisão de não apreciação do pedido efectuado em 21/11/2014 de reapreciação e reclamação da anterior decisão” [que determinou ainda o abandono voluntário do território nacional], proferida em 05/05/2015 e notificada em 15/05/2015; (iii) “decisão de abandono voluntário de território nacional nos termos do art.º 138.º da Lei 23/2007” “sob pena de incorrer no procedimento de afastamento coercivo previsto nos art.ºs 146.º e ss da mesma lei”, proferida e notificada em 13/11/2014; (iv) “decisão de manutenção do prazo de abandono do território nacional” notificada em 20/05/2015.

* A Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões: “Salvo o devido respeito a recorrente discorda da apreciação e da aplicação da matéria de direito com base nos seguintes termos e fundamentos: Pretendeu a requerente com a Providência cautelar prevenir o seu direito de permanência em território nacional através do seu pedido efetuado ao serviço de estrangeiros e fronteiras, sob o art.º 88/2 da lei 23/2007 de 04/07, na sua atual redação, como trabalhadora subordinada, efetuado na data de 25 Julho de 2014 (doc.s 5 e 6 da providência cautelar). Não obstante, em Novembro de 2014, este serviço proferiu decisão e notificou de que se deverá “manter a informação de não apreciação” do seu pedido de autorização de Residência (o que se pressupõe, com o devido respeito e na nossa melhor opinião, que o primeiro pedido de autorização de residência apresentado pela requerente, também não foi analisado). Pelo que, concluindo de acordo com a decisão: “O PEDIDO NÃO SERÁ OBJECTO DE APRECIAÇÃO”. Nessa mesma data foi notificada de que deveria abandonar o território nacional no prazo de 20 dias. Perante tal ato resta à requerente invocar a nulidade de tal decisões pois omitiu uma questão fundamental para além de faltar à verdade que prejudicou seriamente a vida da requerente em Portugal. Esta vive há vários anos no nosso País. Trabalha desde 02 de julho de 2014, para a empresária em nome individual, Exma. Sra. Maria Cláudia Rodrigues de Barros Azevedo, relação laboral comprovada através de contrato de trabalho, está inscrita e contribuiu para a segurança social já em agosto de 2008, cfr extrato de remunerações constante nos autos.

- É inaceitável que se expulse esta cidadã estrangeira para o país de origem porque se proferiu uma decisão de não analisar o pedido de autorização de residência pendente no serviço de estrangeiros e fronteiras, como trabalhadora subordinada. Mais inaceitável, ainda é o tribunal considerar que todos estes fatos correspondem à verdade mas que a segurança interna e a ordem pública justificam uma prevalência do interesse público, devendo prevalecer sobre esta estrangeira que invoca interesse meramente particulares.

A pretensão cautelar da requerente ao contrário do alegado merece acolhimento nos termos do 120.º do CPTA, ao contrário do doutamente decidido na presente sentença. Não se conforma, a recorrente com a douta sentença que sobrepõe os interesses concernentes a ordem interna e a ordem pública a justificar uma prevalência do interesse público da lei 23/2007 de 04/07, na sua atual redação, sobre os interesses particulares da recorrente, considerando estes menos valiosos no campo em apreço.

O interesse particular da recorrente sobrepõe-se a esta proteção de ordem pública e de segurança interna até porque jamais a poderiam colocar em risco atendendo ao cumprimento por parte da recorrente de todas as suas obrigações no país cfr. histórico da segurança social, comprovando a sua situação regularizada perante as finanças, ausência de registo criminal, entre outros.

Existe ainda a questão formal, ou seja, a recorrente foi duplamente prejudicada, por um lado, foi surpreendida com a sentença recorrida, quando aguardava data para a inquirição das testemunhas arroladas na Petição Inicial. O tribunal a quo errou ao não admitir a inquirição das testemunhas indicadas, violando as regras do princípio do ónus da prova, e com tal erro prejudicou gravemente a recorrente.

Mais, verifica-se erro da sentença recorrida, pois mostra-se evidente que deveria ter concedido provimento à presente providência, segundo o critério da evidência. Toda a matéria de facto que fundamenta o nosso juízo sobre a manifesta e evidente ilegalidade do ato administrativo consta dos autos e, temos de voltar a referir, inexiste necessidade de outro meio de prova para proferir um juízo, ainda que sumário, sobre a existência do prejuízo advindo para a recorrente.

Quanto ainda à existência do prejuízo é evidente, explícita e inequívoca, sem necessidade de qualquer prova. No caso vertente, cremos que, é manifesta a procedência da ação principal de impugnação do ato administrativo cuja suspensão se requereu.

Ora, a recorrente, não teve oportunidade de produzir prova testemunhal e documental sobre os factos alegados, pois foi surpreendida com a douta sentença recorrida.

Ao contrário da constante na sentença recorrida, entende-se que está alegado e provado a existência do periculum in mora, isto é, o fundado receio de que quando o processo principal chegue ao fim e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada às situações jurídicas, envolvidas no litigio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja, pelo menos porque essa evolução conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.

Relativamente, à ação principal somente ter sido proposta em 02 de julho de 2015, e em que a decisão recorrida menciona que o prazo legal terminou em 13 de abril de 2015, em virtude do seguinte que transcreve: “Este prazo, pelas mesmas e exactas razões já consignadas a propósito da caducidade do direito de ação relativamente à pretensão de condenação à prática de acto devido, iniciou a sua contagem em 13.11.2014, suspendendo-se em 21/11/2014 com a reclamação apresentada pela Autora, cessando essa suspensão com o termo do prazo geral para decisão (30 dias, como resultava do art.º 165.º do CPA em vigor aquando da apresentação da reclamação), que terá ocorrido em 09 de janeiro de 2015, reatando-se a partir daí a contagem do prazo para a propositura da ação”, com o devido respeito, é ilegalmente inadmissível, em virtude de se aplicar em Direito Administrativo, o princípio da lei mais favorável ao administrado.

Assim, ora vejamos, consagra o n.º 3 do art.º 190.º do novo CPA que “3. A utilização de meios de impugnação administrativa facultativos contra atos administrativos suspende o prazo de propositura de ações nos tribunais administrativos, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa…”.

E o art.º 192.º n.s 2 e 3 do novo CPA consagra à contrário, que o prazo de 30 dias, sem que haja sido tomada uma decisão, confere aos interessados a possibilidade de utilizar o meio de tutela, administrativo ou contencioso, no caso dos recursos necessários e não nos facultativos, que é a nossa situação em concreto, ou seja: “2. O prazo para o órgão competente apreciar e decidir a reclamação é de 30 dias, podendo confirmar, revogar, anular, modificar ou substituir o ato reclamado, ou praticar o ato ilegalmente omitido. 3.º Quando a reclamação for necessária, o decurso do prazo referido no número anterior, sem que haja sido tomada uma decisão, confere ao interessado a possibilidade de utilizar os meios de tutela, administrativo ou contencioso, adequado para satisfação da sua pretensão.”.

Assim, a garantia do ordenamento Constitucional, designado de “Direito de Petição”, prevê que todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individual ou colectivamente, aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição, das Leis ou do Interesse Geral”, art.º 52º n.º1 da C.R.P.

Desta forma e segundo o art.º 266 nº 2 da CRP, Princípio da Legalidade que é “sem dúvida, um dos mais importantes Princípios Gerais de Direito aplicáveis à Administração Pública, e que aliás, se encontra consagrado como princípio geral de Direito Administrativo antes mesmo que a Constituição, o mencionasse explicitamente (art. 266º/2 CRP e art. 124º/1-d CPA).

Os órgãos e agentes da Administração Pública só podem agir no exercício das suas funções com fundamento na lei e dentro dos limites por ela impostos.

O princípio da legalidade aparece definido de uma forma positiva. Diz-se que a Administração Pública deve ou não deve fazer, e não apenas aquilo que ela está proibida de fazer.

O princípio da legalidade, cobre e abarca todos os aspetos da atividade administrativa, e não apenas aqueles que possam consistir na lesão de direitos ou interesses dos particulares.

A lei não é apenas um limite à atuação da administração é também o fundamento da ação administrativa.

A regra geral, não é o princípio da liberdade, é o princípio da competência. Segundo o princípio da liberdade, pode fazer-se tudo aquilo que a lei não proíbe; segundo o princípio da competência, pode fazer-se apenas aquilo que a lei permite.”; Amaral, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, Vol. I, Almedina, Direito Administrativo II, III, IV.

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