Acórdão nº 00509/11.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Setembro de 2016
Magistrado Responsável | Joaquim Cruzeiro |
Data da Resolução | 23 de Setembro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO ARMF, SMDS e RALM vêm interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 15 de Julho de 2015, que julgou improcedente a acção interposta contra o Instituto de Emprego e Formação Profissional e onde era solicitado que devia: A) Ser declarado nulo, ou assim não se entendendo anulado, o despacho da Sra. Directora do Centro de Emprego de SJM, proferido em 24.02.2011, relativamente à reposição dos apoios financeiros concedidos à Oficina EFA, CRL; B) Ser declarado nulo ou anulado o despacho proferido pela Comissão de Coordenação do Prodescoop, de 14.12.2010, relativo aos apoios financeiros concedidos à Oficina EFA, CRL; C) Ser declarado que, com referência aos financiamentos concedidos à Oficina EFA, CRL, os AA. não estão obrigados à sua reposição junto do IEFP; D) Ser o IEFP condenado a reconhecer que, com referência aos apoios financeiros concedidos à cooperativa Oficina EFA, CRL os AA. nada devem ao IEFP.
Em alegações os recorrentes concluíram assim: 1. Os actos administrativos de que se recorre padecem de um vício de forma, por falta de audiência prévia, anulável nos termos do artigo 135.º do CPA, por violação do n.º 1 do artigo 100.º do CPA (antigo).
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Os actos em causa são: a. O despacho da Sra. Directora do Centro de Emprego de SJM, proferido em 24.02.2011, relativamente à reposição do apoio financeiro concedidos à Oficina EFA, CRL; b. Despacho proferido pela Comissão de Coordenação do Prodescoop, de 14.12.2010, relativo ao apoio financeiro concedido à Oficina EFA, CRL; 3. Apesar de ter considerado tratar-se “de uma formalidade essencial cuja violação tem como consequência jurídica a ilegalidade do acto, em regra, sancionada com a anulabilidade (…) uma vez que o artigo 100º do antigo CPA constitui uma concretização constitucional”, 4. O Tribunal a quo decidiu que “a administração encontrava-se – face ao incumprimento registado – estritamente vinculada à prática do acto impugnado, sendo a decisão nele incorporada a única concretamente possível, pelo que a preterição da audiência prévia (…) se degrada em mera irregularidade insusceptível de produzir os efeitos invalidantes invocados pelos Autores”, 5. Perfilhando a tese de que por força do princípio geral de direito administrativo do aproveitamento do acto, o acto administrativo, não obstante inválido, não deve ser anulado quando o acto não possa ser outro e não haja interesse relevante na anulação ou se comprove que o vício formal não teve qualquer influência na decisão.
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Contudo tal entendimento implica que o acto em causa seja vinculado e, mesmo tratando-se de acto vinculado, só será assim se se puder concluir com inteira segurança, num juízo de prognose póstuma, que aquele acto impugnado era o único possível.
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Quer o Decreto-Lei n.º 437/78, de 28 de Dezembro, quer o Termo de Responsabilidade assinado pelos AA. e que o Tribunal considerou “bom”, fazem apelo à verificação de INCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO para que se produza o acto de revogação do apoio.
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Através da margem de livre apreciação que a lei confere à administração a administração procede à concretização de conceitos indeterminados, como é o caso do conceito de INCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO que figura na lei como pressuposto para a revogação do apoio concedido.
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Não foi dada a oportunidade – através da audiência prévia – aos interessados, a quem se dirigirá o acto, para justificarem o incumprimento, apesar de essa formalidade ter sido considerada importante pela entidade que proferiu o acto uma vez que notificou alguns dos interessados, mas não os aqui AA., com violação do princípio da igualdade de tratamento dos interessados.
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Este conceito de INCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO não se encontra densificado de forma que o Tribunal está impedido de fazer um juízo de prognose póstuma acerca da necessidade ou desnecessidade do acto de audiência prévia e da eventual influência que o seu exercício poderia ter no acto final.
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O Tribunal não sabe se as razões que os AA. teriam apresentado em sede de audiência prévia preenchem ou não o conceito de INCUMPRIMENTO JUSTIFICADO pois este conceito - incumprimento injustificado - não está densificado.
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O Tribunal não pode validar a conduta da administração, dizendo que o acto é de conteúdo vinculado quando na verdade existe um conceito indeterminado INCUMPRIMENTO INJUSTIFICADO, cuja verificação constitui pressuposto para a prática deste acto pela administração, e que não se encontra preenchido pela administração, nem foi (nem podia) preenchido pelo Tribunal.
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Logo o Tribunal não pode afirmar com certeza absoluta que a administração estava vinculada àquele acto que foi praticado pois o acto a praticar está dependente do incumprimento ser considerado justificado ou injustificado.
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Acresce que o procedimento é o instrumento privilegiado para o interessado argumentar, contraditar, invocar as condições concretas que se verificaram no momento da concessão dos subsídios, as condutas negligentes das pessoas que conduziram os processos de atribuição dos subsídios, o meio certo para a administração examinar a conduta do particular, verificar se o incumprimento lhe é imputável, ou se existem causas de força maior que o impediram de cumprir.
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Não é possível concluir, sem margem para dúvidas que se os AA. tivessem sido ouvidos antes da decisão final, pela entidade competente para o efeito, a sua intervenção não teria provocado uma reponderação da decisão donde a violação do dever de audiência prévia tem que ter consequências invalidantes para o acto praticado.
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Da mesma forma não é possível fazer aqui aplicação do princípio do aproveitamento dos actos administrativos por não ser possível, num juízo de prognose, o Tribunal concluir que a anulação do acto não traria qualquer vantagem para o interessado.
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Em face de um acto inválido, de conteúdo positivo, desfavorável para o recorrente o tribunal só pode abster-se de o anular se esse acto for renovável, se for indiscutível a sua renovação independentemente das razões que forem apresentadas e se na prática se mostrar indiferente para o particular o momento da eficácia temporal do eventual acto renovador.
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Não é indiferente para os AA. o momento da eficácia temporal do eventual acto renovador: em face da anulação do acto administrativo e da eventual renovação do acto, os AA. teriam outros meios de defesa, designadamente a prescrição que poderia ser alegada pelos AA. logo em sede de audiência prévia, o que poderia implicar a alteração do acto administrativo.
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Além do mais a justa declaração de anulação do acto teria sempre, ao menos, como consequência a procedência da acção dos AA. e a consequente justa devolução ao património dos AA. das custas inerentes a todo o processo, pelo que não se pode afirmar ser indiferente para os AA. o acto já praticado ou o acto renovador.
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Tanto mais que estamos perante actos sancionatórios ou ablativos, que importam sacrifícios graves para os AA., situações em que é obrigatório dar relevo à participação dos interessados, convidando-os a exercer o direito de audiência prévia, não fazendo sentido lançar mão do princípio do aproveitamento do acto.
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Não é o Tribunal a entidade certa para valorar as razões apresentadas pelos AA..
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Até porque a entidade administrativa que revogou os incentivos atribuídos teve larga responsabilidade na concessão dos incentivos, fechando os olhos às mais elementares regras do bom senso, pelo que seguramente a invocação das razões dos AA. teria outro impacto se tais razões fossem alegadas, em sede de audiência prévia, perante essas entidades que “facilitaram” a concessão dos incentivos.
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Deve, por isso, ser declarada a anulação do acto administrativo praticado por violação do dever de audiência prévia, nos termos do artigo 100.º e 135.º do C.P.A. (antigo) e do artigo 267.º, n.º 5 da C.R.P.
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Ao contrário daquilo que vem referido no acórdão de que se recorre os AA. alegaram factos justificativos do incumprimento, a partir do artigo 36.º da petição inicial, onde apresentam as razões, e todo o circunstancialismo que os impediu de cumprir pelo que o Tribunal a quo lavra em erro quando diz que os AA. não invocaram na sua petição razões justificativas dos incumprimentos.
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Tendo os AA. alegado factos que o Tribunal a quo não considerou o acórdão é nulo nos termos do artigo 615.º, n.º 1, d) do N.C.P.C.
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Por outro lado, sob a rubrica erro sobre os pressupostos de facto e de direito, que o tribunal entende que não existe, o tribunal refere-se a um conjunto de factos que não fez constar do probatório, como devia, pelo que existe erro sobre a matéria de facto fixada.
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Foram considerados fundamentos para a decisão sobre o erro dos pressupostos de facto e de direito que não foram considerados na matéria de facto pelo que existe erro sobre a matéria de facto fixada, devendo por isso a decisão proferida ser anulada e ordenada a ampliação da matéria de facto nos termos do artigo 662.º, c) do N.C.P.C.
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Os AA. alegaram factos justificativos do incumprimento que têm que constar do probatório porque se trata de matéria essencial para a tese dos AA., porque o Tribunal a quo se pronuncia sobre ela, sendo essencial tal matéria constar do probatório para que o Tribunal superior possa sindicar o que foi decidido pelo Tribunal a quo.
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E se se entender que para proceder à ampliação da matéria de facto é essencial ouvir a prova apresentada pelos AA. essa prova deve ser ordenada.
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A simplificação da actividade do Tribunal, abstendo-se de ouvir a prova requerida pelas partes, só seria aceitável se o Tribunal validasse as razões de direito invocadas pelos AA., que necessariamente conduziriam à desnecessidade de ouvir a prova.
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O Tribunal não pode negar acolhimento às razões de direito expendidas pelos AA. – violação do dever de fundamentação, violação do dever de audiência prévia – e negar aos AA. a possibilidade de fazer...
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