Acórdão nº 00310/09.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelAlexandra Alendouro
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO JBALC propôs no TAF de Braga acção administrativa especial contra o MUNICÍPIO DE CAMINHA, visando a declaração de nulidade do despacho do Presidente da Câmara Municipal proferido em reunião do executivo, realizada no dia 22/12/2008, mediante o qual, conhecendo de um requerimento formulado por um Vereador, declarou o Autor, então Vereador, impedido de participar e votar os pontos 1 e 2 da Ordem de Trabalhos, concretamente a aprovação da “Proposta do Plano e Orçamento para 2009” e da “Proposta de Contracção de Empréstimos de Curto, Médio e Longo Prazos”.

Na referida acção foi proferida decisão, em singular, de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e), do CPC ex vi do artigo 1.º do CPTA, mantida, na sequência de indeferimento de reclamação para a conferência apresentada pelo Autor, por Acórdão que a indeferiu.

*Deste Acórdão vem o ora Recorrente interpor o presente recurso jurisdicional concluindo as suas alegações, como segue: 1 - O autor/recorrente foi vereador da Câmara Municipal de Caminha, no mandato de 2005 a 2009, após ter sido eleito democraticamente, em 9 de Outubro de 2005, na lista PPD/PSD.

2 - Desde então até ao final do mandato, Outubro de 2009, exerceu, em circunstâncias já apreciadas pelo tribunal a quo, as funções de Vereador e não as de vice-presidente, a tempo inteiro.

3 - O autor foi impedido de participar e deliberar sobre os pontos 1 e 2 da Ordem de Trabalhos da reunião do executivo da Câmara Municipal de Caminha, em 22 de Dezembro de 2008, após incidente prévio à reunião, deduzido por um dos vereadores e aprovado pela Presidente da Câmara Municipal em exercício, com fundamento nos artigos 44.º e seguintes do C.P.A.

4 - O Presidente da Câmara considerou que o vereador em causa, o ora recorrente, não estava capaz de efectuar uma ponderação objectiva, isenta e imparcial, podendo usar o seu cargo em proveito pessoal e impedir que a proposta (ponto 1 da Ordem de Trabalhos) fosse aprovada por questões de índole exclusivamente pessoal.

5 - Acresce que, na discussão e deliberação destes dois pontos da ordem de trabalhos, o recorrente foi substituído por um outro membro da lista do PSD, não eleito vereador.

6 - Ou seja, a decisão impugnada impediu e privou o autor/recorrente de participar e votar em duas decisões importantes para o órgão para o qual foi democraticamente eleito.

7 - Ora, in casu o autor/recorrente impugnou aquele despacho do Presidente da Câmara Municipal de Caminha, com fundamento em que o mesmo violou o conteúdo essencial do seu direito fundamental - de participar na vida política e no exercício de um cargo ou função para o qual foi democraticamente eleito, conf. resulta das disposições combinadas dos artigos 18º n.º 3, 48º, 49º e 58º da Constituição da República Portuguesa.

8 - Além de que invocou, o autor/recorrente, como fundamento do seu pedido, que o despacho em causa violou um direito de personalidade previsto no artigo 70º nº 1 do Cód. Civil que protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça e ofensa à sua personalidade física e moral.

9 - Ora, esta personalidade moral foi indiscutivelmente atingida pelo despacho cuja impugnação se peticionou ao tribunal, pois que o fundamento que lhe subjaz (ao despacho) é o de que o autor/recorrente não dispunha de idoneidade, de isenção e objectividade necessárias à participação na discussão daqueles dois pontos da ordem de trabalhos e de sobre eles deliberar, dado que havia o risco de usar o cargo em proveito pessoal, impedindo que as propostas fossem aprovadas por questões de índole exclusivamente pessoal (!?).

10 - Ora, no entendimento do autor/recorrente não pode sufragar-se legitimamente que a apreciação de uma invocada violação do seu direito de personalidade, uma ofensa à sua integridade moral, enquanto vereador eleito democraticamente para o exercício de um cargo político, perdeu interesse a partir do final do seu mandato, mormente por não ter sido reeleito.

11- A sufragar-se esta tese e tendo em consideração o tempo necessário para o tribunal proferir uma decisão após o desencadear de uma demanda, como sabe nunca inferior a seis meses, pelo menos em tal período de tempo antes de cessar qualquer mandato em órgão para o qual determinado cidadão foi eleito, qualquer privação efectiva do exercício do cargo, momentânea ou sucessiva, ficaria sempre sem tutela judicial.

12 - Por sua vez, o Estado de Direito entraria, assim, em período de vacatura, em que os órgãos da administração política central e local deixariam de ser regulados pelas leis da república e ficariam na dependência ou ao sabor de grupos maioritários de cidadãos, eventualmente nada interessados ou menos escrupulosos no cumprimento das mesmas (leis).

13 - Ou seja, a douta decisão em apreço consubstancia não só uma violação dos princípios constitucionais supra indicados, como uma grave denegação de justiça com efeito devastador no prestígio dos tribunais, órgãos de soberania vitais ao funcionamento da democracia, conf. resulta do disposto nos artigos 20º n.º 4 e 202º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

14 - De resto, a douta decisão em apreço, que nada decide (passe a aparente contradição) in casu constitui ainda uma ostensiva violação do artigo 202º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, pois que o tribunal a quo recusou-se (é o termo) a assegurar a defesa de um direito e de um interesse legítimo de um cidadão, do ora recorrente, além de que se demitiu de reprimir a violação da legalidade democrática e a dirimir um conflito entre aquele e um órgão da administração pública portuguesa local - a Câmara Municipal de Caminha ou Município de Caminha. De resto, 15 - estando in casu em causa a defesa de direitos, liberdades e garantias pessoais, o tribunal não cumpriu a lei, nomeadamente norma constitucional, ao não assegurar ao recorrente o procedimento judicial caracterizado pela celeridade e prioridade, de modo a obter a tutela efectiva em tempo útil da violação de direito por ele invocado de participar e deliberar no órgão político para o qual foi democraticamente eleito, conforme o impõe o artigo 20º n.º 5 da Constituição da República Portuguesa e os artigos 1º e 2º do C.P.T.A Sendo que, 16 - atendendo à manifesta urgência na resolução definitiva deste caso, à natureza das questões e à gravidade dos interesses envolvidos, sempre o tribunal poderia ter antecipado o juízo sobre a causa, dado que o caso sub judice se cinge a uma questão de direito, em conformidade com o disposto no artigo 121º do C.P.T.A. Assim, 17 - o argumento em que se estriba a douta decisão recorrida, de que perdeu interesse uma decisão judicial que redunda apenas em beneficio de uma das partes o Município de Caminha, choca o sentimento de justiça do comum dos cidadãos e, por isso, não pode nem deve ser aceite. Por outro lado, 18 - e com todo o respeito, subsiste todo o interesse na apreciação da legalidade do despacho em causa e aferir-se se foi legitima ou não a privação do recorrente do exercício de um cargo político para o qual, repete-se foi...

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