Acórdão nº 00096/12.2BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução20 de Maio de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: ARMN Recorrido: Estado Português Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel que julgou improcedente a supra identificada acção administrativa comum, na qual era pedido, designadamente, a condenação do Réu ao pagamento de €16.000,00 em sede de efectivação de responsabilidade civil extracontratual.

O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “1.ª Por força do disposto no art.º 1 da Constituição – e até de todo o espírito constitucional – a dignidade da pessoa humana – que assim é eminente – é a base da República Portuguesa. Arrancando dessa perspectiva de transcendência da pessoa humana, a Constituição, consagra, com força da aplicação directa consagrada no seu art.º 18.º, 1, o direito fundamental, que assiste a todas as pessoas, de “acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos”, que inscreveu no seu art.º 20.º, 1. Correlativamente, no seu art.º 202.º, 2 a Constituição vinculou os tribunais o dever de “assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.

  1. Neste conspecto, na administração da justiça, com base em artefactos processuais a que chamam princípios do dispositivo, da preclusão, do auto-responsabilidade das partes, ou análogos, nunca será lícita a objectivação da pessoa; o desprezo da vida com base na letra da morte, a supremacia da forma em detrimento da substância; a vitória do sofisma sobre a verdade; o primado do torto sobre o direito; a vingança do injusto sobre o junto.

  2. Com ressalva do muito respeito devido, tanto as decisões proferidas no processo que suscitou a presente acção, ao recusar o direito da Recorrente, nesse processo, ao recurso, como a sentença proferida nos presentes autos, estão nos antípodas da “mundividência” social e jurídica resumida nas conclusões anteriores, e consagrada na Constituição.

  3. A decisão recorrida até merece censura ainda bem mais forte, na medida em que postergou os factos referidos no parágrafo 7 destas alegações, mormente os que respeitam aos artigos 15, 16 e 17 da petição e 11 deste articulado, que mostram que foi o Tribunal que provocou o erro, que até induziu a outra parte no mesmo erro.

  4. Assim da omissão desses factos da fundamentação de facto, porque estão provados, decorre a nulidade prevista no art.º 668.º, 1, d) do CPC.

  5. Caso se entenda que esses factos estão impugnados, dada a sua relevância, deverão os mesmos dar lugar a base instrutória, anulando-se o julgamento, por força do disposto no art.º 712.º, 4 do CPC.

  6. Entendendo este Tribunal “ad quem” que, ampliando a fundamentação de facto, com os factos referidos no parágrafo 7 destas alegações, deverá condenar o Recorrido nos termos peticionados, porque o Tribunal que recusou o direito ao recurso violou o disposto nos art.ºs 1.º, 2.º, 20.º, 1 e 202.º, 2 da Constituição.

  7. No caso de se entender que as culpas devem ser repartidas (mas sem conceder), e que essa ampliação não permite apurar os respectivos graus de culpa, o julgamento deverá ser anulados, com base no disposto no art.º 712.º, 4 do CPC, para serem apurados esses graus de culpa.

A douta sentença recorrida deverá ser revogada, porque violou as normas invocadas nestas conclusões Justiça!”.

O Recorrido contra-alegou, em termos que aqui se vertem: “Comece-se por dizer que, salvo o devido respeito, a interposição do recurso a que ora se responde acentua o carácter insólito que a instauração da presente demanda, por si só, já evidencia(va).

Isto na medida em que traduz a vontade da Autora de, a todo o transe, atirar para cima do Estado responsabilidade que a este não cabe, agarrando-se a pretensão manifestamente descabida, porquanto sem ponta de fundamento à face da lei.

Ignorando, outrossim, os factos, o correspondente enquadramento jurídico e a pertinente fundamentação explicativa constante da douta decisão recorrida.

Como é sabido, o âmbito dos recursos encontra-se delimitado pelas respectivas conclusões, pelo que nos iremos ater às alinhavadas pela Autora, passando por cima do fumo de palha vertido na alegação recursiva.

Decorre dos autos que a Autora achou azado demandar aqui o Estado por ter deixado cair o prazo de interposição de recurso da sentença absolutória prolatada no âmbito da acção nº 23/08.1TBVLG, que intentara em 20/12/2007, através do respectivo mandatário judicial, no Tribunal Judicial de Valongo - indicando como causa de pedir a circunstância daquele processo não ter sido distribuído no ano de 2007, mas apenas em 2008 (cfr. arts 19º a 22º e 35º do petitório).

Sendo certo que o recurso sentencial que ali apresentou não foi admitido, por intempestivo – decisão essa que, em sede de reclamação, veio a ser confirmada pelo Tribunal da Relação do Porto.

Anotando-se que a extemporaneidade do sobredito recurso, à luz do regime jurídico a que a acção respectiva se encontrava submetida, é inquestionável.

E que todos os acima assinalados factos se encontram documentados e foram, sem controvérsia, dados como provados na decisão sob recurso (cfr. parte II, pontos A), B), D), F), G), I), e J)).

Por nós, tal decisão não merece reparo algum, não padecendo de nenhum dos vícios contra ela atirados, de forma genérica, vaga e imprecisa, pela Autora – não correspondendo à verdade o alegado na 4ª conclusão do recurso (considerando a factualidade e fundamentação da mesma constantes e o disposto nos arts 514º e 664º do CPCivil).

Como é sabido – e se encontra explanado na douta decisão recorrida -, a responsabilidade civil que a Autora aqui pretende colar ao Estado depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos ou requisitos: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade.

O que significa que a não verificação de um dos referidos requisitos/pressupostos acarreta automaticamente a inexistência de tal responsabilidade (cfr. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Responsabilidade Civil Administrativa, Direito Administrativo Geral, Tomo III, Dom Quixote, Maio 2008, p.19).

No caso presente, todos eles se encontram, a nosso ver, ausentes.

Sendo que a Mª juíza recorrida, em concreto, apreciou e afastou dois: o facto ilícito e o nexo de causalidade (entre o facto e o simplesmente imaginado/peticionado dano).

Aqui chegados, importa agora sublinhar que a Autora não contesta sequer neste recurso seja a factualidade em que tal ponderação assentou, seja o correspondente enquadramento jurídico.

Omissão – inteiramente compreensível, diga-se, face à real inexistência de argumentos atendíveis para o efeito – demonstrativa, por si só, da manifesta falta de fundamento do recurso.

Devendo salientar-se que, “in casu”, se mostra, na verdade, cristalinamente evidente que a circunstância de aquela acção nº23/08.1TBVLG ter sido distribuída em 2008 em nada afectou, nem podia afectar o regime jurídico a que, desde a sua pendência, ficou sujeita em matéria de recursos – tratando-se, para o efeito em questão, de facto totalmente inócuo.

Daí que se a Autora, devidamente representada por advogado, deixou cair o legalmente fixado prazo de recurso e, assim, perdeu o direito respectivo, nenhuma responsabilidade nisso pode ser imputada ao Estado.

Como lapidarmente se assinalou na acima aludida decisão do Tribunal da Relação do Porto (que confirmou o despacho de não admissão do recurso interposto para lá do prazo pela Autora): “A lei é clara ao fixar o momento da propositura da acção, não prevendo qualquer excepção, pelo que nenhumas dúvidas poderia ter o mandatário reclamante sobre a data a partir da qual o processo estava pendente em tribunal – o que sucedia desde Dezembro de 2007 -, sendo completamente irrelevantes as questões que suscita quanto à distribuição e ao facto de à acção ter sido atribuído o nº 23/08, que o terá induzido em erro – (e em nota/6) o que não deveria ter acontecido, sabendo o mandatário a data em que tinha remetido a PI para tribunal e, necessariamente, conhecendo a lei – artº 267º, nº1 do CPC”.

Isso significando que se a Autora, por desatenção ou negligência no tratamento/cuidado que entendeu dever dispensar à referida acção, se esqueceu, equivocou, enganou ou confundiu quanto ao prazo legal definido para a interposição de recurso da nela prolatada sentença, sibi imputet.

Sendo, ademais, de destacar que na referida acção nº...

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