Acórdão nº 00865/13.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório S…, Lda.

, pessoa colectiva n.º 5…, com sede na Avenida…, Matosinhos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 29/12/2016, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico, proferida pela Directora de Serviços de IRS, da Direcção de Serviços de IRS, interposto contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, proferida pelo Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, a qual fora apresentada contra o acto de liquidação de IRS e juros compensatórios do exercício de 2007, no valor de € 180.783,29, referente a importâncias não retidas na fonte a título definitivo, à taxa liberatória de 20%, nos termos do artigo 71.º, n.º 3, alínea c) do Código de IRS.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “

  1. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida no processo n.º 865/13.6BEPRT, UO 4, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente o pedido formulado pelo Sujeito passivo, que aí pugnava pela anulação do acto de liquidação adicional de IRS e respectivos juros compensatórios relativo ao período de tributação de 2007.

  2. De acordo com a fundamentação que se extrai da decisão proferida pelo Tribunal a quo, a improcedência da impugnação encontra-se ancorada na circunstância de que, remetendo-se para a alínea h) do n.º 2 do artigo 5º do Código do Imposto sobre as Pessoas Singulares, “à luz da referida disposição o sujeito passivo não é tributado em função de uma presunção de adiantamento de lucros, mas, isso sim, por causa de um adiantamento efectivo de lucros.” C) O sujeito passivo não se conforma com o decidido, porquanto o Tribunal a quo julgou erradamente a matéria de facto, assim como aplicou erradamente o direito aos factos dados como provados e considerou de forma errónea um facto como não provado.

  3. A convicção do julgador há-de formar-se por referência à prova da existência efectiva de um contrato de mútuo entre sujeito passivo e seu sócio-gerente e nunca por referência a uma realidade que um conjunto de indícios e meras ilações e conjecturas não certificados nem comprovados, podem (em abstracto) evidenciar.

  4. O Tribunal a quo ao deixar-se conduzir pela teia urdida pela inspecção tributária, entrou em contradição, dando como assente matéria para a qual não foi produzida qualquer prova.

  5. O princípio da “livre apreciação da prova” não permite a mera arbitrariedade. Funda-se em factores variados, como sejam: a lógica, a experiência, a contradição, a imprecisão, a indefinição, a independência, a razão de ciência, cujos significados nos dispensamos de explanar, face à evidência que dos vocábulos transparece.

  6. As conclusões extraídas do exame e leitura do RIT, não são confirmadas por qualquer outro elemento de prova e a forma como o relatório de conclusões de acção inspectiva se encontra redigido e elaborado não permite que dele se retire com a segurança necessária pela existência de um contrato de mútuo fictício.

  7. Após análise e ponderação da prova dúvidas não subsistem de que não é possível concluir que o sujeito passivo celebrou um contrato de mútuo fictício com o seu sócio gerente de forma a obstar à tributação requerendo-se a reapreciação da prova documental (art. 640º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do CPC ex vi art. 2º, al. e) do CPPT - cfr.).

  8. Em resultado da análise da prova documental não poderá deixar de considerar como provado que o sujeito passivo elidiu todos os indícios que apontavam no sentido da existência de um mútuo fictício.

  9. Da prova produzida resulta efectivamente demonstrada e provada a materialidade da operação.

  10. Como se demonstrou a operação é material, financeira e contabilisticamente verdadeira, uma vez que o contrato de mútuo em apreço tem subjacente um efectivo empréstimo do sujeito passivo ao seu sócio gerente.

  11. Cotejando a prova documental podemos concluir que o sujeito passivo celebrou, efectivamente – tal como flui do exposto – um contrato de mútuo com o seu sócio-gerente O….

  12. Em face desta demonstração resulta claro que não poderia a AT recorrer à presunção relativa a rendimentos da categoria E constante no n.º 4 do artigo 6º do Código de IRS tanto mais que a mesma apenas inclui “os lançamentos nas contas correntes dos sócios (…) quando não resultem de mútuos, da prestação de trabalho ou do exercício de cargos sociais.” claramente a hipótese que se encontra presente na situação vertente.

  13. Como estamos perante uma presunção legal de rendimentos da Categoria E, encontrando-se preenchida a base da presunção, à AT não incumbe o ónus de provar o facto a que ela conduz (cf. n.º1 do artigo 350º do Código Civil).

  14. Assim, no caso sub judice, a AT ao tributar o sujeito passivo com base no facto desconhecido – que tal importância depositada pela sociedade a favor do sócio gerente resultava de lucros ou adiantamentos dos lucros dessa mesma sociedade – fez subsumir o mesmo à norma do n.º4 do artigo 6º do Código do IRS.

  15. Contudo, e apesar de demonstrar a existência de lançamentos na conta corrente do sócio, não curou em demonstrar nem provar a base da presunção, ou seja que tal importância não resultava de mútuo pelo que, desta forma não se encontra preenchida a base da presunção.

  16. E não se encontrando preenchida a base da presunção não poderá a AT concluir pela desconsideração do facto justificativo dos lançamentos para a conta corrente do sócio – celebração do contrato de mútuo em 31/12/2008.

  17. Nesta medida, a liquidação, perante esta factualidade, não poderia ter sido efectuada ao abrigo daquela norma de incidência, que assim se revela indevida por inexistência deste facto tributário.

  18. Posto isto, a AT ao não fazer uma análise mais cuidada do título a que foram entregues as referidas importâncias, efectuou um errado enquadramento do rendimento in casu, determinando, assim, e de forma ostensiva uma correcção em sede de imposto na esfera do sujeito passivo.

  19. Pelo que deverá reconhecer-se que a sentença a quo procedeu a uma incorrecta aplicação do direito à factualidade apurada.

  20. Incorrendo em erro de julgamento, impõe-se a sua revogação por via da procedência da presente impetrância de recurso, dando-se como não provados os factos anteriormente transcritos da matéria assente nos termos em que decorrem nos presentes autos.

  21. Concluindo-se pela cabal demonstrabilidade dos factos alegados nos artigos 56º a 83º da PI.

  22. Ao contrário de quanto é referido pelo Tribunal a quo a AT não procurou recolher elementos necessários à obtenção da verdade material junto do contribuinte, conforme se refere, apenas baseando a sua fundamentação nos indícios recolhidos no âmbito do processo inspectivo desacompanhadas de outras diligências que as pudessem confirmar.

  23. Ao contrário de quanto é referido pelo Tribunal a quo, a AT, no exercício da sua actividade de controlo das declarações do contribuinte, não recolheu indícios, que à luz das normas de experiencia e da normalidade do acontecer, permitam sustentar que a AT cumpriu o ónus da prova quer sobre si impende, enquanto pressupostos que legitimam as correcções à matéria tributável.

  24. A sentença a quo procedeu a uma incorrecta aplicação do direito à factualidade apurada, violando o disposto no artigo 99º do CPPT e n.º 4 do artigo 6º do Código do IRS.

    Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exa., deverá ser revogada a sentença a quo, com o que se fará a Sã e Habitual JUSTIÇA!”****Não houve contra-alegações.

    ****O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

    ****Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    ****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na qualificação do facto tributário, ao julgar que o montante subjacente à liquidação impugnada era um adiantamento por conta de lucros a sócio da impugnante.

    1. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Factos Provados: 1. A Impugnante está colectada em sede de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas (IRC), pelo 1° Serviço de Finanças de Matosinhos (Código 1821), para o exercício de "outras actividades de saúde humana", a que corresponde o CAE 086906, remontando a data de início de actividade a 28/09/2000 (teor do relatório de inspecção tributária, nesta parte não impugnado).

    1. A Impugnante tem como gerentes O…, NIF 1…e F…, NIF 1… (teor do RIT a fl. 25 do PA, nesta parte não impugnado).

    2. A fls. 50 e 51 do PA, consta um documento escrito, denominado “Contrato de Mútuo”, datado de 31 de Dezembro de 2008, subscrito pela Impugnante e O…, com o seguinte teor: “Outorgantes: Primeiro: S…, LDA., NIF 5…, com sede na Avenida…, Porto, adiante igualmente designada por mutuante.

      Segunda: Prof. Dr. O…, NIF 1…, com domicílio na Avenida…, no Porto, adiante igualmente designada por mutuária.

      Entre o Primeiro e a Segunda Outorgante é celebrado e reciprocamente aceite o presente contrato de mútuo que se rege pelas cláusulas seguintes: CLÁUSULA PRIMEIRA Pelo presente contrato o Primeiro Outorgante concede à Segunda Outorgante, que aceita, um empréstimo no valor de 798.000,00 €.

      CLÁSULA SEGUNDA A quantia mutuada, referida na cláusula primeira, foi já entregue ao SEGUNDO Outorgante.

      CLÁUSULA TERCEIRA 1 – O empréstimo é concedido pelo prazo de 10 anos a contar da data de celebração do presente contrato com um período de carência de 3 anos.

      2 – O valor mutuado não será remunerado, não estando portanto sujeito a...

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