Acórdão nº 00346/10.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Março de 2016
Magistrado Responsável | Lu |
Data da Resolução | 18 de Março de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Município de Alfândega da Fé (…), interpõe recurso jurisdicional de sentença do TAF de Mirandela, que, em acção administrativa comum intentada contra si por S... & CA, S.A.
(…), o condenou ao pagamento de quantia certa.
Conclui da seguinte forma: A) O presente recurso vem interposto da Sentença de fis., proferida em 20.03.2013, o qual - e com a devida vénia se transcreve - julgou "a acção procedente e condena-se o R. a pagar à A. o montante peticionado de €12.412,03 a título de indemnização pelos danos emergentes e lucros cessantes, a que acresce os juros de mora à taxa prevista no art. 213º do REOP e no Despacho Conjunto n° 603/2004 (DR. n° 244, Série II de 16/10/2004, vencidos e vincendos sobre aquele capital, entre a data de citação até integral pagamento." B) Entende o RÉU que a Sentença recorrida fez mau julgamento dos factos carreados para o processo e errada interpretação e aplicação da lei, impondo-se, ao invés, absolver o RÉU do pedido, na parte em que foi condenado no pagamento à AUTORA de €11.852,51 a título de lucros cessantes.
C) O presente recurso tem por objeto, portanto, matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, e matéria de direito.
O) A sentença é nula, nos termos do disposto no art. 668º/1, d), 1ª parte, do Código de Processo Civil, porque deixou de se pronunciar sobre a prova de não ter sido feita a consignação da obra, e em consequência determinava uma decisão diferente.
E) Violando as normas dos arts. 799º/1, do Código Civil, n° 2 do art. 234º, do RJEOP, bem como do n° 2 do art. 660º, 1ª parte, do Código de Processo Civil.
F) Ora, embora tenha sido celebrado, em 07.04.2008, o contrato de empreitada de "Arranjos Urbanísticos em várias zonas da Vila-Escola EB1", até à sua rescisão, em novembro de 2009, não foi feito o auto de consignação da obra, o que significa que nunca se deu início à execução do contrato.
G) Este facto foi provado pelos depoimentos das testemunhas CMRG (cujo depoimento se encontra gravado na cassete no 1 Lado A de 00:00 a lado B 24:00), LMMF (cujo depoimento se encontra gravado na cassete n° 2 Lado A de 00:00 a 11:20) e MJAA (cujo depoimento se encontra gravado na cassete n° 2 Lado A de 11:20 a 14:79), e foi alegado pelo RECORRENTE em sede de contestação (artigo 18º).
I) A douta sentença considera provados todos os factos alegados pela AUTORA, fazendo a partir daí uma construção jurídica de culpa presumida do devedor, ora RÉU e recorrente, nos termos do disposto no art. 799º/1, CC.
J) Se a norma constante do art. 799º/1, CC, vale para a generalidade dos contratos, temos, no entanto, de atender às normas especiais que regulam certos tipos de contratos, como o contrato de empreitada de obras públicas, em especial as normas constantes do art. 234º do Regime Jurídico de Empreitadas de Obras Públicas, aprovado pelo DL 59/99, de 2 de março, diploma este em vigor ao tempo da celebração do contrato.
K) De acordo com o estatuído no n° 1 do art. 234º do DL 59/99, de 2 de março, nos casos de rescisão por conveniência do dono da obra, será o empreiteiro indemnizado dos danos emergentes e dos lucros cessantes que em consequência sofra. O cálculo desta indemnização pressupõe uma prévia liquidação por perdas e danos sofridos, que poderá implicar o decurso de algum tempo.
L) Para obstar a essa espera, o empreiteiro pode optar por receber desde logo como única indemnização a quantia correspondente a 10% da diferença entre o valor dos trabalhos executados e o valor dos trabalhos adjudicados, incluindo a revisão de preços correspondente (art. 234º/2).
M) Ou seja, o empreiteiro não pode esperar pela liquidação para de seguida optar por uma ou outra. Estando desde logo fixado o quantum da indemnização, o empreiteiro não pode optar pela medida do n° 2 (10%).
N) Não tendo sido feita a consignação da obra e, consequentemente, não tendo sido iniciada a obra, é forçoso invocar-se outros danos que não os resultantes com a elaboração da proposta e os custos com a manutenção de garantias bancárias! Não pôde falar-se de uma liquidação de algo que não é liquidável, porque não existe - o início da execução da obra! O) A medida prevista no n° 2 do art. 234º (10%) corresponde a um cálculo presumido de lucros. Permite aqui a lei que o empreiteiro possa optar (n° 2 do art. 234º) por um valor correspondente a uma margem de lucro que, sempre ou quase sempre, é superior à margem que o próprio fixou no preço da proposta.
P) Logo seria manifestamente abusiva a sua aplicação ao caso vertente fazendo recair sobre o RÉU o encargo desproporcional face aos eventuais prejuízos sofridos pela AUTORA.
Q) Ora, não resulta da douta sentença recorrida que a questão da não consignação da obra tivesse ficado prejudicada pela solução dada a outras.
R) Pela douta sentença recorrida ficou provado, no ponto 8. da respectiva motivação, que o RÉU declarou proceder à rescisão do contrato de empreitada celebrado com a AUTORA. Está, assim, presumida a culpa do RÉU pelo não cumprimento do contrato (Art. 799º/1, CC). No entanto, a prova da não consignação da obra e da ausência de quaisquer atos materiais no sentido da preparação dessa mesma consignação, como acima foram já demonstrados, determinava uma solução diferente quanto à condenação no pagamento a título de lucros cessantes.
S) A norma do art. 234º/2, RJEOP, determinava uma solução diferente, que seria a condenação do RÉU apenas pelo interesse contratual negativo, ou dano de confiança, justamente porque não foi feita a consignação da obra nem foram praticados entre a AUTORA e o RÉU quaisquer atos materiais tendentes à preparação dessa consignação.
T) O meritissimo juiz do tribunal a quo nunca poderia considerar prejudicada a decisão do facto provado da não consignação da obra pela solução dada à rescisão unilateral do contrato operada pelo RÉU.
U) No que concerne à impugnação da decisão relativa à matéria de facto, o concreto ponto de facto que a recorrente considera incorretamente julgado pela douta sentença recorrida é o constante do ponto 24. da respetiva motivação, que o deu como provado: "24. Se a A. tivesse executado a obra em causa poderia ter tido um lucro bruto de €11.852,51.".
V) Violando assim as normas constantes do art. 396º, n°s 1 e 2 do art. 564º, Código Civil, 655º e 659º/3, do Código de Processo Civil.
W) E que deve ser dado como não provado, alterando-se nesta parte a matéria de facto nos termos do disposto no art. 712º, CPC, sendo a sentença recorrida substituída por outra que absolva o RÉU nesse pedido (€11.852,51).
X) Os depoimentos das testemunhas CMRG e LMMF pecam por contradição e hesitação: não confluem naquilo que deva ser considerado lucros cessantes, porque são estes precisamente que a AUTORA peticiona na PI, art. 36. Na verdade pretenderam...
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