Acórdão nº 00596/04.8BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução31 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: M…, melhor identificada nos autos, impugnou as liquidações adicionais de IRS relativas aos anos de 2000 e 2001 e correspondentes juros compensatórios que a MMª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel julgou totalmente improcedente por sentença de 30 de Junho de 2008.

Inconformada, interpôs recurso para este TCA concluindo as alegações com as seguintes conclusões: A. A sentença proferida pelo Tribunal a quo é nula por força do disposto no artigo 125.º do CPPT e no artigo 668.º, n.º 1, al. d) do CPC, ex vi artigo 2.º, al. e), do CPPT, porquanto não se pronuncia sobre o vício de falta de fundamentação das liquidações, arguido pela ora Recorrente no seu articulado de impugnação, nem sobre o pedido de aproveitamento da prova testemunhal produzida no processo n.º 151/04.2BEPNF.

B. Ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, no ponto 6.º da contestação apresentada a Fazenda Pública confessou a imprescindibilidade do conhecimento e análise do quadro fáctico apurado na inspecção efectuada à M…, LDA., para conhecimento da base factual que determinou as correcções impugnadas, circunstância que exigia a notificação à ora Recorrente do Relatório de Inspecção da Empresa.

C. A Inspecção que deu causa às liquidações impugnadas foi, exclusivamente, motivada por uma denúncia de M…, sócio e ex-gerente da M…, LDA., D. Em face da prova testemunhal produzida no processo n.º 151/04.2BEPNF (cujo aproveitamento se requereu), designadamente através dos depoimentos da Dra. M..., de M... e de L…, e ainda em face dos depoimentos de M… e de M… prestados no processo n.º 12/04.5BEPNF e cujo aproveitamento nos presentes autos foi deferido, deveriam ter sido dados como provados os seguintes factos: • “O denunciante M… e a sua família viveram sempre num nível de vida superior ao que os seus rendimentos próprios lhe permitiam; • Era da empresa ora impugnante que retirava os rendimentos para sustentar as suas extravagâncias; • “Quando deixou de retirar dinheiro da empresa, foi-se endividando; • Pretendeu vender a sua quota aos gerentes da empresa por um valor exorbitante”; • “O M…, teve oportunidade, saber e motivação para adulterar os documentos e registos informáticos da empresa ora impugnante, previamente à sua apresentação em Tribunal"; E. Em face dos factos que se deverão considerar provados, não pode ser atribuída qualquer credibilidade aos elementos denunciados apreendidos no âmbito do processo cautelar n.º 584/02 que correu termos no Tribunal Judicial de Paredes.

F. Tal como resulta dos Relatórios, as liquidações impugnadas fundamentam-se, decisivamente, na reprodução fonética dos depoimentos prestados e gravados no âmbito do processo cautelar n.º 584/02 que correu termos no Tribunal Judicial de Paredes – designadamente no depoimento da Dra. M….– e que foram, na sua totalidade, declarados nulos por despacho transitado em julgado.

G. Com efeito, se é irrefutável que os actos de liquidação dependem decisivamente – senão exclusivamente – dos depoimentos declarados nulos, estamos, como é bom de ver, perante um manifesto e flagrante caso de invalidade consequente, o que implica que, em face da nulidade dos mesmos, sejam consideradas nulas também as liquidações impugnadas que dele depende decisivamente; H. A regularidade processual (de que o regime das nulidades constitui uma garantia) é uma concretização do direito à tutela jurisdicional efectiva pelo que – sendo certo que os limites impostos à produção de prova visam assegurar um núcleo intransponível de direitos fundamentais dos cidadãos – restará concluir que as liquidações impugnadas violam um direito constitucional de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, o que acarreta a respectiva nulidade nos termos do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA; I. Uma vez que o despacho em que se declara a nulidade do depoimento já transitou em julgado, os actos de liquidação ora impugnados ofendem o caso julgado por atribuírem putativos efeitos jurídicos aos depoimentos declarados nulos, circunstância que resulta claramente do disposto no n.º 2 do artigo 522º do C.P.C. que impede a invocação fora do processo de prova que aí tendo sido produzida aí haja também sido anulada; J. A ofensa ao caso julgado determina a nulidade das próprias liquidações nos termos da alínea h) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA; K. Os actos impugnados deverão ser anulados por falta da fundamentação legalmente exigida pelos artigos 62º n.º 2 do RGIT, 77º da LGT, 125º do CPA e 268º n.º 3 da CRP porquanto ao impugnante não foi dado a conhecer o Relatório da Empresa que se afigura verdadeiramente fundamental para a compreensão das liquidações impugnadas.

L. Tal como resulta dos Relatórios, a Inspecção não atendeu a toda a envolvente dos factos que deram causa à Inspecção, e, em vez disso, assimilou os elementos denunciados – os elementos apreendidos no processo cautelar – para deles tirar conclusões, que tentou validar com argumentação comprovativa, retirada desses mesmos elementos; M. Com efeito, todos os factos que vêm referidos nos Relatórios do ora Recorrente e no Relatório da Empresa baseiam-se – sem qualquer juízo crítico – no que os elementos denunciados indicam; N. Resulta do teor do Relatório que a Inspecção não cumpriu com o princípio do inquisitório e com o seu dever de imparcialidade, previsto nos artigos 55º e 58º da L.G.T., carreando para o processo apenas os elementos apurados que iam de encontro aos seus intentos de confirmação dos dados denunciados.

O. A Administração Fiscal não fez prova daquilo que alega, transparecendo antes dos Relatórios do ora Recorrente e do Relatório da Empresa – e consequentemente da sentença ora em crise – uma adesão exagerada e acrítica à denúncia, sem qualquer consideração pelo que é dito e inequivocamente demonstrado pela M…, LDA., e, a final, pela Recorrente; P. Assim, não tendo sido feita prova pela Inspecção dos factos que alega nos Relatórios, resulta “fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário”, circunstância que, nos termos do artigo 100º, do CPPT, conduz à anulação do acto impugnado.

Termos em que deverá dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, julgando se a impugnação totalmente procedente e provada, com todas as consequências legais.

II Recurso interposto da decisão de fls. 267.

A Impugnante requereu a inquirição de duas testemunhas por iniciativa do tribunal, o que foi indeferido pelo MMº juiz «a quo». Desse despacho foi interposto recurso a fls. 272 concluindo a Recorrente como segue: 1. Em Dezembro de 2004, a Impugnante apresentou p.i de Impugnação de liquidações adicionais de IRS, relativas aos anos de 2000 e 2001, na qual indicou apenas prova documental.

  1. Em Março de 2005, em virtude de ter tomado conhecimento de existirem duas pessoas com conhecimento de factos relevantes para a prova dos factos alegados na petição, a Impugnante apresentou um requerimento no sentido de se proceder à inquirição de testemunhas por iniciativa do Tribunal, nos termos do disposto no artigo 645° do C.P.C, aplicável subsidiariamente ao presente processo por força do posto na alínea e) do artigo 2° do C.P.P.T.

  2. o momento para a apresentação das testemunhas pelas partes é em processo tributário a p.i. de impugnação e a contestação da Fazenda Pública.

  3. Não obstante, prevê o no 1 do artigo 645° do Código de Processo Civil que “quando, no decurso da acção, haja razões para presumir que determinada pessoa, não oferecida como testemunha, tem conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa, deve o juiz ordenar que seja notificada para depor”, sendo neste ponto omissa a legislação processual tributária.

  4. É pois de aplicar supletivamente a este processo o disposto no Código de Processo Civil, permitindo assim que sejam inquiridas testemunhas por iniciativa do Tribunal.

  5. E é mesmo assim, uma vez que os princípios do contraditório e da descoberta da verdade material, que regem o processo tributário, impõem que o Juiz não só pode como deve realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade.

  6. E ainda que não se entenda não ser omissa a lei processual tributária neste aspecto, não se aplicando por isso o disposto no C.P.C. – o que não se concede – sempre deveria o Tribunal proceder à inquirição de testemunha por sua própria iniciativa, pela pura aplicação do princípio da verdade material e do inquisitório, que regem o processo tributário que desaconselham a que, até à sentença, se rejeitem novos elementos probatórios, porventura capazes de contribuir para atingir a verdade, com base em razões de mera disciplina processual.

  7. Mais a mais, sendo esta prática expressamente prevista para o processo civil, em que as partes se encontram em pé de igualdade e em que não existe um verdadeiro interesse público na descoberta da verdade, não pode ser ela restringida em processo tributário onde a Fazenda Pública está, ela própria, subordinada ao interesse público de descoberta da realidade dos factos.

Nestes termos e nos que V. Exas. Doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser o despacho recorrido revogado, julgando-se o...

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