Acórdão nº 00560/12.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelVital Lopes
Data da Resolução29 de Setembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE 1 – RELATÓRIO Da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por L…, Lda., contra a liquidação de IRC relativa aos exercícios de 2009 e 2010, recorrem a Fazenda Pública e a impugnante.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo (fls.251).

Na sequência do despacho de admissão, a Recorrente Fazenda Pública apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões: A – O Tribunal “a quo” considerou como custos na esfera jurídica da sociedade os encargos com deslocações com pessoal, relacionados com a alegada atribuição de ajudas de custo e quilómetros em viatura própria e portagens, atribuídas ao funcionário A…, B –Mas tais encargos não poderiam ser objeto de impugnação, visto que a IT, considerou-os como custo na esfera jurídica da sociedade e como rendimentos de trabalho dependente na esfera jurídica do trabalhador A…, NIF 1….

C – O douto Tribunal no ponto 3 da sentença (vide fls 14 a 20 da mesma) aprecia do alegado vício de violação pelo enquadramento da impugnante no regime de transparência fiscal, previsto no art.º 6.º do CIRC, e D – Concluiu não proceder o alegado vício de violação de lei pelo enquadramento da sociedade no regime da transparência fiscal, pois a atividade prosseguida pelos sócios, consta da lista a que alude o art.º 151.º do CIRS, não se podendo retirar da lei, que só as sociedades com dois ou mais sócios podem estar sujeitas ao citado regime de transparência fiscal; E – Ora, se impugnante exerce exclusivamente uma atividade de prestação de serviços, não constando do seu objeto social a realização de “vendas”, ou transmissão de bens, nem sequer está coletada numa atividade comercial de compra e venda ou transmissão de bens, mas sim numa atividade de pura prestação de serviços de “contabilidade, auditoria e consultoria fiscal”, F – Não se concorda com a conclusão do Tribunal “a quo” ao ter considerado como “vendas” os materiais utilizados na execução da contabilidade, assim como o envio das declarações eletrónicas e os encargos de deslocações aos clientes mais afastados da sede da impugnante, G – Retirando o Tribunal tal conclusão, porque a AT, segundo o seu entendimento, descurou a contabilidade da impugnante, onde haviam sido os proveitos contabilizados em contas separadas (uma de vendas, outra de prestação de serviços), “sem que fundamente explicasse o porquê de tal consideração”, H – E não se concorda pois, a IT verificou que o impugnante não registou na conta “compras” a aquisição daqueles bens e se não há compras não se percebe como possam existir vendas e, I – Demonstrou os pressupostos legais da sua atuação, sendo de considerar todos os proveitos da impugnante como “prestações de serviços”, porque tanto os materiais utilizados na execução da contabilidade, como o envio das declarações eletrónicas e os encargos de deslocações aos clientes mais afastados da sede da impugnante, são inerentes à própria prestação de serviços, ou seja, são uma componente subjacente à própria prestação de serviços.

J – A não ser assim, poder-se-ia afirmar ter existido contradição do douto Tribunal, ao enquadrar a sociedade no regime de transparência fiscal, por o seu sócio exercer uma atividade de pura prestação de serviços, incluída na lista anexa ao art.º 151.º do CIRS e ao mesmo tempo ser uma sociedade que efetua “vendas”.

Nestes termos e com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue totalmente improcedente a impugnação, assim se fazendo, JUSTIÇA».

A Recorrida apresentou contra-alegações, formulando as seguintes «Conclusões: A- Quanto às conclusões A e B, a recorrente não alega a existência de qualquer erro de julgamento - e em que é que este está traduzido –, em sede de facto ou de direito, da sentença recorrida que haja de ser repetido em outro sentido propugnado, esquecendo-se que o objecto da discussão, em sede de recurso jurisdicional é a sentença recorrida e não o acto da administração tributária. Mutatis mutandis, B- Também quanto às conclusões C a J, a Recorrente não dá cumprimento ao ónus de demonstrar a existência de erro de julgamento em matéria de facto ou seja, ao ónus de alegar em que ponto do raciocínio presuntivo judicial é que o julgador errou e quais as razões que evidenciam esse erro; quais foram as provas que foram erradamente ponderadas e porquê; em que é que o juízo de ponderação dessas provas está errado (em face de regras de experiência e senso comum, de regras técnicas, da lógica, do comum devir da vida económica das empresas e das pessoas, etc.).

Devendo o recurso ser julgado improcedente com esses fundamentos. Em todo o caso, C- Quanto às primeiras, AT não coloca em causa a correcção do julgado no plano factual, procurando jogar apenas no plano da polissemia do enquadramento jurídico dos dois factos no plano restrito da constituição da obrigação do IRC.

D- No entanto, conquanto o efeito jurídico, ao nível da constituição da relação jurídica do IRC, seja o mesmo, quer os gastos sejam despesas próprias com a organização administrativa da empresa não referentes às remunerações do seu pessoal, quer sejam gastos com as remunerações do pessoal – na medida em que, nas duas situações, sempre funcionam como custos e influenciam, na mesma medida, o apuramento do imposto (cfr. art.º 17.º do CIRC) – não deixam, porém, de ser factualmente um facto diverso, sendo que essa diversidade importa, em outros domínios, efeitos jurídicos diferentes, constituindo direito do contribuinte impugnar o concreto facto que é pressuposto pela administração para a prática do acto demonstrando.

E- A lei não impede que uma empresa de prestação de serviços, sujeita ao regime de transparência fiscal nos termos do art.º 6.º do CIRC, nas relações com os seus clientes, isole ou discrimine a parte da sua prestação que é composta por bens certos e determinados ou até de serviços determinados e específicos da outra parte consubstanciada apenas por uma diferente prestação de serviços, tratando-se de uma opção de administração que cabe na autonomia de gestão reconhecida aos sujeitos de direito.

F- Para haver venda de bens ou serviços que sejam autonomamente contabilizados também não é obrigatório legalmente que esses bens ou serviços estejam correspondentemente contabilizados numa Conta de “Compras”.

G- Aliás, quando esses bens ou serviços, facturados separadamente, sejam produzidos no próprio contribuinte nem isso será sequer possível; por outro lado, quando sejam adquiridos a terceiros, nada impõe que a uma operação tenha de corresponder consequencialmente a outra, daí não decorrendo que as verbas contabilizadas só possam ser relevadas dentro da Conta onde foram escrituradas ou que a falta de contabilização dentro de certa Conta impede a sua relevância ao nível da correcta realidade jurídico-fiscal e contabilística.

H- O Tribunal a quo não teve dúvidas em determinar os factos aqui em causa, nada impedindo, assim, que os mesmos sejam relevados para a determinação do lucro tributável.

I- Também aqui a recorrente argumenta apenas com base em fundamentos meramente formais que não são juridicamente idóneos, como o de os elementos contabilizados separadamente terem obrigatoriamente de estar ínsitos no valor das prestações de serviços. Pelo que, improcedendo as conclusões do recurso interposto pela FP, se fará JUSTIÇA».

A Recorrente impugnante, L…, Lda., também apresentou alegações que culminou com as seguintes «Conclusões:

  1. A AT omitiu do processo administrativo os suportes documentais que provam a prática de actos por funcionário sobre o qual impendia pedido de suspeição.

  2. Esses documentos, por serem essenciais à ponderação judicial da pretensão da recorrente deviam ter sido juntos aquando a organização do processo administrativo nos termos do artigo 111.º do CPPT.

  3. Devem , pois, os mesmos ser admitidos: c1) a todo o tempo, como consequência da violação do disposto no artigo 111.º do CPPT; ou, sem conceder, c2) porque a recorrente apenas tomou conhecimento substancial da sua omissão e da existência dos documentos no processo-crime em momento posterior à decisão; ou ainda, sem conceder, c3) A falta de elementos documentais, que a administração devia obrigatoriamente ter remetido ao tribunal, porque constituem meio de prova do alegado pela impugnante, constitui razão suficiente para que, em sede e no exercício dos poderes de modificabilidade da decisão de facto, se ordene a produção de novos meios de prova, pela fundada dúvida - ou assegurada certeza - de que a prova documental - processo administrativo - valorada pelo tribunal não contém todos os elementos que a lei impõe, não tendo sido, “et pour cause”, adequadamente produzida. - artigo 662.º, n.º 2, b), do CPC.

    Em consequência, d) Deve dar-se como provado o facto constante do artigo 15.º da PI, nos termos do qual “durante a tramitação do pedido de suspeição o senhor funcionário Fernando Ramos praticou actos e realizou diligências”, como resulta dos documentos que se anexam e que impõem ao tribunal decisão diversa quanto ao referido facto e quanto à ilegalidade da actuação administrativa dele decorrente.

  4. Na fundamentação do acto tributário a Administração está obrigada a ponderar os novos argumentos que eventualmente tenham sido aduzidos pelo contribuinte na audiência prévia e a explicitar as razões pelas quais entende não lhe conceder relevância, sob pena do acto se converter numa manifestação de abuso e arbitrariedade.

  5. O direito de audição e o dever de consideração dos elementos novos são violados se: (a) a administração nada refira sobre essa argumentação; (b) a administração se refugie em fórmulas pretorianas do género “face aos elementos enviados e após análise é de manter o acto”; ou (c) a administração não responda materialmente à questão levantada...

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