Acórdão nº 00019/03 - Porto de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | Paula Moura Teixeira |
Data da Resolução | 22 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A Recorrente E…, LDA, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto datada de 09.03.2017, que julgou improcedente a pretensão deduzida na impugnação judicial da liquidação n.° 900 099 de 30.08.2002 de imposto sobre o álcool e as Bebidas Alcoólicas (IABA), no montante de € 12 270.80 e juros compensatórios.
Formulou as respetivas alegações no âmbito das quais enuncia as seguintes conclusões: “(…)I. Salvo devido respeito por opinião em contrário, não poderia a Recorrente concordar, nem tão pouco se conformar com a douta decisão do Tribunal a quo, desde logo, por considerar que fixou-se como assente matéria que não ficou demonstrada e, pelo contrário, da douta decisão resulta não provada factualidade comprovada por prova testemunhal.
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N verdade, toda a fundamentação da decisão de que ora se recorre e fez-se por remissão quase integral ao relatório elaborado pelos Técnicos da Fazenda Pública, tal é, desde logo, percetível na estrutura da enumeração da matéria assente, onde não raras vezes faz-se referência a “refere o Relatório”, “pronuncia-se aquele relatório”, “este relatório conclui”. Assim, considerou-se provado que no relatório de inspeção formularam-se determinadas conclusões, mas em bom rigor, nada se disse quanto à matéria resultante do mesmo.
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Ora, deve ter-se como deficientemente fundamentada, por obscuridade, a sentença que quanto à matéria de facto dada como provada remete para todo um relatório da inspecão tributária sem discriminar nenhum dos factos neles contidos.
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Relativamente ao que motivou a meritíssima juíza na explanação das suas conclusões, salvo devido respeito por opinião em contrário, entende a Recorrente que deveriam ter sido considerados provados os seguintes factos e que, indevidamente foram considerados não assentes: a. “não se provou que a movimentação de produtos de uma empresa para a outra ocorresse sem controlo”; “não resulta dos autos a proximidade entre as duas empresas levasse uma confusão entre as duas”; b. “que a taxa de rendimento, efetiva, do álcool adquirido pela impugnante, seja de 99.7% 100%”; V. Tal resulta essencialmente do depoimento prestados pelas testemunhas A..., registadas em ficheiro áudio (cassete original 1, 0010 a 1471) e M... (cassete original 1 1476 a 2400) que foram prestados de forma clara, isenta e credível; VI. Assim como, entende Recorrente que foram indevidamente considerados provados os factos consagrados nos pontos 8, 9, 10, 11, 12 e 14 (na medida em que se imputa à Recorrente a obrigatoriedade de pagar o montante resultante da liquidação levada acabo pela Fazenda Pública); VII. A Recorrente nunca agiu com dolo de prejudicar a Fazenda Pública, tendo justificado as divergências verificadas em sede de inspeção; VIII. Nomeadamente, não se pode considerar provado que, aquando do varejo, faltavam 4.192 selos, porquanto ficou demonstrado pelos depoimentos das testemunhas A..., registadas em ficheiro áudio (cassete original 1, 0010 a 1471) e M... (cassete original 1 1476 a 2400). Que além dos que haviam sido contados, existiam muitos outros guardados noutro local, tendo a Recorrente dado conhecimento de tal facto aos inspetores e tendo os mesmos se recusado a proceder a uma nova recontagem, mesmo sabendo que, pelo número de série, facilmente conseguiriam perceber se estariam em causa selos adquiridos antes ou após do varejo; IX. Os selos efetivamente em falta eram 275, sendo que a sua falta se justificou pela deterioração normal e lacuna na baixa dos mesmos no sistema, contudo lacuna assumida pelos funcionários da Recorrente, confirmando que nunca houve qualquer intuito fraudulento por parte desta; X. A Recorrente requereu uma segunda contagem dos selos, a qual foi indevidamente negada. Ao agir do modo que agiu, a Fazenda Pública violou os princípios constitucionalmente consagrados do contraditório, igualdade de meios, segurança jurídica. Pelo que o relatório conclusivo e liquidação operada deverão ser consideradas nulas.
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Igualmente, em relação à Vodka Ducal, que apenas baseado em deduções não confirmadas documental ou testemunhalmente, o relatório da inspeção e consequentemente o douto tribunal descuraram o facto da Recorrente apenas comercializar (e não produzir) o mencionado produto, pelo que, relativamente ao IEC, o mesmo já havia sido liquidado pela firma “Grossão S.A.”, aquando da sua introdução no consumo; XII. A Recorrente fez, igualmente prova, que possui uma taxa de rendimento de quase 100%, pelo que, a fundamentação acatada pelo Tribunal de que “é pouco provável” isso acontecer, não pode ser acatado para efeitos de liquidação de imposto; também aqui, em depoimento prestado por A..., registadas em ficheiro áudio (cassete original 1, 0010 a 1471) e M... (cassete original 11476 a 2400). A Recorrente demonstrou como consegue obter essa taxa.
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Ou seja, na modesta opinião da Recorrente a liquidação operada pela Fazenda Pública padece de erros que a inquinam de nulidade e que a meritíssima juíza não poderia descurar tal facto nem as justificações apresentadas por aquela para as vicissitudes verificadas; XIV. A douta decisão viola o artigo 10º do Código dos Impostos Especiais Sobre o Consumo. Termos em que, revogando a douta sentença e anulando a liquidação operada, farão V. Ex.as a costumeira justiça. .
” A Recorrida não apresentou contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respectivas alegações, sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito.
3.
JULGAMENTO DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: (…)Factos Provados: 1. A Impugnante, E…, Lda. é uma sociedade por quotas, cujo objecto consiste no fabrico e comércio de licores para consumo interno e exportação de vinhos e aguardentes ou artigos afins, possuindo ainda o estatuto de depositário autorizado, sendo titular do entreposto fiscal de produção n.° 39914729, sendo a sua principal actividade a produção de licores - cf. certidão da Conservatória do Registo Comercial de Santo Tirso e Informação/parecer elaborado pela Alfândega do Porto a fls. 62 e seguintes dos autos; 2. Pela Ap. 22 e 23 de 24.05.2000 a sede da Impugnante passou a ser na Rua de Santo António, Armazém 1, Lugar de Torrão, freguesia de Água Longa, Santo Tirso - cf. a mesma certidão emitida pela Conservatória do Registo Comercial de Santo Tirso a fls. 11 e seguintes dos autos; 3. De acordo com a mesma Ap. Verificamos que são sócios da Impugnante J..., José... e C... - cf. Certidão da Conservatória do Registo Comercial de Santo Tirso a fls. 11 dos autos; 4. Desde 19.01.2001, J..., por unificação das quotas pertencentes a José... e sua mulher, detém a sociedade J… & Ca., Limitada, cujo objecto é a actividade comercial de bebidas e comércio em geral e cuja sede se situa na Rua…, freguesia de Água Longa, Santo Tirso - cf. certidão da conservatória do Registo Comercial de Santo Tirso, constante de fls.17 e seguintes dos autos, referente a esta sociedade; 5. Em 07.01.2002 iniciou-se uma acção de fiscalização, visando a sociedade Impugnante, com a autorização n.° 020013, que deu origem à instauração do Processo Administrativo ISB.02.05.02, e que foi concluída em 05.07.2002 - cf. relatório final de acção inspectiva constante de fls. 86 e seguintes dos autos; 6. Pelo ofício n.° 533 de 09.07.2002 da Direcção-geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo - Direcção de Serviços Antifraude, Divisão Operacional do Norte, foi a sociedade impugnante notificada do projecto e conclusões, nos seguintes termos: “na sequência da diligência realizada nessa empresa, com início em 09.01.2002 e finalizada em 05.07.2002, junto remeto a V. Exa. o projecto de conclusões do relatório, devidamente fundamentado, nos termos do art. 60° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, aprovado pelo DL 413/98 de 31 de Dezembro.
Mais informo V. Exa. que deverá exercer o sei direito de audição pronunciando-se sobre o mesmo projecto dentro do prazo de 10 dias, oralmente ou por escrito (...)” - cf. notificação constante de fls. 46 dos autos, para qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; 7. Exercido que foi o direito de audição em 01.08.2002 foi elaborado Relatório Final da Acção Inspectiva, que foi objecto do parecer “considerando pertinentes as constatações a que o Sr. Inspector chegou, as suas propostas e conclusões deverão ser levadas à prática” - cf. fls. 85 e seguintes dos autos 8.
A Inspecção id. em 5. iniciou-se com a realização de um varejo, do qual resulta: “não foram detectadas divergências significativas (apenas 112 garrafas em falta para os vários produtos - o que corresponde a uma dívida de €136. 05, cujo cálculo se encontra no anexo 1; Para o produto TIGIRO constatou-se a existência de 134 garrafas, quando contabilisticamente só existiam 51 (...); (...) existiam 8 142 selos. Do estudo efectuado, conclui-se pela falta de 4 192 selos, sem que exista qualquer explicação quanto ao destino dado aos mesmos. (...) (...) A empresa não possui uma conta corrente relativa à aquisição, utilização e inutilização dos selos (...).
À data da realização do varejo, 09.01.2002, não havia registo de qualquer produção realizada no ano de 2002, contudo dois factos parecem apontar em sentido contrário, a saber: As existências de selos constantes do inventário à data de 31.12.2001 eram de 9000, enquanto à data da realização do varejo eram de apenas 8142; As existências de...
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