Acórdão nº 00504/16.3BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório Eólica…, Ld.ª, pessoa colectiva n.º 5…, com sede no Eco Parque…, Estarreja, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida em 31/01/2017, que julgou improcedente a acção para reconhecimento de um direito em matéria tributária, interposta contra o Ministério das Finanças, no pressuposto que esta questão jurídica se repete no tempo, para reconhecimento que a propriedade dos equipamentos instalados em S. Pedro, Serra da Boneca, freguesia de Canelas, concelho de Penafiel, inscritos na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 9…, não integra o âmbito da incidência objectiva do Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis (CIMI).

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “I. O presente recurso é interposto, desde logo, da decisão de fixação do valor da ação, nos termos e do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal recorrido.

  1. Na sentença recorrida a decisão sobre a fixação do valor da causa surge fundamentada por remissão para o n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT. Não obstante nada é referido na sentença recorrida quanto aos fundamentos de facto que presidiram a tal decisão, sendo certo que a própria aplicação da regra prevista na norma invocada pelo Tribunal a quo faz apelo à valoração dois critérios factuais – a complexidade da causa e a situação económica do recorrente.

  2. Em conformidade entende a Recorrente existir nulidade da decisão de fixação do valor da causa por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, porquanto exista identificação do normativo fundamentador não é apresentado qualquer facto e/ou racional que permita a apreensão da aplicação do direito ao caso concreto (artigo 615º, nº 1, alínea b), do CPC).

    IV.

    Sem prescindir, entendendo-se que a decisão se encontra fundamentada, de acordo com o disposto no n.º 2.º do artigo 108.º do CPPT (aplicável no presente caso ex vi n.º 4 do artigo 145.º do CPPT), cabe ao autor identificar o valor da causa e, sempre que a sua quantificação dependa de uma atuação administrativa, indicar a forma como pretende que a autoridade tributária proceda à sua determinação.

  3. A jurisdição tributária segue regras próprias de fixação do valor das causas previstas no artigo 97º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

  4. O direito que a Autora pretendeu ver reconhecido com a presente ação foi a ilegalidade da qualificação jurídica dos equipamentos que compõem o Parque Eólico… e que estão na origem da sua inscrição na matriz predial urbana de Canelas, Concelho de Penafiel, sob o artigo n.º U-9…, como prédio urbano do tipo “outros” nos termos conjugados do artigo 2.º, n.º 1, artigo 4.º e artigo 6.º, n.º 1 alínea d) e n.º 6, todos do Código do IMI, com todos os devidos e legais efeitos, designadamente a anulação da liquidação de IMI melhor identificada no intróito e, bem assim, de todas as que sejam emitidas na pendência da presente ação, pelo que as regras estabelecidas no nº 1 do artigo acima citado não poderão ser aplicadas ao caso em apreço.

  5. A qualificação de uma dada realidade como objeto de tributação em sede de IMI tem como consequência imediata a fixação do seu valor patrimonial (€ 254.406,00, no presente caso) e como consequência mediata, não apenas a sua tributação em sede deste imposto (no valor anual referente a 2014 de € 786,13), pelo tempo em que se mantiver a sua propriedade às taxas que a cada tempo vierem a ser definidas, mas também, e desde logo, a tributação da sua potencial alienação em sede de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) (cf. n.º 2 do artigo 1.º do Código do IMT) e/ou em sede de Imposto do Selo (cf. n.º 6 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo e verba 1.1 da respetiva tabela geral) que não ocorrendo na esfera da Autora, ora Recorrente, é um fator a ponderar que pode condicionar uma futura operação de alienação.

    VIII.

    Nas situações não previstas no nº 1 do artigo 97º-A do CPPT deve aplicar-se o nº 2 do mesmo artigo, o qual determina que “o valor é fixado pelo juiz tendo em conta a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante, tendo como limite máximo o valor da alçada da 1ª instância dos tribunais judiciais”.

  6. Por força do disposto no n.º 1 do artigo 306.º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, a competência para a fixação do valor da causa é do juiz, sem prejuízo do dever de indicação do mesmo na petição inicial que sobre as partes impende. Atentas as finalidades de ordem pública relacionadas com a organização e funcionamento dos tribunais e a própria definição do direito de acesso à justiça, que a fixação do valor da causa visa prosseguir, tal determinação integra o núcleo de questões cujo conhecimento e apreciação reveste natureza oficiosa. Como critério norteador de tal decisão apresenta-se a regra segundo a qual, em matéria da determinação do valor da causa a trave-mestra do sistema assenta no conceito de utilidade económica do pedido, e traduzindo-se este num “benefício” que se pretende obter, o seu valor é a quantia a ele equivalente.

  7. Quanto à recorribilidade das decisões, determina o n.º 4 do artigo 280.º do CPPT que “Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância.”, sendo que o valor da alçada dos tribunais tributários de 1ª instância é (no que ao caso se aplica) igual ao valor o da alçada da 1ª instância dos tribunais judiciais, correspondente a € 5.000 (cf. artigo 105.º da Lei Geral Tributária e artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).

  8. A ora Recorrente, considera, salvo o devido respeito, que na determinação do valor da causa poderia o Tribunal ter seguido um de dois critérios: (i) ou fixava o valor da causa por referência ao valor patrimonial tributário do prédio cuja qualificação jurídica enquanto objeto de IMI é questionada, aplicando por analogia a regra prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, (ii) ou assumia o critério residual previsto no n.º 2 do artigo 34.º do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), fixando o valor da causa em € 30.001,00 (cf. n.º 4 do artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e artigo 44.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).

  9. Relativamente ao primeiro critério, apesar de o considerar admissível, a ora Recorrente entende que o mesmo não traduz a efetiva aplicação do princípio da utilidade económica do pedido na determinação do valor da causa. E isto porque no presente caso, fosse reconhecido à Recorrente o direito peticionado, a tradução económica de tal benefício quantificável à data da decisão limitar-se-ia à poupança do imposto já liquidado em razão da sujeição objetiva afastada. No entanto, e por outro lado, há uma vertente deste benefício que não pode ser negligenciada e que é à data inestimável como seja a avaliação da poupança do imposto que viria a ser liquidado (determinada pela duração da titularidade do direito de propriedade sobre os equipamentos em causa) e o impacto intangível que a consideração destes bens como objeto de incidência tributária de outros impostos (e.g., IMT e Imposto do Selo) poderá ter na sua alienação futura.

  10. Por estas razões, a Autora, ora Recorrente, entende ser de afastar a aplicação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, considerando-se neste caso ter a ação em causa um valor não previsto no n.º 1 daquela norma, e indeterminado à data da sua propositura.

  11. Admitir que nas causas de valor indeterminado a fixação do valor da causa fica limitada ao máximo correspondente ao valor da alçada dos tribunais tributários, significa, pois, assumir desde logo que estas causas não admitem recurso ordinário, o que constitui um inexorável constrangimento do direito constitucional à proteção jurídica que tem acolhimento genérico no direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, na sua vertente de acesso aos tribunais, previsto no artigo 20.º da CRP.

  12. Mais a mais, os subcritérios definidos na norma em análise para definição do valor da causa – “a complexidade do processo e a condição económica do Impugnante” – autorizam a conclusão de que a aplicação daquele referencial à determinação da recorribilidade da decisão de 1ª instância é desajustada porquanto, desde logo a aplicação de tais critérios é suscetível de justificar um valor da causa superior a € 5.000 e, por outro lado, a sua aplicação produz uma injustificável discriminação no direito de acesso à justiça, desde logo em razão da condição económica do impugnante/autor, violadora do princípio da igualdade previsto no n.º 2 do artigo 13.º da CRP. Nesta medida, a única interpretação consentânea com os princípios constitucionais estruturantes do Estado de Direito acima referidos é a de que a norma do n.º 2 do artigo 97.º-A do CPPT deve ser interpretada no sentido de que a limitação ao valor que pode ser atribuído à causa pelo Juiz não tem aplicação, desde logo, para efeitos de determinação da recorribilidade da decisão.

  13. Neste contexto considera a Recorrente que, fora dos casos expressamente previstos no n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, na fixação do valor das ações que devam seguir a sua tramitação no âmbito da jurisdição tributária cujo valor económico do pedido não seja determinável, deve seguir-se a regra prevista no n.º 2 do artigo 34.º CPTA, aplicável ex vi alínea c) do artigo 2.º do CPPT. Em conclusão, considera a Autora, ora Recorrente, que deveria ter o Tribunal a quo fixado o valor da presente ação em € 30.001,00.

  14. Não o tendo feito, o Tribunal a quo incorreu em erro de...

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