Acórdão nº 00638/17.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução12 de Abril de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório O..., Lda.

, melhor identificada nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, proferida em 08/02/2018, que julgou improcedente a reclamação formulada contra a decisão proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças de Coimbra, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 0809201701025767 e apensos, que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, relativo a dívida exequenda no valor de €12.142.67.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1. O presente recurso vem interposto de decisão que julgou improcedente a reclamação apresentada de despacho proferido por órgão de execução fiscal e, em consequência, não isentou a recorrente de prestar garantia.

  1. Desde logo, importa dizer que o despacho reclamado foi proferido sem que tenha sido cumprido o dever de audição do sujeito passivo relativo ao acto praticado.

  2. De modo que, a Administração Tributária desrespeitou os princípios da legalidade, da justiça e da imparcialidade, uma vez que, está por demais consagrada a obrigatoriedade da audição prévia do interessado.

  3. Sobre tal questão, a douta sentença recorrida pronunciou-se, limitando-se remeter para a jurisprudência firmada pelo STA nos termos do Acórdão n.° 5/2012, de 26.09.2012, que, salvo o devido respeito, não consubstancia nenhum Acórdão de Uniformização de Jurisprudência.

  4. Trata-se, sim, de um Acórdão proferido nos termos do art. 148° do CPTA, e não nos termos do art. 152° do CPTA.

  5. Não foi tido em conta que a recorrente foi impedida de suscitar quaisquer novos elementos no direito de audição, designadamente juntando a prova que a AT entende que o requerimento carece.

  6. É de realçar que, a suspensão da execução após prestação de garantia, nos casos enunciados nos artigos 52.° da LGT e 169.° do CPPT, bem como a decisão sobre a dispensa dessa prestação, nos casos previstos na lei, são de qualificar como verdadeiros actos administrativos em matéria tributária e não como meros actos de trâmite, de acordo com o disposto no art. 148.º do CPA.

  7. Assim, a par do desrespeito da igualdade das partes, cuja ratio entronca nos artigos 13.°, 20.°, 267.° n.° 5 e 268°, todos da CRP, é clara e inequívoca a violação dos artigos 100° e 148° do CPA, dos artigos 54.°, 55.°, 60.°, n.° 5, e 98.° da LGT e do artigo 44.° do CPPT, que expõem, clara e suficientemente, tal obrigação.

  8. Deste modo, a douta sentença é nula, nulidade esta que expressamente se invoca para os devidos efeitos legais.

  9. O douto despacho reclamado padece de falta de fundamentação.

  10. Tal despacho de indeferimento de dispensa de prestação de garantia não passa de um despacho-modelo copiado de muitos outros processos, salvo o devido respeito, elaborado em termos gerais e abstratos de forma a abranger um leque de casos, sem atender especificamente às circunstâncias de cada caso, designadamente às do caso sub judice.

  11. De modo que, inexiste qualquer fundamento que sustente o despacho reclamado.

  12. Num Estado de Direito como é o nosso, a fundamentação é um elemento estrutural do acto administrativo que, sem ela não é válido, juridicamente.

  13. Logo, tem de consistir numa declaração formal expressa, explícita e contextual que traduza a representação externa de um procedimento anterior volitivo e intelectivo da responsabilidade do órgão competente para a decisão e reflicta a sua história racional.

  14. Assim, a douta decisão recorrida ao entender que o despacho se encontrava suficientemente fundamentado, violou ou deu errada interpretação ao disposto nos artigos 74.°, n.° 1, 75° e 77.°, n.°s 1 e 2, todos da LGT, e ao previsto nos artigos 152.°, n.° 1 e 153.°, nºs 1 e 2 do Código de Procedimento Administrativo (CPA), sendo consequentemente nula, nulidade essa que expressamente se invoca.

  15. A douta sentença não teve em conta que, em sede de fundamentação dos actos tributários, a lei impõe, quer a chamada fundamentação substancial (pressupostos reais e motivos concretos aptos a suportarem uma decisão legítima de fundo), quer a fundamentação formal do acto administrativo, pelo que a mesma é, salvo o devido respeito, nula por não ter especificado os seus fundamentos de facto e de direito, de acordo com o disposto no artigo 125° do CPPT.

  16. Em virtude de padecer de escassos recursos económicos, não dispondo de meios económicos para prestar a garantia exigida, a recorrente requereu a dispensa de prestação de garantia.

  17. Invocando, a recorrente que os factos que justificam e provam a manifesta falta de meios económicos estão na posse da AT - porquanto tratam-se de elementos contabilísticos, 19. Porquanto, a recorrente está obrigada a enviar periodicamente declarações de IRC.

  18. É por demais evidente de tais elementos na posse da AT, que a recorrente não tem ativos suficientes para prestar a garantia bancária, nem tampouco tem acesso a crédito bancário.

  19. Os elementos que provam a manifesta insuficiência de meios são do conhecimento oficioso da AT.

  20. De qualquer modo, ainda assim, foi junto o balancete do imobilizado.

  21. O certo é que, tendo sido alegada a insuficiência económica, tendo sido junto em elemento contabilístico e invocados os demais elementos existentes na posse da AT, tinha a AT, salvo o devido respeito, a obrigação de proceder à investigação oficiosa, solicitando-lhe, eventualmente, os esclarecimentos que entendesse pertinentes, ao abrigo do princípio do inquisitório e da investigação e do dever de colaboração e de cooperação recíproca, e carrear para os autos os elementos concretos de prova que a recorrente afirmou estarem na sua posse.

  22. Em face do exposto, dúvidas não há que a douta sentença recorrida violou ou deu errada interpretação ao disposto nos artigos 170.° do CPPT e 52.°, n.° 4 da LGT, e aos princípios do inquisitório e da investigação e do dever de colaboração e de cooperação recíproca que impende sobre a AT.

  23. Assim, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, o que se invoca expressamente para todos os efeitos legais.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser revogada a douta decisão recorrida e substituída por outra que julgue a reclamação apresentada procedente por provada.

A SEMPRE E ACOSTUMADA JUSTIÇA!”****Não foram apresentadas contra-alegações.

****O Ministério Público junto deste Tribunal promoveu que se remetesse o processo ao tribunal recorrido, para que aí fosse emitida pronúncia acerca da invocada nulidade da sentença.

Contudo, o disposto no artigo 617.º, n.º 5 do Código de Processo Civil consubstancia uma faculdade, destinada às situações em que tal se mostre indispensável; uma vez que está em causa um processo com tramitação urgente e não se vislumbra a referida indispensabilidade, este tribunal opta por decidir o recurso desde já.

****Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em nulidade, por falta de fundamentação, e em erro de julgamento, por não ter concluído pela violação do direito de audição prévia previsto no artigo 60.º da LGT, por concluir que a decisão de que se reclama se mostra fundamentada e por considerar que não foi feita prova dos pressupostos de que depende a dispensa de prestação de garantia.

  1. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “1.

    Em 9/10/2017, foi apresentado pelo Reclamante no Serviço de Finanças de Coimbra, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 0809201701025767 e apensos, pedido de dispensa de prestação de garantia, relativo a dívida exequenda no valor de €12.142.67.

    (cf. informação constante a fls. 16 dos autos; requerimento a fls. 17 e informação constante do projeto de decisão a fls. 20 dos autos); 2.

    O pedido de dispensa de prestação de garantia referido no ponto anterior, cujo teor aqui se dá como integralmente reproduzido, não foi acompanhado de qualquer prova documental, constando do mesmo o seguinte: «(…) 2.º Dispõe o n." 6 do art. 199° do CPPT: "A garantia é prestada pelo valor da dívida exequenda, juros de mora contados até ao termo do prazo de pagamento voluntário ou à data do pedido, quando posterior, com o limite de cinco anos, e custas na totalidade, acrescida de 25/prct. da soma daqueles valores, sem prejuízo do disposto no n.º 13 do artigo 169.º.” 3.º Sucede que, a requerente padece de escassos recursos económicos - para tanto basta atentar aos baixos valores aqui em execução e que a mesma não consegue pagar.

    4.º Na verdade, a requerente não consegue fazer face às elevadas despesas que enfrenta, 5.º Que são inúmeras, 6.º Contando que os créditos também constituem despesas.

    7.º A verdade é que, a requerente tem de fazer face a diversas despesas, 8.º Considerando a sua situação económico-financeira, a requerente não dispõe de meios económicos para prestar a garantia exigida por lei.

    9.º Não obstante estar a canalizar todos os esforços económicos para cumprir pontualmente as suas obrigações, 10.º A requerente não dispõe de meios económicos para prestar a referida garantia.

    11.º Pelo que, vê-se totalmente impossibilitada de prestar a garantia exigida por lei para suspender os presentes autos.

    12.º E, mesmo que, por remota hipótese, que apenas se coloca por mera cautela de patrocínio, pudesse prestar tal garantia, sempre isso implicaria um prejuízo irreparável à mesma.

    13.º De facto...

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