Acórdão nº 00581/14.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelCristina Travassos Bento
Data da Resolução12 de Abril de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I.Relatório A Fazenda Pública veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que na acção administrativa especial deduzida por A...

, devidamente identificado nos autos, a condenou a reconhecer a isenção de IMI ao prédio inscrito na matriz predial urbana da União de freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória sob o artigo 7..., fracção A.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “Em face de todo o exposto supra, a Recorrente formula as seguintes conclusões: 1.ª Por via do presente recurso pretende o Recorrente reagir contra a sentença proferida a 2017-03-23 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que determinou a anulação da decisão de indeferimento do pedido de isenção de IMI relativo ao prédio urbano propriedade do Recorrido e a condenação da Recorrente a praticar os atos administrativos necessários ao reconhecimento daquela isenção; 2.ª A decisão proferida pelo Tribunal a quo padece de: (i) nulidade, atento o facto de ter omitido pronúncia sobre questões, tendo sido suscitadas, deveriam ter sido apreciadas; (ii) subsidiariamente parede de erro de julgamento, atento o facto de não ter apreciado devidamente a prova inclusa nos autos e de não ter interpretado corretamente a lei aplicável ao caso vertente; e (iii) cumulativamente de padece de inconstitucionalidade, pelo facto de a interpretação efetuada pelo referido areópago ofender os princípios (iii.a) da igualdade tributária, (iii.b) da capacidade contributiva, (iii.c) da justiça fiscal, (iii.d) da autonomia local, (iii.e) da participação na decisão e (iii.f) de reserva de lei.

~I ~ 3.ª A sentença padece de nulidade pelo facto de não ter conhecido duas questões sobre as quais se deveria ter pronunciado; 4.ª Por via da Ação Administrativa Especial deduzida pelo Recorrido, visou este último colocar em crise o indeferimento do pedido de isenção de IMI em torno do prédio urbano do qual é proprietário; 5.ª Além da Contestação tempestivamente deduzida, a Recorrente apresentou ainda as suas alegações finais, por via das quais: (i) salientou o exercício de confundibilidade de conceitos jurídico-patrimoniais em que incorreu a Recorrida; (ii) alertou para a indissociabilidade da isenção sub judice ao conceito fiscal de prédio; (iii) salientou o erro veiculado na certidão emitida pelo IGESPAR; e (iv) suscitou a inconstitucionalidade da interpretação propalada pelo Recorrido; 6.ª Cada uma destas questões era perfeitamente identificável por parte de qualquer leitor; 7.ª O tribunal a quo entendeu que a questão a decidir se limitava ao seguinte: «Ao Tribunal cumpre apreciar e decidir da isenção de IMI do prédio inscrito na matriz predial urbana da União de freguesia de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória sob o artigo 7..., fracção A.»; 8.ª Contudo, não só este “elenco de questões” fixado pelo tribunal a quo veio omitir (i) a questão da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio e (ii) a questão referente às inconstitucionalidades da interpretação feita pela Recorrida; 9.ª Como também – e mais importante ainda – a própria fundamentação da sentença não dedicou uma palavra sequer àquelas duas questões não despiciendas; 10.ª A problemática em torno (i) da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio e (ii) das inconstitucionalidades da interpretação feita pela Recorrida, constituem verdadeiras questões e não meros argumentos; 11.ª Tão-pouco o tribunal a quo justificou – como se lhe impunha – a razão ou as razões que o levaram a não conhecer das restantes questões em causa suscitadas pela Recorrente; 12.ª A problemática em torno (i) da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio e (ii) das inconstitucionalidades da interpretação feita pelo Recorrido não eram (nem são) questões cuja resolução da (única) questão delimitada pelo tribunal a quo; 13.ª Ainda que o tribunal a quo tenha aderido à tese propalada pelo Recorrido, permanece por conhecer: (i) se a interpretação sobre o benefício fiscal aqui em causa poderá ser aplicado a uma universalidade de prédios, quando bem se sabe que uma universalidade não se subsume no conceito fiscal de prédio patente no artigo 2.º do Código do IMI; e (ii) se a interpretação veiculada pela Recorrida é ainda conforme aos princípios da igualdade tributária, da justiça fiscal e da capacidade contributiva; 14.ª A sentença não padece de uma “mera” fundamentação lacónica ou deficiente, antes configura uma “decisão surpresa”; 15.ª Acresce que, ao não cumprir um dos requisitos essenciais inerentes a uma decisão – i.e., a de convencer os seus destinatários – o tribunal a quo coartou um dos poucos mecanismos de controlo que assistem à Recorrente: o recurso para o Tribunal Constitucional; 16.ª Face ao exposto, deverá a sentença sub judice ser declarada nula; ~II ~ 17.ª Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que a mesma sentença padece de erro de julgamento; 18.ª Uma das circunstâncias que motivou o erro de julgamento em que incorreu o tribunal a quo reside no facto deste ter confundido os conceitos de Classificação e de Designação patentes na LBPC; 19.ª Analisada a evolução do conceito de Classificação ao longo das sucessivas leis nacionais do património cultural durante o século XX, verifica-se que: (a) na Monarquia Constitucional previa-se uma única graduação de Classificação (Monumento Nacional); (b) na 1.ª República previam-se duas graduações de Classificação (Monumento Nacional e Imóvel de Interesse Público); (c) no Estado Novo previam-se três graduações de Classificação (Monumento Nacional, Imóvel de Interesse Público e Valor Concelhio); (d) no início da 3.ª República foi introduzido o conceito de Categoria e alargadas as graduações de Classificação, sendo nunca foram aplicadas em virtude da Lei 13/85 não ter sido regulamentada; e (e) durante a 3.ª República e até ao surgimento da LBPC continuaram a ser aplicadas as graduações de Classificação criadas pelo Estado Novo; 20.ª A inegável tecnicidade do Direito do Património Cultural levou a que o tribunal a quo tenha incorrido em várias confusões, designadamente à utilização indiferenciada de conceitos jurídico-patrimoniais completamente distintos entre si, como sejam a Categoria, a Classificação e a Designação, razão pela qual alega que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional; 21.ª O artigo 15.º da LBPC veio consagrar três conceitos jurídico-patrimoniais distintos e com um recorte técnico preciso, a saber: (a) a Categoria, (b) a Classificação e (c) a Designação; 22.ª São três as Categorias previstas na LBPC (artigo 15.º/1): Monumento, Conjunto e Sítio, sendo que as suas definições, para o que releva no caso sub judice, constam da Convenção da UNESCO de 1972; 23.ª São três as Classificações previstas na LBPC (artigo 15.º/2): Interesse Nacional, Interesse Público e Interesse Municipal, organizadas numa escala de graduação decrescente; 24.ª A designação de Monumento Nacional está reservada exclusivamente para os monumentos, conjuntos ou sítios que se encontrem classificados como sendo de Interesse Nacional (artigo 15.º/3), ou seja, ao monumento, conjunto ou sítio (i.e., categorias) que se encontre classificado como sendo de Interesse Nacional (i.e., classificações) é-lhe ainda atribuída a designação de Monumento Nacional; 25.ª Ao afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional o tribunal a quo incorreu num erro de análise, na medida em que: (a) confundiu os atuais conceitos de Classificação e de Designação; e (b) confundiu o conceito de Designação introduzido pela LBPC com o conceito de graduação da Classificação como Monumento Nacional que vigorou entre o início da vigência do Decreto 20.985 de 1932 e a entrada em vigor da LBPC; 26.ª Desde 2001 que não existe uma classificação denominada de Monumento Nacional, mas apenas classificações denominadas de Interesse Nacional, de Interesse Público ou de Interesse Municipal, logo é manifestamente impossível afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional; 27.ª O Centro Histórico do Porto está classificado desde 2010-07-30, com a publicação do Aviso n.º 15173/2010, portanto, seria manifestamente impossível classificar em 2010, como Monumento Nacional, um bem cultural com uma classificação que não existe desde 2001; 28.ª Por outro lado, o conceito de classificação denominada de Monumento Nacional constante do Decreto 20.985 não equivale ao conceito de designação de Monumento Nacional constante da LBPC, pelo que também é manifestamente impossível afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como Monumento Nacional; 29.ª Outra confusão e imprecisão prende-se com a circunstância de se afirmar que o Centro Histórico do Porto está classificado como sendo Monumento Nacional em decorrência direta daquele ter sido “classificado como Património Mundial da UNESCO”, quando, na realidade, não existe qualquer classificação da UNESCO; 30.ª A “Lista do Património Mundial” a que se refere o artigo 11.º/2 da Convenção da UNESCO de 1972 e, portanto, a lista a que se refere o artigo 15.º/7 da LBPC é tão só uma lista que está a cargo do Comité do Património Mundial; 31.ª Ao inscrever um bem cultural na “Lista do Património Mundial”, o Comité do Património Cultural da UNESCO não está a classificar um bem, pois a classificação de um bem cultural depende sempre de prévio procedimento administrativo de Classificação (cfr. artigo 1.º do Código do Procedimento Administrativo de 2015 e de 1991; artigo 18.º da LBPC e artigo 1.º do Decreto-Lei 309/2009, de 23 de outubro); 32.ª A inscrição do Centro Histórico do Porto na “Lista do...

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